Encontros Desastrosos

 

Finalmente, quinta feira chegou depois de uma semana um pouco conturbada. E eu teria um descanso. Camila, depois do desastre da noite anterior, decidiu que não me encheria mais para ir ao próximo encontro, deixaria à minha escolha.

Já estava decidida a ir, acreditei que já tinha passado tudo o que uma pessoa azarada deveria passar. Fui presa, fui higienizada e quase fui grudada com um chiclete na mesa. Fora que confundi uma mulher artificial com uma original. Realmente, não tinha mais nada a perder. Ao menos, teria muita história pra contar.

Não tive noticias da Camila até a noite, quando ela chegou no meu apartamento.

– E aí, Ju, decidiu ir amanhã?

– Sim, acho que não tenho nada a perder, apenas mais um capítulo louco para adicionar na minha história.

– Tudo bem!

– Já temos um plano de fuga?!

– Não. Ainda não bolei nada, pois achei que você não ia querer ir depois de ontem.

– Ora, Camila, não generaliza! Você mesmo me disse.

– É, mas ontem quase fomos presas. Acho que já passamos do limite.

– Que nada! Amanhã o encontro é em uma boate, vamos nos divertir! Há tempos não vou a uma boate. Só você e eu, vamos dançar, beber, lembrar os velhos tempos! Não vamos nos preocupar com o meu próximo encontro.

– Fechado! Vamos arrasando!

– Isso aí! E o Diego já chegou?!

– Não, ele só volta no domingo. Me ligou hoje para avisar.

– Ah! Sim.

– Então, vamos começar a partir de agora! Vamos escolher nossas roupas, sapatos, bijuterias. E você, Juzinha, vai cortar esse cabelo porque já esta sem corte!

– Ok! Mas, só as pontinhas!

– Não! Vamos mudar o visual!

– Larga de ser mandona! Até no meu cabelo quer mandar?

– Não! Só quero você gatíssima para amanhã.

Depois de passarmos horas escolhendo a roupa e os acessórios, Camila decidiu que eu deveria vestir um vestido preto curto, aberto nas costas e cruzado no pescoço com um scarpin com salto alto.

-Você vai ficar perfeita! Amanhã escolho a minha roupa.

Passamos a noite inteira na expectativa do próximo encontro.

– Mila, qual o nome da mulher do encontro de amanhã?

– É Marta. Martinha.

– Ah, sim! Aquela loira de parar o trânsito, né?

– Exatamente!

Nem vi o dia passar na sexta feira e logo estava em frente ao trabalho de Camila. Ela saiu carregando uma mala e entrou no carro.

– Tá de mudança é, Camila?

– Não, sua trouxa! É minha roupa, perfumes e kit de maquiagem.

– Caramba, e precisa disso tudo?!

– Sim. Agora, vamos para o apartamento tomar banho e depois ao cabeleireiro!

Ela, simplesmente, escovou os cabelos, escolheu o corte novo para o meu cabelo e mandou escová-los. O corte ficou excelente, um pouco menor até o ombro, fiquei mais jovem. Fomos para meu apartamento, novamente, para vestir a roupa e tomar mais um banho para tirar os fiapos de cabelo.

Uma hora depois, estávamos prontas. Camila estava linda com uma saia jeans e uma blusinha verde justa, modelando o corpo. Chegamos à boate às 22 horas. Ainda estava meio vazia. Era dois ambientes, a pista de dança onde a música eletrônica rolava alta e o bar com as mesinhas com um som mais suave. Foi onde fiquei. Camila sentou-se nos banquinhos do balcão, perto do barman que a encarava. Let’s era uma boate voltada para todos os públicos, principalmente, ao publico LGBT.

– Me dá um Ice. – Ela pediu ao barman, que galantemente a serviu cheio de sorrisos e eu particularmente não gostei nada daquilo.

– Você não vai beber nada, Ju?

– Não ainda, quer dizer, quero suco. Me dá um suco de uva, por favor!

