Do amor ao caos

DO AMOR AO CAOS

Já era a terceira noite só nesta semana em que eu esperava minha namorada chegar em casa para ver se conseguiria dormir bem, poder repousar o corpo e alma, ter tranquilidade e paz visto que há algum tempo não sabia mais o significado dessas palavras.

Meu relacionamento com a Jéssica sempre foi muito intenso desde o principio. Afastamo-nos de amizades que não enxergavam nossa relação com bons olhos, enfrentamos famílias e sociedade, éramos muito carinhosas em público ao ponto de chocar as pessoas mais tradicionais, até já transamos dentro do busão . Em menos de uma semana fomos morar juntas, porém o Love, carinho, respeito e cumplicidade sempre foram os mesmos nesses três anos que moramos juntas, tirando as últimas cinco semanas pra cá onde as coisas começaram a mudar bem lentamente e para PIOR ou SERIA MELHOR? ACHO QUE O ÚLTIMO FAZ MAIS SENTIDO.

Tudo começou naquela bendita primeira terça-feira do mês passado quando ela chegou muito tarde do bar onde trabalhava como garçonete.

–Jéssica, posso saber aonde você estava até essa hora e o motivo pelo qual deixou seu celular desligado? –perguntei encarando fixamente o relógio que ficava ao lado da cabeceira marcando quase duas horas da manhã, indicando que minha namorada deveria chegar três horas mais cedo.

–Amor, não briga comigo! –pediu com aquele jeitinho que sempre amolecia meu coração bagunçando os longos cabelos loiros. –Tenho uma ótima novidade pra te contar. Fui promovida no trabalho e chegarei mais tarde, mas o meu salário aumentará. Isso não merece uma grande comemoração?

–Quer dizer que a partir de hoje irei te ver cada vez menos? Eu estudando e trabalhando durante o dia e você passando a noite e parte da madrugada fora… Que tempo teremos para nós? –eu realmente não estava feliz com aquela noticia.

–Pensava que no mínimo iria dizer: “Parabéns meu amor! Estou muito feliz pela sua vitória.” Esperava algo diferente de você, Yasmin. –rebateu visivelmente chateada.

–Eu realmente estou feliz, mas eu te amo muito e sinto que cada vez estamos mais distantes.

–Isso é coisa da sua cabeça. Continuamos fazendo amor quase todos os dias…

–Sexo você quer dizer! Não tem o mesmo carinho e mágica de antes, é tudo feito a pressa e maquinalmente.

–Tá bom meu neném.. Prometo que vou te recompensar. Vou tomar um banho delicioso agora, quando sair ficarei o resto da madrugada contigo.

–Você só pode estar de brincadeira. Sabe muito bem que preciso acordar ás 6 para ir a faculdade e ainda quer que eu fique acordada? –era o cúmulo do absurdo.

–Tem certeza que não quer fazer amor com TUDO isso? –Jéssica foi tirando cada peça de roupa lentamente mostrando aquele corpo escultural que era a minha perdição, minha loucura.

Como não sabia negar as suas vontades esperei-a sair do banheiro e fizemos amor loucamente naquela madrugada, tive orgasmos múltiplos e sei que a Jéssica também. Não dormir absolutamente nada, o que acarretou em péssimo desempenho tanto na faculdade quanto no trabalho no dia seguinte.

Os dias que se seguiram foram iguais àquela terça-feira. Eu apenas cochilava rapidamente, esperando ansiosamente minha namorada, que sempre chegava depois das duas horas da manhã, fazíamos amor de maneira quase animalesca. Minhas notas caiam visto que eu não tinha tempo nem de dormir, pois meu mundo girava ao redor da Jéssica, e fui despedida do meu emprego por justa causa depois de um grave erro que cometi no setor administrativo onde a empresa perdeu uma grande quantia em dinheiro.

Quando você acha que as coisas não podem piorar, o Senhor Destino mostra o quanto você está enganada, e pode piorar sim…

Minha amiga da faculdade Alice foi a primeira pessoa que soube da minha relação com a Jéssica e quem mais nos apoiou nesse momento complicado onde nossos familiares nos deram as costas. Em uma sexta-feira a ruiva viu meu abatimento e minhas olheiras que estavam cada vez mais visíveis, não aguentei e desabafei tudo o que estava entalado.

–Tive uma ideia perfeita. O tempo que estamos aqui em casa deveríamos ir até o bar onde a Jéssica trabalha, aí você aproveita e leva um buquê de rosas brancas que ela tanto gosta, será uma imensa surpresa. –a ruivinha falava como quem teve uma sacada de gênio.

