Argentum

Capítulo 63

Aquele nome fez com que Talitha finalmente entendesse o porque de achar a mulher familiar. Não que ela se recordasse da figura magra que se dirigia as cadeiras de espera da clínica. Ah não, ela não havia visto-a vezes o suficiente para se recordar da aparência. Além disso havia o fato da mulher estar com os cabelos mais escuros, sendo que nas poucas fotos que ela havia visto os fios levemente ondulados eram lisos e loiros. Mas ela se recordava com clareza do nome. E das noites em que havia visto a melhor amiga chorar sussurrando o nome daquela mulher.

Talitha se recordava, particularmente de uma forma muito vívida, de certa noite. A primeira noite de Alicia na cidade durante as férias de inverno. A noite em que ela insistiu com os pais da melhor amiga para passar a noite lá com ela, afinal, estava morrendo de saudades pois não se viam a quase seis meses além de que ela havia visto que Alicia não estava muito bem. Mas a parte mais clara em sua memória era ter acordado naquela madrugada, rolado no colchão que estava colocado ao lado da cama da mais velha.

Ela ouviu os soluços abafados, no primeiro momento não soube o que acontecia, mas logo se sentou em sua cama improvisada e notou a amiga encolhida entre seus cobertores. Lembrava-se do seu desespero ao notar o quão dolorido era aquele choro. Naquela madrugada ela havia pulado para a cama da mais velha, envolvendo-a em seus braços finos e acariciado os cabelos da melhor amiga até que ela se acalmasse. Um pouco antes do sol nascer, sem que nenhuma delas houvesse dormido muito, Alicia disse o que foi a explicação completa para Talitha.

– Ela se foi – a voz fraca e quebrada pelo choro da estudante de veterinária sussurrou – Ela me deixou. A discriminação e o preconceito…ela disse que não valia a pena passar por isso.

Talitha não havia deixado a mais velha dizer mais nada, apenas beijado o tomo da cabeça dela e sussurrado que tudo ficaria bem uma hora ou outra. E agora, quando, pela primeira vez em anos, tudo estava finalmente bem, aquela criatura aparecia justo ali. Talvez ela devesse apenas esperar que a situação se resolvesse com Alicia, mas a cara de pau daquela mulher a irritou em um nível que não foi possível permanecer calada. Por isso ela se levantou da cadeira, apoiando as mãos na mesa, e encarou a outra esperando que ela virasse na sua direção outra vez.

– Sabe – começou Talitha saindo de trás de sua mesa e caminhando até estar do outro lado se recostando na borda e encarando a mulher de braços cruzados – Se tivesse me dito seu nome antes eu provavelmente teria te mandado embora – comentou ela com um sorriso falso – Até porque, é preciso muita falta de vergonha na cara para aparecer aqui agora.

– Desculpe – respondeu a outra sem sentar-se e encarando Talitha de volta com uma expressão surpresa – Posso saber quem você acha que é para falar assim comigo?

– Ah, que indelicadeza a minha – respondeu Talitha com um sorriso maior e ainda mais falso – Não que eu me importe no momento. E eu só sou a melhor amiga da Alicia. O que, acredito, provavelmente me dá o direito de querer virar a mão nessa sua cara de pau.

– Como é? – perguntou Jessica ofendida com a forma como a mais nova a estava tratando, mas sem saber como reagir.

– O que você esperava, Jéssica? – questionou Talitha ficando séria pela primeira vez – O que espera vindo aqui? Que Alicia te perdoe? Ou você realmente acha que ela é estúpida o bastante para voltar pra você depois de 10 anos? – enquanto falava sua raiva da mulher ia crescendo, até que ela descruzou os braços e apontou o indicador direito para a mais velha – Você a abandonou. Simplesmente a deixou para trás e passou os últimos 10 anos sem sequer dar notícias, sem sequer tentar saber como ela estava. Não entendo como tem a coragem de aparecer assim aqui.

Talitha provavelmente diria mais alguma coisa, mas ouviu o som da porta do consultório se abrir e se calou. Como estava de frente para o corredor ela pode ver a moça carregando sua gatinha nos braços encostando a porta e caminhando para a saída. Ela forçou um sorriso e voltou para detrás da mesa ouvindo a jovem dizer que a Dra. Ferraz havia pedido um retorno em uma semana. Talitha garantiu que marcaria e depois ligaria avisando. Nesses minutos Jessica ficou parada, em pé, onde estava ainda surpresa e sem saber bem o que fazer. A mais nova agradeceu que a mulher ainda parecia ter um pouco de bom senso ao ficar calada até a moça sair fechando a porta de vidro da clínica.

– Onde você acha que vai? – falou Talitha interrompendo os passos que Jessica havia iniciado na direção do corredor do consultório.

– Garota, você não tem nada a opinar nisso, então apenas fique no seu lugar. Alicia e eu vamos nos acertar por nós mesmas – respondeu a mais velha de forma séria se virando para ir o corredor.

– Ah, mas eu tenho mesmo – disse a mais nova correndo para segurar o braço da mais velha e puxá-la para longe – Eu vi minha amiga sofrer tempo suficiente para impedir que você chegue perto dela outra vez.

