Argentum

Capítulo 42

– Eu vou correr até lá dentro e achar um guarda-chuva, ok? – falou a veterinária desligando o carro e deixando as chaves no painel – Me espere abrir a porta para você sair.

Maia rolou os olhos e segurou o pulso direito de Alicia antes que ela conseguisse abrir a porta de seu lado.

– Nem pensar – falou a mais nova puxando o braço da mais alta fazendo-a ficar no carro – Não tem motivo nenhum para eu te esperar aqui. Vou me molhar de qualquer jeito com essa chuva. É mais lógico e pratico descermos juntas. E depois, é apenas um lance de escadas e logo que entrarmos vamos direto para um banho quente.

Ela até queria contestar, mas sabia que seria uma argumentação perdida. Concordaram em sair sozinhas e correr para a porta da frente. Alicia fez Maia ficar com a muleta na mão e espera-la chegar do outro lado carro para ajuda-la a subir os degraus. Assim elas correram para dentro da casa principal chegando no hall de entrada completamente molhadas e com a mais nova tremendo de frio.

– Minha nossa, como você ficou esse tempo todo molhada sem congelar? – questionou Maia com os dentes batendo e ouviu logo depois a risada da veterinária.

– Honestamente, estou congelando – disse Alicia conduzindo a menor para as escadas que levavam ao andar dos quartos – Por isso sugiro conversarmos depois daquele banho quente de que me falou a pouco.

Maia concordou e as duas subiram mais degraus deixando um rastro de poças de água por onde passavam. A mais nova esperava que Antonieta e Maria não ficassem muito bravas por elas terem molhado todo o caminho da porta da frente até os quartos. Chegando em frente ao seu quarto Maia puxou a veterinária dizendo que ela precisava pegar uma toalha pois os quartos de hospedes, apesar de estarem com roupas de cama limpas, não tinham toalhas. Alicia deixou a mais nova dentro do banheiro do quarto dela e correu para o quarto vizinho deixando as portas meio abertas antes de entrar para o banheiro. Habituada com os costumes do Rancho ela rapidamente achou um sabonete novo dentro do armário embaixo da pia e se livrou das roupas molhadas que faziam seu corpo tremer.

A de olhos verdes tirou as roupas molhadas e logo entrou embaixo da água quente do chuveiro de seu quarto. Aproveitou um pouco a temperatura, mas logo tomou seu banho com agilidade, mesmo tendo de tomar muito cuidado para não escorregar ou se desequilibrar. Saiu do banheiro sendo acompanhada por uma nuvem de fumaça e enrolada em um roupão branco e macio. Correu para suas gavetas pegando duas calças e duas blusas de moletom. Vestiu suas roupas e olhou para sua gaveta de roupas intimas buscando alguma que ainda tivesse etiqueta.

Não achava que teria algo do tamanho da veterinária, mas pegou o maior número que possuía e colocou junto das peças de moletom que eram as maiores que tinha ali. Colocou nos pés uma sapatilha e pegou também seus chinelos. Ajeitou as roupas no braço esquerdo e os chinelos na mesma mão e pegou a muleta com a direita seguindo para o quarto onde estava a veterinária. Ouviu o som do chuveiro e avisou que estava deixando roupas sobre a cama. Ouviu um agradecimento e saiu antes que a mais velha terminasse seu banho.

Meia hora depois Maia subia desajeitadamente os degraus com uma garrafa térmica e duas canecas de porcelana. Andou lentamente pelo corredor sentindo o quadril e os joelhos doerem, provavelmente pelo frio que havia passado quando se molhou e que ainda fazia um tanto presente. Ao conferir a temperatura em seu celular quando mandou uma mensagem à Antonieta se deu conta de o clima estava mais gelado do que imaginava. Os termômetros estavam marcando 7°C e caindo, provavelmente cairia mais cinco ou seis graus durante as próximas horas da madrugada.

Bateu levemente na porta do quarto, mas não ouviu resposta. Empurrou a madeira notando que estava encostada da mesma forma que havia deixado mais cedo ao sair. Deu alguns passos para o interior do quarto. A luz estava acesa ainda, como antes. A porta do banheiro aberta, mas as luzes de lá desligadas. Ainda era possível sentir certo vapor vindo da porta aberta. Olhou rapidamente pelo cômodo e não achou Alicia, até que, com um pouco mais de atenção, percebeu os cobertores mexidos e o contorno de uma pessoa em cima da cama de casal no centro do aposento. Caminhou para perto da cama com cuidado temendo acordar a mais velha, mas preocupada com o motivo de Alicia ter saído do banho direto para debaixo dos cobertores.

