A Organização

Capítulo 9 – Transformações

Renee acordou mais tarde e com preguiça. Não tinha tanta pressa. Tinha que esperar para que Helen chegasse e se estabelecesse também.

Trataria de se cuidar, estava cansada e tinha que restabelecer as energias. Provavelmente teria trabalho para se aproximar de Helen, pelo fato da doutora estar em alerta. Possivelmente desconfiaria de todos que se aproximassem de forma muito afável. Talvez, no princípio, não se mostrasse tão amigável; tentaria instigá-la pela personalidade forte.

“É… Helen deve gostar de personalidades fortes. Não deve gostar de coisas fáceis. Agentes nunca gostam de coisas muito fáceis e adoram um bom desafio”.

Sorriu por seus pensamentos. Pela primeira vez, estava traçando verdadeiramente um perfil de Helen.

Cuidaria do cabelo. Já havia cortado anteriormente na outra transformação e agora mudaria do ruivo para castanho escuro. Tiraria também o desfiado, aparando-o um pouco mais e faria um corte mais tradicional, apenas deixando leves costeletas desfiadas e repuxadas. Mudaria, mais uma vez, suas feições com a maquiagem bioaderente e esperava que fosse a ultima por um tempo maior.

Comprara uma impressora 3D no dia anterior, enquanto ainda estava no aeroporto. Suavizaria as curvas do rosto, deixando uma leve lembrança da própria fisionomia. Talvez chamasse atenção da “presa”. Sintonizaria o “vocalout” para ajustar a voz mais uma vez, deixando num tom de contralto e rouco. Colocaria as digitais que se adeririam simbióticas aos seus dedos e com um “biomodelador” de íris, mudaria a cor de seus olhos, que eram castanhos, cor de mel, em um verde translúcido para se tornar Mila Ortiz e poderia acessar suas contas no Brasil.

Olhou pela vidraça que mostrava o deck e o mar. O dia estava lindo. Após a transformação, caminharia pelo centro histórico para ver o que havia modificado desde os tempos de adolescente… Vinha muito à Paraty em outros tempos, mas os anos já se iam distantes em sua vida. Era um lugar que a deixava feliz. Agradeceu mentalmente a Helen por tê-la levado de volta ao seu antigo lar.

Mais tarde(,) quando resolveu caminhar pela rua, reparou que a cidade mantinha o mesmo ar bucólico de quando era adolescente, no entanto, permanecia viva com muitas pessoas transitando pelo comércio. Não viu mudanças significativas no local.

Circulava pelas ruas estreitas feitas de pé de moleque do centro histórico, quando, sem querer, e dessa vez havia sido sem querer realmente, deparou com a sua presa. Não estava alucinando. Escutou-a falar com um homem de terno à sua frente.

— Vou ficar com este.

— É um excelente imóvel. Ficará muito feliz com este aqui, tenho certeza.

Estava se estabelecendo em um imóvel e provavelmente aquele era um corretor. Dava para perceber pelo tipo de conversa.

“Sim, quem mais usaria camisa social de mangas compridas naquele calor infernal?”

Sorriu mentalmente e passou como se não tivesse interessada em mais nada, a não ser chegar a algum lugar. Esbarrou no corretor, propositalmente. Olhou-o, como se ele estivesse atravancando a rua e não desse espaço para ninguém passar.

— Desculpe, minha senhora…

— Desculpe?! Você está no meio do caminho, será que poderia afastar para o canto, para que as pessoas possam passar?!

Não deixou que o pobre se retratasse. Apenas seguiu em frente. Queria somente irritar Helen e chamar atenção sobre si. Parece que conseguiu. Ouviu-a falar enquanto se afastava.

— Aqui as pessoas são grosseiras, deste jeito mesmo?

— Não(,) senhora. De jeito nenhum, ela deve estar num dia ruim.

