A FILHA DO NOIVO

6. Ela tem feito um ótimo trabalho

– Kaykay, a mãe quer conversar um pouquinho com você a sós. – Olhei para Bela e Clara que estavam ao meu lado. – Relaxa, não vamos demorar muito, eu prometo. – Caminhamos um pouco a frente de onde o grupo estava e sentamos na areia.

– Está tudo bem, mãe?

– Claro que está, você está aqui comigo, não teria como estar melhor. O que preciso falar é importante, mas não me leve a mal. – O coração disparou e as mãos ficaram geladas, ela havia descoberto de alguma forma o que havia acontecido entre a Bela e eu.

– O que foi?

– Ontem, depois da conversa que tivemos… – Ufa. – Eu conversei com Maurice, não quero que me leve a mal, filha, mas de algum modo ele me ajuda a pensar de uma forma melhor.

– Claro, mãe, não fico chateada com isso. – Segurei sua mão. – E então?

– Bem, ele falou a mesma coisa que Bela, o apartamento é seu pelo tempo que precisar, e quanto a trabalho, ele é amigo de um dos donos da Souza & Osório, dependendo da resposta que obtiver do seu trabalho em São Paulo ele pode conversar com esse amigo, apenas conversar, você que provaria se é qualificada ou não para estar ali. – Sorri com tudo aquilo. – Você continua disposta a deixar Yousef e São Paulo para trás, certo?

– Muito certo, não me vejo mais nenhum um segundo com aquele homem, aquela cidade já me ofereceu o que poderia oferecer, quero começar uma vida nova, cercada de pessoas que realmente gostem de mim.

– E apesar de lamentar muito o que houve, fico feliz que esteja de volta, a minha filha cheia de luz e sorrisos. – Ela cochichou em meu ouvido. – Bela tem feito um ótimo trabalho.

– Como assim, mãe? – Afastei um pouco para observar seu rosto.

– Eu não sei de nada, mas os olhos de vocês não mentem… – Ela se levantou e saiu, fiquei ali sentada por um pouco mais de minuto.

– Foda! – Falei enquanto limpava a areia do short, olhei para o mar calmo, olhei para a família que estava reunida e conversando, tirei minha camiseta e o short… Caminhei lentamente para o mar e mergulhei, a água cristalina era como tomar banho de céu em final de tarde, pois os tons avermelhados do pôr do sol refletiam na água, fechei os olhos e me deixei relaxar.

– Tudo bem, prima? – Clara apareceu do meu lado olhando para o céu. – Sua Bela está preocupada, depois da conversa com sua mãe se enfiou no mar e não mais saiu.

– Está tudo bem, Clarinha. Só vim relaxar um pouco, esse mar tão tranquilo está num contraste perfeito com meus pensamentos conturbados.

– Quais pensamentos?

– Eu vou voltar para o Rio, conseguir um novo emprego e deixar acontecer o que tiver de acontecer.

– Isso se refere a?

– Tudo, minha vida profissional vai começar praticamente do zero, minha rotina vai mudar e finalmente não vou precisar ficar pensando no quê devo fazer para não aborrecer o Yousef, vou viver longe da bolha de ignorância e preconceito dele.

– Foi tão mal assim o que aconteceu? Sabe, eu nunca gostei dele, mas era a sua vida e eu jamais teria o direito de interferir em qualquer coisa.

– Foi bem mal, mas eu fui tão bem acolhida por você sabe quem, ela esteve na noite mais difícil que já havia vivido e fez com que ela se tornasse leve.

– Deve ser um aviso, às vezes precisamos passar por momentos ruins para encontrar um bom caminho.

– Você fala como ela, sabia? – Sorri com aquilo. – Ou era apenas eu que vivia fechando os olhos para as possibilidades?

– As duas coisas, acho que viveu muito tempo tentando ser alguém que se anula para que não houvesse briga e agora, você esbarrou em alguém que simplesmente quer que você seja apenas você e que adora essa pessoa.

– Quantos anos você tem mesmo, hein?

– Dezenove com idade mental de quarenta. Agora vamos sair dessa água, está começando a esfriar. – Dei um mergulho e saí do mar, peguei a roupa que havia deixado na areia onde conversava com minha mãe minutos atrás e fui até o grupo que estava reunido em uma pequena roda. Enquanto me aproximava via os olhos de Belinda, neles não havia apenas o desejo, que estava bem evidente, havia algo mais, algo que me acalmava o coração… Havia admiração.

