Consequências

Consequências

Consequências

– E de repente, sem mais nem menos, você resolveu desistir de tudo e reaver a sua “liberdade”?

– Não foi “de repente”. Venho me sentindo assim há algum tempo. Só não tomei nenhuma atitude antes pra ninguém se magoar.

– Sei! Nosso casamento não estava maravilhoso, mas depois de 13 anos, sem nenhum aviso prévio, nem mesmo uma pista, você decidiu que quer a “liberdade”?

– Sinto muito. Você fica com a casa, eu pago a escola das crianças e pensão. Nosso casamento sempre foi uma coisa morna, você vai ver que não vai sentir tanta falta.

– Claro! Eu sei que você estava acomodado, mas posso saber a idade e o nome desta tal “liberdade”? Antes que outros me contem.

– Desculpe Denise! Não planejei nada disso. Bom … é Patrícia e tem 19 anos. Quis aproveitar que neste fim de semana as crianças estão no sítio com sua mãe e acertar as coisas civilizadamente com você.

– É … muito maduro! Espero que hoje mesmo você leve tudo o que queira. Vou dar uma volta. Por favor, deixe a chave na portaria.

Saiu. Andou a esmo, sentou-se num banco sob uma árvore no jardim da praça, tentando prestar a máxima atenção à sua volta, no trânsito, nas pessoas, para não deixar o vazio da angústia, a mágoa, a rejeição, a dor, tomar conta de seu ser. Retornou quase duas horas depois e dirigiu-se ao porteiro.

– Sr. João o Osvaldo deixou uma chave com o senhor?

– Deixou sim. Aqui está.

Subiu, entrou no apartamento, olhou em volta. Faltavam alguns CDs, livros, DVDs. Foi ao quarto e abriu o guarda-roupa. Nenhuma roupa dele. Não havia nenhuma dúvida que ele planejara bem a retirada. Agora teria o resto do sábado e parte do domingo para se reestruturar e receber os filhos na volta. Poderia chorar todas as frustrações e tentar achar uma forma de esclarecer os filhos sem a raiva que sentia naquele momento.

Em outro local da cidade.

– Por favor, Fernanda! O que eu fiz de errado? Nestes três anos você nunca disse nada, eu pensei que tudo estava bem, que a gente continuava se amando, ou você mentiu o tempo todo?

– Pare de chorar Ester! Não é nada disso, eu gostava de você, tava indo tudo normal, mas aconteceu de pintar alguém que me abalou e muito. Não é nada com você.

– Só minha vida caramba! Você “gostava” de mim! Quer dizer, estava sozinha, nada melhor pra fazer e quando me encantei você se deixou levar e foi ficando até aparecer alguém que te abalasse e daí me descarta. É isso?

– Manera Ester! Foi bom, foi legal, mas ninguém disse que seria pra sempre.

– Eu pensei que seria.

– Sinto muito. Não quis te enganar, nem magoar. To indo.

– Não quis, mas fez.

Ester chorou como nunca. A solidão instalada sem convite, sem preparo, sem consulta ou desejo. Acreditava que vivia bem, não intensamente, não feliz, mas bem, e de repente parecia afundar-se em areia movediça.

Denise lembrou-se da adolescência no Colégio quando na 7ª série conhecera Osvaldo. Ambos adoravam e praticavam esportes. Não se viram mais por uns anos após o término do curso. Reencontraram-se na Universidade, ele na Engenharia, ela na Administração. O romance, namoro, noivado de ano e meio, casamento. Aos 23 anos o primeiro filho Douglas. Dois anos depois Débora. Agora 12 e 10 anos. Precisava se controlar e não deixar o ódio ou o vazio se impor. Por ela e pelos filhos. Depois, o casamento há muito não era lá essas coisas.

Ester lembrou-se da felicidade ao encontrar Fernanda, da paixão, do sonho de pensar que encontrara seu grande amor. Percebera com o tempo que o interesse era pelo sexo muito bom entre elas, mas as concessões, as desculpas, eram sempre dela. Talvez fosse melhor agora, seria obrigada a pensar em si. Talvez comprasse um cachorro para diminuir o espaço da casa.

Passado o final de semana, tudo recomeçou, nada parara diante de tragédias pessoais. Na segunda-feira a inexorável roda da sobrevivência continuou conduzindo todos para seus ciclos. Afinal, estavam acostumadas a se jogar de cabeça no trabalho. Desde o começo era assim que agiam. Gostavam de fazer o que achavam importante e útil, e acima de tudo pagava suas contas. Eram capazes e fiéis ao trabalho.

Naquela noite, Denise chegou mais cedo para explicar a separação aos filhos.

– Crianças, eu sinto muito, mas adultos às vezes fazem coisas difíceis de explicar. O pai de vocês continua amando-os, mas encontrou outra pessoa. Está nos deixando, mais a mim que a vocês. Podem falar com ele sempre que quiserem. Apenas não estaremos mais na mesma casa.

– Essa mulher que ele vai morar tem filhos? Ela gosta de crianças?

