Eras

Capítulo 5 – Coisas estranhas

— Tália, ou você ajuda, ou fique em um canto, mas não atrapalhe se estiver nervosa!

Minha mãe começou a tirar rapidamente o colete de proteção do peito de Arítes e afrouxou suas vestes.

— Arítes… Arítes… pode me ouvir?

— Comandante… eles eram muitos…

— Quem, Arítes? Quem fez isso? Onde está sentindo dor?

Enquanto falava com ela, minha mãe terminava de tirar toda a sua roupa e verificar onde eram os ferimentos.

— Eu estou bem, senhora, apenas uma pancada na cabeça em uma pedra, depois de uma queda. Desacordei. Mas meus companheiros… sofremos uma emboscada há doze horas à cavalo. Quando me refiz, o que restou dos rufiões, tinham debandado. Matamos muitos, mas temo dizer que só eu fiquei viva do nosso lado.

— Eram de Terbs?

— Temo que não, comandante. Tinham as cores de Terbs, mas os trajes eram desleixados. Pareciam ter sido roubados. Nenhum deles tinham o uniforme completo. Eu sinto muito…

Arítes virou o rosto de lado e uma lágrima escorreu por um de seus olhos. Minha mãe parou, momentaneamente, diante da revelação.

— É como se quisessem que a guerra precipitasse.

Arítes completou, verbalizando o que todas nós pensamos diante de seu relato.

— Não pense agora, vamos cuidar de você e quando estiver melhor, você nos conta tudo. – Minha mãe se virou para mim e para Tétis. – Tenente, pegue panos limpos e traga água em uma bacia. Tália vá ao meu quarto e pegue em meu baú de curativos, uma bolsa de couro com alguns desenhos nas bordas, mas disfarce. Não quero que percebam que algo está acontecendo aqui no quarto de Arítes.

Enquanto Tétis se apressava para pegar a água e os panos, abri a porta e olhei para o corredor. Não havia ninguém passando e saí do quarto, tentando transparecer tranquilidade. Por dentro eu estava tremendo. Parecia que algo havia rompido tamanha dor que sentia.

Cheguei ao quarto de minha mãe, olhando por todos os cantos, procurando pelo baú. Entrei em seu quarto de roupas e ele estava no canto. O reconheci de imediato, pois minha mãe costumava pegá-lo para tratar de arranhões, contusões e machucados diversos que eu arranjava com minhas peraltices. Abri-o e vasculhei, procurando a tal bolsa que ela havia falado. Estava bem ao fundo. Peguei e imediatamente retornei ao quarto de Arítes.

Minha mãe já havia limpado o corpo e avaliava as lesões. Na maioria arranhões, mas um corte na lateral da perna esquerda ainda sangrava. Minha mãe fazia pressão com um pano no intuito de parar o sangramento.

— Tália, dê-me a bolsa. Tenente, poderia pegar uma chaleira com água quente na cozinha?

— Sim, comandante.

— Tenente. — minha mãe chamou a atenção de Tétis antes dela sair. — Caso alguém pergunte, diga que quer fazer um chá para você. Não fale nada sobre o que está acontecendo aqui. Nem a um superior. Isso é uma ordem!

— Sim, comandante.

Tétis perfilou e saiu para pegar a água quente.

— Tália, acenda a lareira, queime todas as roupas de Arítes, bem como os panos ensanguentados.

Imediatamente obedeci minha mãe, mas não parava de pensar que Arítes estava imóvel. Enquanto ateava o fogo na lareira, olhei minha mãe abrindo um de seus saquinhos de medicamentos e derramá-lo sobre a ferida. Neste momento, Arítes gemeu e minha mãe começou a acalmá-la, conversando com tom suave em sua voz.

— Já está acabando, Arítes. Calma. O corte, apesar de ter sangrado muito, não é tão profundo. Amanhã mesmo estará pensando em levantar. O que está me preocupando é esta contusão em sua cabeça. Prepararei um chá que deve ajudar, mas terei que mantê-la acordada durante um tempo, para ver como reage.

Arítes apenas assentiu com um leve balançar de cabeça. Minha mãe se virou para mim.

— Teremos que nos revezar, eu, você e Tétis para que ela não fique sozinha, mas de modo a não sentirem a nossa falta nos nossos afazeres diários.

Já havia terminado de jogar tudo na lareira e estava ao lado de minha mãe, olhando apática para o corpo que descansava na cama. Lágrimas encheram meus olhos. Quem faria tamanha violência?

