A Magia do Amor

9. Chuva no telhado

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Chuva no telhado
 

O jantar havia terminado, a louça fora lava e guardada. Maysa detestava deixar a louça acumular para o dia seguinte, lhe agradava ver a pia limpa e até mesmo brilhando, não que ela fosse maníaca por limpeza, estava um pouco longe disso, mas a sensação de ver a cozinha limpa lhe agradava. Houve um momento de diversão enquanto Daniel corria atrás do Tapioca pela casa, e muita bagunça durante o banho. Alguns desenhos foram feitos na parede do quarto, essa era a função daquela parede, servir de tela para que a criança expressasse sua arte. E depois da estória de reinos distantes, seres mágicos e amores eternos e felizes ser contada, o pequeno dormiu e a casa imergiu em um silêncio absoluto.

 

Maysa desceu as escadas, pegou o vinho que havia aberto horas atrás para tomar com a vizinha, e foi para o terraço. Olhou para escrivaninha, o computador permanecia ligado, a estória ainda não havia saído do prólogo, estava com bloqueio, não era falta de inspiração ou imaginação, pois sabia o que queria escrever, mas as palavras simplesmente não se organizavam. Sensação horrível para qualquer escritor, mas ela não queria se preocupar com aquilo, não naquele momento.

 

Momento onde a noite era pacífica, a lua estava cheia e não precisava de nenhuma outra luz senão a que ela emitia. Aquele momento era apenas seu. O som dos insetos na grama que em breve ela precisaria aparar, o piado da coruja na casa ao lado. Observou as nuvens que se juntavam no céu, prometendo chuva. O barulho das ondas quebrando nas pedras… ouvir e sentir tudo aquilo lhe fazia feliz.

 

Em momentos assim, ficava óbvia a decisão de voltar para casa. Estando ali, ela finalmente se dava conta do quanto sentiu saudades daquele lugar, talvez fosse por isso, que as cidades mais fantásticas que surgiam em seus livros, acabavam tendo uma ou outra característica de Cabritos. E a bem verdade, nenhum lugar em todo o mundo lhe daria aquela paz e conforto ou Agatha como sua vizinha.

 

Maysa sorriu consigo mesma. – Pois é, para quem andava fugindo dessa mulherada louca como o capeta foge da cruz, você está bem encrencada agora, dona Maysa.

 

Levou bastante tempo para esquecer a falecida esposa, sorriu novamente ao lembrar do trabalho que foi para Alessandra conquistá-la. Depois da noite em que Agatha lhe rejeitou, seu coração se fechou, não que ela tenha ficado sozinha, muito pelo contrário, Maysa se tornou uma conquistadora inveterada. Passou aquelas férias de final de ano de cama em cama, e não foi para dormir, que isso fique bem claro. E assim foi por algum tempo, até conhecer Alessandra, aceitar aquele amor que lhe foi ofertado e que ela aprendeu a retribuir, mudar-se em definitivo para São Paulo, e ser feliz enquanto a esposa esteve ao seu lado, suspirou. Os dias estavam a passar e parecia que algumas fases de sua vida eram capítulos chegando ao fim.

 

Tomou outro gole do vinho, e brindou silenciosa ao desfrute da beleza noturna. Foi então que ouviu o carro de Agatha, não que a estivesse esperando, Maysa tentou afirmar isso para si mesma sem muito sucesso, afinal, estava estampado em suas feições a satisfação, ao constar que Agatha não demorara. A verdade, é que a loira se sentiu aliviada, pois pelo horário, significava que a vizinha não estava em um encontro. – Não que eu me importe com a vida social dela, não é da minha conta.

 

Ouviu o abrir e fechar de porta. Balançou a cabeça e sorriu ao imaginar em como seria Agatha andando pela casa, talvez, indo para cozinha. Ah, sim! A luz da cozinha foi acesa e Maysa viu a vizinha passar pela janela. Subiu as escadas, algumas outras luzes foram acesas. – Não pode ser, ela gosta dessa música?!

 

Agatha ouvia, Olhos de Onda – Adriana Calcanhotto. Uma das músicas preferidas de Maysa, nunca associada a alguma pessoa até aquele momento.

 

“Por que será que ela tem os olhos de onda?

Por que será que ela tem medo de amar? ”

 

– Ah, Agatha… eu não tenho medo de amar. O que me amedronta é essa possibilidade quase certeira de que o sentimento que tive por ti, esse sentimento que acreditei não mais existir, nunca tenha, de fato, ido embora. Sinto os vestígios dele em mim. Meu medo, é que tudo isso volte e ainda mais forte! __ Maysa suspirava ao constar que os pensamentos eram mais que hipóteses, o fato é que ela nunca esqueceu aquela mulher.

 

Ainda olhava para casa ao lado, e por um momento, avistou a silhueta de Agatha em uma das janelas. Conseguiu ver claramente a sombra esguia e feminina despindo-se. Rapidamente, desviou o olhar e bebeu mais um gole do vinho. Ainda que fosse tentador continuar olhando, não poderia chegar aquele nível. – Puta que pariu, era só o que me faltava, virar uma voyeuse?! __ ansiou por um cigarro, arrependeu-se, mas a necessidade se fez maior, tirou um cigarro do bolso e acendeu.

 

A loira entregou-se ao prazer daquele vício, ouvindo a sequência musical que tocava na casa ao lado. Gostava daquele cheiro de cereja, lhe fazia pensar em coisas boas.

 

Continuou sentada ali, mesmo depois que o vinho e o cigarro acabaram.

É correto afirmar que Maysa só entrou em casa quando ouviu os primeiros pingos de chuva bater no telhado.

 

Créditos musicais:

Olhos de Onda – Adriana Calcanhotto (https://youtu.be/XummLdCo0Ek)



Notas:



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Uma resposta para 9. Chuva no telhado

  1. Olá minha Afrodite, boa tarde!!
    Essas duas são como fogo e gasolina e acho que a Maysa vai mudar a vida da Agatha.
    Cidinha.

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