“Ótimo!”. — Pensou. — “Ele para vender ou alugar, se desculpou por mim. Não poderia ser melhor. Comecei muito bem o dia. Vou procurar um local próximo para ser meu atelier”.

Na época de faculdade costumava fazer aulas de arte. Esculturas e artes manuais para ser mais específico, para auxiliá-la na cadeira de práticas de laboratório e antropometria forense. Tomou gosto, pois relaxava enquanto construía algo com as mãos. Resolveu que seria uma artista, no meio de tantos outros que habitavam Paraty, a “cidade de artes”.

Saiu do centro histórico em busca de uma imobiliária. Conheceu vários casarios, mas ainda não havia achado o que queria. Queria especificamente naquela rua onde Helen havia se estabelecido ou proximidades. O corretor que a acompanhava se lembrou de mais um. Levou-a até o local. Dessa vez, ele mostrou uma casa no miolo do centro histórico, na esquina da rua que ela queria.

“É essa!”

A casa se encontrava em estado precário. O aluguel estava barato por conta das reformas a serem executadas. Apesar de todo o caos, ainda vigorava a lei de preservação do patrimônio histórico no Brasil e parece que ninguém queria se responsabilizar pela obra de fachada. Pela lei, a fachada da casa teria que se manter original, só permitindo mudanças de cor e texturas. Não seria problema para ela, pois daria até tempo de se organizar e ir reconhecendo a área, além de possibilitar uma aproximação da “presa”.

Após fechar negócio, foi até um café próximo para beber alguma coisa. Realmente a sorte estava com ela.

“Essa cidade é tão pequena… Será que isso é bom para alguém que quer se esconder?”

Pensava em relação à Helen e sua fuga, pois ela se encontrava dentro do café que Renee entrara. Sentou-se em uma mesa próxima para que Helen a visse. Após a cena feita pela agente da Organização na parte da manhã, não teria como a doutora não notá-la.

Sentou-se em uma mesa à frente, para que Helen a observa-se e não se sentisse apreensiva com as coincidências, no entanto, permaneceu em uma cadeira virada lateralmente à mesa da “presa” para poder, mesmo que de relance, observá-la também.

Esta a olhou com curiosidade a princípio, mas logo voltou a ler a revista que se encontrava em sua mão. Ao chegar a bebida gelada feita com café que havia pedido, Renee resolveu puxar assunto com a garçonete, tentando fazer colocações que fizessem sentido para Helen, sobre o seu comportamento mais cedo na rua.

— Hoje está sendo um dia de matar…

— É mesmo?! Aconteceu alguma coisa?

— Ah! Havia marcado com um corretor, para ver alguns locais para montar meu atelier, ele me fez esperar horas na rua embaixo desse sol, quando resolvi ir até a imobiliária, me disseram que ele havia saído com outra cliente. Poxa! As pessoas não têm mais palavra, não? Resolvi procurar outra imobiliária e, ainda no meio do caminho, encontrei o canalha com a tal cliente. Sei que ela não teve culpa, mas me deu vontade de atropelá-lo.

— Não fica assim não, as coisas estão difíceis e na certa, ele não quis trocar o certo pelo duvidoso, já que você tinha marcado na rua com ele.

— Bom… Deixa para lá! Você tem razão, não vou estragar meu dia por isso e, afinal de contas, consegui encontrar o lugar que queria.

— Encontrou?

— Sim. Precisa de reforma, mas gosto de colocar tudo do meu jeito. É um casario na outra esquina, seguindo essa rua aqui mesmo.

Renee ficou satisfeita ao sentir que Helen acompanhava a sua história. Talvez isso explicasse para ela a sua irritação mais cedo. Conseguira chamar a atenção de sua presa e ainda de quebra, talvez tivesse colocado peso em sua consciência a respeito de si.