Observava pela primeira vez, depois de anos, o corpo de Arítes desnudo. Quando crianças, costumávamos tomar banho no lago apenas com as roupas de baixo. Havia muito tempo que não fazíamos mais estas fanfarrices. Seu corpo havia adquirido formas de mulher. Seus músculos eram fortes, trabalhados como uma bela escultura. Seu abdômen musculoso saltava aos olhos e me perguntava, quem algum dia teve a felicidade de acariciar a pele sedosa e lisa que o recobria.

— Tália… Tália, está me ouvindo?

— Ãh? Falou comigo?

Olhei para minha mãe e ela riu de mim.

— O que foi?

— Estava lhe perguntando, se poderia ficar com a Arítes neste primeiro momento, pois tenho que acompanhar seu pai, na sessão de petição aberta para o povo esta tarde. Mas vejo que estava mais interessada em observar certos atributos da nossa tenente-coronel.

Minha mãe falou baixo em meu ouvido. Um rubor subiu por meu rosto como se o reino inteiro tivesse escutado.

— Mãe, o que a senhora está falando? – Também falei cochichando, mas num tom de reprovação. — E ainda na frente de Arítes! – Arrematei em minha indignação.

— Tenho tanta certeza que ela não escutou, como tenho certeza ser verdade o que falei. Mas não se preocupe, sua indiscrição permanecerá guardada comigo.

E minha mãe riu novamente, diante de minha cara estupefata.

— Como eu estava falando anteriormente, ficará com ela por agora. À noite, Tétis poderá ficar, para que possamos continuar seus treinamentos e não adianta argumentar. Agora mais do que nunca, precisará treinar arduamente. Não deixe que ela durma, enquanto eu não retornar.

Suspirei, sabedora que minha mãe não arredaria de sua decisão. A porta se abriu e a tenente entrou com a chaleira. Minha mãe pegou uma taça no aparador e derramou um pó, para logo em seguida, jorrar a água fumegando por cima. Circundou a taça na mão para que o líquido e o pó se misturassem completamente e foi até a beira da cama.

— Ajudem-me a coloca-la apoiada nos travesseiros.

Adiantei-me e me posicionei do lado oposto ao que minha mãe estava. Não deixaria essa loira, insossa, tocar um centímetro de pele de Arítes.

““Grande Senhora das Águas”! O que estou pensando”?

— Beba, Arítes. – Pediu minha mãe.

Arítes bebeu um gole, fazendo uma cara horrorosa e tossiu.

— O gosto é ruim, mas lhe ajudará com essa contusão. Beba tudo.

Minha mãe voltou-se para Tétis, enquanto dava a infusão para Arítes.

— Tenente Tétis, conte o que aconteceu.

— Eu cheguei ao quarto, comandante, pois o compartilho com a tenente-coronel e quando entrei, ela me segurou por trás, tapando a minha boca e pedindo silêncio. Soltou-me e quando virei de frente para ela, quase desfaleceu em meus braços. Ajudei-a chegar até a cama e ela me entregou o lenço que lhe dei. Disse que era de suma importância, que levasse o mais rápido possível para a senhora e que não falasse a ninguém. Não questionei, pois conheço a postura da tenente-coronel. Fui direto aos seus aposentos.

— Tem alguma ideia do que está acontecendo?

— Não tinha até hoje cedo, quando acompanhei a princesa até o lago e troquei algumas palavras com a sacerdotisa-curandeira. Fui pedir sua proteção, mas ela me disse para ficar atenta, pois “os ventos do lago começariam a soprar para amainar a inveja e a ganância que cresciam entre os nossos”. Essa foi a frase que ela usou e disse para confiar na comandante-general e ficar à sua disposição.

— E que conclusão chegou, depois desta conversa?

— Que estamos encrencados com a “Senhora das Águas”, mas sinceramente, não sei por quê.

A comandante esboçou um leve sorriso. Inclinou a cabeça ligeiramente para frente.

— Sim, estamos encrencados. Mais adiante lhe falarei e entenderá. Por agora, vá para seu exercício com o regimento. Você passará à noite com Arítes e amanhã de manhã eu a renderei. Quero que isto fique entre nós, até ela ficar de pé. O regimento que a tenente-coronel comandava, levava uma mensagem do rei para Terbs e só retornaria daqui a três dias. Espero que até depois de amanhã, ela já tenha condições de colocar um uniforme e se apresentar sem levantar suspeitas do que aconteceu. Pelo menos, à primeira vista. Depois falarei que a acolhi por estes dias, mas primeiro, quero ver a reação dos que estão conosco perante o retorno de Arítes.

