Em Qualquer Lugar

Capítulo IX – Nunca namorei de verdade

Aghata

Liguei para Ana Maria na segunda feira de manhã.

— Alô!

— Oi! Sou eu.

— Aghata?

— E quem mais seria, ô!

Falei, rindo. Aliás, sorrir estava sendo uma constante para mim depois das ultimas 30 horas.

— Bom humor?! Hoje não tenho consultas à tarde. Vou levar o Zé Mauro para fazer uns exames, só para descartar a possibilidade de dengue. Mais tarde, estarei livre e aí eu te encontro.

— Por que essa ânsia de me encontrar?

— Por que você me ligou?

Gargalhei. Ana era terrível no jogo de palavras. Essa era uma das coisas que gostava dela.

— Você é fogo! Estou nas nuvens, mas estou preocupada…

— Vai acovardar?

— Não! Não… Só que… Bem é algo que eu não estou controlando.

— Você pode apenas, uma vez na vida, não controlar algo para variar?

— Que horas posso te pegar?

— Às quatro da tarde.

— Passo para te pegar esta hora então.

— Vou esperar. Beijos.

— Beijos.

Fui à secretaria, mas as cenas do dia anterior povoavam minha mente. Era maravilhoso e, ao mesmo tempo, apavorante. Gostei muito de tudo, mas… Eu não conseguia controlar meus sentimentos, minha alegria desenfreada, minha vontade de ligar e ver como ela estava. Acho que se eu juntasse tudo que eu senti, por todas as pessoas que passaram pela minha vida, não daria um décimo do que ela me fez sentir só no dia de ontem. Era aterrador! Lógico que eu não correria. Eu, correr? Nunca! Nunca corri de nada em minha vida e não seria agora. Até porque, nunca me senti tão feliz em minha vida. Mas tinha que achar um jeito de administrar o que eu sentia senão eu me perderia…

O André falava comigo e eu estava aérea, mas consegui interagir; mais ou menos. Escutei suas propostas para a campanha e dei minha opinião para alguns pontos que eu não concordava e ele me perguntou sobre o projeto de captura de movimento. Disse que patrocinaria o projeto, aos poucos. Estava cansada de remar contra a maré e quando o projeto despontasse, pois eu realmente achava que era bom, apostava que muitos iam querer patrocinar. Pediu para eu elaborar o projeto, com mais etapas que eu realmente queria, mas ele achou prudente termos algo a mais, para o caso de, realmente, a coisa deslanchar. Concordei e disse que o faria, durante a semana.

 Sai da secretaria e fui almoçar. Não tinha compromissos marcados para aquela semana e fui para casa. Amanhã começaria a escrever o projeto e entraria em contato com o Roberto, mas já antecipava que, quem trabalharia, seria a Paula e o Carlos Eduardo. Eu estaria com ela à noite, mas não queria misturar as coisas. Uma coisa era eu ter algo com ela, outra era eu trabalhar com ela. Isso me deixou nervosa.

Almocei e fui pegar a Ana Maria. Levei-a até minha casa. Sentia-me mais confortável, até porque estaríamos sozinhas.

 — Está muito calada…

— É.

— É, o que?

— Minha cabeça tá uma bagunça.

Sentei na minha poltrona predileta, enquanto ela se acomodava no sofá.

— Já imaginava.

— É! Já imaginava?! E aquela história toda de: “seja feliz”, “ninguém vai ser feliz por você”!?

Ela, na sua canalhice, riu da minha cara.

— Aghata, você não é nenhuma menina para achar que ia passar incólume por essa experiência, né? E depois eu disse para você ser feliz, não disse que você iria passar por tudo, às mil maravilhas. Mas me conta, como foi?

Meu sorriso estampou meu rosto. Era disso que eu falava! Parecia uma idiota adolescente, cada vez que pensava na Paula e no nosso fim de semana.

— Pelo seu sorriso, foi bom mesmo!

— É disso que se trata. Foi bom demais! E eu não consigo parar de pensar nela! Hoje, na secretaria, o André falava comigo e nem prestar atenção direito eu conseguia… Droga, Ana Maria, isso nunca me aconteceu!

— Parabéns! Acertou as seis dezenas na loteria. Minha amiga, quem tem a sorte de encontrar algo assim como você encontrou?

 — E ficar igual a uma abestalhada?

Rimos juntas da minha recente imbecilidade.

— Essa é uma das partes boas, sabia?

Eu sorri. O pior de tudo é que eu estava achando bom mesmo. Era um frio no estômago e, cada vez que eu imaginava a Paula comigo, eu me excitava.

— Mas me conta, agora eu quero os detalhes.

— Eu não acredito que você queira saber da minha intimidade?

— Logico que quero! E depois, sempre te ouvi quando você me contava daqueles namorados idiotas seus. Agora que tem uma coisa boa pra me contar você não vai? Nada disso! Pode começar a falar.

— Ela é maravilhosa! – Eu sorri.

— Essa é a parte boba, eu quero a parte boa.

Gargalhei.

— Você não tem jeito mesmo, Ana.

