A Organização

Capítulo 20 – Coisas expostas

Assim que saíram, começaram a conversar em voz baixa, enquanto andavam pela rua, a caminho do restaurante.

— Sua revolta não é contra ela, pelo que entendi. Conte-me o que houve.

— Não. Descarreguei nela, por ela ter conseguido chegar a nós, Re, mas a verdade, pelo menos é o que parece, ela é tão vítima como nós. Só que é uma vítima perigosa. Teremos que nos proteger dela, protege-la dela mesma e ainda por cima, protege-la dos outros…

****

Ao chegarem, comeram conversando sobre os seus próximos passos, no máximo de descontração que a situação permitia. Loren voltou para seu quarto avisando que, assim que houvesse contato do agente que estava cuidando de seus passaportes, as informaria.

Helen se incomodava com o silêncio em que o quarto imergiu. Enquanto Renee olhava displicente o display incrustado na parede, onde noticiários do mundo todo, se revezavam em mostrar toda sorte de desgraças ou assuntos de negócios. Helen se enfiou embaixo das cobertas abaixando o grau dos climatizadores de ambiente.

A agente da Organização saiu de sua introspecção.

— A temperatura estava agradável.

— Gosto de dormir coberta. Não se preocupe com o desperdício de energia. Vi que o hotel tem geradores de energia solar e sol, é o que não falta nessa terra.

Falava com uma carga excessiva de aborrecimento na voz.

— O que houve? Por que está zangada?

— Fora o fato de vocês duas voltarem estranhas da rua e você estar me ignorando completamente? Não houve nada demais.

— Não voltamos estranhas. É impressão sua. Estamos apenas apreensivas com a espera. Não sou do tipo que fica sentada contando os minutos.

— Então, poderia passar a hora partilhando suas intenções na ação e impressões.

Helen falava, enfiada embaixo do cobertor e voltada de costas para Renee. A ex-agente da Távola estava visivelmente amuada. Renee olhou-a complacente, mas o que havia escutado de Loren a assustou. Não poderia culpar Helen de nada, mas não poderia deixar de se preocupar pela outra. Estava em uma encruzilhada. Via que os sentimentos da doutora estavam em ebulição. Ela estava chateada e cada vez mais confusa. Renee não podia deixar que se alterasse, uma vez que poderia detonar uma série de eventos nada agradáveis para ela.

Entrou embaixo das cobertas e abraçou a outra por trás, escondendo seu rosto na curva do pescoço almejado. Helen tentou, sem muito ânimo, desvencilhar-se do abraço, fazendo com que a agente da Organização a estreitasse com mais força.

— Ei. – Sussurrou. — Não fica assim. Não estou estranha. Estou preocupada, está bem?

O corpo da doutora relaxou e se permitiu sentir o calor do corpo desejado junto ao seu. Se acomodou um pouco mais nos braços da agente.

— É tão difícil assim, sair desse país com todo apoio que vocês têm?

— Não é que seja difícil sair; o difícil é não deixarmos rastro. Hoje somos um grupo de mais de cinquenta milhões ao redor do mundo todo e não podemos permitir que, em uma falha nossa, esse grupo seja descoberto e talvez até, ser aniquilado.

— Cinquenta milhões?

Helen falou assustada e Renee riu.

— Quando a Organização começou há quase cento e quarenta anos, éramos em torno de três milhões. Acho que é tempo suficiente para crescer, não acha? Vieram os filhos que foram educados nos mesmos valores e mais pessoas eram convidadas. Como disse antes, temos muitos problemas, mas tentamos resolvê-los da forma mais pacífica que encontramos. Também ninguém é santinho. O que tem visto todo o tempo que está conosco, são atividades da cúpula. O núcleo da Organização é trocado invariavelmente a cada seis anos. Aliás, o tempo de Loren no núcleo está chegando ao fim. No próximo ano entrará um novo grupo e é possível que ela nunca mais faça parte. Entendemos que é bom novas pessoas ingressarem e como a comunidade é grande… 

Renee encolheu ligeiramente os ombros, não dando importância ao fato. Helen virou de frente para Renee, ainda aninhada a seu corpo. Retirou alguns fios de cabelo que havia sobre os olhos da agente e depositou um beijo terno e suave em seus lábios.

— Você me assusta. — Helen falou baixo. – Você me descontrola, me faz não pensar direito e também, não pensar com prudência. Eu tinha tudo para querer ficar longe de você quando a conheci, mas não conseguia.

