A Magia do Amor

37. Desespero

37

Desespero

 

Roberto andava de um lado para o outro dentro do casebre, a proposta de Agatha foi tentadora, afinal, aquela foi a sua intenção desde que chegou em Cabritos. Porém, quando percebeu que a bruxa estava disposta a abrir mão da própria felicidade só para salvar aquela criança, isso o deixou ainda mais possesso. E aquele sentimento de inveja, de ódio, por saber que ninguém faria aquilo por ele, apenas aumentou. Recordou das vezes em que estava a espionar a casa de Agatha e a viu nos braços da outra, tanto amor e sorrisos bobos que lhe embrulhava o estomago, mas, ele acabaria com aquilo, não importava o quanto lhe custaria. Olhou para a criança que estava encolhida em um canto qualquer, tinha consciência de que foi responsável pela má sorte de muitos, e indiretamente, levou alguns à morte. Porém tirar a vida de alguém com as próprias mãos, isso ele ainda não tinha feito, e ao contrário do que alguém possa pensar, isso não o deixava assustado ou com pesar, a bem verdade, ele até sorria com certa satisfação ao planejar em como seria.

 

Daniel, diante aquelas ameaças, começava a perder as esperanças de ser encontrado. O medo ganhava forças e ia o preenchendo aos poucos. Porém, toda vez que Roberto se aproximava do pequeno, os olhos cor de madeira envernizada enfrentava o homem. Talvez, aquilo se desse pela voz feminina que Daniel ouvia, e que tentava lhe dar a certeza de que tudo ficaria bem.

 

* * * * * * * * * *

 

– Me perdoe…

– Não é sua culpa, vida.

– Mas, me sinto culpada. Eu a impedi de que fizesse algo, e agora a May e a Agatha estão nessa situação. Ele é só uma criança… __ Alana abraçou a esposa.

– Meu amor, você tinha razão. A Tatha me fez entender isso também, infelizmente, essa luta não pode ser minha. Você só me ajudou a enxergar isso. Eu quem te peço perdão. Perdão por colocar você em uma situação assim, perdão por você estar se sentindo culpada. Perdoa a teimosa da sua mulher?

– Como não perdoaria? __ sorriram. – Adoro quando você fala isso.

– O que?

– Sua mulher! __ o abraçou ficou mais apertado. – Amor, não tem mesmo nada que possamos fazer?

– Você me daria cobertura? Preciso ir em casa. __ Eva a olhou desconfiada. – Calma, amor. Não vou fazer nenhuma besteira, apenas uma proteção para o Daniel.

– Acha que a Agatha já não o fez?

– Tenho certeza que não, agora ela não é tão bruxa assim. Olhe-a, é apenas uma mãe em desespero, precisando ser forte para amparar a mulher que ama.

– Vai, amor. Eu fico aqui e te mantenho informada.

 

Alana saiu e apenas Olívia e Eva que perceberam, todos os outros estavam nervosos demais para prestar atenção. Em casa, ela já sabia o que fazer. Primeiro precisava purificar seu corpo e livrar a mente de todos os pensamentos indesejáveis para que aquilo pudesse dar certo. Evocou os deuses, o caldeirão com água já estava no fogo, o papel e as ervas que precisavam ser colocados dentro do caldeirão já estavam em mãos. Algumas pitadas de sal, e Alana mexia o caldeirão no sentido horário declarando aqueles versos, como se fosse uma canção. E seu corpo ia no mesmo ritmo, como se uma força superior e misteriosa estivesse a bailar com ela:

 