Helen observava o diálogo entre a estranha que quase atropelara o seu corretor na rua mais cedo e a menina que atendia as mesas. Evidente que simulava estar olhando para fora, para não chamar atenção. Costumava desconfiar das coincidências. Não queria ser paranoica para não perder a objetividade, mas depois de escutar a moça aborrecida, entendeu o porquê de sua fúria. No seu lugar, possivelmente, se irritaria com o corretor também. Talvez a procurasse para se desculpar pelo ocorrido, afinal fora ela o motivo do desentendimento.

Observava-a agora com mais interesse. Era uma mulher beirando seus trinta e cinco ou trinta e oito anos, feições firmes, porém delicadas, um pouco mais baixa do que ela, mas sugeria personalidade. Lembrou-se de Renee. Não havia se permitido pensar nela nos últimos dias, possivelmente se o fizesse, não conseguiria raciocinar de forma tão prática, a ponto de conseguir fugir com segurança.

Terminou sua bebida e comprou a revista que havia pegado para ler. Passou pela desconhecida, que havia contado a sua história para a garçonete e deu um leve sorriso, olhando-a nos olhos. Surpreendeu-se ao ver tamanha segurança em seu olhar. É…essa moça a agradava em sua forma física e sua forma de olhar. Parecia ter uma personalidade forte e segura, sincera, mas serena. Porém, nem de longe lembrava a moça brava e grosseira que havia encontrado antes.

 “É… definitivamente ela me lembra Renee.”

Caminhava calmamente em direção à pousada, pensando se gostava ou não, da situação de conhecer alguém, que lembrasse “sua algoz”. Talvez seja cedo demais para pensar nessas coisas. Não tinha relaxado ainda de todo, do turbilhão que passara pela sua vida nas ultimas semanas. Gostaria de pensar e avaliar isso mais tarde, quando já estivesse realmente estabelecida. Aí sim, pensaria mais seriamente em tudo que ocorreu, para saber se realmente assumiria essa vida aqui, ou se deveria se mudar novamente.

Renee retornou à sua casa e resolveu que começaria a reforma do casario no dia seguinte. Assim possibilitaria novos encontros com a doutora e veria as mudanças que ela estaria construindo para sua nova vida. Relaxou, tomando uma cerveja na varanda e olhando a pequena baía. Depois de algum tempo avaliando as suas opções, foi dormir.

Acordou cedo e foi fazer sua atividade física. Já estava muito tempo sem correr e praticar alguns exercícios básicos de kung-fu e Krav-magá. Deveria continuar se mantendo em dia, tanto com seu corpo, quanto com suas técnicas marciais. Começou a correr em direção à Jabaquara, onde poderia ter uma tranquilidade maior. Surpreendeu-se novamente, ao encontrar Helen correndo na mesma direção.

“O local é pequeno e com poucas opções para se exercitar. Claro que Helen retomaria uma rotina, para se manter em forma também. Coincidências demais, talvez não sejam boas para mim”.

Deu meia volta, antes que Helen a visse, e seguiu em direção ao bairro Caborê. Mas, logo percebeu que estava sendo seguida pela sua “presa”. Esta apertou o passo até alcançá-la. Seu braço foi tocado e reagiu como se tivesse levado um susto.

— Desculpe se te assustei! É que queria pedir desculpas à você…

— Nossa!! “Me” assustou mesmo! Desculpas pelo que?

— É que ontem nos esbarramos duas vezes, uma eu estava alugando uma casa e você passou quase derrubando o meu corretor e outra eu ouvi você contar a sua historia, do que o corretor fez com você, para uma garçonete em um café lá no centro. Creio que eu seja o pivô do seu desagrado pelo dia de ontem…

Continuavam correndo e Renee deixou que a surpresa estampasse seu rosto.

— Então foi você que me roubou o corretor? – Falou com um tom de divertimento. – Não se preocupe, já achei o que desejava. E depois eu estava furiosa naquele momento, tinha ficado debaixo do sol e fiquei aborrecida. Normalmente não sou de fazer barraco, mas fiquei muito “puta” com ele. Já passou. Eu é que tenho que te pedir desculpas por ter sido grosseira.