– Pensei que as mocinhas fossem virar peixinho. – Minha mãe disse enquanto Bela mexia na mochila e me entregou uma toalha.

– Obrigada. – Sorri para ela e voltei a olhar para minha mãe. – Estava apenas deixando a água do mar lavar o que de mal possa ter ficado. – Me sequei e entreguei para Clara.

– Já me sequei, besta. – Passou a toalha de volta para Bela que a colocou em volta do pescoço. – Gente, estou com fome.

– Eu também, vamos entrar e tomar um café bem completo. – Ajudei minha mãe a levantar, logo em seguida estendi a mão para Belinda.

– Vem, eu te ajudo. – Ela segurou minha mão e levantou, vi que o grupo já estava caminhando em nossa frente e beijei o rosto dela. – Obrigada pela toalha.

– Não tem de quê, você está bem?

– Sim, só precisava pensar em algumas coisas.

– A Vera disse alguma coisa que não te agradou?

– Jamais, minha mãe é um doce, apenas disse que seu pai fez o mesmo que você em questão de apartamento.

– Claro que ele faria, pensamos igual. – Caminhamos lado a lado. – Você vai aceitar?

– Vou, apenas por um tempo, quando eu me estabelecer tentarei comprar um.

– Ou você pode simplesmente ficar lá. – Me olhou sorrindo.

– Vamos fazer assim, um passo de cada vez.

– Acho ótimo.

– Tem mais uma coisa. – Olhei pra ela enquanto caminhávamos. – Minha mãe muito provavelmente sabe, ela veio com uma história de que nossos olhos nos entregam.

– Então passarei a usar óculos escuros, assim posso ficar babando em você sem que ninguém veja.

– Idiota.

– É brincadeira, não me importo que vejam, já passei da idade de fazer algo escondido.

– Somos duas, mas vamos deixar assim por enquanto. – Alcançamos o grupo na recepção.

– Boa tarde, tenho reserva, Maurice Spollatto.

– Boa tarde, sim, senhor Spollatto, os quartos estão prontos. – Entregou uma chave para tia Lena e outra para Bela.

– Bem, agora vocês se dividem. – Ele disse.

– O café da tarde já está sendo servido no restaurante, é só seguir em frente, primeira porta a esquerda, o café da manhã é servido das 6:30 até 11 da manhã, o almoço das 12:30 até 15:30 e qualquer dúvida que tenham é só ligar para recepção, tem os números necessários ao lado do telefone em cada quarto.

– Obrigada! – Seguimos todos para o restaurante e ocupamos uma mesa. – Bem, eu gostaria de agradecer todos que estão aqui, minha filha, minha futura enteada, minha cunhada e minha sobrinha. Esse momento é especial pois eu desejo que seja o primeiro de muitos passeios em família. Estou grato pela boa notícia que Kayla virá ficar perto de nós, pois sei quanto sua presença é fundamental para minha querida noiva e eu a entendo, é uma menina doce, que deixa a todos encantados por sua inteligência e simplicidade.

– Ah, Maurice, se sua meta era me fazer chorar… conseguiu. – Enxuguei algumas lágrimas. – Eu fico feliz pelo bem que faz a minha mãe com seu amor e devoção, para o carinho que dedica a minha pessoa, estou grata por tudo! E gostaria também de agradecer pelo carinho de todos nessa mesa, esse final de semana foi um divisor de águas determinante em minha vida e foi essencial todo apoio e carinho que cada um me dedicou.

– Eu gostaria também de falar umas palavras. – Tia Lena disse. – Estou feliz por tudo, por minha sobrinha querida e desastrada estar de volta conosco, ganhar uma nova sobrinha que é por si só uma querida e por estar nesse lugar maravilhoso com todos vocês. – Seguramos nossas mãos por cima da mesa.

– Faltou eu. – Disse Clara. – Eu estou com muita fome, amo todos vocês, mas podemos comer agora? – Explodimos em gargalhadas e finalmente comemos. Conversamos por mais de uma hora, o assunto foi totalmente voltado para o casamento e se dependesse de Maurice seria uma festa de quase dois dias.