– Assim como a Terra gira e o Sol fecunda, assim eu fecundo o meu desejo de que o Daniel fique protegido, que nenhum mal o aconteça e o possamos encontrar. __ a bruxa estava com os olhos fechados e por isso não viu, mas sentiu. A água no caldeirão reagiu de imediato aquelas palavras, ganhou uns traços de luz azul. – Assim como a Terra gira e o Sol fecunda, assim eu fecundo o meu desejo de que o Daniel fique protegido, que nenhum mal o aconteça e o possamos encontrar. Mexo e remexo, dando corpo ao meu desejo. Assim como nesta água mexo e crio redemoinhos, assim o Pilão de Prata abrirá os caminhos para que o menino volte para casa em segurança. __ sentiu o vento balançar seus cabelos e sorriu. – Mexo e remexo, dando corpo ao meu desejo. Assim como nesta água mexo e crio redemoinhos, assim o Pilão de Prata abrirá os caminhos para que o menino volte para casa em segurança. Assim como como a Roda gira sem parar, assim eu teço essa magia; que o menino para sua casa com vida possa regressar. __ e repetiu o quanto foi necessário, até esgotar-se, até o fogo apagar. Estava feito.

 

Com cuidado, manejou o caldeirão para o quintal da sua casa e despejou a água na terra a recitar:

 

– Theós i mitéra! __ havia poder em sua voz, naquelas palavras. Estava tão segura. – Kyría pou vlépei ta pánta! Kathós aftó to neró sti gi vrískei néa monopátia, prokalóntas ti zoí na vlastísei. Étsi, ta monopátia anoígoun gia to asfalés paidí kai me ti zoí sto spíti érchontai. Me tin evlogía sou, Megáli Mitéra. (Deusa Mãe! Senhora que tudo vê! Conforme esta água na terra encontra novos caminhos, fazendo a vida brotar. Assim os caminhos se abram para a criança segura e com vida em casa chegar. Com a tua benção, Grande Mãe.)

 

* * * * * * * * * *

 

Havia uma confusão, vozes exaltadas na sala, e ninguém conseguia chegar em um consenso. O delegado opinava que o melhor era esperar a próxima ligação e negociar, pois, estava certo de que aquela ameaça de morte era apenas uma forma de deixar a mãe do menino ainda mais suscetível as exigências que ele faria. Agatha sabia que não, embora desejasse profundamente que fosse apenas aquilo, não pensaria, não hesitaria, trocaria de lugar com Daniel. Olívia, discordava do delegado e sabia que o mais certo era montar uma equipe de buscas. A conversa que começou com palavras sutis e sugestões tornou-se uma verdadeira bagunça de vozes alteradas.

 

– CHEGA! __ e todos emudeceram. – VOCÊS FALAM E FALAM, E EU SÓ OS OUÇO, MAS NO FINAL DAS CONTAS, NINGUÉM ESTÁ FAZENDO ALGO. É O MEU FILHO! É O MEU FILHO QUE ESTÁ LÁ FORA, ASSUSTADO, E SÓ DEUS SABE O QUE AQUELE LOUCO PODE ESTAR FAZENDO COM ELE. JÁ QUE VOCÊS SÃO OS ESPECIALISTAS E AINDA NÃO SE DECIDIRAM, EU MESMA RESOLVO. __ a loira saiu batendo a porta, caminhou em direção ao carro, não saberia por onde começar, mas ia encontrar o filho.

 

Assim que sentou no banco do motorista, tentou ligar o carro, mas as mãos tremiam tanto que não conseguia acertar. Uma nova onda de choro se apossou de seu corpo. Sentia-se culpada, se não tivesse quebrados suas próprias promessas, talvez, se tivesse escolhido outro lugar para morar… seus pensamentos foram interrompidos, a porta do carona se abriu e fechou, sentiu o peso daquele olhar sobre si.

 

– Você deve estar me odiando.

– Não.

– Mas, deveria. A culpa de tudo isso é minha.

– Agatha… __ suspirou e tentou conter o choro. – Eu… __ olhou para a morena, ela estava tão abatida e triste, mesmo com toda aquela dor, todas aquelas dúvidas e culpas, Maysa sabia que não poderia condenar aquela mulher, jamais poderia fazer isso com a mulher que tanto amava. – Não há culpados, exceto aquele louco. __ falou mais para si mesma que para a morena.

