Aceitação

Aceitação – Primeira Parte

ACEITAÇÃO

PRIMEIRA PARTE

A família mudou acompanhando o pai, militar do exército. Pelo menos começariam tudo com o início de um novo ano, não pelo meio como já haviam feito várias vezes antes.

Primeiro dia de aula do ano, primeiro dia de nova escola pública (o pai exigia), em nova cidade e uma nova aluna receosa. Andrea não conseguia disfarçar totalmente a tensão, principalmente por atrair tantos olhares masculinos. Alta, olhos verdes, longos e sedosos cabelos loiros, elegantemente feminina (o que era natural nela, sem nenhuma pose), o que talvez fosse um empecilho para conseguir novas amizades. Não estava interessada em namoros e as meninas têm o hábito de não gostar de pessoas com a aparência dela.

Em Porto Alegre, onde nascera, tinha vários amigos de infância (pois a família já havia estado por lá algumas vezes) e duas amigas a quem confiava tudo. Agora sentia-se uma adolescente de 17 anos, sozinha em um lugar desconhecido e com fama de “fria”. A vaga só fora conseguida porque quando transferido o militar, os filhos têm vagas garantidas nas escolas.

O irmão mais velho não viera, ficou com a avó porque não quis mudar de faculdade, o mais novo estava na mesma escola que ela, mas com 3 anos de diferença de idade, não podia contar com ele naquele momento.

– Hei, sapata! Vem cá conhecer um homem de verdade.

– Quando conhecer um me avisa que terei prazer em conhecê-lo!

– Tem algo aqui que prova que sou homem, não quer ver? (com a mão no pênis).

– Qualquer macho de qualquer espécie também tem isso! Homem é muito mais que isso. A começar por respeitar os outros.

– Vai se ferrar, sapatão!

– Vai sonhando, seu merda!

– Isso aqui é um corredor de escola, cada um pra sua sala. AGORA!

Andrea permaneceu estática e assustada. Agora sim estava com medo. Um garoto e uma garota discutindo daquele jeito dentro da escola!

A mesma pessoa que fizera os dois pararem dirigiu-se a ela.

– E você aí, mocinha, está perdida?

– Hã! …. estou procurando minha sala …. 3º ano … hã … D?

– Segunda porta à sua direita – apontou.

– Obrigada!

Entrou, sentou-se em uma carteira vazia olhando à sua volta. Já tinha vários estudantes, uns conversando, outros ouvindo música, muitos “navegando com os dedões” e uns dois cochilando no fundo. Parecia não terem notado a aluna nova. E o encrenqueiro entrou.

– E aí, galera?

– Qual é, Janjão, encarnando com a Carmem de novo?

–  Ah, só porque é a favorita do Alfredão da educação física não vai me descer, né! – replicou Janjão.

– Que foi? Ela não te deu mole, é? – o amigo perguntou rindo junto aos outros.

– Que isso! Tá me estranhando? Aquela cara comum não faz meu gênero, não! – respondeu Janjão indignado.

– Mas tem um corpaço! – o outro chacoteou em meio a risos.

– Eu encarava na boa! – um terceiro afirmou

– Para com isso, cara. Joga feito homem aquela sapata. – Reclamou Janjão.

– O fato dela jogar muito bem, ao contrário de uns e outros que se julgam o máximo, isso não a transforma em lésbica. Essa é a palavra que quer dizer, mas não tem cérebro para guardar a informação. Sapata já virou arcaico o homofóbico. – Ivete se intrometeu.

– Pronto! Lá vem a “defensorinha”! Conta aí como é que funciona na cama entre vocês duas? – Janjão perguntou

– Se eu gostasse de transar com mulher, provavelmente seria muito bom! E você não vai saber nunca já que ela disse não quando a convidou né? – a moça implicou

– Eu nunca convidei ela não, sua … – Jorge começou a revidar

– Boa tarde, classe. Sentando, por favor.