Passamos o resto da tarde conversando e Ana me convenceu a contar algumas passagens de minha experiência. Ela era enxerida, mas eu me senti mais confortável, depois que conversei com ela. Até no meu envolvimento sexual, quando eu contei algumas coisas, ela pontuava de forma interessante. Expunha a minha vida como uma grande sucessão de erros com todos os homens que eu namorei. Era como se eu estivesse com uma venda em meus olhos e, de repente, essa venda tivesse caído. Como eu disse, isso não me incomodava. Incomodava-me era o fato de não estar conseguindo controlar esse amor adolescente. Para mim era exatamente isso, um amor adolescente, pois minhas reações com Paula eram descontroladas e isso estava me deixando louca.

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Mais tarde tomei um banho, me arrumei, fui deixar a Ana em casa e me dirigi para o apartamento da Paula. Tínhamos combinado de jantar na sua casa; ela queria fazer o jantar. Adorei a ideia, pois nunca ninguém quis fazer algo do tipo e bem, eu também não, já que era pior do que meus companheiros na cozinha. Quando cheguei ao lobby do prédio, o porteiro me recebeu e disse que a dona Paula já havia avisado e eu poderia subir. De fato, eu gostei da receptividade. Ela tinha autorizado a minha entrada sem a menor resistência, isso era um sinal de que era bem-vinda em sua vida. Peguei o elevador e, quando saí, eu vi uma cena que se não fosse engraçada, poderia me preocupar com a repercussão que já estava demonstrando o nosso relacionamento.

— Sai, Cacá! Vai embora!

Essa era a Paulinha, expulsando o Cacá de seu apartamento. Literalmente, o expulsando, porque ela tentava empurrá-lo para fora e ele se segurava no portal.

— Qual é, Paula? Sou seu melhor amigo e você não vai me contar o que está acontecendo? Você nem saiu comigo no sábado e, depois, desligou o celular! Hoje você estava sorrindo de orelha a orelha no trabalho e não quis me contar nada; agora me diz que hoje eu não posso ficar no seu apê e tá fazendo uma comida que nunca fez pra gente!

 — Cacá, a gente é amigo! Você não é meu irmão ou meu namorado!

Ela falava exasperada e continuava lhe empurrando e ele agarrado. Eu ria muito da cena. Sempre pegava os dois em flagrante.

— E amigo confia no outro! Você está me escondendo coisa! É a gostosona, não é? Pode confiar em mim, Paula, eu não vou contar pra ninguém!

— Eu não posso, Cacá! Sai.

— Qual é?! Você passou um fim de semana inteiro com a gostosona e não quer me contar?

Paula parou de empurrá-lo. Ela estava vermelha, não sei se de raiva ou se do esforço.

— Olha, Cacá, eu não posso te contar nada. Você tá sendo injusto comigo! Me deixa conversar primeiro com ela, tá bom?! E para de chamar de gostosona!

 Eu não sabia se achava graça do “gostosona” ou se ficava triste por me interpor na amizade dos dois. Ela estava me protegendo, por eu ser uma figura pública. Resolvi interceder.

— Paula, por que não chama o Carlos Eduardo para jantar conosco?

Os dois me olharam como se eu fosse um fantasma e eu ri muito.

— Ei! Não vão me chamar para entrar?!

— Cla-Claro, subsecretária!

Quando o Cacá, como a Paulinha o chamava, me chamou de subsecretária, eu ri mais ainda. E quando a Paula o cutucou, aí é que eu ri mesmo. Lembrei-me da primeira vez que os vi juntos no laboratório. E foi aí que, quando passei por eles da porta para dentro do apartamento da Paula, me dei conta que eu a tinha admirado e achado uma graça, desde a primeira vez que a vi.

 Entrei na sala. Seu apartamento, apesar de ser em uma área valorizada era pequeno, mas muito aconchegante. Poucos móveis, de muito bom gosto. Uma decoração estilo moderno, como minha casa, só que em um ambiente bem menor. Uma gracinha!

Um cheiro muito gostoso rescendia pelo ar.

— O que você está fazendo, Paula? O cheiro está delicioso!

— Cordeiro assado temperado com ervas, arroz de lentilha e cebolas…

— Cordeiro? Você sempre faz macarrão para mim!

— Você está sempre de ressaca e não é meu namorado, você consegue lembrar disso?

— E ela é sua namorada? Agora você conseguiu lembrar para me contar?

Eu ri. Eles juntos eram uma figura premiada de álbum, mesmo.

— Cacá. Posso te chamar assim?

— Claro!

— A Paula só estava me protegendo.

— Mas eu sou amigo dela!

— Mas eu estou com ela e não havíamos conversado sobre isso. Acho que a Paula queria fazer as coisas certas comigo…

— Está bem, mas só vou aceitar se ela me pedir desculpas.

— Desculpas!? Desculpas pelo que, ô?

— Você queria me esconder coisas e eu sempre conto tudo para você…

— Você conta porque quer me provocar!

— Quero nada!

Eu ria muito dos dois e eles acabaram parando com a discussão.  O Cacá ficou sem graça e disse que iria embora e aí eu ri mais, pois a Paula deu um tapa na cabeça dele e sorriu.

— Fica aí. Agora vai ter que aguentar, mas só até depois do jantar, porque aí você vai ter que se mandar.

 Ele sorriu sem graça e se sentou no sofá.

Jantamos. Meu primeiro jantar feito por meu amor, isso mesmo! Meu amor, pois eu já tinha me convencido que eu, realmente, estava amando. Meu problema começou aí. Nunca consegui me expressar corretamente com ela…

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Notas:



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