Luz para florescer

Capítulo 15

Afundou o rosto nos cabelos negros, encontrando com a face o vale aveludado e perfumado entre a orelha e a nuca. Passou a explorá-lo com a boca e o nariz, aspirando-o, tateando-o com os lábios, redescobrindo com martirizante paciência, o cheiro e a textura das penugens quase invisíveis das laterais do rosto. Sobrevoou os lábios carnudos com os seus, tocando-os como a asa de uma borboleta. Aspirou fundo o hálito que escapava da boca entreaberta. Tornou ao pescoço, e quando menos se esperava, cravou dentes vampirescos sobre a jugular saltada enquanto seus braços escorregavam pelos braços longos, segurando-os atrás da cabeça. Suzana prendeu a respiração de susto e tesão.

Mas, quando a loirinha principiou um bailado voluptuoso com os quadris, Suzana gemeu alto de prazer ao sentir o triângulo de pelos dourados tocando o seu ventre num rebolado enlouquecedor. Sem mais se conter, Suzana livrou-se da doce prisão dos braços. Agarrou com firmeza as nádegas firmes e alvas e aumentou o contato da umidade abrasadora contra sua barriga. Eleonora não parava o bamboleio erótico e quando Suzana a apertou com as mãos fortes, o aumento instantâneo e intenso do contato quase a levou a um gozo imediato. Conteve-se devorando os lábios substanciosos num beijo consumidor.

Desceu aos seios fartos, abocanhando-os, um após o outro com uma gula capital. Lambia, sugava, mordia, comprimia-os com as mãos de encontro ao rosto perdido entre aqueles dois montes de beleza encimados por mamilos trigueiros, tensos de desejo. Suzana arfava e soltava palavras desconexas.

Eleonora prosseguiu burilando a barriga perfeita, brincando com o umbigo, mordiscando a cintura perto do quadril proeminente, causando pequenos sustos, gemidos profundos ou um choramingo suplicante quando roçava a língua sobre o início dos pelos negros do púbis ao passar de um lado ao outro do abdômen dourado.

Suzana suportava tudo, perdida no doce purgatório entre o deleite e a agonia.

Sem aviso ou indulgência, a jovem treinadora, enfiou o rosto no meio das pernas musculosas e abocanhou a clitóris pulsante sem a menor piedade. Sugou-o inclemente para, em seguida, beijá-lo com torturante leveza. Suzana agarrou-lhe os cabelos numa súplica muda. Eleonora respondeu começando uma degustação, a princípio, delicada, com a língua macia e insistente de baixo para cima. Em seguida, mais firme, rápida e urgente, levando Suzana à beira do delírio, incapaz sequer de emitir um mínimo som articulado, arrastando-a a um gozo intenso e soluçante.

Aquela mulher enorme e poderosa quedava-se trêmula e arfante aninhada nos braços cuja pouca envergadura abraçava docemente os tremores incontroláveis do corpo moreno.

Não durou muito a aparente fragilidade. Ansiosa em possuir o corpo que a enfeitiçara por uma década, Suzana envolveu Eleonora com a pujança que lhe proporcionava os membros vigorosos e o desejo imperioso. Girou-a sobre o seu próprio corpo até colocá-la deitada de costas sobre si como sobre um tapete flexível. Nessa posição privilegiada, Suzana passou a explorar cada centímetro do corpo pequeno e perfeito com as mãos ávidas e insaciáveis. Passeou, exigente, as longas mãos por toda a extensão do tronco arrepiado da sua amante. Capturou-lhe ambos os seios, apertando-os, ora com força, ora com delicadeza, experimentando-os e dominando-os, circundando e apertando os mamilos crescidos e intumescidos com volúpia enquanto beijava e mordia a carne tenra acima da clavícula, próxima ao pescoço. Desceu uma das mãos sensualmente pela trilha de penugem dourada que dividia ao meio o abdômen delgado, e encontrou o paraíso quente e úmido por entre pelos loiros.

Eleonora gemeu um sussurro entrecortado e arqueou os quadris, aflita por um contato maior que a aliviasse da doce agonia gritando a sua urgência no clitóris túmido.

Inabalável, Suzana começou a explorar aquela cálida maciez com os dedos atrevidos, descobrindo seus segredos, despudoradamente. A mão restante achou o outro recanto de maciez na boca rosada da loirinha a qual passou a sugar-lhe os dedos com a ansiedade de quem espera impacientemente pela saciedade. Eleonora já estava à beira da loucura com aquela mão maravilhosa, massageando-lhe o íntimo, dominando-lhe a escalada do prazer com tanta propriedade. Quando julgou que não aguentaria mais, Suzana virou-a novamente, desta vez de lado, encaixou-se contra as nádegas perfeitas e, privilegiada pelos braços e dedos longilíneos, penetrou-a gentil e firmemente.