— Sim, comandante.

Tétis fez uma reverência e se retirou.

Minha mãe olhou Arítes prostrada sobre a cama. Compreendi que ela deixou suas barreiras arriarem, pois seu olhar, transparecia dor. Voltou-se para mim.

— Sabe que ela é a filha de minha melhor amiga, não sabe?

— Sim. Já me contou sua história.

— Eu falhei, filha.

— Evidente que não, minha mãe!

— Falhei sim, minha filha. Prometi a mãe dela que a protegeria…

— Prometeu para a sua amiga que cuidaria de sua filha e a instruiria. Nem mesmo a mim, você pode prometer proteção.

Minha mãe fechou os olhos, inspirou fundo e enquadrou seus ombros, como que tomando à força, um alento para si.

— Cuide bem dela e não a deixe dormir até à noite. Se acaso ela tiver algum sintoma diferente, algo que pareça anormal, não hesite em me chamar. Estarei alerta.

— Tudo bem. Pode ir, mãe. Tenho certeza que ninguém zelaria por ela, nesse momento, mais do que eu.

A comandante-general do exército eriano se aproximou de mim e afagou meu rosto suavemente. Intuía que minha mãe estava buscando suporte em mim e novo ânimo para continuar.

— Vocês são tão jovens e sinto que perdem tanto tempo em auto recriminações. Abra seus olhos, minha filha. As coisas evoluem em um segundo e, apesar de termos consciência dos nossos deveres, nós não sabemos ao certo, o que se delineará em nosso futuro. Não perca tempo. Amanhã, ela ou você, talvez não estejam mais aqui nesse chão.

Neste momento, minha mãe estava morbidamente filosófica e com toda a certeza, não compreendi uma vírgula do que falou. Virou-se e me deixou no quarto. Fiquei olhando a porta se fechar depois dela sair.

Voltei-me para Arítes e custava a crer que aquele corpo, que tantas vezes vinha ao meu encontro com tanta disposição, estava necessitando de mim para manter seu bem-estar. Aproximei e me sentei na cama a seu lado.

— Arítes… Arítes…

Chamava-a enquanto passava minha mão delicadamente em seu rosto. Quantas vezes tive vontade de fazer isto, enquanto ela estava sã? Porém, me segurava diante do medo dela me repreender. Apesar de minha apreensão diante de seu estado de saúde, não consegui evitar que meu coração apertado, sentisse o calor em minhas mãos no contato com sua pele.

— Mmm…

Ela resmungou.

— Acorde, Arítes. É importante que fique desperta por enquanto.

— Estou acordada.

Eu mal sabia que Arítes estava o tempo inteiro atenta e escutando a maior parte das conversas que permearam o ambiente.

— Tália, por favor, poderia pegar uma manta e me cobrir?

— Claro!

Levantei-me e fui ao seu quarto de roupas. Peguei uma manta e quando retornei, antes de cobri-la, tirei minhas botas e me deitei a seu lado, tracionando a manta sobre nós. Ela abriu os olhos, olhando-me confusa.

— Tenho que ficar aqui durante a tarde e quero me colocar confortável. Incomodo se ficar deitada a seu lado?

Ela sorriu e fez um sinal negativo com a cabeça.

— Dói ainda?

Perguntei débil, na impossibilidade de falar algo mais coerente ou interessante para o momento. Sentia apenas uma necessidade de estar ao seu lado.

— Agora não sinto tanta dor quanto antes. Parece que meu corpo está relaxando da tensão.

— Foi minha mãe quem deu aquele lenço para você?

Perguntei só para que Arítes se abrisse comigo, pois eu sabia que sim.

— Sim. Ela me deu há uns anos e disse-me para nunca me separar dele, pois se eu me encontrasse impossibilitada de encontrá-la e estivesse em apuros, deveria enviá-lo, através de alguém de confiança, com uma mensagem de socorro. Ele tem bordados do povo do lago nas extremidades.

— Mmm.

Eu me acomodei na cama, olhando o teto e fiquei pensando se falaria com ela que tinha um lenço igual. Resolvi mostrar a verdade em vez de contar.

Segurei o laço que prendia o meu corpete na parte superior, junto aos meus seios e puxei. Ela me olhou interrogativa e, diria até, um pouco assustada.