— Não se preocupe. Depois de escutar sua história, no seu lugar, eu teria dado um tiro no corretor.

— Nossa! “Me” lembre se um dia pisar em seu pé sem querer, correr para bem longe o mais rápido que puder!

Ambas riram largamente.

— Você se importa se te acompanhar?

— Claro que não! Gosto de companhia e não conheço muita gente “Me” mudei há pouco tempo.

Renee sabia que talvez fosse arriscado deixar que Helen a conhecesse tão cedo. Mas as oportunidades as uniram tão facilmente que não houve com não permitir. Pior seria se negasse, ela desconfiaria mais ainda. Provavelmente a avistou na corrida e se empertigou com as coincidências tanto quanto Renee.

— Qual o seu nome?

— Mila Ortiz, e o seu?

— Margaret Potter. Você é brasileira? Seu nome não parece ser brasileiro.

— Sim… Bom, na verdade não sei. Minha família é de uma miscelânea de lugares. Acho que o Brasil é isso. Nossa identidade se faz com as mais variadas raízes. Não posso te dizer ao certo de onde veio meu nome. Mas meus pais eram brasileiros. E você, de onde é? Dá para perceber que seu português está enferrujado.

— África do Sul. Meus avós eram ingleses, Foram para lá quando eram novos e a família se estabeleceu.

— Você está bem longe do seu país!

— A África do Sul hoje é um lugar muito ruim de se morar. Muitos contrabandistas passam por lá, terroristas também. A polícia está sempre de prontidão nas ruas. Não é um lugar para quem queira uma vida mais tranquila.

— Entendo… Mas não pense que aqui é a sétima maravilha, temos muitos problemas também. O que pretende fazer aqui?

— Abrirei um café.

— Eu estou fazendo meu atelier.

— Você, então, é artista?

— Sim, artista plástica.

Renee olhou Helen, com intensidade. Continuaram correndo lado a lado e a mudez de Helen, denunciou algo que Renee não conseguia identificar. Concentrou-se para entrar em contato com Helen tentando decifrar seus sentimentos. Percebeu uma onda de medo, excitação e angustia que se misturavam a uma turbulência pulsante.

“Não posso me expor tanto, ela está assustada ainda e está na defensiva”. – Pensou Renee.

Helen se retraiu, tentou analisar a estranha sensação que sentia pela outra que estava começando a intriga-la.

“Estou carente e, agora, estou sozinha no mundo. Não posso me arruinar mais uma vez. Ela só me lembra Renee, não mais que isso. Tenho que me manter afastada dela para não me sentir tentada…”

— Preciso voltar para a pousada agora, eu ainda tenho muito que fazer se quiser inaugurar o café em breve.

— Ok! Tenha um bom dia. Voltarei para minha casa também, pois vou ter que cuidar das obras do atelier.

Renee voltou para casa, treinou um pouco, alongou e decidiu pôr mãos à obra, para poder inaugurar o atelier. Contatou “o Empreiteiro”, que era um agente “olheiro” da Organização, e atuava no estado do Rio de Janeiro.  Entrou em contato também com seus fornecedores de armamento e com algumas pessoas que poderiam melhorar seu perfil, já existente no sistema. Decidiu ir à São Paulo para encontra-los e estabelecer definitivamente seu “posto de vigília” em Paraty. Investigou o perfil de Helen como Margaret Potter. Impecável. Sul-africana, filha de ingleses, comerciante da área de restaurantes, pais mortos em acidente, sem antecedente e sozinha no mundo. Pessoa que não tem muitos bens, mas não é pé de chinelo. Uma pessoa normal.

“É agulha no palheiro, difícil rastrear. Perfeito!”

