Argentum

Capítulo 100

Na quinta feira Dr. Márcio entrou em contato com Maia comunicando que Renato havia conseguido o direito de responder em liberdade, informando ainda que o advogado do ex bancário havia conseguido também uma autorização para que seu cliente pudesse esperar as convocações hospedado em um pequeno hotel numa cidade vizinha. Ela não gostou nem um pouco de saber disso, mas não havia o que ser feito e Renato provavelmente já nem estaria mais na cidade. Alicia gostou menos ainda quando ficou sabendo de tudo naquela mesma noite quando as duas conversaram por chamada. Mantiveram o combinado de que na manhã seguinte a veterinária estaria no Rancho para buscar a namorada e leva-la a sua primeira consulta com o novo fisioterapeuta.

Ansiosa como estava a semana toda, Alicia acabou por sair de casa sem tomar seu café e chegar muito cedo ao Rancho. As duas então fizeram a refeição juntas sentadas lado a lado no banco comprido em frente a mesa de madeira da cozinha. Perto das 80 da manhã elas já estavam no Troller da veterinária indo em direção a cidade onde Maia havia marcado com o fisioterapeuta, consulta que fora marcada para as 100. A cidade não era vizinha, mas também não ficava tão longe, apenas um pouco mais de uma hora de viagem passando por outras três cidades no caminho.

Uma pausa para um sorvete depois e elas entraram no consultório de paredes em tons amarelos claros com detalhes brancos. A sala do fisioterapeuta ficava em um prédio de quatro andares no centro da cidade, no mesmo andar do consultório onde elas entraram ficavam também mais três salas, o prédio todo era formado por consultórios de diferentes especialidades. Haviam alguns dois sofás e duas poltronas espalhados pela sala de espera em volta da mesa onde uma moça, com algo entre 20 e 22 anos, fazia anotações. Ela perguntou a que horas a consulta delas estava marcada e Maia respondeu que era dali a 10 minutos. A secretária pediu que elas esperassem e ambas se sentada num sofá de dois lugares para esperar.

Quase dez minutos depois a mesma moça se aproximou perguntando se Maia estava com os antigos exames. Alicia retirou uma pasta cinza da mochila de onde a mais nova retirou seus exames mais recentes e seu histórico médico para entregar a garota que lhes sorriu antes de voltar a sua mesa avisando que elas só teriam de esperar mais alguns minutos. De fato, menos de 10 minutos depois a porta da sala onde o fisioterapeuta estava atendendo se abriu e de lá saiu um casal, o homem em uma cadeira de rodas sendo empurrado por uma mulher, ambos na casa dos 40 anos. A jovem da recepção se adiantou para dentro da sala após responder o cumprimento do casal levando a ficha de Maia.

Minutos depois ela saiu pedindo que as duas entrassem. Alicia ajudou a menor a se levantar e, de braços dados, elas seguiram para dentro do consultório. Era uma sala ampla, do lado direito da porta estava posicionada uma mesa com duas cadeiras em frente a ela e uma atrás onde um homem jovem estava sentado lendo alguns papéis. A parede atrás dele era toda coberta por uma prateleira de madeira imensa, metade repleta de livros e a outra metade acomodava diversos equipamentos que deveriam ser usados nas sessões de fisioterapia.

Do outro lado haviam duas macas paradas em paredes opostas, na parede do fundo um espaço no chão recoberto por um material acolchoado onde haviam duas barras de metal paralelas numa altura próxima a um metro do chão. Além disso haviam alguns materiais como bolas, pequenos pesos e outras coisas que elas não souberam identificar organizados próximos as macas, também haviam almofadas e um sofá num canto mais reservado próximo de uma das amplas janelas que se enfileiravam na parede oposta a porta. O médico não deveria ter mais de 30 anos. Tinha a pele bronzeada e os cabelos negros cortados bem curtos. Os olhos que encararam às duas quando entraram eram castanhos escuros. Ele se levantou dando um sorriso branco e estendeu a mão às duas, primeiro indicando às cadeiras e depois na intenção de cumprimentá-las.

– Acredito que a senhorita seja minha paciente – ele disse encarando Maia com um sorriso tranquilo – Meu nome é Bernardo Fontes, mas podem me chamar apenas de Bernardo.

– Correto, eu sou Maia Augustus e essa e Alicia Ferraz – ela as apresentou, as duas mantendo sorrisos gentis.

– É um prazer conhecê-las – ele afirmou com o mesmo sorriso calmo – As senhoritas são amigas? – ele perguntou e viu às duas trocarem um olhar antes de dar uma resposta.