Andrea achou que o tal Janjão fosse bater na menina e ficou aliviada com a entrada da professora.

– Bom, pelas caras que vejo quase todo mundo se conhece e me conhecem, então não vou perder muito tempo com apresentações. Lá do corredor ouvi alguém gritando e a voz me pareceu sua, Jorge. Por que e com quem estava gritando?

– Só uma discussão aqui com a Ivete profa. – o rapaz se fez de santo.

– Sei! Então, vamos evitar gritaria na sala de aula. Temos uma aluna nova aqui na escola, Andrea, não é? – a professora questionou.

– Sim, senhora! – a loira imediatamente disse.

– Seja bem-vinda! Eu sou Marlene, professora de matemática, e aos poucos vai conhecendo seus colegas, inclusive os atrasadinhos (depois que ela entrara, vários alunos ainda chegaram para a aula), e que tenha uma impressão melhor do que as discussões do senhor Jorge.

Andrea suspirou fundo, dando graças a Deus pela professora não perguntar nada a ela. Tudo transcorreu normalmente até a hora dos 20 minutos de intervalo. Andrea saiu da sala, gravando o número e localização quando ao dobrar o corredor BAM! A “trombada” foi forte. Ambas caíram no chão.

– Puta que pariu! É hoje. Tá no mundo da lua? Me ajuda pegar os livros. Antes parecia uma estátua, agora vem feito trator. – Carmen reclamou.

– Me desculpe, mas para esse tipo de acontecimento, os dois corpos teriam que estar em movimento, não é? E você não sabe ser educada? Um por favor, ajudaria eu pegar os livros numa boa. – replicou Andréa.

– Os livros caíram porque você os derrubou, então porque eu pediria, por favor, se foi você quem fez a merda? A mão de direção no país é pela direita e era onde eu estava e com pressa. A não ser que seja inglesa, não há desculpas por estar do lado errado. – Carmen continuou a xingar.

– Caramba! Sabia que você é intragável? – A loira criticou.

– To morrendo de preocupação com opiniões alheias! – A outra disse fingindo indignação.

– Pronto! Foi o último livro, foi um desprazer. – Andrea exclamou.

– Igualmente! – Carmen revidou.

Olharam-se como se fossem rosnar uma para a outra.

– Dá pra você ir pra sua direita e me deixar passar? – completou.

Andrea, num misto de raiva, sentindo algo gelado no meio do peito e outro sentimento indefinido, fungou e se afastou.

No retorno à sala, antes do início da próxima aula, Ivete e Josie vieram cumprimentá-la.

– Oi! Sou Ivete, esta é Josie. Seja bem-vinda e, se precisar de alguma coisa que a gente possa ajudar, alguma dificuldade com matérias por causa da mudança de escola, é só falar.

– Oi! De onde você veio? – Josie perguntou

– Oi, meninas! Obrigada. Eu sou Andrea e vim de Porto Alegre. 

Este foi o início do papo, porém o professor de Português entrou e a conversa continuaria depois. No final da aula Jorge foi se apresentar.

– Oi, gata! Eu sou Jorge, o melhor jogador de futebol de salão da escola a seu dispor.

– Obrigada, Jorge, mas não há nada que eu precise no momento.

– Vamos embora, Andrea? – Ivete chamou.

– Vamos, Ivete. Boa tarde … Jorge. – Andrea disse já saindo.

– O quê? Nem chegou e já vai se enturmando com um bando de sapatas? – Ele revoltado perguntou.

Andrea se virou com raiva, não gostara do rapaz já no corredor, pela forma dele ter gritado com a garota, mesmo que não simpatizasse com ela, mas Ivete tomou a frente.

– Impressionante! Só são hetero as galinhas que ficam com você! Você é um porre, moleque. Vai procurar a mamãe pra te dar mamadeira, vai! – Ivete o enxotou

Pegou Andrea pelo braço e saíram.