– Ju, vou ficar sentada aqui e você senta naquela mesa ali que eu fico de frente pra você. Qualquer coisa, eu apareço e te salvo.

– É bom mesmo!

Faltando 15 minutos para a hora marcada sentei-me na mesa, a boate já começava a lotar e a pista já estava bombando. Martinha chegou meia hora depois. Loira, um pouco mais alta que eu, aliás, todas eram mais altas que eu. Olhos de um azul céu profundo, sorriso cafajeste, usava uma calça jeans colada e uma regata preta exibindo todos os detalhes do corpo perfeito. Voz rouca. Simplesmente perfeita.

– Juliana, não é?

– Sim, e você Marta!

– Exatamente, minha linda, mas você pode me chamar de Martinha!

Levantei-me para cumprimentá-la como a etiqueta estabelece, os três beijinhos, cujo o último pegou no cantinho da minha boca. Ela deu um daqueles sorrisos cafajestes e eu quase me derreti.

– Você está tomando o quê? – Me perguntou de um modo gentil.

– Suco, não sou muito de beber. Aliás, as bebidas geralmente me deixam louca!

– Isso deve ser algo interessante de se observar.

– Não mesmo!

– Então vou buscar uma bebida para mim e trago um suco para você.

Ela se levantou e foi caminhando até o bar, parou do lado da Camila e sorriu para o barman, conversou um pouco com ele, fiquei olhando em volta as pessoas sorrindo e dançando. Finalmente alguém normal para se encontrar. Logo ela voltou com um suco de uva para mim e uma bebida rosada para ela.

– Aceita um pouco?

– Não obrigada, mas o que é?

– Chama-se Pink Lady. É feito com gim, clara de ovo, suco de limão, grenadine que é um xarope feito de suco de romã ou mel. Muito saboroso. Experimente.

Ela estendeu o copo para mim, ao menos era bem chamativa a bebida. Tomei um pouco. Havia muito gim o que deixava a bebida muito forte, o sabor ficou em minha boca. Para quem gostasse de bebidas fortes não deveria ser ruim, mas para mim, não foi muito bom.

– É forte, né?

Disse um pouco sem graça, ela deu uma gargalhada e disse de modo galanteador:

– Sim, é forte, mas vejo que você não gosta muito desse tipo de bebida, prefere coisas sem álcool.

– É porque, realmente, fico fora de controle quando bebo e isso não é legal às vezes. Não quero dar vexame, da última vez que bebi perdi uma namorada.

Fiquei muito vermelha ela sorriu novamente e, mais uma vez, em tom galanteador:

– Você é uma graça vermelhinha assim. Realmente linda, adoraria te levar para casa e ver você fora do controle.

Então ela pousou as mãos sobre minha coxa e acariciou, me deixando mais sem graça ainda.

– Minha linda, não precisa ficar sem graça. Nós apenas iríamos fazer coisas que, com toda certeza, não é novidade para nenhuma de nós.

Tomou toda a bebida e eu engoli o suco todo de uma vez. Já estava ficando com calor, acho que era porque a boate estava lotada. A pista de dança estava cheia.

– Vou buscar outra bebida, você vai ficar só no suco mesmo?

– Sim, acho melhor.

Ela foi buscar outra bebida, para mim e para ela. Novamente, parou do lado da Camila que também conversava animadamente com o barman. E eu já estava morrendo de calor, olhei para os lados e começou a tocar uma música animada e comecei a sentir vontade de dançar.

Logo ela voltou, porém estava com outro drink diferente. Estendeu para mim o meu suco e disse:

– Esta bebida aqui é a irmã da Lady Pink, White Lady. A única diferença é que, ao invés de grenadine, usa-se Contreau que é um licor feito de laranja. Ainda não me decidi pelo preferido, experimente este e me diga qual é melhor?

E, novamente, bebi um pouco da bebida exótica que ela me ofereceu.

– Os dois, para mim, têm gosto de álcool puro!