— Você estava sob pressão, num lugar isolado e que não conhecia. Assusta mesmo.

— Não é isso. Você me assusta.

— Por quê?

— Eu não consigo pensar com você a meu lado… bom pelo menos pensar com sensatez.

— Fico imaginando se conseguisse pensar…

Renee brincou, mas percebeu que Helen se amuava novamente.

— Ei, estava brincando. – falou suave.

— A ação que tive junto a Távola era porque eu os conhecia e sabia que, uma hora, nos pegariam e nos matariam sem piedade.  Foi mais um ato de sobrevivência. E quando te peguei em Paraty, achava que a Mila Ortiz era alguém deles. Mesmo assim, eu me senti desorientada, pois me descontrolei tanto com a Mila, como me descontrolei com você, lá na Organização. Agora eu sei porque. Mas antes, quando não sabia quem era, não. Aí eu achei que estava desestabilizando, por ter tido uma chance, lá atrás, de ficar com alguém que me atraía, me livrar de tudo e ter jogado a oportunidade fora. Quando você falou que era a Renee, fiquei confusa, mas não descartei a possibilidade; apesar disso, quando começamos nossa fuga, fui observando a “Mila”, além de ter a Loren e a interação que tivemos.

— E você me desorientou desde o primeiro dia.

Renee falou abrandando sua atitude e sua voz, percebendo que Helen amolecia nas suas atitudes também.

— Eu tinha acabado de voltar de uma missão de meses na Rússia, desbaratando uma máfia… – Calou-se sentindo que havia falado demais.

— Foram vocês? – Helen falou espantada. – Aquela máfia agia há anos e ninguém fazia nada!

— Ninguém fazia nada porque muitos poderosos, espalhados pelo mundo, estavam envolvidos.

— Eu vi. Teve muita repercussão. Explodiu pouco antes de eu ir para a Organização, mas soube pelos noticiários depois que cheguei a Paraty. Alguns foram soltos e iriam responder em liberdade. Isso me revolta. E o que mais me revoltou, foi o fato do cara que morreu na ação, ser o responsável do governo russo pelas instituições que cuidam de órfãos no país. Ele usava desse poder para fazer tráfico de órgãos das crianças e adolescentes e, ainda, tráfico sexual.

— Lá na Rússia ele era o cabeça.

— Como ele morreu? Disseram que foi morto na ação, mas eu desconfiei, pois o tiro foi dado entre seus olhos. Parecia mais execução.

O semblante de Renee assumiu uma fisionomia fechada e seus olhos escureceram em dor. Ato que não passou despercebido pela ex-agente da Távola.

— Ei. Ele era um cara mau.

Helen segurou seu rosto e beijou seus olhos.

— Ele era um ser humano, e eu já o havia prendido. Eu não precisava ter feito aquilo, mesmo sabendo que até pudesse vingar as inúmeras pessoas que ele matou ou fez sofrer. Isso não me faz melhor que ele, não é mesmo? Afinal, não o matei na ação, matei executando. Prova também, que não somos realmente perfeitos e mesmo para uma sociedade como a nossa, que tenta viver na paz, é um caminho difícil.

— É um caminho melhor do que o mundo está trilhando agora, não acha? Pelo menos, você tem uma consciência que dói, ao praticar uma ação dessas. Sabe que não foi algo correto e por isso, tem a índole e vontade de não mais o praticar. Quando estamos em campo e isso eu sei bem como é, muitas vezes tomamos medidas que julgamos acertadas para o momento. Somos treinados a fazer escolhas o tempo inteiro. Pior é quando somos treinados, como eu fui, a obedecer ao que é mandado, sem questionar se é certo ou errado.

— Ele fez coisas atrozes e eu fui obrigada a conviver e ver tudo. Muitas vezes, quando ia para a cama à noite, sentia medo de ser obrigada a participar das orgias que faziam. Chegou um momento, que estava tão anestesiada, que tive medo de sentir prazer em ver o que eu presenciava…

Renee não entendia porque tinha se aberto daquela forma para Helen. Estava expondo novamente sua alma. Mostrava, também, o que mais a atormentou nos últimos tempos. Aqueles tempos, naquela missão, haviam quase destruído sua essência. Helen colocou-se mais colada a agente, passando suas mãos pela sua cintura.