– Alicia? – ela chamou quando já estava próxima da cama – Está acordada? – ouviu um resmungo baixo como resposta e decidiu se aproximar mais contornando a cama ao notar que a veterinária estava de costas para a porta e encolhida.

Maia colocou as duas canecas e a garrafa no criado mudo ao lado da cama e se sentou sobre o colchão notando que a mais velha estava completamente coberta. A única coisa que ela podia ver da maior era o topo de sua cabeça e o contorno do corpo encolhido embaixo dos cobertores. Sem saber o que fazer a dona do Rancho apenas encarou a veterinária por alguns segundos, até que notou pequenos tremores no corpo dela. A preocupação de Maia aumentou exponencialmente notando que esses tremores estavam sendo contínuos.

– Alicia – ela chamou outra vez, mas levando também a mão esquerda até a coberta puxando-a devagar para baixo a fim de revelar o rosto da maior – Alicia, você está se sentindo bem? – ela questionou preocupada, mas assim que conseguiu afastar parte do cobertor do rosto da veterinária tomou um susto ao sentir também o calor irradiando da pele da outra – Minha nossa, você está com febre alta – murmurou Maia surpresa e preocupada ao encostar as costas da mão contra a testa da mais velha.

A mais nova ouviu um resmungo que julgou ser a veterinária dizendo estar com frio e se levantou. Disse para que ela não se movesse que buscaria um antitérmico, por sorte tinha diversos tipos deles assim como analgésicos e outros remédios. Correu da forma que podia para seu quarto, pegou toda sua bolsa de medicação e um copo plástico que sempre tinha na cabeceira da cama para ocasiões em que tinha que se medicar. Voltou ao quarto sentindo seu quadril latejar, mas sem se importar com isso no momento. Passou pelo banheiro colocando um pouco de água da torneira no copo, já que não desceria as escadas até a cozinha, e voltou para a beirada da cama. Alicia não havia se movido nem um milímetro e continuava na mesma posição, até com o cobertor abaixado até seu queixo como ela havia deixado.

– Alicia – chamou ela se sentando ao lado da veterinária que continuava encolhida – Eu sei que está com frio, mas precisa se sentar para engolir o remédio – disse ela que havia parado apenas para abrir o baú aos pés da cama e tirar dele outro cobertor grosso que encontrou – Vamos – ela incentivou a veterinária e largou sua bengala do outro lado para não se atrapalhar abrindo o cobertor esperando que Alicia fizesse o que ela havia pedido.

– Só preciso ficar quietinha que já vou melhorar – murmurou a mais velha com os olhos fechados e tremendo ainda – Não precisa se preocupar – Maia conseguiu entender mesmo com os tremores que vieram em uma sequência sacudindo o corpo alto.

– Vamos lá, nem você consegue acreditar nisso – disse a mais nova em tom de brincadeira se aproximando mais da veterinária – Apenas faça o que estou pedindo – ela completou com um sorriso gentil enquanto ajeitava o cobertor e uma mão e começava a afastar o que estava sobre a maior com a outra.

Achou que precisaria insistir outra vez, mas os olhos castanhos, que estavam avermelhados provavelmente por conta da febre, encararam seu sorriso gentil e se fecharam quando ela concordou. Maia soltou o cobertor que já estava por cima da mais velha e deixou Alicia se sentar sozinha na cama. Antes que a veterinária terminasse seu movimento enquanto se apoiava com as mãos no colchão a dona do Rancho passou o grosso cobertor que tinha no colo por trás dos ombros de Alicia. O tecido ajudou a maior a manter seu corpo aquecido já que a febre a fazia tremer.

Sem questionar nem resmungar dessa vez Alicia aceitou o comprimido que Maia disse ser um antitérmico e o copo de água. Por sorte sua garganta não doía, ainda, pois ela sentia o arranhar característico de uma inflamação na garganta. Enquanto engolia o remédio com alguns goles de água a menor serviu uma das canecas com o líquido da garrafa térmica. O cheiro doce de chocolate quente preencheu o quarto e fez a mais alta abrir os olhos curiosa e sentindo a boca salivar pelo líquido cheiroso e quente.

– Eu amo chocolate quente – murmurou ela com a voz fraca enquanto seus olhos semiabertos tentavam se focar na caneca que Maia lhe estendia, um sorriso preenchendo timidamente o rosto da mais nova assim como seus olhos brilharam divertidos ao receber aquela informação enquanto via Alicia fechar os olhos e beber pequenos goles da bebida quente para não se queimar – Acho que vou precisar de um anti-inflamatório também – pronunciou a veterinária pousando as mãos em volta da caneca em seu colo e abrindo parcialmente os olhos avermelhados na direção da menor.