– Mas, ele só está aq…

– Não faça isso com você, não faça isso conosco.

– E o que você quer que eu faça? Como não posso me sentir culpada, se a única coisa que grita na minha mente é isso! Meu coração está partido e dói, Maysa.

– Eu sei… __ abraçaram-se. – Eu amo você, Agatha. Eu não te culpo… __ foi um sussurro. – Sei que se sente culpada, também sei que você ama o Dan, mas agora não posso ser uma pessoa boa com você. __ a morena se afastou.

– O que você quer dizer com isso? __ notou o olhar da loira mudar. – Maysa?

– Agatha, você é uma bruxa! Não disse ter poderes? Dons? __ a morena assentiu. – E por que diabos ainda não os usou?

 

* * * * * * * * * *

 

O mar começava a agitar-se, o vento era forte e levantava os galhos secos de coqueiros que serviam como teto do casebre, já era final de tarde. Roberto que optou por prolongar aquele momento, trazendo mais sofrimento para Agatha e a mãe do garoto, decidiu que só ligaria para as mulheres na manhã seguinte. Era arriscado ficar naquela cidade pequena, mas seu plano era bom; quando levasse a criança para se despedir da mãe, o jogaria no mar. Enquanto Agatha e todos os outros estivessem procurando pelo menino, ele estaria saindo daquele lugar. Sorriu maléfico com a cena do menino ao telefone se despedindo, com o desespero que causaria. A dor insuportável, tinha a certeza de que as mulheres não ficariam juntas depois daquilo, provavelmente, elas já deveriam estar brigando. Assustou-se quando o vento levou alguns dos galhos de coqueiro.

 

– Veja só pirralho, vamos dormir admirando estrelas. __ e gargalhou. – Aproveite, pois será a última vez que você terá uma oportunidade dessas. __ Daniel, ainda amordaçado e, de pulsos e pernas atados nada pode dizer. Mas, alguma coisa havia acontecido, pois o medo de outrora já não estava mais lá, havia esperanças. De alguma forma, elas foram renovadas.

 

* * * * * * * * * *

 

Maysa tinha razão, pensava Agatha enquanto separava os materiais qual precisaria para realizar aquele ritual. – Eu estou mesmo muito abalada, como pude esquecer dos meus poderes? O gato caminhava por entre suas pernas, e miava como se estivesse a responder suas perguntas.

 

Os cristais estavam postos sobre a antiga mesa de madeira preta, o caldeirão borbulhava e o cheiro de relva invadiu o lugar. A morena permitiu-se sorrir, estava na hora. Aproximou-se do caldeirão, e proferiu as primeiras palavras. E do lado de fora da casa, no alto de uma arvore, a coruja despertou.

 

– Mam Mawr, eich bod chi’n ein tywys ni ac yn dangos i mi yr hyn sydd angen i mi ei weld. (Grande Mãe, que você nos guie e mostre o que preciso ver.) __ jogou uma das penas de Duda dentro do caldeirão. –  Gadewch i’r tylluan hedfan a dangos i mi! (Que a coruja voe e me mostre!) __ Duda abriu as asas e saiu majestosa em seu voo, a pupila parecia dilatada.

 

O sol se punha no horizonte, e do outro lado, o manto betume da noite começava a se aproximar. E mesmo dentro daquela saleta, imersa naquele transe, Agatha conseguia sentir o vento, ver o sol se despedindo e mergulhando nas águas. O perfume de relva deu lugar para o cheiro de peixe, madeira envelhecida e podre, e brisa marinha. Duda continuava seu voo. Mas, por algum motivo, Agatha demorou para reconhecer aquele lugar. O coração da morena passou a bater com mais força, com maior pressa ao tempo em que parecia diminuir ou ser prensado. Estava ansiosa! Os cristais sobre a mesa brilhavam ainda mais forte. Ela estava sensível, podia ouvir até o som da cidade. Foi então que a coruja piou; era um casebre, e não teria nada demais, se não fosse pelo fato de não ter parte do telhado. A visão não era tão nítida quanto gostaria, não podia correr o risco de ser vista, ainda assim, a figura do homem que parecia estar se alimentando e ao seu lado, deitado no chão de terra batida, uma criança.