— Isso é normal, Renee. Você teve que mergulhar num mundo que não era o seu. Esse mundo é inimaginável para nós. Infelizmente somos obrigadas a ver e vivenciar essas coisas. Mas olha o bem que fez. Muitas crianças e adolescentes tiveram suas vidas de volta. O fato de ter se descontrolado, só prova o quanto você é humana e se sensibiliza diante de situações. Você se sensibilizou com as pessoas que ele fez mal.

— Não justifica, uma violência em detrimento a outra, mas agora estou mais tranquila.

Helen escondeu seu rosto no pescoço da agente da Organização. Aspirou seu perfume, fazendo Renee arrepiar, arfando diante do toque sutil da companheira. Deixou-se levar pelas suaves carícias que a ex-agente perpetrava sobre a pele sensível das laterais de seu corpo, a embalando para um relaxamento profundo. Adormeceram sob o carinho confortador que aquietou seus corações.

****

Renee acordou assustada, diante de batidas na porta. Havia dormido profundamente depois da conversa com Helen e, pelo visto, a doutora também havia sucumbido, pois acordava igualmente alarmada. Renee ampliou sua percepção para entrar em contato com a pessoa do outro lado da porta. Tranquilizou-se.

— É Loren.

Helen não questionava mais sobre essa interação que havia entre Renee e Loren. Certamente quando confiassem mais nela, contariam. A agente abriu a porta. Loren entrava acompanhada de um homem alto, negro e bem alinhado. Trazia uma bolsa consigo.

— Meninas este é meu contato, Roberto e estas são Renee e Helen… bem, Helen até o momento.

Helen não retrucou. Entendeu que Loren começava a aceitar o fato dela ser levada e tratada na Organização, de forma a lembrar seu passado.

Roberto as cumprimentou, porém seu comportamento era austero. Abriu a mala e retirou um mobile, um pequeno scanner ótico e passaportes digitais em “plates de cristal”.

— Já tenho todos os dados de vocês no sistema. Puxei da antiga identificação antes de apaga-la. Agora só falta a identificação de íris para que eu autentique online e grave nos “plates”. Loren, seu nome será Rita Valadares; Renee será Clara Santos e Helen, eu coloquei com origem australiana, pois seu sotaque é muito forte, não dá para passar por local. Seu nome será Kelly Ryan.

Roberto fez todos os procedimentos, esclareceu sobre suas novas identidades para que pudessem viajar com conhecimento do histórico nos “plates” dos passaportes e antes de sair, deu as instruções.

— Teremos um avião particular, saindo de Belo horizonte para a Organização, às vinte e três horas de hoje. Vocês terão de sair daqui, no voo comercial das vinte e uma horas e trinta minutos, pois chegarão em Belo Horizonte às vinte e duas, não dando muito espaço para o horário do voo particular. Dessa forma, a alfandega terá que agilizar para poderem pegar o voo na hora. Assim evitamos que eles façam muitas perguntas, ou se aprofundem na busca dos perfis.

— Roberto, o fato da identificação da íris de Helen cair no sistema, não tem perigo da agência inglesa rastreá-la?

— Não, Loren. Eu salvei as informações, mas ainda não enviei ao nosso sistema. Só farei pouco antes de embarcarem com data retroativa e enviarei só para o nosso sistema. Elas não entram direto no sistema internacional. Isso só ocorre quando liberamos. – Ele deu um pequeno sorriso. – E adivinha quem libera?

Loren sorriu em cumplicidade.

 — Depois que estiverem seguras, eu tirarei de nosso sistema.

Loren olhou o relógio, eram cinco horas da tarde. Ainda teriam que fazer hora até saírem para o aeroporto. Suspirou.

— Bom, acho que deveremos sair as oito horas da noite. O aeroporto é perto e não quero nenhum engraçadinho aborrecido na alfândega vasculhando nossas identidades.

— Ok. Boa sorte a vocês.

— Obrigada, Roberto.

O homem meneou a cabeça afirmativamente e saiu.

— Vou para o meu quarto e continuarei vendo o noticiário local. Qualquer ação imprevista da polícia, aviso vocês.

— Está certo. – Falou Renee.

Loren saiu do quarto, deixando as duas agentes sozinhas. Renee olhou Helen. Não sabia porquê, mas estava encabulada diante da outra mulher.

— Mmm… vou…

Renee falava de forma débil, apontando para a bolsa com os pertences que levavam.

— Espera.

Helen se aproximou, passando seus braços sobre os ombros de Renee e a estreitando num abraço. Falou em seu ouvido, contida.

— Vem para mim… O que eu quero dizer é… Estou perdida. Pela primeira vez, tenho receio de meus passos.

