ALÉM DAS PALAVRAS

5. Uma namorada falsa, por favor!

Aléxia fitou seu reflexo no espelho. Estava provando, pela última vez, o vestido que usaria no casamento do irmão. Depois do pedido de Lis, decidiu ir à cerimônia. Pretendia provar para ela que a superou, mesmo que fosse uma mentira. 

— Está linda — Vivian elogiou. 

Estava sentada na cama, com as pernas cruzadas em forma de borboleta, o queixo apoiado nas mãos e um sorriso discreto nos lábios rubros. 

— Não está mal — respondeu, dando de ombros. Não era adepta a vestidos, mas reconhecia que ficava muito bem dentro deles, principalmente, quando caprichava na maquiagem. 

— Está maluca? — A amiga saltou da cama e se aproximou, abraçando-a por trás. — Você está uma perdição e vai causar euforia entre os corações, nesse casamento! 

A fez rodopiar, em um passo de dança, então voltou a abraça-la. 

— A sua sorte é que meu negócio é homem, senão… — Caiu na risada e voltou a se jogar na cama, conferindo a hora no relógio de pulso. 

Aléxia balançou a cabeça, esboçando um sorriso fraco. Só queria causar euforia em um coração, mas esse já havia se fechado para ela há muito tempo. 

A figura no espelho tinha olhos azuis profundamente tristes. Tão tristes que não conseguiu evitar que um pequeno gemido lhe escapasse. Odiava se sentir daquela forma, mas quanto mais se odiava por isso, pior ficava. 

— Tira logo esse vestido! Daqui a pouco, Mateus vai chegar. Se sairmos tarde vamos pegar trânsito. 

Ela obedeceu e, em menos de cinco minutos, havia tirado e guardado o vestido na mala e voltado a colocar camiseta e short. 

— Estou feliz por vocês irem comigo — confessou. 

— Mesmo se sua mãe não tivesse nos enviado convites, não perderíamos esse casamento por nada. 

Aléxia sentiu uma onda de ternura por sua amiga e teve vontade de abraça-la, mas se controlou. Estava muito sensível com a proximidade do casamento e, ainda mais, com seu reencontro com Lis. De quebra, ainda tinha o retorno de Nicole, mas havia quase uma semana que não a via. 

Seu último encontro, tinha acontecido na entrada do prédio em que Vivian morava. A ex-colega saía do edifício acompanhada por Mateus. Se cumprimentaram rapidamente e tomaram seus rumos. Contudo, o constrangimento entre elas era gritante e Mateus acabou fazendo uma piadinha para quebrar o clima, o que não deu muito certo. 

Sem mais encontros indesejados, parte do seu sangue frio, que não era muito, retornava às suas veias. Pois, felizmente, Vivian teve o bom senso de não convidar Nicole para jantar na sua casa no meio da semana, quando planejaram a viagem.  

— Com vocês por perto, terei uma boa desculpa para não ficar tão perto deles. 

A amiga fez uma carinha afetada. 

— Assim você me magoa! Então, é isso que sou para você? Uma distração? Uma desculpinha safada… — Calou-se quando ela a puxou para um abraço apertado e sapecou um beijo em sua bochecha. 

— A Rainha do Drama! — Riu. — Sabe, muito bem, o que eu quis dizer. 

Vivian tentou responder, mas a campainha tocou e elas pegaram suas malas. No caso de Aléxia, era uma mochila. Se encaminharam para a porta entre risos e piadinhas. Mateus as aguardava na calçada e, para surpresa de Aléxia, Nicole estava com ele. 

— O que você faz aqui?! 

Nicole exibiu um sorriso confuso. 

— Como assim? Vou com vocês — respondeu. 

— Mas… 

Limpando a garganta, Vivian assumiu o controle da situação, dando uma leve tapinha nas costas da amiga. 

— Nossa! Sabia que tinha esquecido de contar alguma coisa — sorriu, exibindo uma expressão sapeca. Era evidente que não esqueceu nada. — Estávamos conversando, Mateus e eu, e achamos que seria bom se Nicole fosse conosco, já que ela é sua “namorada”. 

— O quê?! — Aléxia mal conseguiu controlar a altura da voz. 

Diante do desconforto da amiga, Vivian a puxou para dentro da casa com a desculpa de que esqueceu algo. 

As sobrancelhas loiras de Nicole estavam erguidas quando a porta se fechou atrás delas. Se voltou para Mateus. 

— Ela não sabia?! Como assim ela não sabia, Mateus? 

O rapaz ergueu as mãos na defensiva. 

— Cara, sou inocente! Isso é coisa da Vivi. Se quer saber, nem entendo o porquê dessa confusão toda — coçou o queixo e colocou os óculos escuros que estavam pendurados na gola da camisa. 

Ela escondeu o rosto entre as mãos, aspirando todo o oxigênio possível. 

— Inacreditável! — Resmungou, puxando um cigarro da carteira. — Só aceitei essa maluquice porque a Vivian me garantiu que ela concordou com a ideia! Droga! Só queria ajuda-la e, agora, consegui piorar as coisas! — Acendeu o cigarro com mãos trêmulas. 