–Adorei a ideia! Acho que a Jes irá amar minha presença lá.

–Com certeza! Mas, você não pode chegar lá com a cara de cão arrependido do Chaves. Dá um trato no visu e vê se esconde essas olheiras.

Tomei um banho rapidamente. Coloquei um vestido vermelho tomara que caia que a minha namorada tanto gosta junto com um par de sapatilhas da mesma cor. Optei por uma maquiagem que combinava com a minha pele branca e fiz uma trança simples, porém elegante.

–Que gata você está! Sua namorada irá pirar quando perceber que toda essa arrumação é só pra ela.

–Espero que você esteja certa e que ela realmente goste.

–Fica tranquila amiga. Não tem como o meu plano dá errado. –Alice falou empolgada

Antes de irmos ao bar, passamos em uma floricultura e comprei um buquê com as rosas preferidas da Jéssica. Depois ainda tivemos que enfrentar um longo congestionamento até chegar ao lugar onde minha namorada trabalhava. Quando desci do ônibus não andei até o bar, na verdade corri tamanha era minha excitação em estar perto do meu amor.

–Vai com calma que o mundo não vai acabar hoje. –Lice ria ofegante tentando acompanhar meus passos acelerados.

–É que eu tô doida pra vê a Jéssica…

–Isso é o que eu chamo de amor.

Adentrei tão rapidamente no “Point Sul” que sem querer esbarrei bruscamente em uma pessoa que rapidamente tratou de me ajudar.

–O que aconteceu, querida? Parece que vai tirar o pai da forca! –André, o dono do bar que já me conhecia há muito tempo, questionou intrigado com a minha afobação.

–É que eu gostaria de falar com a Jéssica.. Tem problema se eu levar essas flores até onde ela está? Prometo que serei a mais breve possível e não irei atrapalhar no trabalho dela. –soltei tudo de uma vez. –Ainda mais com essa promoção que ela teve sei que tá trabalhando dobrado.

–Deve estar havendo algum mal-entendido, Yasmin. –André falou puxando duas cadeiras para que Lice e eu pudéssemos sentar.

–Como assim? –minha amiga perguntou curiosa.

–Já tem pouco mais de um mês que a Jéssica me procurou dizendo que gostaria de permanecer no emprego, mas como estava focada em alguns projetos precisaria de dois dias de folga semanais, no caso às terças-feiras e às sextas-feiras são os dias de folga dela. Como ela não vem mais todo dia, o salário dela diminuiu e não sei de que promoção você está falando. –juro que nessa hora a sensação foi como se tivessem me dado vários socos no estômago.

–Você tem certeza disso? –Vendo que eu não tinha reação nenhuma, parece que minha amiga resolveu falar por mim.

–Quer saber mais do que eu que sou dono deste estabelecimento? –André perguntou chateado.

–Não foi isso que ela quis dizer, mano! –finalmente consegui me pronunciar nessa conversa. –O problema é que a Jéssica não me falou nada disso e estou surpresa com tantas informações. –disse tentando em vão controlar o choro visto  que algumas lágrimas já rolavam pela minha face.

–Só mais uma pergunta. É verdade que a loira está trabalhando até de madrugada aqui no bar? –Lili parecia que tinha o poder de ler a minha mente e perguntou justamente o que eu gostaria de saber.

–Claro que não, muito pelo contrário… A Jéssica está começando a trabalhar a tarde justamente para largar o posto antes das 10 da noite.

–Vamos embora, amiga! Acho que eu já ouvi tudo o que eu precisava. –disse já soluçando de tanto chorar.

–Yasmin, realmente não sei o que está acontecendo entre você e a Jéssica, mas espero sinceramente que consigam se acertar. –André disse me dando um abraço fraterno.

–Sr. André quero lhe pedir apenas um último favor. Não comente com a Jéssica que estivemos aqui e muito menos fale dessa nossa conversa. –Lice pediu enquanto me abraçava fortemente.

–Pode deixar. Essa conversa ficará entre nós três.

XXXXXXXXXXXXXXXX

Sou muito branca, então com o excesso de choro não demorou para que meu rosto ficasse vermelho borrando toda maquiagem, me proporcionando uma aparência horrível, pior ainda com o nariz entupido.

–Vamos pegar um táxi e hoje dormes no meu apartamento. Você não estará em condições de conversar com a Jéssica nesse estado. –apenas concordei com a minha amiga. Aliás, não estava a fim de olhar para a minha namorada tão cedo.

Durante o trajeto até onde a Alice morava permaneci no mais absoluto silêncio, apenas chorava e recebia carinho da minha amiga. Acho que minha situação era tão deprimente que até mesmo sem falar nada, o taxista me olhava completamente penalizado.