– Eu tenho, termine seu chocolate que pegarei um comprimido – falou Maia com um sorriso gentil erguendo a mão esquerda instintivamente para ajeitar o grosso cobertor que começou a escorregar dos ombros largos – Você toma ele antes de dormir, ok?

Um aceno com a cabeça foi a única resposta dada aos olhos verdes que sorriram novamente enquanto as mãos pequenas serviam a segunda caneca pela metade com o líquido marrom e quente. Alicia se recostou à cabeceira da cama, sobre os travesseiros, da forma que estavam e soltou um longo suspiro ao ingerir mais um pouco da bebida depois de assoprar a fumaça grossa. Maia se distraia assistindo a veterinária esfriar seu chocolate antes de beber cada gole. A fumaça do líquido subindo em frente ao rosto com aparência cansada e que tinha a pele avermelhada pela febre.

A dona do Rancho teve imagens de diversas vezes que havia visto a maior beber coisas quentes em sua mente. Registrou o fato de que era uma grande mania de Alicia assoprar qualquer líquido quente antes de levar a boca até a bebida. Talvez por medo de se queimar, talvez por não gostar de coisas muito quentes ou talvez apenas por algum tipo de mania adquirida em algum ponto da vida. Ela não saberia dizer, mas, enquanto levava sua caneca aos lábios, não conseguiu desviar o olhar da forma como os lábios da veterinária se comprimiam mantendo uma pequena abertura quando ela assoprava o líquido dentro da caneca em suas mãos.

Sua bebida acabou alguns instantes antes de Alicia também virar o último gole. Maia ainda não havia conseguido desviar o olhar dos lábios da mais velha. Estava se recriminando por isso quando esticou a mão esquerda para pegar a caneca vazia que Alicia lhe estendeu. Deixou as duas sobre o criado mudo que também tinha a garrafa e esticou o braço para pegar a bolsa com seus remédios que estava sobre a cama próxima aos pés da mais velha. Achou os antiinflamatórios que tinha e mostrou à Alicia que escolheu um relativamente fraco. Maia serviu um pouco do chocolate quente na caneca da mais velha e assoprou esfriando o líquido parcialmente.

Dessa vez quem observou os lábios comprimidos assoprando o líquido quente foi Alicia. Mesmo com a visão embaçada por causa dos olhos pesados que insistiam em se fechar. Mesmo com a febre fazendo sua mente não conseguir se focar nas coisas. Mesmo com o corpo tremendo querendo apenas se recostar nos travesseiros e dormir. Nada conseguiu impedir que seus olhos avermelhados acompanhassem cada movimento dos lábios rosados da mais nova. Mas seu estado letárgico ajudou-a a disfarçar toda essa atenção quando Maia lhe estendeu a caneca com o comprimido.

Repediu o gesto de assoprar o líquido por pura desatenção e colocou o comprimido na boca virando a caneca forçando-o a atravessar sua garganta que começava a reclamar. Estendeu novamente a caneca à mais nova e deixou seu peso cair contra a cabeceira da cama. Piscando lentamente ainda pode ver Maia ajeitar as canecas no criado mudo e fechar a sua bolsa de remédios colocando a mesma ao lado das canecas. Notou então a mais nova se apoiando com a mão esquerda na cama e a direita na beirada do criado mudo. Seus sentidos entraram em alerta ao não ver a bengala ao alcance da menor e ela se sentou na cama lentamente procurando o objeto.

Mesmo com a visão embaçada por ter os olhos lacrimejando levemente devido a febre e mesmo com o corpo lento devido ao seu estado febril já estar durando algum tempo ela ainda conseguiu perceber quando algo deu errado. A menor se inclinou, seu apoio sobre o braço direito, seus pés se estabilizando no chão para que ela conseguisse colocar seu peso sobre eles. Mas, no instante em que se ergueu da cama, assim que seu peso ficou completamente sobre seus membros inferiores, sua perna esquerda perdeu a força. A dor irradiou de seu quadril e joelho pelo resto de seu corpo que perdeu o equilíbrio e começou a cair para frente, na direção do criado mudo.

 



Notas:



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2 Respostas para Capítulo 42

  1. eita, esse tombo! esa febre da Alicia. promete! kkk
    tão bonitinho Maia cuidando da Alicia! vamos vê no que vai da.
    tomara que seja o beijo! rss
    fica na paz
    Mascoty

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