Falava baixo, andando diante do carro, no qual Mateus se recostou com os braços cruzados. 

— Aléxia está sendo uma medrosa — disse ele. — No lugar dela, já tinha mandado todo mundo às favas. Outra coisa que não entendo, é o motivo de você ajuda-la com essa história ridícula que inventou e que a Vivi está apoiando. Vocês não se “bicam”! 

A amiga tentou responder, mas ele fez um gesto com as mãos, impedindo. 

— Deixa pra lá! Quanto menos souber, menos dor de cabeça pra mim. Eu sou o amigo das farras e da alegria. Chororô, confissões e dramalhões são com a Vivi. 

Com os ombros caídos e as sobrancelhas arqueadas, juntou-se a ele. O vento forte do meio da manhã os envolveu, trazendo o aroma da terra molhada no jardim da casa. Nicole suspirou, sem saber como conversar com o amigo sobre as coisas que a fizeram desprezível até para si mesma. Perderam o contato por alguns anos, depois que foi para a faculdade, e ele jamais conheceu a Nicole que Aléxia odiava. 

Haviam se reencontrado pouco tempo antes, graças as redes sociais e alguns amigos em comum. Ainda estavam se reconhecendo. Contudo, o carinho que se dedicavam permanecia o mesmo de quando se afastaram. Pediu a Vivian que não lhe contasse sobre as coisas que conversou com ela e, também, sobre sua história com Aléxia. Queria lhe contar pessoalmente. 

— Nós temos uma história — disse, admirando as flores no jardim da ex-colega. — Devo isso a ela, mesmo concordando que é uma mentira idiota. — Balançou a cabeça e alguns fios loiros deslizaram, cobrindo sua testa. O encarou, pendurando o cigarro nos lábios. — Não dá para saber o tamanho do medo que as pessoas escondem no coração, até elas começarem a fazer coisas estúpidas. Mas o que é estupidez para alguns, pode ser o mecanismo de defesa de outros e, ou, a forma que encontraram para seguir adiante. 

Brincou com o crucifixo de ouro em seu pescoço. 

— Às vezes, uma mentirinha faz bem, noutras só traz mais dor e confusão. 

*** 

— O que foi que você fez? — Aléxia perguntou entredentes. 

Estava tão próxima da amiga que podia sentir seu hálito batendo em sua face com o aroma do chiclete de menta que ela mascava. 

Vivian sorriu como uma criança travessa e covinhas discretas se formaram em suas bochechas. Seus cabelos estavam presos em um rabo de cavalo e, por um segundo, Aléxia a achou mesmo com aparência infantil e quase angelical, mas conhecia a amiga o suficiente para saber que de anjo ela só tinha o rosto. 

— Não precisa fazer um drama, você mesma se meteu nessa história! 

A moça a fitou, confusa. A boca ligeiramente aberta. 

— Do que está falando? 

— Não se faça de desentendida. Você mesma fez da Nicole sua namorada. 

— Para provar para Lis que a esqueci! — Se empertigou, sugando uma grande quantidade de ar para os pulmões. 

— O que é uma mentira — a ruiva observou. 

— Sim — obrigou-se a não gritar. — O que ela disse estava me matando. A verdade estava me matando — confessou, desviando o olhar do dela e se afastou. — Não podia apresentar você como namorada, porque minha família a conhece e… 

— Havia acabado de me apresentar como amiga para ela — concluiu, certeira. 

— Sim. Eu me senti tão desesperada, tão magoada, que entre o amor que sentia por Lis e o ódio por Nicole, preferi me humilhar e pedir ajuda a Nicole. 

Era a primeira vez que conversavam sobre o que aconteceu durante a visita de Lis. Vivian havia respeitado o silêncio e a dor da amiga e, esta, era grata por isso. 

— A verdade é que, no fundo, eu esperava que Nicole risse de mim e me provocasse como fazia antes. — Passou a mão na cabeça. — Para ser sincera, desejava que ela fizesse isso mesmo. Queria que me deixasse cega de raiva, que inflamasse meu ódio e que, assim, pudesse descarregar minha dor, raiva e frustração nela, já que sabia que não seria capaz de fazer isso com Lis. 

Se jogou no sofá, escondendo o rosto por alguns instantes, então encarou-a. 

— Mas ela me ajudou — riu, com olhar perdido e Vivian ficou penalizada. — Ela me ajudou! Por quê?! 

Se fez essa pergunta dezenas de vezes ao longo dos últimos dias e continuava sem resposta e sem poder acreditar no que aconteceu. 

A conversa que tiveram na praia também lhe parecia irreal, pois continuava resoluta em não acreditar e aceitar a mudança pela qual Nicole afirmava ter passado. 

— Eu não sei — Vivian mentiu, desviando o olhar do dela para que não percebesse. 