– Isso não interessa agora Débora. O que queremos saber mãe é se vão se separar e ele só vai ver a gente nos finais de semana igual aos outros pais separados e sempre com a “piranha”.

– Douglas! Não a conhecemos como pode chama-la assim? E eu não sei crianças. Teremos que conversar com seu pai pra ver tudo isso. É que os sentimentos, às vezes, é como o mar e areia, sabem? O tempo é como uma paisagem é uma profusão de cores e/ou vida. No ser humano, os sentimentos são como as ondas do mar na praia, a água vem, bate te puxa e se você não fizer nada, não mudar, vai te enterrando. Nós somos a areia e vem a água do mar em ondas, que seriam os sentimentos e nos arrasta, a gente querendo ou não. Nem sempre se é feliz. Vamos ver como tudo será. Venham.

Abraçou os filhos e segurou as lágrimas da mágoa.

Osvaldo marcou uma reunião 15 dias depois e veio com a nova mulher.

– Denise, crianças! Esta é Patrícia.

– Tudo bem? Sentem-se, por favor.

– Ela não é muito nova pai?

– Douglas, que é isso? Sinto muito, mas me apaixonei por ela.

– Teremos que ter a companhia dela toda vez que você vier nos ver?

– Crianças, por favor! Sejam educados. Nunca ensinamos a tratar ninguém desta forma.

– Desculpa mãe, mas você continua aqui, ele é que deixou a gente pra ficar com ela.

– Não, não é assim. Eu estou com ela, mas vocês continuam meus filhos. Vou continuar pagando as mesmas coisas, vamos passear de vez em quando, às vezes com Patrícia, às vezes só nós três. Eu prometo.

– Você sempre prometeu que a gente seria uma família e mentiu.

– Não filho, não menti! Eu acreditava realmente que seria assim, mas as coisas mudam.

Denise se esforçou além de seu limite para manter a educação, um ambiente amigável adulto, mas seus filhos deixaram claro que a situação levaria tempo para se ajustar.

No inicio Osvaldo manteve a promessa da freqüência, que foi diminuindo com o tempo. Patrícia engravidara, trabalho demais, depois a criança nascera… Agora ligava nos aniversários, passava antes dos Natais, ligava quando chegava de viagens e raramente saia com Débora e Douglas. Denise percebia isso e três anos depois da separação ouviu.

– Ô mãe! Vai se ausentar da mesma forma que o papai?

– Como? O que você quer dizer filha?

– A gente sabe que você se esforça, mas queremos mais tua presença do que você trabalhando sete dias por semana. Não vamos fazer pedidos exagerados que seja preciso mais e mais dinheiro.

– Desculpem. Vou melhorar isso, prometo.

E cumpriu o prometido. Havia se entregado ao trabalho quase desesperadamente, mas conseguira contrabalançar agora. Dividiu melhor seu tempo, tornando-se mais presente na vida dos filhos.

Tempos depois, parecia-lhe que os filhos começavam a excluí-la. Douglas já completara 16 e Débora 14. Embora educados, como todos nessa idade, achavam que tinham conhecimento suficiente para enfrentar o mundo. Preocupava-se mais agora que quando eram crianças.

Naquele dia, receberiam representante de uma outra agência de propaganda. Denise colocou as pastas distribuídas na mesa da sala de reunião – a secretaria estava ocupada, era amiga e ela tinha um tempinho livre – e, ao sair:

-Uau!!!

– Desculpe, foi comigo?

– Com quem mais seria? Além de mim, só existe você aqui.

– É que não entendi o que você disse.

– Eu disse “uau”!!

– Foi o que pensei ter ouvido.

– Você é de uma presença impressionante. Bonita, charmosa, ar inteligente, simpática e, o mais importante, tem senso de humor.

– Percebeu tudo isso enquanto eu saia e você entrava na sala? Neste segundo?

– Bom, tenho bons olhos para ver o visível, não se irritou comigo, é simpática e está sorrindo, ao invés de querer me processar por assédio, então, tem senso de humor.

– Mente afiada, hein!?

– A profissão me obriga.

– Não diga que é a representante de marketing da agência nova? Está cedo para a reunião.

– Tá bom, não digo, mas gosto de observar com quem vou trabalhar, não só produtos. Gosto de ver o “ar” dos ambientes e só falta … o quê? … 20 minutos. Já andei por aí, tenho alguns esboços para apresentar, os quais vou rever enquanto espero.

– Chegou antes da hora e já com material para apresentar!? Esplêndido! Trabalho há 20 anos nesta firma, há oito na Diretoria e nunca vi alguém tão rápida, tão confiante. Pensei que só veria algo depois do primeiro contato; depois de ouvir o que queremos.

– Digamos que pesquisei e bolei algumas coisas para produtos que vocês trabalham, com vistas ao grande público.

– Impressionante! Boa sorte.

– Impressionada estou eu; e sorte eu terei se aceitar jantar comigo.

– Isso é assédio!

– Não trabalho com você, não é considerado assédio. Paquera sim, assédio não.

– Fico lisonjeada, mas obrigada, não é a minha praia. E é considerado assédio, sim. Boa tarde.

– Ciao, até mais.