Passou alguns dias fora; quando chegou, percebeu algo diferente em sua casa. Não conseguia identificar. Caminhou por sua casa sem demonstrar aparente interesse. Empertigou-se. Era uma sensação estranha de “movimento” (estranha), como se alguém tivesse caminhado por toda a sua casa. Olhou com mais acuidade e viu que faltava um cinzeiro decorativo numa mesinha de canto que, na verdade, era uma composição de duas mesinhas coladas em formato de degrau. Ele havia sido tirado da parte baixa da mesinha e havia sido posto na parte mais alta. 

“Certamente esbarraram nele e quando recolocaram no lugar, acharam que estava na parte mais alta. Será que alguém já estava no encalço de Helen e as coincidências de seus encontros levaram alguém a vigiá-la?”

Se isto tivesse acontecido, seria capaz que tivessem pontos de vigias na sua casa. E se havia, tinha que saber de que tipo era. Poderia também ser a própria Helen, que estaria desconfiada das inúmeras coincidências entre as duas. Não a condenava. Isto fazia dela uma pessoa mais atraente.

“Se fosse comigo, eu faria o mesmo”.

Em um dado momento, depois de tantas tarefas caseiras que se propôs a fazer, para achar a vigia ou as vigias, sem sucesso, foi até o bar e resolveu pegar uma garrafa de uma bebida destilada qualquer. Resolveu pelo cognac, por ser uma bebida de essência quente. Afinal quem tomaria cognac naquele calor? Sim estava lá sua vigia. Bem posicionada por permitir uma visão ampla da sala e a uma altura perfeita.

Fingiu não perceber. Fez um drink refrescante com uvas, cognac, gelo bem picado e pinout. Não sabia se o gosto ficaria realmente bom, mas não importava. A intenção era tirar aquele espião incômodo sem despertar suspeitas. Não se importando com a força imprimida, na hora de repor a garrafa, empurrou com força para trás, sem olhar para a prateleira e esmagou o seu espião anônimo.

Teria que olhar onde estava implantado o transmissor. Não seria fácil despistar e certamente teriam outras microcâmeras em outros lugares. Faria sua base em outro lugar para seus apetrechos e manteria uma vida sem muitos atrativos dentro de sua casa.

“É. Até que o drink ficou bom”!

Pensou enquanto tomava um gole da bebida e sem muito compromisso, recostou-se no sofá. Ficou bebericando e admirando a paisagem vista de sua sala, pensando em seus próximos passos.

****

Helen trabalhara duro durante a semana, para poder se mudar para a casa dos fundos de sua futura cafeteria.

“Ainda bem que escolhi uma casa em perfeito estado. Pelo menos tenho tempo para verificar minhas pendências. Essa tal de Mila viajou, mas deu para eu saber quem ela é. Internet é uma arma valiosa, porém é a coisa mais insegura do mundo para guardar informações pessoais. Principalmente se navegamos pelas camadas inferiores do mundo virtual, sem utilizar esses navegadores padrão.”

Cada vez que a doutora navegava pelas “camadas marianas” da internet, se espantava mais e mais, em como o ser humano poderia ser tão pervertido. Só conseguia acessar estas camadas, com navegadores utilizados pelo submundo da escória virtual. Lógico que todos os governos, também se utilizavam destes subterfúgios para as suas atividades de espionagem.

Helen terminou de arrumar algumas coisas, comprou móveis para sua casa e começou a planejar o seu “bunker”, para poder colocar suas armas e equipamentos. Após alguns dias estafantes de trabalho braçal, já em sua nova casa, tomou um banho e começou a caminhar pela cidade. Quase sem perceber chegou à Praia do Pontal e observou a casa de sua “quase e única conhecida em Paraty”.

“Ela já chegou de viagem. A luz está acesa. Levou tempo para voltar…”

Na investigação que fez sobre Mila Ortiz, descobriu onde era sua casa. Admirando a construção sobre a encosta do morro, observava que esta dava a impressão de estar plainando sobre a água.