Nicole lhe contou bem mais do que esperava quando a confrontou, após ela ter levado Aléxia para dormir em seu apartamento. E era por isso que insistia em forçar sua presença nos encontros com a amiga e naquele casamento. 

Aléxia precisava conhecer as verdades que a ex-colega guardava, mesmo que isso a fizesse odiá-la ainda mais. E Nicole precisava disso também; ela estava bastante ciente de que o perdão que buscava podia nunca chegar, mas estava disposta a se arriscar. 

Às vezes, Vivian se pegava a imaginar se não devia, simplesmente, ficar de fora dessa confusão, fingir que nada sabia e deixar que as duas se resolvessem. Mas conhecia Aléxia o suficiente para saber que, como afirmou várias vezes, se manteria o mais longe possível da ex-colega. 

Claro que tudo poderia dar errado e, talvez, acabasse ganhando duas inimigas em vez de amigas, mas achava que valia a pena tentar. 

Não conhecia Nicole tão bem quanto conhecia Aléxia e poderia estar completamente enganada nas decisões que tomou, mas raramente julgava o caráter de alguém errado e esperava que a amiga a perdoasse em um futuro próximo. 

— Essa mulher me odiava pelo que eu era, pelo que sou! 

Voltou a fita-la, surpresa com a desolação em seu olhar; tão semelhante a que viu no dia que Lis a visitou. 

— E, ainda assim, ela te ajudou. 

— Sim… — encolheu os ombros, derrotada. 

— E é por isso que pedi para que fosse conosco. — Recebeu um olhar magoado. — Não adianta me olhar assim. A culpa dessa situação é toda sua. — Sentou ao lado dela e continuou: — O que acha que a sua “amada” Lis — fez uma careta — vai achar quando aparecer sem a namorada, que você esfregou na cara dela toda orgulhosa, no casamento? Já que ela é tão confiante e parece saber tanto sobre os seus sentimentos, não hesitará em tripudiar deles outra vez. 

Aléxia engoliu em seco e mordiscou os lábios compreendendo o seu ponto de vista.  Ir sozinha, apenas provaria que as palavras de Lis, que se empenhou tanto em negar ao pedir a ajuda de uma “inimiga”, eram verdadeiras. 

— Você devia ter me consultado. 

— Para você se negar? Claro que não. Te conheço! Sou sua amiga, Alê. Sei como pensa e, às vezes, é preciso te empurrar certas coisas sem lhe dar espaço para reação. Você pode me agradecer ou me odiar por isso no futuro. 

A amiga fez um biquinho, claramente confusa pelo comentário. Vivian sorriu e afagou os cabelos dela. 

— Se te faz sentir melhor, Nicole não queria fazer isso também. 

Aléxia encarou o rosto sério dela. 

— Realmente, não faço ideia de tudo que ela aprontou contigo, mas ela diz que mudou e a sua vida é prova mais que o suficiente disso — deu de ombros, deixando implícito que suas palavras tinham muito mais significado, porém não se aprofundou. — Não a estou defendendo, apenas afirmando que todo mundo merece uma chance de encontrar a redenção. 

Parou por um instante, a fim de recuperar o fôlego e ignorando o revirar de olhos da outra. 

— Nicole não queria te colocar em uma situação constrangedora, mas a convenci de que você mesma se colocou nela quando lhe pediu ajuda e que ela também era culpada por tê-la ajudado, mas o que realmente a convenceu foi a possibilidade de conseguir o seu perdão ao fazer isso. 

— Eu não entendo. 

— Não tente. Apenas aproveite a oportunidade de esfregar a sua felicidade na cara daquela vadia sem coração! Mesmo que seja falsa. 

Aléxia riu, amarga. Pensou um pouco e curvou os ombros. 

— Está bem. Por você, apenas por você. Só não deixe que a “boa” Nicole quebre o resto do meu coração na frente da minha família. 

*** 

— Posso dirigir um pouco, se estiver cansada — Nicole ofereceu. 

Aléxia deu-lhe uma espiadela com o canto do olho. O vento que entrava pela janela do carro bagunçava seus cabelos, parte do rosto estava oculto por um par de óculos enormes, que jamais teria coragem de usar, mas ficavam perfeitos nela. A loira tinha uma postura relaxada, como se tivesse estado ali a vida inteira e um sorriso nos lábios vermelhos. 

— Obrigada, mas estou bem — agradeceu, voltando a prestar atenção na estrada. Sua cabeça doía e a luz forte do sol de início da tarde a incomodava, mas manter-se concentrada no caminho ajudava a aliviar a tensão de estar voltando para casa para ser madrinha de casamento do irmão com sua ex-namorada ao lado da mulher que infernizou sua vida por quatro anos e que fingiria ser sua namorada atual. 

Nem novela mexicana tinha enredo semelhante! 

Pelo retrovisor, viu o carro de Mateus logo atrás do seu e apertou os olhos, fazendo uma careta. Estava tudo planejado para irem todos no seu carro, mas Vivian a surpreendeu, outra vez, ao informar que eles teriam de viajar logo após o casamento, então iriam no carro de Mateus a fim de agilizar o retorno. 