Eleonora quase gritou de surpresa e prazer. Começou a mexer-se, freneticamente, para frente e para trás. Para frente, de encontro aos dedos de Suzana, para trás, de encontro aos pêlos do sexo de Suzana, deliciosamente encostados em suas nádegas.

Suzana sincronizava os seus movimentos aos movimentos de Eleonora, que arfava e gemia descompassadamente. De repente, a loirinha contraiu-se num espasmo destemperado, apertou as coxas aprisionando a mão de Suzana entre as suas pernas e soltou um som longo e choroso, sinal de um orgasmo arrebatador.

Foi a vez de Suzana abraçá-la, protetora e carinhosamente, beijando-lhe seguidamente os cabelos sedosos.

Eleonora virou-se, sem uma palavra, e de frente para Suzana, deitou a cabeça sobre os seus ombros com um suspiro indecifrável. Suzana tornou a envolvê-la com os braços e colocou queixo sobre a cabeça loura, também silenciosamente. Não tinham necessidade de falar e não queriam desmanchar esse momento com palavras que, certamente, o destruiriam. Ficaram escutando as respirações uma da outra, grudadas, incapazes de se mexerem, temerosas em propiciar a menor mudança no estado das coisas. Nesta mesma posição, adormeceram.

Eleonora acordou com a tênue luz entrando pelos desvãos da cortina do seu quarto. Com leveza, desvencilhou-se delicadamente do abraço de Suzana. De bruços, apoiada sobre os antebraços, ficou olhando para a mulher adormecida com quem fizera amor à noite passada. O rosto, serenado pelo sono, parecia ainda mais belo. Os cílios escuros dobravam-se de tão longos. O cabelo descansava como um manto negro sobre o travesseiro e uma mecha atrevida, repousava sobre a boca ligeiramente entreaberta. Eleonora afastou a mecha com um sorriso terno pairando nos lábios. Subitamente, seu coração acelerou-se de apreensão com a repentina consciência de algo. Seu estômago se contraiu e a garganta pareceu trespassada por uma seta enquanto ela fechava os olhos e um nome escapava dos seus lábios numa triste anunciação:

– Luciana…

Eleonora olhava, perplexa, para a mulher nua adormecida à sua frente. O desvario da noite anterior passara e ainda que o corpo dourado, languidamente abandonado sobre a cama, lhe atraísse o olhar como a uma mariposa embevecida pela luz, a sua mente já havia retomado o domínio sobre a razão e agora a sensação que experimentava era menos de arrependimento do que de uma boa dose de pânico.

Sua agitação pareceu ter sido percebida por Suzana porque a morena abriu lentamente os olhos cor de safira e Eleonora recebeu um olhar tão profundo e terno que, por um instante, a sua angústia foi encoberta pelas batidas do seu coração disparado. Murmurou quase inaudivelmente:

– Suzana…

A jogadora não proferiu uma palavra. Em resposta, ensaiou um sorriso fraco e continuou deixando aos olhos a tarefa de traduzir o que queria dizer naquele momento.

Eleonora ergueu os olhos para o teto numa tentativa de fugir daqueles dois pedaços de mar caribenho que a faziam perder o prumo e o bom senso. Respirou fundo.

– Suzana – chamou novamente, com mais firmeza, restabelecida do recente assomo de enternecimento.

A morena permaneceu calada algum tempo. Por fim, falou simplesmente:

– Sim.

– Precisamos conversar…

Silêncio.

Eleonora continuou sem se perturbar.

– O que aconteceu entre nós… Eu… Não deveria ter acontecido, Suzana… – Eleonora sentou-se na cama de costas para a jogadora. – Suzana, eu sou casada. Bem casada. Tenho uma vida, um lar, compartilho projetos e sonhos com outra pessoa.

Silêncio e olhos azuis indevassáveis.

– Eu tenho uma mulher linda a quem eu amo e respeito. Uma relação estável cheia de afeto, compreensão e apoio mútuos. Olha… Não vou dizer que o que ocorreu ontem à noite não foi intenso e não vou ofender este acontecimento ou o seu discernimento procurando desculpas no que quer que seja, mas… Isso foi um erro. Um erro que não se repetirá. Entendeu?

Silêncio.

Eleonora repetiu mais incisiva:

– Entendeu?

– O que você falou? Sim, eu entendi – Suzana respondeu com uma tranquilidade imponderável.