– Não deixamos de ser amigas – Alicia respondeu tentando evitar sentir-se tímida – Mas, na verdade, somos namoradas.

Houve um pequeno silêncio do homem, alguns segundos em que ele às encarou de uma a outra até soltar a respiração que vinha prendendo e voltar a ter o mesmo sorriso calmo.

– Perdoem a surpresa – ele disse sem jeito – Se me permitem a pergunta, estão juntas a muito tempo?

– Não muito – foi a vez de Maia dar a resposta, as duas estavam com as mãos entrelaçadas abaixo do nível da mesa – Mas já nos conhecemos a um tempo considerável. Por isso Alicia disse que não deixamos de ser amigas.

– Bem, vamos passar a consulta então – o Bernardo falou em tom gentil, além da surpresa no momento que soube das duas o rapaz não demonstrou mais nada sobre o relacionamento delas – Olha, Senhorita Augustus – ele começou, mas foi interrompido.

– Maia, pode me chamar de Maia – ela se pronunciou interrompendo-o, mas de forma gentil – O senhor foi muito bem recomendado pelo meu antigo fisioterapeuta, de modo que espero que nossa relação seja longa e duradoura. Por isso acredito que podemos pular essas formalidades.

– Como quiser, Maia – ele respondeu sorridente – Mas com a condição de que vocês me chamem de Bernardo e não de senhor – comentou bem humorado, mas logo voltou a ter uma expressão calma e controlada, quase séria – Como eu ia dizendo, eu avaliei os exames que me trouxe e havia solicitado ao seu antigo fisioterapeuta seu prontuário de forma que dei uma breve olhada em tudo. Nós vamos passar para um exame físico em alguns minutos, mas antes gostaria que me contasse como anda se sentindo nos últimos tempos, desde que parou com a fisioterapia.

Maia respirou fundo sabendo que falar das dores que sentia em alguns dias incomodaria mais a namorada do que ela mesma, já que havia se acostumado a esses episódios. Ela explicou ao médico que, mesmo quando ainda fazia as sessões com o antigo fisioterapeuta, ainda sofria com algumas crises de dor. Falou que não havia notado aumento das mesmas desde que parou, mas também disse que não sentiu-se melhorar em nenhum aspecto. Falou que apenas nas ultimas semanas havia sentido um pouco mais de força nas pernas e disse acreditar que era por conta de estar se movimentando mais, além de estar tendo as aulas de montaria com Alicia, mesmo que houvessem praticado um número muito reduzido de vezes.

– Veja, é a fisioterapia que tem que preparar você para as suas atividades, não o contrário – Bernardo falou após ela terminar seu relato falando como acreditava que montar poderia estar ajudando na sua recuperação – Acontece que a equoterapia é uma das abordagens que se pode ser utilizada em casos como o seu. Mas precisa ser feita com os cuidados e atenções precisos.

– Acha que Maia deve parar de montar por enquanto? – Alicia perguntou se pronunciando pela primeira vez desde que o fisioterapeuta e sua namorada haviam começado a conversar.

– De forma alguma – ele respondeu sorridente – Desde que Maia respeite os próprios limites e use da montaria como parte da sua recuperação e durante poucos períodos de duração eu penso que ela deve tornar isso um habito mais frequente. Entretanto, pelo que vi dos laudos e dos exames, isso não será nem perto de o suficiente.

As duas acenaram positivamente demonstrando que haviam compreendido o que ele estava falando. Logo em seguida ele convidou Maia e Alicia a acompanha-lo até o outro lado da sala para que pudesse avaliar melhor a condição física de Maia. Com ela deitada em uma das macas, a que estava do lado das janelas e parecia um pouco mais macia que a outra, Bernardo começou uma avaliação física movendo os membros e articulações de Maia sempre atento as expressões que ela demonstrava e sempre pedindo que ela lhe avisasse os exatos momentos em que começasse a sentir desconforto com cada movimento. Alicia ficou um passo afastada da maca que o rapaz havia desencostado da parede e em volta da qual ele se moveu por alguns minutos. Quando terminou Maia se sentia levemente dolorida, fazia algum tempo que ela não movimentava daquela forma suas articulações das pernas.

