The Day that never comes:

Metallica

Break of Reality –

Riding with the King:

Rock and Roll:

Camila – Diedra Roiz

Ao contrário do que eu esperava, Sunny não hesitou, nem se ofendeu, sequer pareceu chateada. Me olhou como se o que eu tivesse dito fosse a coisa mais imbecil do planeta, foi… Irônica, na verdade:

– Tudo bem, Camila. Sem problemas. Desculpe, eu tô achando engraçado, porque… Você pensou o quê? Que eu ia querer casar só porque foi minha primeira vez com uma mulher? Tudo bem, foi uma ótima trepada, tão maravilhosa que eu quis repetir ontem, hoje e daqui a pouco de novo… Se você não sair correndo, claro…

Fiquei muda. Sem saber o que dizer. Tentei esboçar:

– Eu…

Mas ela me cortou:

– Olha só… Fica tranquila. Não precisa falar mais nada. Tá tudo certo… Vamos aproveitar, ãh? – se aproximou, enfiou a mão em meu pescoço, subindo pela nuca, me causando um arrepio inevitável… Sorriu com a minha reação imediata… Me puxou… Os lábios tão próximos que quando falou, soprou nos meus: – Você acabou de me abrir um novo universo, sabe? E a última coisa que eu quero é exclusividade…

Colou a boca na minha, pondo fim ao diálogo… Me fez deitar na cama e se encaixou por cima, no meio das minhas pernas… Reacendendo meu desejo por ela de uma maneira mais do que incontrolável… Tudo que eu queria era me deixar queimar…

Sem parar de me beijar, ela tateou a procura de algo na mesinha de cabeceira… Só descobri o que quando o som entrou alto, preenchendo todo o quarto: “The Day that Never Comes” (Metallica).

Deixei que Sunny conduzisse, no ritmo da música, me entreguei sem restrições, por completo, de forma integral… E ela me recompensou… Regendo o ato com maestria… De forma tão absolutamente voraz que me fez gemer alto…

Perdi a conta de quantas vezes gritei… Repetidas vezes… Antes, durante e depois… Dos múltiplos orgasmos que tive durante aquela noite… Todos profunda e profusamente intensos, arrebatadores e fantásticos…

No dia seguinte de manhã, Sunny me levou até o carro. Despediu-se com um sorriso que eu achei lindo:

– Foi ótimo! Me diverti muito… – Me beijou nos lábios, recuou alguns passos e soprou: – Tchau…

Antes de se virar e entrar em casa, me deixando ali parada, com uma estranha sensação de… Sacudi a cabeça, girei a chave na ignição, passei a marcha e acelerei… Antes de conseguir identificar…

– Não vai dizer nada?

Perguntei, profundamente incomodada com o silêncio de Flávia depois que contei o que havia acontecido entre Sunny e eu.

Ela sorriu e desviou os olhos. Durante um momento que pareceu durar a eternidade olhou em volta, buscando alguma coisa na praça de alimentação do shopping… Antes de tentar desviar o assunto:

– Vamos tomar um chope?

Insisti:

– Não vai me responder?

Havia algo diferente, que eu nunca tinha visto no olhar dela quando encontrou o meu:

– O que você quer que eu diga, Camila?

Levantou e caminhou em direção a um dos balcões. Não me ouviu dizer, até por que… Falei baixinho, muito mais para mim mesma:

– Eu também não sei.

A semana passou muito fácil e rapidamente, de uma maneira quase… Feliz. Há muito tempo eu não me sentia tão… Leve.

Na sexta feira saí do trabalho mais cedo. Cheguei em casa no final da tarde, atirei minha bolsa em cima do sofá e fiquei andando de um lado para o outro no apartamento. Os olhos de Sandra me seguiam… Em cada cômodo… Nos porta retratos, objetos, móveis, paredes… Sabendo muito bem o que eu estava pensando, precisando, desejando…

Peguei o celular e liguei… Tocou várias vezes antes que atendesse:

– Oi?

– Sunny?

– Sim… Quem é?

Tinha música atrás dela. E vozes. Falei alto, para que ela me escutasse direito:

– É a Camila.

– Oi, tudo bem?

O tom dela foi… Morno. Menos do que eu esperava, com certeza.

– Tudo, e você?

– Tudo ótimo!

Riu e esperou. Eu continuei:

– Eu queria te ver.

Ela foi francamente objetiva:

– Hoje não dá. Me liga amanhã?

– Tá.

O que mais eu poderia responder?