Fez um muxoxo e voltou a olhar para a frente. Fazia pouco mais de uma hora que estavam viajando e o vento que entrava pela janela lhe dava a ilusão de que não havia motivos para nervosismo diante do que lhe esperava ao fim do caminho. 

Tentou, mas não conseguiu ignorar a presença da “namorada” no banco do carona. Forçou-se a pensar noutras coisas; até se imaginou viajando sozinha. Ligou o rádio para ajudar, mas ficava difícil de manter a fantasia quando trocava a marcha do carro e acabava esbarrando a ponta dos dedos na perna dela. Seu perfume também era um tormento. Podia não olhá-la e tentar não tocá-la, mas cada vez que aspirava o ar, o cheiro que ela exalava lhe preenchia as narinas. Era um aroma delicado, marcante, que lhe recordava noites orvalhadas e flores silvestres. 

— Então, não vai me contar a história? — Nicole interrompeu sua tentativa de trocar a estação do rádio pela quinta vez consecutiva. Ela afastou sua mão, gentilmente, e desligou o rádio. 

Nicole havia lhe perguntado mais cedo como ela perdeu a namorada para o irmão. Resignada ao som do vento e do motor, respondeu: 

— Não há nada para contar. 

A olhou de esguelha, um sorriso cínico adornava seus lábios. Apertou o volante com um pouco mais de força, prendendo a respiração por alguns momentos. Havia esquecido o quanto a presença dela lhe irritava e perguntou-se como deixou Vivian convencê-la daquela loucura. 

— Qual é! — Pegou um cigarro na bolsa. 

— Não é da sua conta! 

Nicole riu para esconder a tensão. Estava verdadeiramente curiosa, mas naquele momento a provocava apenas para que lhe desse um pouco de atenção. 

O silêncio a inquietava. 

Estava nervosa e levemente irritada consigo mesma e muito mais com Vivian. Queria ajudar Aléxia, mas, outra vez, acabou por forçar sua presença e, com certeza, aumentou seu desprezo por si. 

Quanto mais tentava se aproximar, mais longe do seu alcance ela ficava. 

A motorista reduziu a velocidade ao passar por um grupo de homens e maquinas que reformavam o asfalto esburacado, naquele trecho. Manobrou pelo desvio formado por cones que reduzia as três faixas da pista a apenas uma, enquanto falava: 

— Se vamos fazer isso dar certo, tudo que precisa saber é que sou vegetariana desde a adolescência, adoro ler, viajar, jogar vôlei nos fins de semana e “odeio” cigarro. 

Nicole apagou o isqueiro com o qual havia acabado de acender o cigarro que estava pendurado em seus lábios vermelhos e deu um meio sorriso. 

— Neste caso, “amor”, acho que deve saber que prefiro cinema aos livros, como muita carne, curto um pouco de rock, também gosto de viajar e tomar sol na praia, mas, principalmente, “adoro” fumar! — Soltou a fumaça pela janela, em provocação. 

Aléxia respirou fundo, repetindo mentalmente “Isso não vai dar certo”. 

— Ok, façamos um acordo — disse afundando o pé no acelerador. 

Nicole a mirou, atenta. 

— Diga. 

— Nas últimas semanas, você invadiu a minha vida, alegando ter “mudado” e até o momento, está agindo diferente da mulher que conheci. Então, contarei o que aconteceu, se você contar a razão da sua “mudança”. 

O semblante e Nicole tornou-se sério, quase imediatamente. Alguns instantes se passaram sem que ela se manifestasse. 

— Então, temos um acordo? — Insistiu, dividindo sua atenção entre ela e a estrada. 

A moça deu uma longa tragada no cigarro e soprou a fumaça pela janela, novamente. 

— Não. 

— Por quê? 

— Ainda não é a hora — respondeu, simplesmente. 

Aquele não era o momento nem o lugar para lhe falar sobre coisas tão íntimas e dolorosas. Ainda mais, porque já previa sua reação e esperava poder olhá-la nos olhos, enquanto falava e ter sua completa atenção. 

— E quando será? 

— Quando eu lhe pedir perdão. 

Aléxia esperava algo como “não é da sua conta”, mas preferiu não insistir. Pensou em dizer que não queria um pedido de desculpas, pois sentia que jamais seria capaz de perdoá-la. Mas, em vez disso, escolheu guardar o que pensava para si e se satisfez por tê-la feito se calar. 

*** 

O pôr do sol se aproximava tingindo o horizonte com tons de laranja quando chegaram a chácara da família de Lis. A propriedade, que ficava a alguns quilômetros da cidade natal de Aléxia, foi o local escolhido para a realização do casamento. 

 Cruzar os portões de entrada daquele lugar, trouxe um turbilhão de emoções e lembranças para Aléxia. 

— Por favor, seja sincera comigo — pediu. 

Nicole ficou surpresa com o seu tom e fixou toda sua atenção nela, que havia parado o carro no meio da estrada de paralelepípedos ladeada por pés de eucaliptos. 