A diretoria ficou encantada e a agência Nova Gaya ganhou a conta.

– Oi… Denise, não?

– É, Denise. Já se informou?

– Com certeza e, como ganhamos a conta, espere alguns contatos, possivelmente nem todos profissionais. A propósito, meu nome é Ester.

– Você não vai desistir, vai?

– Facilmente, não. Não é sempre que alguém atrai tanto a minha atenção, aliás, é raro.

Foi embora, sorrindo.

Daí em diante, todas as vezes que ligava, ou comparecia na firma, fazia contato com Denise, às vezes levava ou mandava flores, ou alguma coisa diferente.

– Ester, por que quando me dá uma flor é sempre plantada?

– Assim, de vez em quando, você tem que cuidá-la e se lembrar de mim, nem que for para xingar por ocupar seu tempo.

– Não xingo, não!

– Já é alguma coisa.

Alguns meses depois de se conhecerem, num sábado à tarde, tocaram a campainha e Denise foi atender.

– Oi! Desculpe aparecer sem convite ou sem permissão.

– Ester! Como… como sabe onde moro?

– Sou simpática, sei ser agradável e acabei conhecendo as pessoas certas onde você trabalha. Resolvi conhecer seus filhos e como estou com vontade de passear, talvez cinema, parque, jantar… hum, sei lá. Posso entrar?

– Já que está aqui, por favor.

Após apresentações.

– Você trabalha com mamãe?

– Não, Douglas, eu presto serviço à empresa em que ela trabalha.

– E se tornaram amigas?

– De certa forma; e eu vim aqui hoje convidá-los para sair. Vocês podem escolher.

– Qualquer lugar? Quem paga?

– Qualquer lugar, eu os levo e pago.

Tem lugares que adolescentes adorariam ir, mas falta-lhes dinheiro para curtir a diversão. Ester levou-os. Duas horas naquele lugar barulhento foi o suficiente para Denise. Mesmo as duas permanecendo afastada da pista de dança e máquinas de games, era impossível conversar sem gritar.

– Acho que já gastaram mais que o suficiente do dinheiro alheio. Vamos para casa, agora.

– Já que a mãe de vocês está com dor de cabeça, podemos ir comer antes, pra que ela não tenha trabalho na cozinha.

Os jovens se divertiram; e Denise surpreendeu-se ao perceber o quanto Ester tinha talento para aproximar-se das pessoas.

Depois da primeira vez, houve a segunda, a terceira… A cada quinze dias, Ester estava com aquela família que se acostumara com sua presença. Denise, sem perceber, abrira uma enorme brecha.

Numa noite de sexta feira, “as crianças” foram a uma festa de amigo aniversariante e Denise iria buscá-los quando ligassem. Por volta das 21 horas, Ester ligou, soube do fato, dispôs-se a fazer-lhe companhia, desligando antes de dar-lhe tempo para a recusa. Chegou esfuziante com um jantar chinês completo de contrapeso.

– Oi, tudo bem? Eu ainda não jantei e espero que você não se incomode que eu o faça aqui. Ah! Tem bastante pra mais que nós duas, se quiser, por favor, me acompanhe.

Acabou acompanhando. Ouviram música e Denise, de repente, percebeu-se dançando nos braços de Ester, tentando lembrar-se dos detalhes de como acontecera. Achou que fora acontecendo, mas estava gostando e resolveu não se importar. Um ritmo mais junto, um puxão mais forte, uma aproximação perigosa, risos, liberdade, um beijo leve nos lábios. Não houve nenhum protesto, só sentiu o arrepio, o leve calor e não se lembrou de tentar parar ou dizer não. Um olhar terno, mas muito comprometedor, o sorriso mudando, um afago mais íntimo e um beijo profundo, sem contestação. O calor intenso, uma vontade crescente (é só carência … talvez eu possa experimentar … não vai fazer mal) e num deslizar duplo não se ouvia mais a música, mas seguia-se a vontade de ver nu e tocar o corpo da parceira da dança mudada para paixão aflorada.

Sentiu-se livre, solta, amada?, dona e escrava, possuída e possuidora. Naquele momento, amante! Não quis sair correndo, não tinha pressa para o banho, queria ficar ali abraçada, largada, dormir assim, afinal seus filhos não estavam e.. Os filhos! Sentou-se e olhou-a.

– Como pude? Não sou homo, nunca fui, tenho filhos, como pude chegar a este ponto?

– Quer que eu me vá? Já se arrependeu?

– Talvez eu me arrependa depois, por deixar acontecer e talvez criar ideias não reais na sua cabeça. O que estou dizendo agora, é como pode alguém como eu querer e deixar acontecer, e ter gostado muito e ainda não sentir culpa ou arrependimento por isto?!

– Talvez o momento. Talvez eu tenha me aproveitado de um momento propício, ou talvez você goste um pouco de mim.

– Eu gosto muito de você, mas nunca antes senti tesão por você ou qualquer outra mulher.