 

– Daniel!

 

O brilho dos cristais estava fraco, como uma bateria que chegava ao fim, a morena sentiu o corpo amolecer, mas, não sem antes perceber que o clima estava a mudar, trazendo mais uma preocupação para o seu coração. Só então, seu corpo foi ao chão.

 

– Diolch, Mam Mawr. (Obrigada, Grande Mãe.)

 

* * * * * * * * * *

 

As percepções de Agatha não estavam erradas, o clima estava mudando, a natureza parecia revoltada. Seria mais uma noite de lua cheia, e seu esboço já se formava no céu. O mar agitava-se ainda mais, as ondas eram altas, mas nenhum surfista se arriscaria nelas naquele inicio de noite.

 

– Cadê a Agatha? __ a voz de Alana fez-se presente.

– Ela foi em casa. __ Maysa respondeu enquanto descia as escadas com uma foto de Daniel em mãos, finalmente o delegado concordou em colocar alguns policiais pelas ruas para procurarem o menino.

 

Alana caminhou até a loira e lhe sorriu. – Vai ficar tudo bem.

– Como pode ter certeza?

– Eu sempre tenho! Estamos tão acostumados com tristezas e dor, que quando algo acontece, já prevemos um final infeliz, ainda que a gente tente manter as esperanças. Mas, acredite. Não precisa perde-las, o Daniel voltará para casa, e tudo ficará bem. __ a loira abraçou a mulher a sua frente. – Eu vou ver a Agatha, ela precisa falar comigo. E você, fique aqui e se prepare para receber seu filho.

 

Saiu e deixou aquela sensação de paz não apenas no coração de Maysa, mas no de todos que ouviram aquelas palavras. Quando alcançou a prima, ela já estava colocando o casaco e desligando o alarme do carro.

 

– Aonde você pensa que vai sozinha?

– Buscar o Daniel.

– Agatha, você não pode ir sozinha.

– Eu não vou ficar aqui, esperando que outros façam algo. Não importa o que digam, é minha culpa sim.

– Não é, mas entendo você. E… não disse que não deves ir. Apenas que não pode ir só.

– A Olívia saiu, está seguindo as pistas. Com certeza, ela acabará me encontrando.

– Não estou falando da Olih, eu vou com você.

– Eu prefiro que você fique, a Eva é como a Maysa, precisam de alguém para acalmá-las. Eu sei aonde ele está, o Roberto não fará nada comigo.

– Ele já está fazendo, você é teimosa demais! Ao menos me fale aonde você irá, preciso informar ao delegado.

– No velho farol. __ entrou no carro e deu partida. – Preciso me apressar, o tempo não está ao nosso lado, Alana.

 

Observações:

1 – Idioma usado por Alana é o grego.

2 – A magia que Alana fez serve tanto para obtenção de bênçãos quanto proteção, com a troca de algumas palavras, é claro.

3 – O ritual que a Agatha fez para que pudesse enxergar através dos olhos da coruja foi pronunciado no idioma galês.

4 – Desculpem a demora para atualizar, mas os dias andam corridos demais.



Notas:



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Uma resposta para 37. Desespero

  1. Boa noite Afrodite ^^
    Ai que aflição!!
    Tô curiosa para saber o que Agatha vai fazer com o Roberto!

    ÓDIO E NOJO DESSE ROBERTO.
    Puta merda, cara maldoso, deu até medo dele fazer algo de ruim contra Daniel.
    Espero mesmo que ele pague caro…nam… Agatha mlr…Destrua esse ajudante do capiroto…

    A história tá ótima Afrodite!!
    Precisamos do próximo capítulo logo…
    POR FAVORR.

    Bjus querida…
    Cidinha.

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