— Você pretende mesmo me ajudar ou é apenas mais uma de suas brincadeiras? 

O olhar da ex-colega lhe pareceu ofendido, mas Aléxia continuou ignorando-o: 

— Não sou brinquedo, Nicole. Sou grata pelo que fez na semana passada e até por ter vindo até aqui, mas preciso saber que não vai bancar a Nicole de antes e aprontar alguma coisa que magoe a minha família. 

Por algum tempo, tudo o que se ouviu foi o som do motor, até que a moça lhe ofereceu a mão. Aléxia a segurou, desconfiada, e os dedos longos e macios dela, se enroscaram suavemente em volta da sua mão. 

Seu toque era macio, mas o aperto era firme e, de alguma forma, aquele contato a acalmou sobre suas ressalvas. 

— O passado nos oferece lições para o futuro. Estou aqui para lhe provar que tudo o que pensa e acha que sabe de mim, não é mais a realidade — respondeu seriamente. 

Aléxia soltou a mão dela e inclinou a cabeça, assentindo. 

— Além disso, considere-me um presente dos deuses, pois você jamais namorou alguém como eu — Nicole riu, satisfeita com o tom vermelho vivo que lhe tomou a face. O que dizia, era uma grande verdade. 

Aléxia voltou a pôr o carro em movimento com uma careta irritada, ainda tinha sérias dúvidas, mas não podia mais desistir. 

O lugar não poderia ser mais adequado para a cerimônia. A casa havia sido construída a beira de uma lagoa e era circundada por árvores frutíferas e roseiras. A mãe de Lis era apaixonada por jardinagem e nunca deixava que o lugar perdesse sua beleza.  

A residência, em estilo rústico, possuía dois pisos, janelas enormes que permitiam uma maior ventilação nos dias quentes e mais tempo de luz do dia. A varanda que a circundava provia sombra e abrigo a qualquer época do ano. 

Aléxia contemplou os jardins com um aperto em seu coração, estava tão nervosa e apertava o volante com tanta força que Nicole percebeu. 

— Vai acabar arrancando o volante se continuar apertando ele assim — provocou ela, sorrindo largamente. 

O simples fato de odiá-la pelo comentário acalmou Aléxia inesperadamente e quase se sentiu grata por isso. Quase. Mas, se tivesse se concentrado um pouco mais no que se passava à sua volta, teria percebido que Nicole batia o pé freneticamente, enquanto seus dedos rolavam um cigarro apagado de um lado para outro. 

Observou a casa. Passou muito tempo ali com Lis, momentos maravilhosos que jamais esqueceria, mas também foi naquele lugar que ela lhe disse que havia escolhido o amor de Alberto e partiu seu coração. Voltou-se para Nicole, que a observava com os cantos da boca ligeiramente arqueados, seu olhar estava cheio da confiança que lhe era característica. 

— Hora do show! — A moça lhe disse, dando de ombros. 

Quando desceu do carro, sentiu todo o peso das lembranças que aquele lugar lhe trazia e teve de respirar fundo algumas vezes para se acalmar. 

As enormes janelas da casa a encaravam como se fossem olhos acusadores e o seu coração se comprimiu ainda mais dentro do peito. Estava com medo, muito medo e vergonha de encarar seu irmão no altar, mas o maior medo que sentia era de ver a mulher que amou, e pela qual ainda nutria sentimentos fortes, se casar com outra pessoa. 

Seus pais saíram da residência, assim que ouviram o carro estacionar. Sua mãe se atirou em seus braços e após uma sessão de beijos e apertos, cedeu o lugar para o marido. 

— Que bom que chegou bem! — Ele disse e logo se voltou para Nicole. 

Ela os observava por trás de seus enormes óculos escuros, recostada no jipe vermelho sangue de Aléxia, exibia um sorriso despreocupado numa postura relaxada, mas por dentro era pura agitação.  

— Desculpem! Que bom que “chegaram” bem — corrigiu ele, oferecendo a mão a Nicole que lentamente se aproximou deles, seu sorriso havia assumido dando lugar a um ar ligeiramente tímido. — E quem é esta moça linda? 

Aléxia respirou fundo e tentou disfarçar seu nervosismo com um sorriso. Estava na hora do teatro. Nicole os cumprimentou com abraços e beijinhos, em seguida, enlaçou a cintura da “namorada” possessivamente, mas de forma graciosa, quase como se fosse um gesto que repetia naturalmente a todo instante. 

— Esta é Nicole, minha namorada — informou, sentindo um sabor levemente amargo ao dizer aquelas palavras outra vez. Então, se deu conta de que a razão disso era o fato de que havia cinco anos não as usava para denominar qualquer mulher com quem se relacionou. 

Seu pai pigarreou e deu um sorrisinho aprovador, enquanto sua mãe balançou a cabeça assentindo em silêncio. Era tudo que receberia deles com relação a isso. Nunca expressaram suas reais opiniões sobre sua sexualidade, mas, também, nunca se opuseram a ela. 