Renee transpôs seus braços pela cintura de Helen, trazendo-a para junto de seu corpo. Deixou esconder seu rosto na curva do pescoço, aspirando o aroma que, nos últimos tempos, passou a atormentar seu íntimo. Confiou beijos miúdos sobre seus ombros, afastando a blusa em um toque leve e amoroso. A alma de Renee ansiava pela pele, pelos sentidos de Helen.

A ex-agente da Távola relaxou no abraço e sua respiração se tornava pesada. Começou a retirar as peças de roupa de Renee, beijando a pele abrasadora sob seus toques. Tudo era suave, doce como uma brisa, que se deleita nos cabelos revoltos ao ar. Passeou a língua pelo colo delicado chegando a uma aréola túrgida, sugando-a com fome.

— Isssss… aaahh, Helen…

Helen retornou seu caminho em direção a boca que arfava e pronunciava seu nome. Segurou, com seus dentes, os lábios que gemiam para ela. Abriu passagem com uma língua gulosa. Foi recebida com igual apetite, fazendo as duas gemerem, entre beijos esfomeados, onde as línguas trançavam e dançavam sob o véu da paixão.

Renee não resistiu, tamanho desejo que crescia impetuosamente. As roupas já haviam sido largadas e a agente empurrou sua amante de encontro a parede. Abriu as pernas de Helen, colocando sua coxa em contato com o sexo pulsante e abundante em umidade.

— Ah, Helen…. Você muito é gostosa. Está molhada demais!

Na coxa da agente, escorria o líquido abundante da doutora que, ao escutar as palavras passionais, incendiou e levou suas mãos ao sexo de Renee, sentido o fluxo escorrer por sua palma. Novamente de sua boca saiu o lamento rouco do desejo.

As palavras embargaram na garganta de Helen que sentia o roçar em seu clitóris pela coxa de Renee. Introduziu, sem culpa, seu dedo atrevido e inquieto na abertura tentadora que se abria a seu toque.

— Uhummm! Helen…

Renee gemeu diante da súbita investida, contraindo seu ventre em espasmos de prazer intenso. Sua mente divagou pelos sentidos que só os dígitos de Helen, poderiam proporcionar. Quentes, penetrando em seu íntimo, na mais pura delícia de sentimentos que corria por seu corpo.

Helen intensificava os movimentos de seu quadril, na tentativa de aumentar o atrito de sua vulva calorosa contra a perna da agente da Organização, mantendo o ritmo de seus dedos no interior da agente. Renee sugou o lóbulo da doutora, trançando suas mãos pelas costas suadas pelo delicioso esforço, trazendo-a para que seus corpos se colocassem tão unidos que os seios de ambas, se tocavam e roçavam no mesmo movimento que faziam para atingirem o delicioso ápice do gozo. Suas peles arrepiavam, o sangue corria em seus corpos rápido e não havia uma só parte de seus corpos em que não fosse experimentado o desejo pulsante.

O gozo veio com intensidade quando Helen sentiu que descontrolava. Esfregou-se impaciente sobre a coxa desejada com a vida, ao mesmo tempo que ávida, a doutora entrava deslizando na umidade abundante da cavidade cobiçada de Renee, na busca pela liberação. Olharam-se e seus rostos estavam transformados pelo prazer. Gritaram juntas. Uniram suas bocas no auge do desejo, escorrendo seu deleite, uma abraçando a coxa cobiçada e a outra acolhendo os dedos amorosos.

— Aaahhh!

As pernas de ambas falharam e deixaram seus corpos escorregar pela parede que as amparava. Helen abraçou Renee ainda lânguida.

— Deus, eu espero que não aconteça mais nada, até a gente sair daqui.

A agente da Organização falou aninhada à doutora, que não compreendeu a colocação da outra numa hora como aquela.

— Mmm?

— É que toda vez que a gente transa acontece algo. Parece até praga!

Helen não conseguiu segurar o riso, levando a agente a rir junto.

— Desculpa, acho que tive dolo sobre isso na maioria das vezes. – Falava diminuindo o riso. – Sei que tomei atitudes drásticas, mas acredito que tinham fundamento, não?

— Com ou sem fundamento, fiquei traumatizada.

Renee falava ainda rindo, enquanto levantava e estendia a mão para Helen se apoiar e ficar também de pé.

— Vem. Vamos para a cama.

— Humm… Isso é um convite, senhora Renee Marquez?

— Não. Isso é uma intimação.



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