– Meu bem, podemos subir? O dia foi realmente maravilhoso, mas gostaria de descansar um pouco antes do jantar.

– Viu, mãe, tia Vera é como eu nisso de comer, ela está levantando da mesa do café já pensando no jantar. – Tia Lena deu um tapa de leve em sua testa e sorriu. – Estou em fase de crescimento, não riam.

– Vamos, querida, bem, nos encontramos às nove aqui. – Seguimos todos para o elevador, os quartos eram no mesmo andar.

– Mãe, vou ficar com você, acho que é meio óbvio, né!?

– Claro. Meninas, concordam?

– Tudo bem, tia. – Dei um sorriso amarelo, pois Clara notavelmente rindo da nossa cara. Entramos no quarto, deixei minha bolsa em cima da cadeira e fui olhar a vista.

– Aqui é lindo, mais que a Sicília. – Me abraçou por trás apoiando seu queixo em meu ombro.

– Mas você disse que lá era um pedaço do paraíso, até me animei de quem sabe viajar para lá.

– Estou começando a perceber que estar perto de você é todo o paraíso. – Virei de frente para Bela e segurei seu rosto com carinho. – Será que agora eu posso te beijar?

– Não só pode como deve. – Nossos lábios se aproximaram e apenas roçaram um no outro. – Senti falta do seu beijo durante todo o caminho até aqui.

– Eu também, senti muita falta. – Nossos lábios se encaixaram calando a voz, meu corpo acordava com cada toque dela em minha pele, minhas mãos buscavam cada contato, cada curva. Desamarrei seu biquíni e vi sua pele levemente dourada, ela fez o mesmo com o meu e nos abraçamos, sua boca em meu pescoço, suas unhas em minhas costas. Desabotoei seu short e deixei que deslizasse por seu corpo.

– Toma um banho comigo?

– É uma proposta tentadora, senhorita Martins. – Tirou meu short e colou seu corpo no meu.

– A senhorita Spollatto aceita?

– Só uma louca não aceitaria tomar um banho com uma mulher como você. – De um jeito rápido me colocou em seu colo.

– Não faça isso, vai me deixar cair. – Agarrei em seu pescoço.

– Confia em mim, jamais vou te deixar cair. – Abriu a porta do banheiro. – Temos uma banheira, Kay, uma banheira toda pra nós. – Desci de seu colo e pus a banheira para encher.

– Você e uma banheira, não poderia querer mais nada. Mas antes vou tomar uma ducha, tirar a areia do corpo. – Tirei a calcinha e entrei no chuveiro.

– Isso também se resume em banho, você me convidou. – Entrou no box comigo, o corpo nu se encaixou por trás do meu. – E eu não quero perder um segundo desse banho. – Senti suas mãos segurarem meus seios e apertar sem muita força.

– Eu estou começando a ficar viciada nos seus toques.

– E eu viciada em você.

Já deitada na cama com Bela dormindo ao meu lado comecei a me questionar o quão natural isso normalmente é com ela, como é natural saber exatamente o que fazer sem nunca ter feito, o quão natural foi tê-la em meus braços pela primeira vez e como foi perfeito a segunda. Simplesmente eu sabia o que fazer, como fazer, o momento certo… Para simplesmente agora me questionar se transamos ou fizemos amor, eu não conseguia me cansar do seu cheiro, da sua pele, dos seus olhos perto do orgasmo, a forma que ele os fecha para a boca abrir e logo morde os lábios. Talvez por toda uma vida eu tenha esperado esse momento, talvez fosse para ser assim desde sempre, talvez fosse pra ser assim com ela. Meus dedos deslizavam entre seus seios e mesmo em sono profundo podia ver como os pelos arrepiavam a esse toque.

– Kay, meu bem, acorde. – Abri meus olhos devagar. – Bom dia, sua mãe bateu aqui chamando a gente pra tomar café. – Me deu um beijo na testa.

– Bom dia, parece que eu acabei de dormir. – Suspirei. – Mesmo que eu preciso levantar?

– Penso que sim, mas se quiser posso pedir um café pra você aqui.

– Não, eu preciso mesmo levantar para resolver algumas coisas. – Me sentei na cama. – Por que me olha assim?

– Estou me perguntando como pode acordar tão linda… – Sorriu. – E estou com um pouco de medo.