– Você tem um humor maravilhoso! – Disse rindo para mim.

O suco de uva estava maravilhoso, nunca tinha tomado um suco naquele sabor.

– Nossa! Esse suco de uva tá muito bom! O que será que eles colocam aqui?!

– Não sei!

– Nossa, aqui tá um calor, né? Você esta sentindo?!

– É você, delícia, que é muito quente!

Agora ela deslizava a mão pela parte interna da minha coxa, que era exposta pelo vestido.

– Sabe que este vestidinho seu me faz ter vontade de tirá-lo com a boca?

– É?!

– Sim, você deve ser uma delícia.

DEUS! A mulher ia me deixar louca. Estava prestes a sair da seca, daí ela levantou, terminou a bebida dela e me puxou pelas mãos. Me levou até a pista grudando o seu corpo no meu. Começamos a dançar de forma sensual, ela passava as mãos pela minha cintura e ombros. Aproximava os lábios dos meus, mas não me beijava. Logo voltamos para mesa, eu estava suada e ela foi, mais uma vez,  buscar outra bebida. Então, sentou outra mulher na mesa comigo.

– Você é linda! Não é a toa que a Martinha tá afim de você!

– O quê?

– Ela escolheu bem.

Fiquei meio desconfiada, talvez fosse alguma amiga da Martinha.

– Juliana, prazer. E você, quem é?

– Renata.

Era uma moça bonita, cabelos cor mel e olhos castanhos claros.

– Então. Já estão de saída?

– Pra onde?

– Oi, Renata, vejo que já conheceu a Juliana.

Marta chegou na hora e se sentou na maior tranquilidade. Estendeu o copo com o suco para mim e eu comecei a beber sem entender muita coisa. Renata sorriu para mim e sentou-se do meu lado. Passou a mão pela minha perna do mesmo modo que a Martinha tava fazendo anteriormente, me senti um pouco tonta depois que bebi um pouco do suco. Olhei para Marta e ela sorriu maliciosamente. Renata olhou para ela e disse:

– Ela é deliciosa. Você tinha razão!

– O quê?

– Calma, Juliana. Essa é minha esposa!

– Você é… Tem…  Para aí! Você marcou um encontro comigo tendo esposa?!

– Em momento algum disse que era solteira.

– Mas eu pensei!

Olhei para os lados meio desnorteada. O mundo tava meio que girando. Procurei por Camila. Não conseguia compreender muita coisa. Então Renata me segurou firme e começou a beijar o meu pescoço. Marta ficou olhando e sorrindo. Confesso que era prazeroso, ela tinha lábios macios que começaram a descer pela a extensão do meu ombro. Então, Marta se aproximou e beijou meus lábios. Eu estava sem ar. Totalmente irracional. Eu não tinha bebido e estava me sentindo bêbada.

Logo senti alguém puxando Renata sobre mim. E depois pegou Marta pelos cabelos e a tirou de cima de mim.

– Suas descaradas, saiam de cima dela!

Camila! Por que Camila estava fazendo isso? Eu tava gostando. As duas foram pra cima de Camila que, de um modo incrível, conseguiu desviar do ataque.

– Você, por acaso, é namorada dela?! – Gritou uma Marta com raiva!

– Se eu for não é problema de vocês!

Renata se manifestou!

– Se você for. Venha participar com a gente, vai ser gostoso para nós quatro, tenho certeza.

– NÃO! NUNCA!

Foi a resposta enérgica da Camila. Nunca a vi com tanta raiva. E eu, definitivamente, estava bêbada. Não consegui nem levantar da cadeira. Camila me segurou para que eu levantasse. Acariciou meu rosto de forma carinhosa e olhando para as duas mulheres:

– Não irei dividir minha namorada com vocês! A gente estava meio brigada, mas sei que ela vai me perdoar. Além do mais, nós temos algo que vocês duas não tem. Vergonha na cara! Nos amamos e se vocês quiserem alguém para se divertir procurem outra.