– Liga não, Andrea, esse ai é um machão metido a gostosão, no entanto, tem cérebro de minhoca e agrada a poucas, então sai chamando todas as outras de “sapata”. Acho que é a única palavra que conhece. – Explicou Ivete. 

Riram. Josie já estava no corredor esperando, e ali nasceu a amizade entre as três. Como faziam parte do time de vôlei, Andrea foi convidada a se apresentar para tentar entrar no mesmo, que era bem colocado nos jogos estudantis. Já que ela jogava e gostava, resolveu que iria.

No dia seguinte, na quadra da escola, depois das aulas, fizeram testes com várias garotas para formar o time para o ano, já que algumas jogadoras foram para a faculdade e novas alunas chegaram. Andrea foi bem e ficou admirada com a forma que a tal Carmem jogava.

Chegando a hora do término do uso da quadra pela turma do vôlei, o pessoal do futsal começou a chegar. Jorge se aproximou de uma das jogadoras e tentou conversar.

– Vamos lá, gata! Eu não fiz nada! – O rapaz disse.

– Eu soube da tua atitude ontem no corredor. Já te disse várias vezes para parar com essas coisas de moleque, mas você não cresce, então, pra mim chega. – A garota afirmou exasperada. 

– Você não pode acabar comigo por causa daquela sapatona! – Jorge indignou-se.

– Não é por causa dela! É por causa da sua infantilidade. – ela revidou.

Virou-se para ir embora.

– Volta aqui. – disse Jorge segurando-a pelo braço.

– Me larga! Vai fazer escândalo agora, pra provar tua idiotice? – Leonor perguntou.

Largou-a olhando em volta e muitos dos colegas estavam olhando para eles. Então viu Carmem arrumando sua mochila, de costas. Foi pra ela que se dirigiu com raiva, com os punhos cerrados. Gritou o nome dela ao chegar perto e, antes que ela terminasse de se virar, desferiu o soco. Ela desviou por reflexo e o soco apenas raspou seu rosto. Porém, ela se desequilibrou na manobra e caiu.

– A culpa é tua! Sua vaca! – Jorge gritou

Carmem se levantou bem rápido.

– Do que é que você está falando, animal? Eu não te fiz nada! – Carmen respondeu

– A Leonor acabou comigo por tua culpa!

Veio pra cima dela com tudo e o professor e amigos não tiveram como segurá-lo, estavam longe pra isso. Mas, ficou bem surpreso, ao sentir o murro desviado e uma joelhada na boca do estômago. Tentou dar um passo para trás, curvando-se de dor e sem fôlego e desabou no chão.

– Presta atenção, pivete! Se ela te deixou foi por coisas que você fez. Não vem pondo culpa em ninguém não. E, se quiser bater em alguém, machão, primeiro veja se é fácil como você acha e não tente pegar quem faz kung fu, há vários anos. Babaca! – Disse Carmem.

O professor ajudou Jorge a se levantar.

– Pode começar a correr em volta da quadra até o final do treino.

–  Eu? Foi ela quem me bateu! – Jorge questionou indignado.

– Todo mundo aqui presente viu o que aconteceu. Correndo.

– Ivete, o que foi isso? – Andrea perguntou

– A peste do Jorge, babaca mor da escola. – respondeu.

– O que tem entre esses dois? Ela é mesmo gay? – A loira indagou.

– Ele encarnou nela por algo que aconteceu com a irmã dele. É um baita preconceituoso, acha que mulher é inferior ao macho. Quanto a outra pergunta, só ela pode responder.

Tinham se aproximado de Carmem.

– Hei, Carmem, esta aqui é Andrea, aluna nova. – Ivete apresentou.

– Oi! Ah, a perdidinha! Te vi jogando, joga bem. – comentou de relance.

– Obrigada! E aqui está a “educadinha”. – Andrea disse

–  Ah, já se conhecem!? – Ivete sondou.