– Sabe? Conheço muita gente casada que demonstra e arrota um monte de bobagens preconceituosas – homens e mulheres – e sempre que podem dão suas escapadas com alguém do mesmo sexo, às escondidas. Tem um monte de bissexuais por aí. E tem gente que, de repente, ama alguém sem se importar com o sexo desse alguém. Essas coisas não têm explicação, só acontecem. Acho que quando acontecem deveriam ser curtidas ao máximo e deixar a razão de lado.

– Huumm! Vou me preparar para buscar as crianças.

– Eu vou junto. Se importa?

– Não, tudo bem. A gente aproveita pra conversar sobre isso.

– Como você está?

– Estou com as ideias confusas, mas bem. O corpo está ótimo!

– Isto é bom, não é?

– Olha, vou ser franca. Eu não queria e não quero nenhum envolvimento com mulher. Tenho meus filhos e o resto da família.

– Mas podemos continuar como até ontem?

– Como até ontem podemos.

Mudaram de assunto até o telefone tocar.

Depois de todos em casa, Ester se despediu.

– Não, não. Está tarde para andar sozinha por aí. Durma aqui.

Já estava amanhecendo quando Débora e Douglas finalmente terminaram as fofocas da festa e foram dormir.

– Bom, estou indo.

– Não vai dormir um pouco?

– Melhor, não. Você está muito perto para eu dormir. Em casa será melhor. Pra manter a amizade.

E continuaram a amizade com contato permanente.

Dois meses depois, Denise achava que Débora andava diferente, Douglas um pouco preocupado, mas tentavam disfarçar na sua presença. No entanto, estavam sempre conversando com Ester, pessoalmente ou por telefone. Resolveu perguntar-lhe:

– Ester, tenho perguntado às crianças e dizem que está tudo bem, mas eu os conheço e sei que algo está errado. O que está acontecendo?

– Desculpe, querida, mas só eles podem te dizer.

– Então, eu tenho razão. Como posso ajudar ou não enlouquecer de preocupação? E como confiam em você e não em mim?

– Não é uma questão de confiança. Eles confiam em você, mas você é a mãe. Converse com eles, vão se abrir, só precisam de tempo.

À noite, quando estavam reunidos, foi direto ao ponto.

– Muito bem, crianças. Eu sei que há algo errado que nem vocês, nem Ester querem me dizer, mas já chega. Esperei o bastante para ouvir, mas agora vou exigir como sua mãe. Quero saber; e quero saber já. Que está acontecendo?

– A Ester te disse alguma coisa?

– Não, não disse e estou perguntando a vocês.

– Bom, mãe, é que como é comigo o problema e eu envolvi o Douglas e Ester, acho que devo encarar a coisa.

– O que houve, Débora?

– Primeiro, desculpe por não ter dito nada a você, mas achei que só iria piorar as coisas e você ia ficar muito preocupada. Depois como Ester é um adulto responsável e eu precisava de conselho e ajuda, pedi à ela.

– E eu, filha? Não fiquei contente com sua atitude.

– Tive medo e um pouco de vergonha de te contar, mãe.

– Mas o que pode ser tão vergonhoso a ponto de não poder contar comigo, filha?

– Bom, mãe, é que estou com 15 anos e, há alguns meses, comecei a paquerar um garoto da escola … e daí a gente estava ficando…

– Filha, vocês transaram?

– Não, mãe, não é isso. Deixa eu terminar, por favor. O cara parecia legal, é bonito, mas está envolvido com drogas e eu não sabia.

– Oh, meu Deus!

– Ele me ofereceu e eu recusei, aí ele quis que eu entregasse para algumas meninas. Quando eu disse “nem pensar”, que eu não fui criada para acreditar nesse tipo de coisa e que não queria saber mais dele, ameaçou pegar eu e o Douglas, com a turma dele, fora da escola e se eu o “dedurasse”, o pessoal dele pegaria o Douglas. Desde que me ofereceu drogas, conversei com o Douglas que disse para eu me afastar e esquecer, mas ele resolveu que eu tinha que ajudar na distribuição, pois ninguém suspeitaria de mim e me deu uma semana para ajudar ou iria “aprontar pra mim”. Antes de te envolver, pedi ajuda para Ester. Ela pediu para te contar, para irmos à polícia, mas tive medo. Daí ela resolveu fazer uma coisa, amanhã. Não sabemos o que é, mas tem que dar certo, senão vamos à polícia, eu prometi isso à ela e que te contaria. Desculpe, mãe.

– Meu Deus! Ainda não acredito! Como você pode não me contar tudo isso? Falou com alguém que conhece há um ano e não comigo? Que tipo de mãe eu sou?

– Mãe! Por favor, não é com você. Depois de tudo o que passou, que nos ensinou, eu tive vergonha. Pelo amor de Deus, me desculpe.

– E Ester não me contou! Tudo isso é grave!

– Eu implorei pra ela não contar nada pra você.

– Bom! Deixe eu digerir isso tudo e esperar que dê certo o que ela pretende fazer.

Denise acabou cochilando já por volta das 4:00 h. A cabeça pesava de tanto pensar e de preocupação. No dia seguinte, percebeu que seus filhos também não haviam dormido bem e estavam bastante ansiosos.