Por sorte os pais da ruiva estavam viajando a trabalho e o irmão caçula havia ido passar alguns dias na casa da namorada, com isso estaríamos sozinhas. Minha amiga me ajudou a tomar banho e a me vestir, acredito que pelo cansaço mental vivenciado associado ao cafuné que recebia rapidamente dormir.

Não sei precisar quanto tempo dormir, mas ainda acordei com o cafuné delicioso que me ajudou a descansar.

–Você tá melhor gatinha? –Alice perguntou quando notou que eu estava me espreguiçando, era visível sua preocupação.

–Não tanto, mas pelo menos consegui dormir bem como há muito tempo não conseguia. Aliás, que horas são?

–Ainda tá cedo, vão dá 5 da madruga. Quer desabafar? –parece que eu precisava dessa pergunta para recomeçar a chorar. Quando me acalmei, comecei a falar o que estava entalado.

–Eu apenas estou me perguntando aonde foi que eu errei nesse relacionamento, Alice. Quero também entender o que está acontecendo com a Jéssica. Será ela está me traindo?

–Seria uma péssima amiga se falasse apenas o que você quer ouvir e não fosse sincera. Ainda não posso afirmar nada, mas tudo indica que a sua namorada está te traindo. Agora cabe a você decidir se terá uma conversa madura e definitiva com ela mesmo que isso culmine em uma separação, ou se empurrará essa relação com a barriga.

–Ao mesmo tempo que quero que ela me diga toda a verdade, parece que tenho medo disso. Enfrentamos tantos problemas para ficarmos juntas que não quero jogar o que vivemos pela janela. Não vejo mais a minha vida sem ela.

–A propósito, a Jéssica te ligou várias vezes, mas como tu estavas dormindo não atendi porque cabe a você ser forte ou deixar ela te fazer de trouxa. –notei um desapontamento no olhar da minha amiga.

–Não quero falar com ela esses dias… –nesse instante meu celular recomeçou a tocar… Era ELA! –Por favor, atende e coloca no alto falante, mas diz que estou dormindo. Vê se age naturalmente. –meu olhar era de completa súplica. No quarto toque Lice atendeu.

XXXX

— Oi Jéssica. O que você quer? –o tom de voz dela saiu muito seco. Minha amiga era péssima para disfarçar os sentimentos.

–Eu quero falar com a Yasmin. Quem está falando?

–É a Alice. A sua namorada está dormindo.

–Onde ela está? Estou ligando há muito tempo e nada dela atender. Era pra ela estar em casa.

–Precisei que ela me ajudasse a estudar pra uma prova que terá nessa semana. Então como você está completamente ocupada com a sua promoção e chegando muito tarde, pedi pra ela dormir por aqui. –o tom de voz da minha amiga foi completamente irônico.

–A minha vida não é da sua conta sua idiota! Quando a Yasmin acordar mande ela vim para a nossa casa o mais rápido possível, o lugar dela é aqui e comigo.

XXXXXXXXXXXXX

Fiquei extremamente surpresa com a maneira que a minha namorada tratou Alice. Sabia que as duas não se davam bem, mas não conhecia esse lado mal educado e autoritário da Jéssica. Como  que adivinhando o que se passava pela minha cabeça, a ruiva logo tratou de explicar.

–Não fique tão surpresa cara amiga, as vezes as pessoas não são o que demonstram ser… Já ouviu o recado. Não esqueça que depois você deve ir para a casa da sua dona. –disse ironicamente se retirando do quarto.

A partir daquele dia a relação com a minha namorada que já estava péssima, ficou ainda pior. Depois da conversa com a Alice, ela não queria sequer que eu saísse de casa achando que eu a trairia com a minha amiga. Concomitantemente como que para tentar reparar os seus erros, aparecia com presentes que me deixavam na dúvida onde a Jéssica conseguia tanto dinheiro para comprar roupas de marca, joias caras e sapatos de veludo. Para piorar nem sexo fazíamos mais, ela sempre chegava cansada e colocava a culpa no trabalho sendo que eu já sabia há muito tempo que era uma mentira.

A situação se agravou em uma noite de domingo quando começou a agressão física… O motivo novamente foi por ela não querer fazer sexo comigo e dizer que precisava sair pois faria horas extras no trabalho. Escondi a chave da porta principal e teimei que ela só sairia dali por cima do meu cadáver.

