Argentum

Capítulo 10

O dia amanheceu mais frio que o anterior, o tempo nublado fazia uma pequena neblina cobrir a cidade e o horizonte moldado por alguns montes e elevações do relevo. Como sempre Alicia acordou pontualmente às 50 e foi se arrumar. Às seis da manhã já estava tomando uma caneca de café preto enquanto organizava a clínica para mais um dia. Aproveitou para repor os materiais de consumo que havia usado no dia anterior em suas caixas de equipamentos.

Organizou tudo de novo e aproveitou para colocar junto delas um conjunto de pijama cirúrgico para qualquer eventualidade. Então voltou para o andar superior para trocar de roupas. Vestiu uma calça jeans grossa e de cor clara, colocou um par de botas pretas cano médio ajeitou a calça por cima do cano delas. Depois achou uma camisa jeans azul escura de botões que era bem quente e a vestiu por cima da regata branca de algodão. Deixou o ultimo botão e o botão da gola abertos mostrando o começo de suas clavículas e a corrente de prata que usava sempre.

Pegou a jaqueta de couro marrom vestindo-a enquanto saia do quarto e fechava a porta. Ajeitou o cabelo que estava solto em ondas negras para trás jogando-o todo para um lado. Caminhou pelo corredor até a sala e, de lá para a cozinha encontrando Talitha sentada em frente a sua mãe bebendo algo quente em uma caneca. A mais nova olhou para cima encarando os olhos castanhos claros de Alicia e franziu o cenho.

– O que é que ainda está fazendo aqui? – perguntou ela se virando na cadeira e colocando a caneca sobre a mesa.

– Estou indo comer, por que? – perguntou Alicia realmente não entendendo a reação da amiga.

– Porque a senhorita deveria estar indo para o Rancho atender ao potro como o Giulio pediu pra Dona Antonieta dizer – falou a mais nova rolando os olhos e suspirando ao ver os castanhos mais claros se arregalarem – Você esqueceu – murmurou ela – Vai logo, ela pediu para você estar lá cedo e já são 70.

– Mas eu ainda não comi nada! – reclamou Alicia quando viu a amiga se levantando e pegando as suas chaves que estavam penduradas perto da porta da cozinha – Talitha! Você não pode me expulsar da cozinha da minha casa!

– Tanto posso como estou – disse a mais nova colocando as chaves na mão da veterinária – Agora vá logo porque vai ser mais uma consulta pra você. O que significa mais dinheiro entrando. O que quer dizer que meu salário vai poder ser pago. Pensa que pode ver a senhorita Almeida de novo que você esquece que queria comer.

– Quem é Senhorita Almeida? – perguntou Dona Marta curiosa e confusa.

– Ninguém, mãe! – gritou Alicia, já perto da escada e sendo empurrada para baixo, depois continuou num tom mais baixo – Não ouse contar da nossa conversa de ontem para a minha mãe. Não quero Dona Marta me questionando sobre ela.

– Como se fosse possível esconder algo da Tia Marta – resmungou Talitha rolando os olhos – Tá! Vou tentar não soltar nada.

Alicia não conseguiu dizer mais nada porque já estava no fim da escada e a mais nova se virou subindo os degraus novamente. Com um suspiro cansado e uma expressão chateada, além da barriga reclamando, ela foi para a garagem, abriu o portão e saiu com seu carro. Com pouco mais de uma hora estaria chegando no Rancho. No caminho achou uma única barra de cereais perdida no porta luvas e torceu para a visita não durar muito para que ela pudesse voltar e acertar alguns socos em Talitha por ter feito-a passar fome.

Enquanto a veterinária começava seu caminho pelas estradas de terra e pedras, no Rancho Maia acordava. Seu celular marcava 7h43 minutos e ela se sentou assustada na cama percebendo que estava atrasada. Um vento gelado entrou pela janela entreaberta fazendo seu corpo se arrepia e ela puxar os cobertores para cima de seus braços. Com um gemido frustrado por ter esquecido a janela aberta na noite anterior ela se levantou e foi até o banheiro. Sabia que estava atrasada e por isso se apressou.

Ao sair do banho vestiu uma blusa cinza de mangas compridas e gola alta e pegou uma jaqueta roxa. Com um certo esforço colocou um jeans escuro e quente por cima de uma legging, calçou botas de cano alto e sem salto e olhou a hora em seu celular. Exatas 8h40 minutos e ela saiu do quarto indo para o andar de baixo a passos lentos. Se maldizia em pensamentos por ter demorado uma hora para se arrumar. Seu caminho era feito devagar por conta de uma dor irritante no lado esquerdo do quadril que deveria ter surgido por ela ter passado um pouco de frio a noite.

Agradeceu a si mesma por não ter sido cabeça-dura demais e ter pego a muleta antes de sair do quarto. Sua mão direita firme no apoio e o antebraço encaixado no suporte faziam seu caminho muito mais seguro e lhe ajudaram a enfrentar a escada. Com muito cuidado foi vencendo degrau por degrau e a cada um ficava um pouco mais confiante. Concentrava-se em seus pés e seus olhos não desviavam dos degraus. Pisou no penúltimo e já se sentia aliviada por ter vencido a escada toda quando, ao colocar o pé esquerdo no último degrau não acertou o local exato e perdeu o apoio.