Vivian e Mateus surgiram se esticando entre sorrisos e cumprimentos. Ela mal os notara chegar, tamanho era o seu nervosismo. Tentou se aproveitar da distração que eles causaram e começou a se afastar do contato de Nicole em sua cintura, mas a moça não estava disposta a soltá-la e a segurou com um pouco mais de força. 

— Onde pensa que vai, “amorzinho”? A diversão está só começando — lhe disse baixinho e Aléxia sentiu a garganta ficar seca junto com a sensação de que estava prestes a reencontrar a antiga Nicole. 

No entanto, a moça, que sempre foi uma mulher encantadora, não perdeu tempo e tratou de exibir sua simpatia, jogando seu charme para os pais da “namorada”. Fazia comentários curtos e divertidos e a soltou com graça e naturalidade quando os “sogros” os convidaram a entrar. 

— Como foi a viagem? — Dona Alexandra quis saber, enquanto os guiava para o interior da casa. 

— Um pouco cansativa — respondeu Nicole, acompanhando-a. 

— A estrada está bem esburacada — completou Mateus, soltando um suspiro cansado e enlaçando a cintura da namorada. 

Aléxia ficou para trás, recolhendo sua mochila e a de Nicole. Estava aliviada por ter um minuto de solidão para se acalmar. Definitivamente, aquele Carnaval seria de muita agitação para o seu coração e, com certeza, inesquecível. 

— Ela é muito bonita — comentou Seu Jorge, ajudando a filha a fechar a porta do carro. 

A moça levou um susto ao ouvir sua voz, já que o tinha visto entrar na casa um minuto antes. Pousou a mão sobre o peito e lhe deu um sorriso amarelo. 

— Sim, ela é — concordou. Afinal, Nicole era o tipo de mulher que chamava a atenção por sua beleza onde passava. 

— Ela é modelo? 

Riu da pergunta do pai, mas entendia o motivo de a ter feito. Nicole sempre foi magra, embora tivesse ganho um pouco de peso, pelo que tinha notado. Era dona de uma impressionante beleza clássica, olhos verdes intempestivos e misteriosos e um sorriso fácil e marcante. Além disso, tinha quase um metro e oitenta de altura o que, aliado com sua magreza, dava-lhe um ar de modelo. 

Sempre que estava perto dela, Aléxia se sentia uma tampinha, já que era quase vinte centímetros mais baixa. 

— Não, ela também é designer como eu. 

— Hum, que desperdício! 

— Pai! 

Ele riu alto e tomou uma das mochilas que ela segurava. 

— Vai dizer que também não acha? — Perguntou, indo em direção a casa. 

Não, ela não achava. De fato, a moça era uma das mulheres mais bonitas que seus olhos já viram, mas nunca imaginou que poderia ganhar a vida com a beleza. Pois, apesar de suas diferenças, sempre soube que Nicole era bem mais que um rosto e corpo bonitos. 

Parou um instante, admirando o fim da tarde. Protelava sua entrada na casa, desejando estar o mais longe possível dali. Soprou uma mecha de cabelo que lhe caía sobre os olhos e entrou; se demorasse demais, a mãe a viria buscar pessoalmente com um calculado sermão sobre ser falta de educação deixar os amigos desacompanhados em um lugar estranho a eles, ainda que fosse um ambiente familiar. 

Nicole e os amigos, estavam largados no sofá da sala tomando limonada. Ela lhe sorriu quando entrou; um sorriso tão largo e carinhoso que quase se voltou para ver se havia alguém às suas costas que era alvo dele. 

Poucos segundos de observação lhe bastaram para que notasse que ela já havia conquistado sua mãe, o que não deveria ter sido difícil de conseguir, já que sempre soube se mostrar simpática, inteligente e graciosa; razão pela qual raramente era vista sozinha na faculdade. 

Teve de admitir para si mesma que estava agradecida por ela não fazer o tipo “namorada metida a gostosa e não me toque”. Talvez, aqueles dias não fossem o desastre que imaginava, se conseguissem agir como um casal e mantivessem a maior distância possível de Lis. 

Sua mãe se ofereceu para lhes mostrar os quartos que ocupariam e os guiou para o andar superior da casa. 

— Onde estão todos? — Vivian indagou, diante da porta que Dona Alexandra indicou como o quarto que ela e Mateus ocupariam. 

— Correndo por aí, com os últimos preparativos para a cerimônia — respondeu, rindo. — Estarão todos aqui durante o jantar. — Ela recomeçou a andar e Nicole a seguiu. 

Vivian aguardou alguns momentos para que se distanciassem e, rindo maliciosamente, questionou à amiga: 

— Preparada para o seu ninho de amor? 

— Às vezes, acho que você me odeia! — Lhe sorriu azeda, enquanto caminhava para alcançar as outras duas. 

— Não me decepcione, tigresa! — Vivian imitou um tigre bastante desafinado e fechou a porta do quarto às gargalhadas, antes que tivesse tempo de retrucar. 