Assim que chegaram à escola, Arnaldo esperava-os na entrada. Olharam para os lados e foram devagar na direção do portão. Ao mesmo tempo, parou um carro grande, escuro, vidros fumê, e dele desceram dois homens enormes, de terno. O motorista do auto desceu, deu a volta e abriu a porta traseira, mas ninguém saiu. Ele permaneceu meio perfilado segurando a porta. Os outros dois foram a passos largos na direção de Douglas e Débora. Assim que Arnaldo abordou-os, os homens chegaram.

– Olhe para o chão, garoto. Não me encara, não.

– O quê..!

– Cala a boca, pivete. Tá vendo aquele carro ali? Tá vendo o cara lá dentro? – Os garotos olharam, mas só dava para vislumbrar alguém de terno, chapéu e bengala. – É o tio do casal aqui. Acenem pro seu tio – os dois o fizeram, sorrindo. Ele adora estes garotos e tem uns contatos que você e seu bandinho de merda não vão gostar de encontrar. Não olhe pra mim, olhe pro chão, lixo. Se você pensar em chegar perto deles de novo, encomenda a tua alma e de teus cupinchas pro Demo. Sacou, seu merda?

– Olhe, eu não..

– Não quero ouvir nada além de “sim senhor, entendi e não vou nem olhar pra eles”.

Sentindo o peso da manopla no seu ombro, Arnaldo repetiu a frase meio gaguejando.

– Agora sai fora.

Ele disparou pra dentro da escola.

– Obrigado, gente!

– Não foi nada. Agradeçam a sua tia Ester. Só fizemos um favor à ela.

– Falou! Pode deixar. Mandaram legal. São atores, né?

– Os do carro são, nós dois somos seguranças. É tudo da agência, roupa, carro, mas foi divertido encarar o “laranja” aí. Droga é a maior porcaria.

– Até qualquer hora. Valeu mesmo. Tchau, tio.

O homem do interior do carro acenou, os outros voltaram e partiram.

Denise ficou mais aliviada ao saber do ocorrido, mas as preocupações com o caso só sumiriam, depois de algum tempo, sem o incômodo do tal Arnaldo.

O episódio da escola servira para aproximar Ester mais ainda. Denise pegava-se pensando nela às vezes, desde aquela noite do aniversário, no quanto era bom sua presença, o quanto a família se divertia. Mesmo quando casada, muitas vezes se sentia sozinha, mas agora sem a companhia dela, sentia-se tremendamente só. Faltava o riso contagiante, a alegria de viver. Quase sem pensar resolveu convidá-la pra jantar, só as duas, sem compromisso.

– Oi, Ester! Estou ligando pra convidá-la pra jantar nalgum lugar.

– Já tem um lugar definido, ou posso escolher?

– Pode escolher. Que tal amanhã?

– Tá. Te pego na saída do metrô, ou melhor, como a agência fica quase em frente à estação Consolação, você vem até aqui, conhece o meu local de trabalho, primeiro.

– Tá, ótimo. Metrô é meu transporte mesmo. Até amanhã.

Sentiu-se um pouco ansiosa naquele dia e por volta das 18:30 h. chegou à agência onde havia muita gente no maior pique de trabalho.

– Nossa, é sempre assim?

– Menos domingos e feriados e, às vezes, nem isso.

– Agora eu sei porque têm tantos clientes e são tão famosos.

– Embora sejamos engraçados, às vezes, é só na propaganda, aqui levamos a criatividade e o trabalho muito a sério.

– Aonde vamos?

– Pra minha casa, assim não haverá encontros ocasionais que possam gerar algum comentário maldoso.

– Obrigada, mas você pretende cozinhar?

– Outro dia, talvez, hoje eu compro. Afinal é só escolher e usar o telefone.

– Vamos usar o metrô?

– Vamos. Uso o carro para passear, sair à noite, viajar. Pra trabalhar é mais rápido, prático e menos tenso que dirigir nesta cidade.

Observaram coisas e pessoas pelo caminho. Faziam comentários, parecia tudo interessante, engraçado. Riam por pequenas bobagens. Ao chegarem, Ester abriu a porta, dando passagem para Denise. Ela entrou e passou os olhos pelo ambiente.

– Hum! Claro, espaçoso! Legal!

Ester encostou-se nela por trás, inteira. Segurou delicadamente seus cabelos e beijou-lhe o pescoço, deslizando os lábios com suavidade. Desceu as mãos e fez menção de tirar-lhe a blusa. Denise entendeu e ajudou. Peça por peça foi tirada, devagar, sendo os corpos acariciados com volúpia. Sentiu-se acesa, dona do pedaço, virou-se e praticamente arrancou as roupas de Ester, passando a beijá-la, apalpá-la com sofreguidão. Tropeçando chegaram ao sofá, onde desabaram e, entre a névoa e a luz, entre o primitivo e o sublime, entre o sagrado e o profano, viagem?, deslize?, real? Por um momento ou uma vida, existiram inteiras e únicas, complementares.

Mais tarde, enquanto jantavam:

– Então? Esta concordância indica alguma coisa?