Maia trincou a mandíbula e endureceu os músculos. Fechou os olhos já imaginando a dor do contato com o chão e se preparando mentalmente para a queda. Mas seu corpo não sentiu a dor que imaginava, tudo o que ela sentiu foi um aperto firme em sua cintura. Ao abrir os olhos ainda um tanto assustada notou um braço envolvendo sua cintura e colando o lado direito de seu corpo contra algo quente e macio. Algo que tinha cheiro de menta e alguma coisa cítrica. Algo que ela identificou como o corpo de alguém quanto, ainda olhando para baixo, viu uma bota preta junto de uma calça jeans clara.

Alicia tinha chegado a pouco no Rancho. Encontrou com Giulio perto dos estábulos e o homem disse que queriam a presença dela no casarão para conversar sobre seus serviços e sobre o potro. Um tanto confusa ela seguiu para a casa principal e entrou pela cozinha encontrando Antonieta, sua filha Amanda e Maria. A esposa de Giulio lhe disse que os patrões queriam falar com ela antes dela atender ao potro. Alicia concordou um tanto desanimada olhando para os bolos que Maria estava levando para a mesa para servir o café.

Antonieta reparou o mesmo e disse a veterinária que o café estava sendo servido agora porque os novos patrões só haviam levantado a pouco. Convidou Alicia a se juntar a eles durante o café fazendo os olhos dela brilharem e sua boca salivar com a expectativa de comer os bolos de Dona Antonieta. Maria brincou perguntando se Dona Marta não a estava alimentando direito e a veterinária saiu rindo dizendo que saiu sem comer. Avisou que esperaria na sala para não sofrer a tentação daquela cozinha e saiu passando pela sala de jantar e indo para a sala de visitas.

Ela acabava de sair da sala de jantar onde o café da manhã estava sendo servido. Maria havia acabado de entrar de volta a cozinha para conversar com Antonieta e Amanda e ela seguiu para a sala de visitas. O acesso dava na lateral da grande escada e ela foi caminhando em volta dela para ir até os sofás. Foi quando viu a figura descendo os últimos degraus de forma concentrada usando uma muleta como apoio. Seus instintos protetivos lhe deram um alerta quando viu a posição em que ela deixou o pé esquerdo sobre o último degrau.

Antes que ela notasse o que estava acontecendo seu corpo havia reagido sozinho. Ela avançou os poucos passos que a separavam da mulher mais nova e, quando viu que ela se desequilibrava, jogou seu braço em volta da cintura fina. Para impedir a queda da mulher Alicia a puxou contra seu corpo, o ombro da menor sendo apertado contra seu peito enquanto sua mão esquerda estava firmemente segurando a cintura da mulher. O perfume floral dela preencheu o ar que a veterinária respirava, seus olhos notaram os olhos verdes se abrindo receosos, como se ainda esperassem a dor da queda que não aconteceu.

Alicia ajeitou seu corpo que ainda estava um tanto inclinado, mas seu braço não soltou a cintura da mais nova que virou os olhos de esmeralda em sua direção. A veterinária estava com os lábios entreabertos, e os olhos verdes estavam arregalados. O corpo pequeno e magro tendo sua lateral esquerda toda pressionada contra ela e, por um instante, Alicia perdeu o ar de seus pulmões quando sentiu a mão esquerda dela segurar seu braço num aperto leve como se quisesse confirmar a presença deles ali.

– Obrigada – disse Maia ainda sem conseguir se mover, mas já entendendo que a veterinária havia acabado de salva-la de um tombo, possivelmente doloroso.

– Não precisa agradecer – sussurrou a voz que estava mais rouca do que deveria – A senhorita deveria tomar cuidado com escadas – ela completou tentando soar de forma mais normal.

– Eu não estou muito acostumada a descer escadas – ela admitiu encarando os olhos cor de mel com um olhar profundo – Principalmente com a muleta.

– Se aceita um conselho – disse a veterinária dando um meio sorriso – Talvez devesse manter-se atenta até estar a alguns passos das escadas – ela disse piscando o olho direito e depois erguendo as sobrancelhas e sorrindo.

– Vou me certificar de me lembrar desse conselho – respondeu Maia soltando um pequeno riso e desviando os olhos por ter ficado levemente encabulada.

Alicia ainda se permitiu admirar a mulher em seus braços por mais um segundo. Até que se deu conta de que ainda a segurava de forma intima e próxima demais para duas desconhecidas. Ainda com as mãos na cintura da menor Alicia se afastou levemente, mas só após ter certeza de que a mais nova estava firme sobre seus próprios pés foi que ela afastou suas mãos da cintura de Maia.



Notas:



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4 Respostas para Capítulo 10

  1. Alini,

    Que encontro estranho heim??? Não menos instigante para as duas com certeza ainda não se deram conta do que aconteceu por causa da surpresa, mas adoreiiiiii kkkkkkk

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