– Juntando essa nossa rápida avaliação e os exames passados que você trouxe – Bernardo começou a falar assim que os três voltaram as suas cadeiras junto a mesa dele – Eu preciso dizer que, apesar de ter certa experiência com a recuperação e fisioterapia de pacientes que sofreram graves lesões generalizadas, seu caso é um dos mais complexos com o qual me deparei. O que posso afirmar é que a sua recuperação, até o momento, já é surpreendente. Olhando os primeiros exames, principalmente os primeiros raios-X’s, eu acho difícil acreditar que você foi capaz de deixar de usar uma cadeira de rodas – ele falou com sinceridade – É por isso que eu projeto uma melhora no seu quadro com a ajuda da fisioterapia. Entretanto, minha análise me leva a crer que é necessário que isso seja feito de moto constante e intensivo. O que eu recomendo são sessões com, no máximo, dois dias de intervalo entre cada uma. O que eu acho ideal seria que você pudesse passar por pelo menos uma sessão com um dia de intervalo.

– Eu não sei como seria possível isso – Maia respondeu preocupada e notando a expressão séria e concentrada da namorada – Você sabe que eu não moro nessa cidade. Infelizmente, por conta de um incidente, eu estou sem o meu carro, apesar de não poder dirigir era com esse carro que eu me locomovia com o auxílio de um funcionário que era meu motorista nessas ocasiões.

– Eu a trouxe hoje porque queria muito estar presente nessa primeira consulta – Alicia falou complementando a explicação da namorada – Mas acho que podemos tentar organizar um horário pra ser possível que eu venha com Maia até que ela tenha o carro de volta.

– Alicia, isso está fora de cogitação. Você tem seu trabalho, pode acontecer alguma emergência na clínica e não quero que você seja impedida de atender seus pacientes por minha causa. Com certeza podemos encontrar uma forma.

As duas continuaram a se encarar, como se disputassem pelo olhar quem tinha razão naquele pequeno impasse, mas Alicia não tinha tanta confiança assim de que conseguiria vencer naquele jogo de olhares. Não se decidiu nada porque o fisioterapeuta as interrompeu.

– Eu tenho certeza de que podemos sim arrumar um meio termo entre vocês duas – ele falou sorrindo divertido com a intransigência boba de ambas as mulheres – Mas antes, se me permite perguntar, a senhorita tem uma clínica? Com o que trabalha?

– Eu sou veterinária – Alicia respondeu – Tenho uma clínica na nossa cidade, mas Maia mora no Rancho Aureus que fica um pouco distante.

– Por isso precisamos de uma solução mais prática do que Alicia me trazer aqui dia sim dia não – falou Maia e a veterinária rolou os olhos incomodada, no fundo ela sabia que era dispendioso e provavelmente traria complicações para ambas, mas se recusava a admitir que não era uma boa ideia ela trazer Maia as consultas regulares – Você falou sobre dias de intervalo, como exatamente pensa que devemos realizar minha fisioterapia?

– Para cada intensidade dos exercícios que vou propor seu corpo vai necessitar de um certo tempo para se recuperar devidamente antes da próxima – Bernardo começou a explicar – O que eu acho que seria o mais indicado seria começarmos com exercícios mais leves com um dia de descanso antes da próxima sessão. Entretanto, com essa complicação de disponibilidade, podemos começar com exercícios um pouco mais custosos para teu corpo, vão exigir um tempo de descanso maior e, talvez assim, seja mais fácil as nossas consultas.

– Quando sugere que façamos a primeira? – Maia perguntou já tentando organizar em sua mente os compromissos que tinha e pensando também em agilizar o concerto de seu carro, ou até solicitar um novo pelo seguro ou comprar outro.

– Bom – o fisioterapeuta sorriu – Eu já havia pedido que minha assistente checasse meus horários dessa semana e tenho um vago amanhã cedo. Se quiser, podemos aproveitar que já estão na cidade e fazer a primeira sessão já amanhã. Tudo depende da sua disponibilidade – ele terminou cruzando os dedos sobre a mesa.

Alicia encarava a namorada. Sabia que teria o dia de amanhã praticamente livre, exceto por uma consulta de retorno no final do dia, quase na hora de fechar a clínica já que a dona de seu paciente tralhava o dia todo e Talitha havia marcado aquele último horário para ajudá-la. Mas não sabia das obrigações de Maia, então esperaria o que ela fosse escolher. Quando os olhos verdes se viraram para ela tudo o que fez foi concordar levemente com a cabeça e sorrir mostrando que não teria problemas em ficar. No fim Maia concordou com a sessão ser feita no primeiro horário da manhã seguinte e as duas saíram para procurarem um hotel onde pudessem passar a noite.

 

 

N/A: Olá pessoinhas,

Mais um capítulo aqui pra vocês. Espero que tenham gostado do Bernardo, ele é um fofo e vai ajudar muito a Maia com a fisioterapia.
Até semana que vem gente (talvez eu volte antes =P )
Bjs
;]


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