— O que…

“Grande senhora! O que Tália está fazendo?” — Arítes pensou

— Calma, você verá.

Eu sorri com a cara de assustada que ela fazia. Na certa, achava que eu tinha enlouquecido e que queria ficar nua, sobre a cama, como ela estava. Depois que afrouxei o laço, coloquei dois dedos na intercessão dos seios e puxei um lenço devagar. Enquanto o fazia, olhei-a de relance e vi que Arítes olhava intensamente e sua respiração se tornou um pouco pesada.

Ultimamente, meu corpo experimentava sensações nada puras, diante de determinados olhares da minha guarda pessoal. Eu me negava a pensar sobre isso. Repreendia-me, pois sentia como se estivesse cometendo uma deslealdade para com ela. De uns tempos para cá, um sentimento, que eu não me atrevia dar significado, foi crescendo dentro de mim. Gostava de chamar sua atenção, sentia ciúmes de quem conseguisse atenção dela. Esta manhã foi verdadeiro choque em relação a Tétis, ao perceber que eu estava tomada pelo ciúme.  Esse monstro crescera dentro de mim e eu não conseguia mais controla-lo.

O mais terrível foi quando, no dia em que caí sobre ela, na sala de treinamentos, meu corpo se aqueceu ao estar em contato com o dela. A sensação havia sido tão maravilhosa, que ao chegar em meu quarto, tomei meu banho e me toquei intimamente, pensando nas mãos de Arítes acariciando meu corpo. Pela Senhora das Águas! Nunca havia tido um orgasmo tão forte. Lógico que me envergonhei de meus atos. Censurei-me depois. Não poderia trair a amizade que estava retomando depois de tantos anos.

Voltei de meus pensamentos, no exato momento em que o lenço saiu completamente de meu corpete. Olhei-a, e devo dizer, que ela não estava contribuindo muito para que eu me mantivesse respeitosa, pois ela ainda olhava para o laço desfeito, que deixava a parte superior de meus seios à mostra.

— Tenho um lenço igual.

Falei baixo. A voz traiçoeira me denunciaria, se o estado da tenente-coronel não fosse tão débil, perderia minha cabeça.

— Vejo que sua mãe nunca deixou de nos cuidar.

— Fique com esse. – Ofereci.

— Não acho que sua mãe gostaria que você me entregasse o seu, além do mais, ela não demorará a me dar outro.

— Eu pego outro ainda hoje com ela. Fique com o meu, por favor.

Os olhos verdes da tenente-coronel me olharam tão ternamente, que me perdi na íris verde-brilhante. Ela pegou o lenço de minha mão e cortou meu prazer de naufragar em seu olhar. Voltou seus olhos para o teto e inspirou fundo.

— Está com dor? Estou incomodando deitada aqui?

— Desculpe-me, Tália, mas não tenho controle sobre as dores de meu corpo. A dor está voltando e, acredito que se levantasse, ficaria mais confortável.

— Tudo bem. Não tem problemas. O que interessa é você se curar.

Fiquei frustrada, mas compreendia, é claro. O resto da tarde transcorreu com conversas corriqueiras e com certa tensão entre nós. Não entendia porque dávamos um passo à frente na nossa amizade, para logo depois, nos retrair.

Ao cair da noite, minha mãe veio nos ver e trouxe uma espessa sopa para Arítes se alimentar. Estávamos falando sobre as nossas travessuras de criança e conseguimos relaxar. Minha mãe parou à porta e nos observava sorrindo.

— Vejo que está mais disposta, Arítes.

— Assim é, comandante. Minhas dores estão diminuindo e a minha cabeça não está mais confusa.

Minha mãe olhou o lenço nas mãos de Arítes e me apressei em explicar.

— Dei o meu para Arítes, pois poderia pegar outro com a senhora hoje mesmo.

— Ainda carrega entre os seios?

Minha mãe perguntou arqueando as sobrancelhas.

“Por que minha mãe tirou o dia para me envergonhar na frente de Arítes”?

— Ainda.

Falei debilmente na impossibilidade de articular coisa melhor. E acreditem, se puderem; minha mãe riu de nós, pois tanto eu quanto Arítes ficamos completamente rubras. Ela estava querendo brincar comigo, não é?

— Vocês são preciosidades mesmo. Tão adultas para algumas coisas e ingênuas para outras. – Minha mãe balançou a cabeça em negação. — Bom. Tétis deve chegar logo e vejo que se encontra muito melhor, Arítes. Acredito que poderá dormir. Se algo tivesse afetado em sua cabeça, teria apresentado sintomas ao longo do dia. Durma tranquila, depois de comer a sopa.