– Indica que você me cativou, que preenche minha carência afetiva e física, mas é só. Não tenha ideias porque eu acho que foi a última vez. Não podemos continuar com isso.

– Eu, francamente, não te entendo. Como pode dizer isto, depois do que já tivemos?

– Tenho família. Não quero perder meus filhos.

– E por que teria que perdê-los?

– É difícil para você entender, mas são meu mundo e, embora já sejam quase adultos, ainda precisam de mim. Por incrível que possa parecer para você, o que eu fizer pode gerar muitos problemas para eles. Eu não teria coragem.

– De assumir um relacionamento?

– Exato.

– Meu Deus! Preste atenção no que você está falando! É tua vida. Teus filhos vão seguir as deles. Vão se relacionar, mudar e você vai ficar sozinha.

– Não posso, não adianta.

– Está bem. Terminamos aqui.

Ao perceber o esforço que Ester fazia pra não chorar, Denise sentiu-se um monstro. Mas não magoaria os filhos de forma alguma.

– Desculpe, me perdoe. Outra hora, a gente conversa sobre…

– Não. Tudo na vida se movimenta, tem suas nuances. A melodia, os acordes, tem as notas, os semitons, os sustenidos. As cores, dependendo de seus tons, você gosta mais ou menos. O azul forte, o esmaecido, o azul bebê. Nunca tive um sentimento tão forte por alguém, mas nem mesmo por você, vou estancar minha vida, ou deixar esse tremendo amor se tornar uma coisa menor. É tudo ou nada. Tua amizade não me basta, me diverti com teus filhos, não me basta, eu quero o pacote inteiro… ou outro pacote.

A voz saíra doce, terna, resignada, mas determinada. Ninguém disse mais nada.

***

– Ô, mãe. Cadê tia Ester? Já faz uns dois meses que não a vejo.

– Ela deve estar com muito trabalho. Pronto, vamos jantar todos juntos; coisa rara ultimamente.

– A gente tem coisas pra fazer, né, mãe!

– Não estou reclamando, foi só um comentário.

– Vocês brigaram?

– Eu e teu irmão estamos conversando, não brigando.

– Vocês dois estou vendo. To perguntando sobre Ester, lembra o que eu acabei de te perguntar?

– Ah, tá! Não, não brigamos, só estamos ocupadas.

– Você cortou o barato dela?

– Que barato?

– Pô, mãe! O barato da paixão, do tesão, do que deixava vocês felizes.

– Débora!!!

– Dava pra ver que ela gostava pra caramba de você, desde o começo. E, cá entre nós, você ficava bem radiante no telefone ou quando ela aparecia.

– Para com isso Débora. Mamãe não é “sapata”. Ela já respondeu.

– É… a gente não tinha nada, além da amizade.

– Tá bom. Só se foi porque você ficou com medo e disse não.

– A mamãe não gosta dessas coisas; se isso acontecesse nós íamos morar com papai.

– Deixa de besteira. Nós, uma vírgula. Eu ficaria aqui mesmo. O cara nem lembra que a gente existe, mané. Cai na real, seu preconceituoso. E depois a mamãe tem o direito de ser feliz, seja lá com quem for, fora que a Ester é gente finíssima.

– Você está louca? Nunca. O fato dela ter te ajudado naquele caso n..

– Eu nem estava pensando mais nisso. Eu estou falando de interesse, amizade, amor, carinho que sentem uma pela outra; e é gritante.

– Você é..

– Chega! Isto está indo longe demais. Não há nada demais entre a gente e vocês não precisam ficar discutindo sobre o que não existe. Vamos acabar de jantar e, de preferência, em paz.

Dois dias depois.

– Oi, Ester.

– Débora! Que surpresa boa! Hum, que abraço gostoso! Senta aqui. Que houve? Algum problema?

– Estava com saudadona. Estou atrapalhando?

– Não. Estava terminando um relatório. Se quiser, a gente pode sair em dez minutos e ir comer um lanche e conversar.

– Quero, sim. Eu espero aqui mesmo.

– Tá bom.

Esperou, olhando encantada o vai e vem do pessoal, os desenhos, os gestos aparentemente desconexos de alguns. Foram minutos rápidos. Foram a uma lanchonete grande que, no momento, estava com pouca gente. Pediram.

– Então me conta. Vocês estão bem? A escola?

– A escola vai bem, sim. Eu estou bem, mas preocupada com mamãe. Ela se esforça, mas está apagada. Não quis me dizer o que aconteceu, mas eu tenho certeza que ela não te aceitou, não foi?

– Foi. Ela só quer minha amizade.

– Mentira dela! Acho que o casamento com meu pai não foi bom; e ela ficou com muito medo de entrar num relacionamento e se anular e sofrer de novo.

– Preste atenção que vale pra qualquer um. Nenhum tipo de amor deve acabar com a individualidade. Ela deve permanecer e se mesclar uma a outra. O respeito é tudo. Casamento não é papel passado, é coração alimentado. É um ajudar o outro em suas realizações e jamais se sentir menor ou maior com isso. Você é madura pra sua idade, madura o suficiente pra entender. E tua mãe tem filhos, numa sociedade preconceituosa.