Desliguei, fui até a geladeira e peguei duas latinhas de cerveja. A primeira coloquei no freezer, a segunda bebi sem estar gelada de verdade. Sentada em uma das poltronas da sala, olhando para o nada… Foi rápido. Ficou vazia sem que eu percebesse. Voltei à cozinha. Mais uma latinha no freezer, no lugar da que abri… Movimento que repeti umas três vezes antes de ligar a TV, já com certa dificuldade em encontrar os botões certos do controle…

E foi assim, sem saber como, que acabei acessando o pen drive que estava conectado e que continha…  Filmagens de Sandra… Com o violoncelo, em uma das apresentações com o quarteto do qual fazia parte… Passei os olhos pela lista, escolhi a música e ela apareceu… Tocando Metallica… “The Day that Never Comes”.

Todos os meus sentidos imediatamente reagiram… Sem que eu pudesse mais contê-los…

Lembrar a sensação, o gosto, os sons, o cheiro… Sunny em meus braços… Me deixou completamente excitada, louca de desejo… Precisava… Vê-la… Tocá-la… Comê-la. Naquela noite. Se estivéssemos frente a frente, poderia… Quem sabe? Mudar o não dela para sim… Com certeza, pessoalmente seria bem mais fácil do que pelo telefone…

Peguei o celular de novo… E liguei para Flávia:

– Tá fazendo o quê?

Ela ficou audivelmente surpresa:

– Por enquanto nada. Por quê?

Fui direta:

– Vamos pra Porto Belo?

Ela também:

– Pra quê?

Tentei disfarçar minha ansiedade… Inutilmente:

– Hoje é sexta, se bem te conheço você vai sair pra pegar, né? Então… Pode ser lá, não pode? Não faz diferença, faz?

Flávia riu:

– Eu que te pergunto, Camila: que diferença faz? – Fiquei sem palavras. Ela prosseguiu: – Pensa comigo só um pouquinho mais: se é só sexo que você quer, por que lá e não aqui?

Aquilo ergueu todas as minhas defesas:

– O que tem uma coisa a ver com a outra?

Flávia não fez rodeios:

– Você quer uma pessoa específica. Não é?

Levei um tempo para ser capaz de admitir:

– Sim. – O silêncio dela me levou a dizer: – E…?

Ela falou num tom sério e pausado:

– Não sei. Responde você.

Não estava nem um pouco a fim daquele tipo de conversa. Voltei ao que realmente me interessava:

– Vamos ou não?

Não poderia ser tão fácil, obviamente:

– Ok. Vou voltar à minha primeira pergunta então: pra quê?

Só tinha um jeito de Flávia parar com aquilo… Fui obrigada a confessar:

– Eu quero encontrar a Sunny. Pronto. Satisfeita?

Ela riu:

– Por hora é o suficiente. Te ligo quando estiver saindo daqui. Tchau.

Desligou antes que eu pudesse responder:

– Tchau.

Entrei no pub atrás de Flávia, procurando Sunny com os olhos. Ainda não a tinha avistado quando paramos na mesa de Lu e Ive. Cumprimentei-as rapidamente. Flávia sentou, eu permaneci de pé, alheia a conversa, olhando em volta até encontrar o que buscava. E lá estava ela… Dançando no meio da pista ao som de “Riding with the King” (Eric Clapton e B. B. King), mais maravilhosa do que nunca, na verdade parecia… Quase magnética. Eu não era a única que achava, obviamente… Não foi difícil perceber alguns olhares famintos em volta. Venci a distância entre nós rapidamente. Cheguei por trás e soprei baixo, bem pertinho do ouvido de Sunny:

– Oi, linda…

Ela parou de dançar e se virou sorrindo:

– Camila! – Me cumprimentou encostando o rosto no meu… Sussurrou num tom provocante: – Que surpresa…

Segurei-a pela cintura, afastei o rosto e a olhei nos olhos:

– Boa ou ruim?

Ela voltou a sorrir… Soltou-se e se afastou… Me olhou de cima a baixo, avaliando e aprovando:

– Ótima… Como sempre…

Sorri de volta:

– Posso te pagar uma bebida?

– Quem sabe mais tarde?

Foi a resposta dela antes de fechar os olhos e voltar a se mover no ritmo da música, com uma sensualidade que me deixou hipnotizada… À muito custo contive a vontade que senti de puxá-la para mim… Ao invés disso acompanhei-a… Seguindo a mesma cadência… Tentei aproximar meu corpo do dela, mas Sunny se afastou. Abriu os olhos e, sem parar de dançar, me olhou profundamente… Manteve a distância física… Mas era como se estivesse me tocando… O calor entre nós aumentando, me deixando excitadíssima… A música terminou… Ela se aproximou e sussurrou:

– Pode ser agora…

Sorriu… De um jeito que me confundiu:

– Hein?

O sorriso dela aumentou… Estava… Rindo de mim…

– A bebida. – me pegou pela mão: – Vem…

Me deixei conduzir… Os olhos fixos no andar requebrado delicioso na minha frente… Tudo que eu queria era…

– O quê?