“Realmente ela deve ter uma bela paisagem do quarto”.

Sorriu levemente ao reparar que o seu pensamento era malicioso. Decidiu sentar em um bar-restaurante, que servia cerveja aos clientes em mesas colocadas na calçada e com isso, permitiria que visualizasse mais a casa da estranha, que esbarrara com ela tantas vezes.

As luzes internas apagaram. Tentou olhar de forma mais aguçada para saber se ela sairia. As luzes externas já estavam acesas, talvez por conta de algum sensor. Não conseguia divisar muito bem a frente da casa àquela distancia. Retirou um “óculos-binóculo” de sua bolsa e tentou olhar discretamente. Sim, o portão pequeno se abriu e Mila estava saindo. Pagou ao garçom a long neck que estava bebendo e saiu caminhando displicente pela orla, em direção à saída da rua em que a interessante estranha viria.

— Oi! Pelo visto essa cidade é pequena mesmo!

Falou Helen descontraidamente com a garrafa de cerveja na mão. Renee caminhava em sua direção a observando e sentiu enorme satisfação ao encontra-la tão descontraída. Porém, duvidava que desta vez, fosse coincidência seu encontro.

— Oi! Tudo bem? É parece que nos encontraremos mais vezes por aí, afinal, vamos ter negócio no centro histórico.

— Mas não te vi por esses dias… Pensei que estivesse doente. – Helen tentou disfarçar a curiosidade.

— Não, não estava. É que resolvi comprar material para iniciar meus trabalhos no atelier. Fiquei um tempo fora mesmo. Contratei um empreiteiro para reformar e ele me garantiu que me entregaria em duas semanas e meia. Quero começar a trabalhar em casa mesmo, para poder inaugurar com alguma coisa em exposição.

— Isso é ótimo. Onde você está morando?

Renee começou a achar a conversa engraçada. Sabia que Helen devia ter investigado e possivelmente, fora ela quem colocara as câmeras espiãs em sua casa.

— “Beeemm” naquela casa ali no alto.

Renee falou sonoramente e apontou para a sua casa, girando ligeiramente o corpo e depois retornando o olhar para a mulher à sua frente. Divertia-se com a atitude da outra mulher.

— Nossa! Você deve ter uma vista maravilhosa.

— Tenho sim. Aliás, foi exatamente isso que me atraiu nessa casa, quando estava procurando um lugar para morar aqui.

Helen parou momentaneamente para observar a casa mais de perto. Renee olhou para a doutora, não entendendo a sua apreciação curiosa a respeito da casa, afinal essa já devia até saber o que existia dentro. Iria continuar o diálogo quando seu celular tocou. Estranhou, pois os agentes amigos, “pc e empreiteiro”, só entrariam em contato, se algo muito grave acontecesse.

— Só um momento.

Fez sinal com o indicador para Helen e se afastou para atender o seu celular.

— Alô!

“A cafeteria está com problemas. Não deverá abrir. O Atelier terá que dar o suporte e deverá conhecer todos os detalhes, mas o “empreiteiro” não está fazendo a reforma, está com problemas também. A casa da artista está aberta, mas não foi a “barista” que abriu”.

— Ok. Entrarei em contato com o empreiteiro.

Helen escutou as palavras de “Mila” ao telefone e entendeu que algo aconteceu em sua obra, pois a expressão da mulher havia mudado para uma expressão preocupada.

— Algum problema?

— Sim. Parece que meu empreiteiro está com problemas na obra e terei que falar com ele. Obrigada pela breve companhia, Margaret, mas terei que ir.

— Me chame de Meg.

— Ok, Meg. Terei que voltar para casa. “Nos vemos” por aí.

Renee falou incisiva, não dando chance para Helen retrucar.

— Sim, nos vemos. Até mais.

Helen meneou a cabeça e Renee votou o passo pela rua.

……………..



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