Minha guarda pessoal assentiu com a cabeça. A porta se abriu e Tétis entrou.

— Vamos, Tália, ainda temos o que fazer agora à noite.

— Ai, não!

Minha mãe me repreendeu com um olhar gelado.

— Tá bem. Vamos lá.

Falei rápido caminhando em direção da porta, mas retornei até a cama de Arítes e beijei seu rosto.

— Fique boa logo, porque não irá se livrar de mim tão cedo.

— Longe de mim, fazer algo tão estúpido quanto isso. Tenho amor à minha vida.

Ela falou sorrindo e me encantei ao ver seu rosto mais corado e contente.

Minha mãe abriu a porta devagar. Continuávamos cautelosas para sair do quarto da tenente-coronel, para que não fossemos pegas.

— Tome um banho e se troque para jantarmos com seu pai. Não devemos mudar a nossa rotina. Depois do jantar, nos encontramos na sala de treinamento.

— Ah, tá. Mais uma sessão de surra na filha querida.

— Tália, eu não vou facilitar para você. Sabe que não posso.

— Tá. Tá. Só estava resmungando um pouco, não posso?

— Fique à vontade, se acaso se sente melhor resmungando…

Bufei. Dez horas da noite estava entrando na sala de treinamentos e vendo minha mãe fazendo exercícios com o “Takubi”.

— Espero que se lembre dos golpes que lhe ensinei ontem, pois acrescentarei mais alguns.

— Mãe, eu espero que saiba que terei que estar inteira daqui a alguns dias, senão, não serei capaz de derrotar nem o cavalariço.

Ela me jogou o outro “Takubi”, sem nada dizer. Agarrei-o e me posicionei de prontidão para mais uma sessão de tortura da comandante. Eram quatro da madrugada quando paramos, pois, conseguira defender um único golpe e contra-ataquei desequilibrando-a.

— Viu? Não está tão mal assim. Arítes me derrubou só no terceiro dia e só numa ação desesperada.

— Ela tinha apenas doze anos, mãe. Como pôde ser severa com ela?

— Você defende muito Arítes… não estava sendo má. Estes primeiros dias de treinamento servem para mostrar que, quem está do outro lado, por melhor que seja, ainda é humano. A luta depende muito mais do controle e inteligência do que da força bruta.

— Pelo que soube, ela te derrubou utilizando a força.

— Não. Ela me derrubou utilizando o desespero e agilidade. Eu precisava daquilo também, pois fui pega desprevenida. Isso é o que acontece quando ficamos confiantes demais em relação a um adversário.

— Ela ainda não consegue derrota-la, mãe?

— Consegue me derrotar sim, filha. Hoje a luta é bem equilibrada. A luta corpo-a-corpo é seu ponto forte. É uma boa arqueira e excelente espadachim, mas na luta corporal ela se destaca mais.

— Com o arco, ela já lhe derrotou?

— Não. — Minha mãe sorriu. – Se me derrotasse, acho que eu me decepcionaria. É o que mais gosto e esse é meu ponto forte.

— Ô! Eu fico imaginando qual seria seu ponto fraco.

Minha mãe riu novamente.

— A luta corpo-a-corpo.

— O que?!

Parei em frente à minha porta, estupefata. Minha mãe gargalhou e entrou no quarto comigo.

— Meu amor, eu não sou a comandante-general apenas porque galguei posições no exército, politicamente. Fui escolhida por unanimidade, pelo equilíbrio das habilidades que demonstrei ao longo do tempo.

— Sim, eu sei. Só nunca tinha visto a senhora em atividade e talvez por isso, me espante tanto. Você quer que Arítes lhe suceda, não é?

— No comando do exército, sim. Gostaria que ela fizesse o exame para subir de posto. Sei que ela tem possibilidade de ir a general e talvez em uma posição bem alta, mas depois de ontem… não sei se estará em condições físicas. Várias pessoas sabem da minha afeição por ela. Não só por ser a filha daquela que foi minha melhor amiga, mas por ela ser realmente boa no que faz. Depois do que houve ontem, esta questão começou a me preocupar.

Assustei-me com a insinuação de minha mãe. Será que alguém seria tão vil, a ponto de fazer uma tocaia, só para eliminar uma “concorrente”? Isso era uma acusação grave.



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