Perguntei, assim que percebi que Sunny esperava minha resposta… Para uma pergunta que eu não tinha absolutamente ouvido…

Ela repetiu:

– Blue Margarita?

Concordei:

– Sim… Principalmente se tiver o mesmo efeito da última…

Dessa vez sorrimos juntas… Uma para a outra… As recordações me atingindo com uma intensidade incrível… Até ela falar:

– Hoje não vai dar… Eu já te disse…

A chegada dos drinks nos interrompeu. Sunny se virou para pegá-los, mas a impedi:

– Deixa comigo.

– Não preci…

Nem a deixei terminar:

– Eu faço questão.

Entreguei minha comanda para o barman e ele marcou as duas bebidas. Ela deu de ombros:

– Já que insiste…

Peguei as duas taças, entreguei a dela, dei um gole na minha… Sunny sorveu o líquido azul olhando em volta… Chamei a atenção dela para mim:

– Por que não?

Não precisei explicar mais. Ela compreendeu perfeitamente a minha pergunta:

– Já tenho outra coisa marcada…

Nem pensei em tentar disfarçar a minha vontade dela… Era absoluta:

– E é inadiável?

Me olhou rapidamente, parecendo achar graça:

– Tô esperando uma pessoa. – Deu mais um gole, dessa vez com o olhar fixo em algo… Na verdade eu sabia que em alguém… Atrás de mim. Antes que eu pudesse descobrir quem, Sunny me estendeu a taça: – Segura?

Fiz o que me pediu. Ela se virou e se afastou, caminhando direto para uma loira que tinha acabado de entrar… As duas se abraçaram, roçando as faces… Ela sussurrou algo no ouvido da outra, que sorriu e pegou-a pela mão… Tentou puxá-la em direção à porta, mas Sunny a parou… Mostrou a comanda, indicou o caixa… A loira assentiu e a acompanhou… Ficou esperando, quase grudada atrás dela, segurando-a pela cintura… Sunny pagou e guiou a loira até à saída… Antes de cruzá-la me olhou… Levantou a mão perto do rosto, fazendo um sinal de “me liga!”, me soprou um beijo e…

Retirou-se.

E eu…

Fiquei ali parada, com as duas bebidas na mão, enquanto a música que tocava naquele momento – “Rock and Roll” (Led Zeppelin) – me atingia…

Bastante frustrada, mas plenamente consciente de que não deveria. Afinal, eu mesma tinha proposto aquilo, era… Não era? Exatamente o que eu tinha dito que queria.

Dei de ombros, bebi o que sobrava do meu drink, coloquei a taça no balcão e fiquei só com a dela nas mãos… Tomei um gole do líquido azul encostando meus lábios em cima da marca de batom que ela havia deixado no vidro, lamentando não ter os lábios de Sunny ali, à minha disposição…

Lembrei do que ela havia me dito:

-“Você me abriu um novo universo…”

Concordei para mim mesma, baixinho:

– Você também, linda…

Sorri…

No exato instante em que o refrão repetia:

“It’s been a long time, been a long time (Já faz muito tempo, muito tempo)

Been a long lonely (Faz um longo e solitário)

Lonely, lonely, lonely (Solitário, solitário, solitário)

Lonely time…” (Solitário tempo)

(Rock and Roll – Jimmy Page – Led Zeppelin)

Olhei ao redor, vi Flávia dançando animadíssima no meio da pista… Me livrei da taça e fui ao encontro dela, que me recebeu com um abraço empolgado e um enorme sorriso:

– Que bom te ter de volta, Camila!

Dancei a noite inteira, primeiro com Flávia, depois com a amiga da guria com quem ela se atracou aos beijos, mas não passei disso. Apesar de simpática, atraente e bonita… Ela não me interessou.

Quando chegamos no apartamento o dia já tinha amanhecido. Flávia e sua companhia se fecharam no quarto dela e eu fui dormir no quarto de hóspedes, onde sempre ficava com Sandra.

Deitei, me cobri, fechei os olhos e… Não sei se por sugestão, ou pelo efeito da bebida… Foi como se ouvisse o sussurro tão conhecido em meu ouvido:

– Boa noite, meu amor…

Respondi sem abrir os olhos, sorrindo:

– Boa noite, meu bem… Minha querida…

Naquele estágio suspenso, entorpecido entre a consciência e o sonho, meus pensamentos correram livres… O arco do violoncelo acariciando as cordas… Deliciosa… Linda… Acompanhando e imprimindo a música… Indo e vindo… Num molejo indescritível… Caminhando… Dançando… Em cima… Embaixo de mim…

Deixei escapar um suspiro… E antes de mergulhar num sono profundo prometi para mim mesma:

– Assim que acordar eu te ligo…



Notas:



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