– Sei lá, talvez seja o sexo, o ato em si, sabe.

– Menina! Você está falando de sua mãe!

– Eu sei, por isso mesmo quero entender. Eu a amo e admiro pra caramba. Quero que ela seja feliz, sem minhocas na cabeça. Ela é muito certinha, não se solta e morre de preocupação por causa dos filhos, principalmente meu irmão.

– Talvez tenha medo da altura do abismo.

– Mas pode ter um rio lindo, de água morna e gostosa lá embaixo.

– Tenha cuidado, não vá se soltar de uma vez que pode bater em muitas pedras até o fundo que pode estar seco. Solte-se aos poucos e não confie totalmente, antes de conhecer o percurso, principalmente se for a primeira vez.

– Obrigada. Farei isso, mas a gente tava falando da minha mãe. O sexo, lembra?

– Lembro-me. Sexo não é a obrigação que, às vezes, em um casamento acreditam ser. Deve acontecer quando ambas as partes querem, jamais pela vontade de um só. De preferência que envolva alguma emoção, algum sentimento, além de simplesmente tesão.

– Caramba! Por que ela não fica com você?

– Porque ela não quer. Porque não é só você.

– Insista.

– Já fui até onde podia, o resto do caminho ela tem que fazer sozinha, ou ficar sozinha. E eu acho que é o que vai acontecer. Vamos, está ficando tarde. Independente do que aconteça, você tem uma amiga pra sempre.

Realmente Débora manteve a amizade. Contava dela e da mãe sempre que possível. E ouvia os conselhos com atenção. O tempo foi passando.

No trabalho, Ester percebeu que havia alguém jovem e bonita paquerando-a. No começo pensou ser admiração ou inveja por ela ter nome bem conceituado no meio, depois achou que era apenas impressão e finalmente deu-se conta que era paquera mesmo. A garota trabalhava em área diferente da criação, cuidava da finalização de arte. Até que um dia.

– Oi. Hã … desculpe, mas sabe há quanto tempo eu trabalho aqui?

– Eu não! Você não sabe, está com amnésia ou algo parecido?

– Bem que disseram que você é bem humorada. Não, não por isso. Eu trabalho na agência há três anos, tenho 30 anos e há ano e meio que te olho e te vejo e, a cada dia, te admiro mais e você só me notou há poucos dias atrás. Daí resolvi me apresentar. Eu sou Isolda, não gosto de gracinha com meu nome, isso me irrita, sou malcriada quando irritada, e estou muito a fim de você. Não me via muito porque minha mesa era em outro lugar. Caso esteja sozinha, como aparenta, posso ter alguma esperança?

– Nossa! Que atacada! Vamos por parte. Aparenta bem menos idade. Eu já trabalho aqui há décadas, acho, sei lá. Tenho 38, estou sozinha; e não sei.

– Não sabe o quê?

– Se você pode ter esperança. Não te conheço, não sei quais são seus projetos pro futuro, suas metas, se posso gostar de você no aspecto de relacionamento amoroso.

– Engraçadinha! Eu quis dizer esperança no sentido de chance de conhecimento, afinal você pode ser diferente do que aparenta, do que eu penso, pode ser apenas uma idealização minha e cair por terra. Caso contrário, confirmada a impressão, pode ser algo duradouro, talvez até pra sempre já que não sou de ficar “ciscando” por aí.

– Legal. Hoje é quinta … que tal a gente sair amanhã; já que neste sábado não tenho que trabalhar?

– Maravilha. Até amanhã.

O resto do dia e no dia seguinte houve troca de olhares e sorrisos. Ester percebeu que há muito, muito tempo, não fazia essas coisas simples e estava gostando. Talvez pelo fato de Isolda ser “uma graça” e fazer muito bem ao seu ego.

E a noite de sexta-feira chegou.

– Muito bem, aonde vamos?

– Como não sei de suas preferências e não vou impor as minhas, pensei em irmos a um barzinho que conheço onde poderemos conversar e começar a nos conhecermos.

– Vamos lá. Hoje eu te sigo.

O barzinho era agradável. Conversaram sobre muitas coisas e descobriram várias em comum. Dançaram, comeram e já era de madrugada quando se despediram.

E continuaram a fazer coisas simples como cinema, passeios, teatro e depois de cinco meses parecia que o conhecimento era profundo e antigo. Isolda soube que não fantasiara. Ester confidenciara o quanto amara e ainda amava Denise; e Isolda em contrapartida contara o quanto amava a ela, Ester. Até na agência já haviam percebido o namoro. Namoro que progrediu lentamente, com Isolda conquistando pouco a pouco seu espaço. Não era amada como gostaria e sabia disso, mas também sabia que havia respeito, ternura e muito gostar da parte de Ester e o mais importante, nenhuma mentira.

– Não chore, Débora!

– Acho que agora acabou de vez toda e qualquer chance pra minha mãe. Ela nunca vai ser feliz.

– Talvez um dia ela seja, mas não comigo.

– Ela realmente te ama, eu sei.