– Espera aí! Se você é namorada dela, por que não a beija? Aliás, por que ela estava procurando por outras pessoas?

Marta perguntou.

– Não é da conta de vocês!

– Então prova!

Foi Renata que disse para Camila provar que era minha namorada.

– Não preciso provar nada!

– Você não tem cara de gostar de mulher. Com certeza, nunca deve ter beijado uma.

Marta grudou no pescoço de Renata e deu um beijo na frente da Camila.

– Eu… Eu… Eu…

– Viu?! E ainda fica chocada vendo duas mulheres se beijando!

– Não estou chocada!

– Está sim!

– E pelo que a gente viu, ela estava gostando. Então a deixe com a gente. Aposto que ela vai se divertir.

Decidi me manifestar:

– E… u…

Estava tão grogue que estava começando a falar enrolado.

– Calada! Essas duas aí, estavam te embebedando. Deram suco com vodka para você e, por último, colocaram um comprimido estranho na sua bebida!

Sentei-me incrédula, ainda restava um pouco de sanidade em mim.

– Viu?! Essas duas não são namoradas, Martinha. Essa aí, só esta querendo tirar a Juliana da gente.

– Cala a boca, sua vadia! Já disse que vocês não vão levá-la a lugar nenhum. Eu não vou permitir!

Camila, novamente, me ergueu deixando de frente para ela e, me abraçando de uma forma carinhosa, sussurrou em meu ouvido: “Vai ficar tudo bem” e pousou os lábios dela suavemente sobre os meus. Num beijo suave e lento o qual, a principio, não retribuí, mas depois, me deixei levar retribuindo com toda a vontade que tinha. Sua língua acariciava a minha e os meus lábios brincavam com os seus. E eu me esqueci de onde estava e tudo o que estava acontecendo ao meu redor. Era minha melhor amiga que estava me beijando. Logo ela se afastou. Sorriu vitoriosamente para as duas mulheres.

– Viram?! É comigo que ela quer ficar.

– Juliana, com quem você quer ficar? Comigo e a Renata? Olha, somos as duas, você pode ter as duas. Te garanto que terá muito mais prazer do que com essa daí.

– Eu…quero… ficar… com ela! – Disse um pouco com dificuldade.

Mas, realmente, eu queria ficar com Camila. Eu estava confusa, mas aquele beijo que ela me deu foi diferente de todos os beijos que já provei. E novamente, Camila me deu um selinho.

– Você vai se arrepender, Juliana, teve a oportunidade de ter duas mulheres como eu e a Renata. Então, felicidades para o casalzinho certinho.

E as duas saíram, deixando Camila e eu juntas.

– Vamos, Ju. Está na hora de ir embora.

– Eu tô meio tonta, Cami…

Ela me segurou e foi me conduzindo até o carro.

Quando chegamos, ela me colocou no banco e me olhou preocupada, eu não estava muito bem, comecei a ter dor de cabeça.

– Que tipo de comprimido ela colocou na minha bebida?

– Não sei, mas acho que deve ser algo para dopar. Você está meio sem noção das coisas!

– É, tá tudo girando…

– Aquela safada tava te embebedando às escondidas. Eu a vi pedindo pro barman colocar vodka no seu suco, achei que era você que tinha pedido, mas no terceiro já tinha desconfiado. Ainda mais, quando a outra sentou e começou a te alisar.

– Eu pensei que ela fosse legal. Estou cansada. Não vamos falar sobre isso! Vamos embora!

– Sinto muito, Ju. Sei que você teve uma semana infernal e é culpa minha.

– Tudo bem!

Ficamos caladas o restante do percurso. Tive sorte por não ter bebido todo o suco, sou muito fraca para bebidas e ainda mais misturando com um remédio desconhecido. Seria muito perigoso. Porém, eu estava devidamente lúcida para lembrar do beijo que a Camila tinha me dado. O que me fez ficar terrivelmente confusa.