–Você acha que sou alguma burra, Jéssica? Que eu nasci ontem? Para de me esconder as coisas. –estava gritando quebrando alguns objetos da casa. –Seja  suficientemente mulher uma vez na vida para falar o que realmente está havendo. –tampar o sol com a peneira não estava adiantando, minha paciência já havia acabado.

–Que minhocas a Alice está colocando na sua cabeça? O que está havendo com você, Yasmin? Não é mais a mesma moça meiga por quem eu me apaixonei, tá parecendo um monstro.

–O monstro que você mesma criou, apenas não sou mais a idiota e retardada que você conheceu. Desembucha! –disse apertando fortemente o seu braço. –Quero saber porque você volta tão tarde para casa. Com quem você está?

–Larga o meu braço que está me machucando! –disse desvencilhando-se de mim, pela primeira vez vi medo no seu olhar. –Já disse que o André me promoveu e estou trabalhando até mais tarde…

–Mentirosa! –lhe dei uma bofetada. –Cadela! –lhe dei um segundo tapa. –Tem muito tempo que já sei das suas mentiras. Quero saber quem anda te comendo por aí. –Ao mesmo tempo em que gritava, lhe dava vários tapas e socos.

–Está bem! Você saberá, mas outro dia porque pra hoje tenho outros planos. –disse se afastando de mim e me jogando no sofá… –Você anda enchendo o meu saco para termos sexo, então é isso que teremos.

Mesmo contra a minha vontade, Jéssica rasgou toda a minha roupa com uma faca e se apossou do meu corpo. Chupou, mordeu e marcou todo o meu corpo, mas não senti nenhuma espécie de prazer, apenas muita dor. Era literalmente um estupro porque eu não estava consentindo.

–Para Jéssica! Tá doendo! –eu suplicava e em resposta ela fazia as coisas mais fortes.

–Você também machucou e marcou o meu rosto e minhas costas, então estamos quites. Agora vou te arregaçar toda por trás…

E assim aquela tortura seguiu por toda a noite até que não aguentei e desmaiei. Quando acordei estava em um hospital com a Alice, e as últimas pessoas que esperava vê novamente: meus pais que se afastaram de mim desde que assumi minha sexualidade.

–Graças a Deus você acordou, querida! –meu pai falou. –Uma covardia o que aquela mulher fez com você. –Era novidade para mim vê aquele homem com mais de 1,90m chorando.

–Meu amor vou chamar o médico. –minha mãe saiu e voltou acompanhada por um senhor de idade avançada portando um jaleco.

Depois de muita insistência consegui ficar sozinha com a Alice e queria saber como me acharam e me levaram ao hospital, além do motivo por sentir dores insuportáveis no final da minha coluna lombar.

–A Jéssica te machucou fisicamente, além de ter te violentado sexualmente, principalmente na região anal, com isso você teve uma grande hemorragia nessa área. Ela mesma chegou a ligar para a ambulância, porém quando chegamos lá ela já havia fugido.

–Apenas quero saber com quem ela estava me traindo. Saber o que essa vadia tem que eu não tenho. Onde a minha namorada está agora?

–Não posso acreditar nisso! Te digo que ela abusou de ti e você está preocupada com ela.

RESPONDE LOGO O QUE PERGUNTEI! CADÊ A JÉSSICA?

–Primeiro você deve saber que ela transava com uma coroa milionária em troca de dinheiro fácil pois ela tinha planos de viver com você fora do Brasil, em um lugar deserto, apenas vocês duas, pois ela tem ciúmes de ti até com seus pais. Nem eu, nem a policia e nem ninguém sabe onde ela está nesse momento, mas antes de fugir ela prometeu voltar pra te buscar, por isso todo cuidado é pouco.

Com pretexto de querer dormir consegui ficar sozinha no quarto do hospital. Não acredito que a Jéssica transava com uma mulher rica por amor a mim querendo que ficássemos sozinhas em algum lugar desse mundo, ela me amava, aliás, ela me ama… Até que o meu amor volte precisarei fazer tudo certinho e seguir o que a minha família acha melhor, porém mais cedo ou mais tarde, a minha Jéssica retornará para vivermos juntas no meio do nosso amor e da nossa guerra. Amo muito a minha lourinha louca!

XXXXXXXX

Em algum lugar por aí…

–É meu amor… Espero que os médicos te deem alta o mais rápido possível, a velha morreu, então meu corpo novamente será apenas seu, pois minha alma sempre foi… Te amo mais do que a mim mesma minha morena, é a única pessoa que me importa nesse mundo, te levarei comigo até o final dos meus dias. Muito em breve estarei de volta…



Notas:



O que achou deste história?

Deixe uma resposta

© 2015- 2022 Copyright Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem a expressa autorização do autor.