– Também sei e isso é o que mais doeu e ainda dói, mas eu posso ser feliz com alguém que eu gosto e que me ama sem nenhuma vergonha disso e não vou fazer com ela o que sua mãe fez comigo.

Estavam em casa num domingo e, ao terminar o almoço, antes que saíssem da mesa, Débora jogou a bomba.

– Sabia que Ester está assumindo um relacionamento? Estão prestes a viver juntas.

– Não sei como você descobriu, mas é ótimo. Assim você não diz mais besteiras a respeito dela e mamãe.

– Deixa de ser egoísta. Não vê que, desde que ela sumiu, mamãe não é mais a mesma, que nunca esteve tão infeliz nem mesmo quando se separou e divorciou do seu pai? E você, mãe, não diz nada?

Denise estava imóvel, parecia que, de repente, a cabeça ficara oca, não conseguia reagir, os filhos brigando parecia uma coisa distante. Até que ouviu Débora gritar por ela.

– Mãe, mãe! Desculpe ter jogado a coisa assim, de repente.

– Mãe, diz pra ela que você não se importa.

– Pare, Douglas, chega. Sabe por que esse “preconceito” imbecil, mãe? Porque um dos meninos da turma dele declarou ser gay e alguns fingem nem conhecê-lo e, embora seu filhinho aqui o adore e não sei não se já não transou com ele, é um dos que só fala com o rapaz quando longe da “tchurma”.

– Eu tenho namorada!

– Eu sei; quem não sabe que você tasca dos dois lados é ela, porque o Marcos sabe, o tonto.

– Vou te arrebentar!

Só então Denise acordou de vez e colocou-se entre os dois.

– Parem já com isso.

– Pois é, mãe, é por esse aí que você jogou tudo fora, “pra não ferir seus sentimentos”, esse que parece teu ex-marido.

– Débora, por favor, por favor! Pare.

Débora saiu dali chorando, mais de raiva que outra coisa.

– Isso é verdade, Douglas? Você ignora o amigo na frente dos outros e teve medo que eu tivesse um relacionamento com Ester, não porque você tivesse ciúme, ou porque achava errado, te faria mal, mas simplesmente por causa do que os outros vão pensar?

– Bom, mãe, é que eu vivo com a turma e não ia aguentar o sarro, nem ser excluído de algumas coisas, você sabe como é.

– Não, eu não sei porque não foi assim que eu criei vocês, para terem preconceitos e descartar sua formação, sua opinião ao invés da de um grupo de imbecis que mal saíram das fraldas e se acham donos da verdade.

– Ah, não, mãe! Eu não ia aguentar minha mãe virando gay, não.

– Não se preocupe, eu já fiz minha escolha e escolhi meus filhos. O bem estar deles, pra que não sofressem com o maldito preconceito, com nenhuma discriminação, sem parar pra pensar um pouco em mim. De repente, não sei se valeu a pena. Tudo. Ter tido você, as noites sem dormir por você, ter me dado ao máximo na sua criação e ter dito não ao amor por uma pessoa tão egoísta.

– Mas, mãe, você não i..

– Cala a boca, Douglas.

Algum tempo depois, num coquetel de abertura de um seminário de negócios, houve o reencontro.

Denise a viu, ao lado de uma bela mulher. Ao vê-la, Ester se aproximou.

– Oi, Denise. Como está?

– Estou bem; e você?

– Trabalhando, vivendo. Sabe como é, sempre em frente.

– Claro! Como sempre.

A mulher se aproximou.

– Isolda, esta é Denise.

– Oi! Desculpe, não sabia que era ela. Conversem à vontade, eu estou por aí.

– É ela?

– É ela.

– Débora me contou, ela gosta muito de vocês. Ela é bonita … e você está radiante. Ela lhe fez bem.

– Obrigada. Quem podia me fazer melhor ainda não quis e não podemos desprezar a chance de ser realmente amada.

– Não devemos, mas achamos que podemos; e eu não fiz nada. Fiquei parada. Ao contrário do que sempre ensinei a meus filhos, deixei alguém fazer a escolha por mim e justamente um deles. Espero, não, desejo de todo o coração que você seja muito feliz.

– A seu modo, espero que você encontre muita paz, porque amor você teve de sobra, mas sei que não é o que te move.

– Eu sei. E no fundo você sabe que a reciprocidade, embora tardia, foi, hum, hum, é verdadeira. Adeus.

Beijaram-se ternamente e se separaram. Caso se encontrassem algum dia, seria por acaso e de passagem.

Denise pensava. Quem disse que nunca é tarde demais, se enganou. Ainda agora estava amarrada ao filho, mesmo depois da mudança no relacionamento dos dois por causa da revelação de quem o filho se tornara, mesmo sabendo que breve ele sairia de sua vida. O momento de agir passara e Ester não magoaria Isolda como ela a magoara. Isolda escolhera Ester e fez tudo que podia para demonstrar e Ester acabara concordando em ser a escolhida e ela, Denise, nada fizera para impedir isto. Todo ato, toda escolha, tem consequência. Às vezes, não fazer nada é uma escolha e como tal também tem consequência.



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