– Já sim, essa é a trombadinha que quase me quebrou a coluna. – Carmen explicou

– Que exagero! Foi uma leve trombada. Vai continuar com grossura até quando por causa de um pequeno acidente?- A loira provocou.

– Oi, gente! Tem aula agora, Carmem? – Josie perguntou.

– Tenho sim, por isso já estou de saída. Ciao meninas, avoada! – Ela se despediu.

– Isso foi comigo? Eu vou … – Andrea falou com raiva 

– Ué! Que tá pegando? – Josie indagou sem entender.

– Esquenta não, Andrea. Aliás, eu sei que te conheço praticamente há poucas horas, mas me parece uma pessoa gentil. – Ivete tentou colocar panos quentes.

– Eu sou gentil! – A loira exclamou

– A Carmem também! Mas, parece que se odeiam! – Ivete replicou.

– Eu não odeio ela não, só que ela me irrita! – Andrea revidou.

–  Hum! Vamos pro chuveiro que tá na hora. – Ivete encerrou.

E durante aquele ano letivo foi assim. Encontros ocasionais com muitas farpas e Ivete e Josie apaziguando enquanto tentavam entender. Andrea acabou descobrindo que Jorge tinha uma irmã mais velha que fora amiga de Carmem, mas envolvera-se com uma garota que Carmem detestava. Ela até preveniu a irmã de Jorge sobre a índole da garota, contudo como ela não lhe deu ouvidos, se afastou e a irmã se ferrou com a garota que não valia nada, entrou em depressão, tentou suicídio.

Embora Carmem a tivesse prevenido, Jorge a culpou e tudo que as pessoas dissessem ele não aceitava e não mudava de ideia.

Fim de ano chegando e Andrea viu que não era tão difícil se enturmar em São Paulo, afinal. O time de vôlei feminino foi campeão dos Jogos Escolares, ainda que as melhores jogadoras, Carmem e Andrea, o tempo todo criticassem qualquer errinho uma da outra. Carmem foi a melhor jogadora do campeonato.  O time de futsal também foi campeão, o que deixara Jorge mais intragável por ter sido o artilheiro do campeonato.

Nas vezes que Andrea encontrava Carmem, havia sempre aquele misto de gelado e adrenalina que se convenceu ser antipatia, raiva às vezes.

A escola reunia os alunos que desejassem ter aulas de reforço para tirar dúvidas em algumas matérias para o ENEM, PISM, vestibular. Carmem e Andrea, embora tivessem excelentes notas, aproveitaram para os últimos acertos antes dos exames para ingressarem nas faculdades escolhidas. Foi o único tempo que permaneceram no mesmo lugar sem se atacarem com ironia e/ou rispidez.

Antes da formatura haveria um jantar com alunos e professores. 

Durante o jantar em um restaurante, Andrea foi ao banheiro. Ao entrar, deu de cara com Carmem que estava acabando de enxugar as mãos. Como sempre se encararam. Andrea com aquelas sensações mistas. Carmem lhe deu passagem e quando ela estava quase ao seu lado, em movimentos rápidos, colocou a mão em sua nuca, puxou-a e beijou-lhe a boca com vontade.

Com o coração quase estourando, Andrea ficou sem reação, todavia sentiu a língua invasora passear por sua boca e não a afastou. Tão de repente como começou, o beijo parou e Carmem saiu. Andrea viu um rosto no espelho e não se reconheceu. De quem seria aquele rosto tão surpreso quanto assustado? Não a beijara, mas também não recusara o beijo!

Não comentaria com ninguém e sabia que Carmem também não o faria.

– Oi, Andrea! Encontrei a Carmem saindo do banheiro, espero que não tenham discutido. Aliás, sabe que estranho muito essa relação entre vocês duas? Você é legal com todo mundo, menos com ela. Ela é uma doçura de pessoa, menos com você. Sabe que mesmo sendo ótima jogadora, esse foi o primeiro ano que ela disputou com o time? – Ivete disse.