– Medo? – Puxei seu rosto e dei um selinho em seus lábios.

– Sim, mas acabou de passar. – Me puxou para um abraço apertado. – E como se cada noite que dormisse ao seu lado, tudo bem, essa é a segunda, mas ainda sim acordo pensando que foi sonho, ou que você tenha se arrependido. Eu realmente não sou uma mulher habituada ao medo.

– Pois então pode parar, meu único arrependimento agora é ter que sair dessa cama, já que você está aqui, poderia ser um ótimo café da manhã. – Tapei a boca. – Sinto, eu não sou uma ninfomaníaca.

– Não é isso que está parecendo. – Me fez deitar e deixou seu corpo pesar sobre o meu. – Então quer dizer que eu sou um ótimo café da manhã? – Mordeu meus lábios antes de beijar. – Quero ser todas as suas refeições.

– Vou me acostumar mal, muito mal. – Nos beijamos novamente e alguém bateu na porta.

– Kay, Bela, falta só as duas, pelo amor de Deus, não me façam morrer de fome. – Bela levantou e abriu a porta. – Desculpa aí se atrapalhei, mas minha solitária não está feliz.

– Vou só trocar de roupa, não demoro. – Levantei da cama e peguei uma roupa na bolsa. – Você sabe o que planejaram pra hoje?

– Acho que uma volta pela ilha, voltaremos para Angra no meio da tarde. Por que?

– Preciso resolver umas coisas pelo telefone, talvez eu não dê esse passeio com vocês.

– É tão importante assim?

– Sim, preciso ligar para meu trabalho, tecnicamente estaria de volta amanhã, então é bom que eu resolva isso o quanto antes.

– Quer que eu fique com você? – Bela falou enquanto voltava para o quarto e procurava meu chinelo.

– Não, por favor, vá se divertir, eu adoraria ir também, mas quanto mais tempo passar mais complicado será.

– Eu cuido dela, prima, pode deixar.

– Estou de olho, hein!? – Sorri pra Clara que levantou as mãos como se não estivesse fazendo nada. – Vamos? – Descemos para o café, minha mãe, Maurice e tia Lena já estavam lá aguardando.

– Sempre dormindo mais que a cama, filha.

– Bom dia mãe, bom dia família. Tive um pouco de insônia. – Me servi de café e alguns salgadinhos que tinham na mesa.

– Iremos dar uma volta na Ilha, aproveitar que não está muito calor.

– Clara me falou, mãe, mas eu ficarei no hotel, preciso resolver parte dos meus problemas em São Paulo, vou ligar para o escritório e ver o que consigo acertar com eles e não posso deixar passar muito tempo.

– Eu entendo, sentiremos sua falta. Você virá ou ficará também, Bela?

– Irei, Vera. Até perguntei se ela gostaria de companhia.

– E eu disse que não precisava, só irei ficar horas no telefone, eu conheço bem o Dr. Roberto e ele não irá me poupar de um questionário enorme. – Segurei sua mão por baixo da mesa e fiz um carinho de leve. – Se eu tivesse a certeza que seria rápido aceitaria sua companhia, assim poderíamos encontrar com eles.

– Acho que estou acostumada demais a sua presença. – Falou em tom baixo já que Clara e minha mãe fizeram questão de distrair os outros.

– Pensa que eu não? Vai ser um saco. – Disse com empáfia. – Prometo compensar.

– Isso é uma promessa, não pode descumprir.

– Não costumo falhar com minhas promessas. – Nossos dedos se entrelaçaram e senti meu coração disparar. Eu não poderia já estar apaixonada, não assim, não tão rápido, nossos olhos se encontraram e foi como se nós duas nos questionássemos a mesma coisa.

– Então vamos, Bela? – Minha mãe olhava pra nós duas. – Quanto antes sairmos mais cedo voltamos.

– Espero que consiga resolver todas as suas pendencias. – Beijou o topo da minha cabeça.

– Força, filha, vai dar tudo certo. – Me deu um beijo no rosto, acompanhada de Maurice que me fez um cafuné, Clara que me deu um tapa na cabeça e tia Lena que segurou um de meus ombros. Bem, força, vai dar tudo certo. Caminhei até o quarto e sentei na cama já com o celular na mão.



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