Sua mãe e Nicole a esperavam no fim do corredor. 

— A que se dedica, Nicole? — Perguntou Dona Alexandra, a fim de conhecer melhor a moça. 

Embora sorrisse e aparentasse confiança, a moça estava tão ou mais nervosa quanto Aléxia. Deixou as esmeraldas em seu olhar passear pelo rosto ansioso e gentil da mulher mais velha e a filha notou o efeito que aquelas pupilas causaram em sua mãe. 

— No momento, sou responsável pelo departamento de criação da empresa do meu pai — fitou a “namorada”, percebendo que não lhe prestava atenção. 

De fato, Aléxia se desligou da conversa, pois começou a matutar sobre a quantidade de lembranças que aquela casa lhe trazia. Cada canto que olhava, despertava suas memórias e teve de engolir a vontade de chorar que lhe assaltou. 

Dona Alexandra, finalmente, abriu a porta na frente da qual estiveram conversando e ela identificou o quarto como sendo um dos muitos que sempre estavam trancados nas ocasiões em que ali esteve com Lis. 

Para seu alívio, Nicole não demonstrou surpresa ao ver que dividiriam uma cama de casal. Afinal, seria bem complicado explicar para a mãe que a sua “namorada” não queria dormir com ela, ou pior, que ela não queria dividir uma cama com Nicole. Mas bastou ficarem às sós para a loira perguntar, cinicamente: 

— Prefere o lado direito ou esquerdo, “amorzinho”? — Atirou-se na cama com os braços abertos e um sorriso largo. Sabia que estava caminhando por uma linha fina e bamba, mas adorava provocar Aléxia. Não era por maldade, como foi no passado, mas porque gostava de vê-la desconcertada. 

Aléxia pensou, seriamente, em como seria esganar aquele lindo pescoço e arrancar o sorriso zombeteiro de seus lábios, mas se conteve e respondeu no mesmo tom: 

— Se não se importar, “amor”, fico com o esquerdo. 

Nicole ampliou o sorriso, satisfeita com o tom rosado na face da outra. Era adorável. Apanhou a mochila que tinha deixado largada no chão e a jogou sobre a cama. Então, se afastou, tirando um cigarro da carteira. De repente, uma gargalhada nervosa lhe escapou, chamando a atenção da companheira. Foi crescendo gradativamente, ao ponto dela se recostar na parede e enxugar uma lágrima. 

Aléxia a fitava, desnorteada, certa de que ria dela. Estava prestes a insultá-la, quando Nicole ergueu as mãos, conciliadora. 

— Por favor, me desculpe. — Respirou fundo. — Não estava rindo de você — esclareceu. 

A moça engoliu a raiva que lhe tomou, ainda duvidando. Cruzou os braços, irritada. 

— Ria de mim mesma. 

Uma sobrancelha castanha ergueu-se na testa de Aléxia e Nicole, percebendo a desconfiança, deixou os braços penderem na lateral do corpo sem saber como lhe explicar que, naquele momento, experimentava uma estranha mistura de alegria e inveja. 

— É que… — se interrompeu e dirigiu o olhar para a porta que, segundos depois, se abriu para dar passagem a uma cabeça morena como a de Aléxia. 

A moça se empertigou, abandonando a expressão mal-humorada. Abriu os braços e gritou, cheia de uma gostosa surpresa: 

— Beto! — Correu em direção a porta e se pendurou no pescoço dele. O irmão a envolveu em um abraço tão forte que sentiu alguns ossos estalarem, mas nada que lhe tirasse o prazer daquele contato. 

— Minha maninha linda, que saudade! — Disse ele quando a soltou depois de um longo instante e passou a mão pelos cabelos curtos dela. — Que bom que está aqui. 

Alberto era uma cabeça mais alto que ela, e possuía o físico de um lutador de MMA, embora nunca tivesse dado um soco em toda sua vida. De repente, Aléxia sentiu uma pontada de saudade dos seus tempos de criança, quando andavam juntos o tempo todo e eram tão parecidos fisicamente que algumas pessoas os chamavam de gêmeos. Agora, com exceção dos cabelos e olhos claros que vagavam entre o verde e o azul cinzento, nada tinham de parecidos. 

Ele deu-lhe um beijinho rápido na testa, como faziam na infância, e passou a dedicar sua atenção a Nicole. Aléxia podia ver o sorriso malicioso se formando em seus lábios, mas ele não surgiu realmente. Beto apenas a encarou sério por alguns segundos, depois ofereceu sua mão a moça para um aperto firme e demorado e, por fim, deixou escapar um sorriso tímido. 

— Isso é que é bom gosto — falou baixinho no ouvido da irmã e um leve rubor tomou a face desta e de Nicole também, que estava próxima o suficiente para captar suas palavras. Mas o motivo que a fez corar não foi o que ele disse e, sim, o modo como Aléxia a fitou, de alto a baixo, em uma avaliação minuciosa. 

— Esta é Nicole. 