Talitha começou a puxar Jessica para longe do corredor enquanto a outra protestava dizendo-lhe para larga-la. Elas estavam no meio da sala quando Alicia apareceu no final do corredor ainda com seu jaleco branco, aberto, por sobre suas roupas. Encontrou sua melhor amiga puxando uma mulher pelo braço e as duas falando alto e em tons irritados. No segundo em que ouviu a voz da outra mulher ela a reconheceu e sua expressão mudou de confusa para surpresa e confusa. Viu Jéssica puxar seu braço e Talitha a segurar com ambas as mãos, esse foi o seu sinal para se mover.

– Chega, vocês duas! – disse ela em tom irritado avançando para o meio da sala de espera e separando as duas, mantendo-se entre elas segurando a mão da amiga e a afastando de Jéssica.

– Alicia – disse Jéssica com um sorriso aparecendo em seu rosto ao ver a veterinária a sua frente, mas a outra não retribuiu o sorriso e continuou com uma expressão séria – Alicia, por favor, nós precisamos conversar – disse ela dando um passo na direção das duas, mas encarando Alicia nos olhos.

– Não, Jéssica, nós não temos nada a conversar – respondeu Alicia em tom brando, mas sério – Não entendo o que você está fazendo aqui, mas não acho que deveria ter vindo.

– Alicia, por favor – pediu Jessica encolhendo os ombros, mas sem deixar de encarar os olhos da veterinária – Só me dê alguns minutos.

– Jéssica, eu não sei o que você pretende dizer, mas não acredito que faça diferença nenhuma – falou Alicia soltando um suspiro cansado, Talitha estava com as mãos em seu braço esquerdo e ela acreditava que a melhor amiga estava a ponto de tirá-la dali – Foram mais de dez anos, Jessica. Não há mais nada que precise ser dito entre nós. Você disse tudo antes de ir embora.

– Alicia, eu sei o que falei, e é por isso que eu estou aqui – disse ela dando mais um passo na direção da veterinária – Aconteceram muitas coisas nesses últimos anos. Eu sei que falei coisas horríveis com você quando fui embora, mas eu apenas não estava pronta ainda. Eu sinto muito por tudo o que fiz contigo, mas agora tudo é diferente. Eu preciso falar com você e dizer o quanto me arrependo. Me dê uma chance de conseguir o seu perdão – pediu ela e era nítido em sua expressão que falava a verdade.

Alicia fechou os olhos soltando um suspiro cansado e colocando a mão direita sobre a testa abaixando o rosto. Aquela conversa não havia durado nem dois minutos ainda e ela já estava se sentindo cansada do assunto. Ergueu o rosto, colocou as mãos nos bolsos frontais de seus jeans e encarou a ex-namorada com a expressão mais calma que possuía.

– Eu acredito em você – ela respondeu calma – Acredito que tenha se arrependido. E se o que veio buscar aqui foi o meu perdão, então saiba que já está perdoada a muito tempo. Se era isso, acho que já pode ir, eu tenho trabalho a fazer ainda.

Alicia tinha uma expressão calma e, atrás dela, Talitha tinha um sorriso orgulhoso da forma como a amiga parecia estar lidando com a situação. Apesar de tudo a mais nova ainda estava morrendo de vontade de mandar a outra embora de uma vez e acabar com toda aquela cena ridícula. E as duas continuavam a se encarar deixando a mais nova um tanto ansiosa com o que aconteceria em seguida.

– Então acredite também que eu nunca deixei de te amar – falou Jessica com uma expressão esperançosa e dando um sorriso discreto – Mesmo quando fui embora, mesmo nos anos em que fiquei longe. Eu nunca deixei de pensar em você, eu nunca deixei de sentir as mesmas coisas por você. E eu sei que demorei tempo demais, mas eu não vou persistir no meu erro. Eu voltei. E voltei querendo ficar – disse ela dando mais um passo para perto de Alicia.

 

N/A: 

Quem não estava esperando me ver tão cedo levanta a mão!
(dai td mundo ergue as duas mãos hehe) =P

Olá pessoinhas, espero que tenham gostado desse cap hehe. Ele está mais curtinho, mas tenho um motivo para isso. Antes de tudo tenho que dizer que tive um pequeno surto de 24h de inspiração (culpa da minha namorada fofa e romântica; agradeçam a ela o que vai acontecer nesse carnaval kkkkkkk).
Então, não vai ser uma maratona, mas vai ser quase kkkk Apenas porque quero guardar alguns capítulos para ir acumulando e não deixar vocês sem atualização por mt tempo.
Maaas, para alegrar o carnaval vou trazer três capítulos, começando pelo de hoje). O próximo sai na segunda e outro vai sair na Quarta de cinzas pra finalizar o carnaval kkkkk. Prometo que os próximos estão um pouquinho maiores.

Bjinhos pessoas e comentem para eu saber o que acharam do capítulo (estou curiosa pela reação de vocês)

;]



Notas:



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2 Respostas para Capítulo 63

  1. Cara de pau essa Jessica! depois de 10 anos quer chegar e ter Alicia. mas Maia vai por ela no lugar, ah se vai!
    beijos
    Mascory

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