–  Sério? Por que ela não jogava? – Andrea, perguntou, tentando se recompor.

– Diz que gosta de jogar por diversão, que não gosta de competição. – A amiga respondeu.

– Pois me parece que gosta de disputar o tempo todo quando estou por perto! – A loira replicou.

– Essa briguinha besta entre vocês duas, não sei não! – Ivete brincou.

– Não sabe o que, Ivete? – Andrea se irritou.

– Nada não, deixa pra lá. – Ivete respondeu.

No baile que alguns insistiram em ter, Carmem não participaria, então não se encontrariam mais da mesma forma. Para receberem o certificado (diploma), estariam divididos por classes e nem precisariam conversar!

Depois de estarem com o “canudo” nas mãos, ouvido o orador da turma e todo aquele “ritual”, jogarem os capelos para o alto, gritaram, se abraçaram, se despediram. E, quando já começavam a sair, Carmem passou por Andrea, estendeu-lhe uma rosa vermelha, sorriu, piscou-lhe e saiu.

Tudo correu como planejado. Alunos e familiares contentes. Estudar como nunca para conseguir a faculdade desejada.

Depois de várias noites mal dormidas, finalmente o fim de semana que definiria futuros.

Carmem foi a segunda colocada em Propaganda e Marketing. Andrea conseguiu a primeira chamada para Engenharia de Produção.

E o primeiro e o segundo ano se foram. No final do segundo ano, já em férias, Andrea foi ao teatro com alguns amigos da faculdade, um deles meio que namorado e quando depois do espetáculo, na saída, se beijavam, sentiu que a olhavam. Parou o beijo e olhou em volta. Ela estava olhando, sorrindo estranhamente, jogou um beijo e foi embora. O garoto puxou Andrea tentando continuar beijando-a, mas o momento se fora e aquela sensação de sempre quando a encontrava estava presente, junto com uma outra de … quase …culpa!

– Olha, Osvaldo, desculpa, mas não vai dar. Paramos aqui. – Andrea determinou.

– O que? Que foi? Tava tudo bem e do nada vem com esse papo!? – O rapaz questionou.

– Desculpe, mas … melhor nem começar nada. Não estou a fim. – A loira explicou.

O rapaz irritadíssimo deu-lhe as costas e deixou-a sozinha.

“Droga! Que foi isso? Por que tive essa reação tão … tão … idiota!”

A vida continuou. Andrea estudando, se divertindo quando dava, ficando, namorando alguns rapazes, nada sério. O namoro que mais durou foi seis meses.

E chegou o dia de nova formatura. Convidara, claro, Ivete e Josie, amigas com as quais mantivera o vínculo. Depois do longo “ritual”, o encontro com familiares e amigos para os parabéns. Ivete e Josie a abraçaram juntas, logo depois de seus pais que agora conversavam com outras pessoas.

Andrea se sentia eufórica, quase realizada, mas estava faltando algo que não sabia precisar, para ficar realmente feliz.

– Oi, Andrea, desculpe a intromissão, só vim parabenizá-la. – a voz de Carmen lhe chegou aos ouvidos.

E lá estava aquela sensação de novo! Virou-se devagar sem saber porque, afinal, podia ter se enganado com a voz. Não, não se enganara. Elegante, discreta, cheia de charme.

– Ah! Oi, Carmem, que surpresa! – Andrea falou.

– Espero que boa. Ivete me avisou sobre sua formatura e resolvi te dar um abraço. Posso? – Ela pediu.

– Claro! – Respondeu Andrea efusivamente.

Pela primeira vez, viu-se e sentiu-se dentro daquele abraço e também pela primeira vez …. o cheiro! “Meu Deus, que cheiro gostoso!”. Naquele momento sentiu também uma nova sensação, ou talvez teve conhecimento que tinha essa sensação, a vontade de ser abraçada por ela. Foi um abraço forte, aconchegante e no ouvido, um sussurro.