O rapaz sorriu largo, inclinando a cabeça em um novo cumprimento à moça. 

— Algumas línguas compridas andaram me falando que você havia chegado em muito boa companhia. Como sou um irmão muito protetor… 

— Curioso — corrigiu ela, sorrindo. 

— Protetor — afirmou ele. — Vim conhecer minha cunhada e avaliar se ela realmente serve para a minha mana — concluiu, jogando um sorriso charmoso para Nicole que o brindou com um dos seus mais cativantes. 

— Muito bem! E o que está achando até o momento? — Perguntou ela, entrando na brincadeira. 

— Que a minha mana tem o bom gosto do irmão! — Riu, batendo no peito, orgulhoso. 

“Mal sabe ele o quanto está certo”, pensou Aléxia com uma pontada de vergonha e inveja também. 

Ele mudou de assunto, perguntando sobre a viagem e conversaram por mais alguns minutos, mas logo se despediu com a desculpa de que ainda havia muito que preparar para o casamento e que, se não ajudasse, Lis teria um treco. Conhecendo o jeito perfeccionista da ex, Aléxia concordou com ele, mas lhe cortou o coração ouvi-lo falar do casamento. Doeu mais ainda quando pronunciou o nome dela com tanto carinho na voz. 

Afastou sua dor e frustração, dedicando atenção à mochila que estava jogada sobre a cama. Devagar, retirou as roupas e dobrou cuidadosamente sobre a cama, engolindo a vontade de chorar e a raiva que sentia por nem mesmo poder odiar a pessoa que lhe roubou o amor de Lis, já que ele era seu irmão. 

Somente muito tempo depois que ele saiu, é que se deu conta de que tinha desfeito a mochila de Nicole. Envergonhada, fingiu que não havia nada de mais em desfazer a mochila dela e passou a guardar as roupas em uma das gavetas da cômoda ao lado da janela em que a moça estava recostada. Para variar, ela fumava, observando-a enigmática e silenciosamente. Então, passou a dedicar sua atenção a própria mochila que era bem pequena, mas assim como a de Nicole, estava abarrotada de coisas. 

Se ocupar com alguma coisa foi reconfortante e quando, finalmente, terminou, estava calma e relaxada. Organização sempre lhe causava esse efeito. Mesmo se machucando, tinha tomado a decisão de curtir aquele momento com sua família, amigos e, mesmo não lhe agradando, Nicole. 

Decidiu tomar um banho; o calor era intenso, mesmo para o início da noite. Estava muito abafado. Seus cabelos curtos estavam úmidos e a camiseta que usava já apresentava manchas escuras na altura do pescoço e axilas. Começou a se despir lentamente, parando apenas para dobrar cada peça de roupa e depositar sobre uma cadeira próxima a porta. 

Esqueceu completamente da presença de Nicole a lhe observar da janela e tomou um leve susto ao ouvi-la falar com um sorriso provocador nos lábios: 

— Ouvi dizer que as lésbicas preferem flores e borboletas. Então, por que o dragão? 

Seu rosto ardeu ao perceber que se encontrava seminua na frente dela, que percorria seu corpo devagar com olhos brilhantes e um sorriso torto, claramente provocando-a. Deixou até um pequeno suspiro escapar. 

— Aí, já deu! — Reclamou quando os olhos dela deslizaram em direção ao seu ventre. 

— Ora, sou sua namorada, faz parte do pacote admirar suas curvas e todo o resto. 

A face de Aléxia ardeu mais com a raiva que sentiu pelo sorriso cafajeste que lhe deu. Se não a conhecesse, até acreditaria que estava mesmo lhe desejando. 

— Você é muito irritante! — Revirou os olhos e atirou a camiseta, que ainda segurava, sobre a cama. — Pode parar com o teatrinho de namorada apaixonada e pare de me olhar assim, também. Está começando a me assustar! 

Deu-lhe as costas, indignada com a risada dela. 

— Como quiser, “amorzinho”! 

Aléxia bufou, revirando os olhos novamente. O reflexo no espelho, sobre a cômoda, mostrava o dragão de tons escuros cuja as garras e dentes afiados avançavam em direção ao seu pescoço, enquanto sua cauda longa se enroscava na altura da cintura e descia em direção a sua intimidade. 

Sua primeira e última tatuagem, uma obra de arte. 

Desde a adolescência sempre quis tatuar um dragão, mas nunca teve coragem até que Lis começou a namorar seu irmão. Sofrer tanto por ela a fez querer mudar muitas coisas em si e pensou que o dragão podia ser um dos passos para isso. Adorava aquela tatuagem e, como sempre fazia, dedicou alguns instantes a admirar-se no espelho. 

Por fim, sorriu orgulhosa para o reflexo magro e levemente abatido, pegou uma das toalhas que tinha sido cuidadosamente dobradas e deixadas sobre a cama por uma das empregadas da casa ou, talvez, sua mãe. Antes de entrar no banheiro, enviou uma piscadela maliciosa para Nicole e deixou sua pergunta sem resposta. 



Notas:



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