– Parabéns, avoada! Continua tão linda quanto me lembrava. – Carmen elogiou.

Separaram-se. Andrea não sabia o que dizer ou fazer, estava toda arrepiada e …. feliz.

– E ai, Andrea, vai comemorar com seus pais? – Ivete perguntou

– Eles estavam pensando num jantar, mas não acho que seja exclusivo. – Andrea respondeu.

– A gente podia ir junto, né, Carmem? – Josie sugeriu.

– Primeiro deixe ela ver com os pais, Jô! Carmen sugeriu sorrindo. 

Os pais concordaram de imediato, afinal já tinham ouvido tantas vezes sobre aquelas pessoas, que seria uma oportunidade de saber mais sobre o tipo de amizade da filha, embora já conhecessem, por rápidas visitas, Ivete e Josie. 

Ao ouvirem o nome de Carmem:

– Ah, você é aquela que sempre irritava Andrea! – Maria Helena perguntou.

– Mãe! – Andrea exclamou.

– Coisas de adolescentes, dona Maria Helena! Bobeira. – Carmen tentava se explicar.

– Por favor, tire o “dona”, só Helena está ótimo! Que bom que era só bobeira, porque acho que ouvia falar de você todos os dias. – Disse, rindo da lembrança.

– É mesmo!? É bom não ser esquecida. – Carmen continuou.

Para desespero de Andrea, sua mãe se simpatizou de imediato com Carmem e não parava de falar, perguntar, querer saber sobre ela, enquanto iam de braços dados para o restaurante. Lá chegando, Carmem deu um jeito de se sentar bem à sua frente. Embora a conversa fosse animada à mesa, Andrea percebeu que o olhar penetrante de Carmem com aquele meio sorriso não a irritava, mas sim a descontrolava.

– Então, avoadinha, já tem planos para o início do ano, ou vai dar um prazo para férias? – Carmen indagou.

– Avoadinha! É mesmo! Ela ficava doida por você chamá-la de avoada. Mas, por que exatamente você a chama assim? – Maria Helena perguntou em meio às gargalhadas.

– É que a primeira vez que nos esbarramos nos corredores da escola, ela estava toda distraída que nem me viu cheia de livros. E depois, várias vezes, até no vôlei, ela se desligava, pensando em não sei o que. Era e é um jeito carinhoso, mas ela achava que era irônico. – Carmen explicou.

Andrea não se lembrava, porém agora começavam vir à cabeça momentos não de “desligamentos”, mas de “desconcertos momentâneos” quando encontrava Carmem sem estar prevenida, pois ela pensava ser irritação o que Carmem provocava.

Como ali mesmo, naquela mesa, toda vez que se encaravam e ela não sabia o que fazer.

– Ah, que bonitinho! Viu, filha, se irritava à toa, eu te disse que deveria falar com ela. – Maria Helena disse.

À certa altura, Ivete e Andrea foram ao banheiro.

–  Então, já descobriu o que sente por ela, Andrea? – Ivete questionou.

– Como assim? 

– Vai me dizer que ainda não percebeu? Como alguém tão inteligente pode ser tão … desligada?! – a amiga se indignou.

– Percebi o que? – Andrea tentava entender.

– Interrompo alguma coisa? – Carmen perguntou.

–  Não! Não interrompe nada! A avoadinha continua do mesmo jeito. – Disse já entrando num dos boxes.

Carmem passou por Andrea enquanto acariciava seus cabelos e entrou em outro box. Pronto! Estava sem ação de novo! Outras pessoas entraram no banheiro e ela reagiu, indo fazer o que viera fazer. Quando saiu, só Ivete estava esperando-a. Voltaram à mesa e Carmem já tinha ido embora.



Notas:



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