– Então estamos de acordo.

– Não.

– O quê? – a jovem treinadora virou-se e fitou a mulher mais alta, calma e displicentemente deitada, recostada em um travesseiro dobrado sob a cabeleira negra.

– Eu disse que entendi o que você falou. Eu não disse que concordava – explicou a jogadora.

Suzana ouviu uma expulsão de ar sonora e exaltada saindo da boca entreaberta, e um rubor intenso tingir a face alva da loirinha – sinal de uma iminente explosão temperamental que poucas pessoas adivinhariam ser possível em uma pessoa com um rosto tão delicado. De fato, Eleonora exclamou quase gritando:

– Você não entendeu, não! Eu não quero nada com você!

– Eu não acredito – retrucou Suzana, inabalável.

Eleonora levantou-se da cama num salto e se postou de frente para Suzana com as mãos na cintura e uma expressão facial alterando-se entre o descrédito e a indignação. Já ia lançando um comentário colérico quando percebeu um sorriso malicioso vindo dos lábios de Suzana. Foi então que se lembrou de que não estava usando uma única peça de roupa. Puxou bruscamente o lençol sobre a cama e se cobriu, desajeitada.

– Su-Suzana, você é a pessoa mais presunçosa que eu conheço. Aliás, a sua presunção só não é maior que a sua incapacidade em ouvir o que não quer!

– Isso é verdade – Suzana falou grave e pausadamente enquanto se levantava e caminhava em direção a Eleonora.

A pequena loira observou aquela mulher alta e nua caminhando para ela lentamente, com os olhos fixos em seu rosto e o queixo voluntarioso cerrado de determinação. Percebeu-se incapaz de se mover. Suzana parou a poucos centímetros dela.

– Realmente, eu tenho grande dificuldade em ouvir o que eu não quero. Eu sei… Mas, o que você não sabe é do que eu sou capaz para conseguir o que eu quero.

Com o rosto quase tocando os seios rijos e morenos, Eleonora girou o corpo rapidamente na intenção clara de bater em retirada. Não deu sequer um passo. Suzana a abraçou pelas costas. Uma das mãos deslizou sob o lençol frouxamente enrolado no corpo da loirinha até capturar o seu palpitante seio esquerdo. O outro braço deslizou pela cintura até quadril, segurando-a colada ao poderoso corpo da atleta.

Eleonora ainda tentou escapar, mas sabia de antemão que era inútil. Apelou para o sarcasmo:

– Então, é desse jeito que você consegue o que quer… Impedindo os outros de fazer o que querem ou, mais precisamente, de fazer o que você não quer.

– Admito que já usei desse artifício muitas vezes em minha vida… Mas não é o caso agora – Suzana aproximou os lábios da orelha de Eleonora até roçá-los de leve na cartilagem macia. Sussurrou devagar. – Trata-se de uma pequena prova do que eu afirmei há pouco. Negue que o seu coração disparou ao toque da minha mão. Diga que não se arrepiou inteira com o meu rosto tão próximo ao seu. Diga…- deslizou os dedos longos pousados sobre o quadril para o início da virilha e encaixou ainda mais as nádegas da jovem treinadora contra o seu baixo ventre. –…que não está novamente molhada de excitação.

Com a respiração alterada, Eleonora respondeu entre-dentes:

– Seria estúpido, senão desnecessário, negar que eu sinto atração por você. Você é linda e sedutora. E sabe disso. Mas o que eu sinto não é nada mais do que isso: simples, ordinária e vulgar atração física. Mais nada!

Suzana afrouxou o abraço, colocou o queixo sobre a cabeça loira, respirou fundo e falou, séria:

– Você pode dizer o que quiser. Vou te citar uma frase que alguém me disse há anos atrás, que nunca saiu da minha cabeça e que eu vou repetir para você. Veja se reconhece: “… Porque eu te vi desarmada dessa sua armadura de indiferença. Porque eu te vi nua de corpo e de alma. Porque eu adormeci escutando o seu coração… Não me venha com conversas sobre como você é. Para mim, você não precisa. Eu já sei”. Antes de você me vir com conversas sobre como você se sente em relação a mim, Eleonora… Lembre-se! Eu também estava aqui ontem.

Soltou-a. Eleonora permaneceu quieta no lugar.

Suzana começou a recolher as suas roupas e a vesti-las. Antes de sair, olhou para a mulher ainda estática ao lado da cama.

– Eleonora – chamou.

Não houve resposta.

– Eleonora, saiba de uma coisa. Eu me recuso terminantemente a desistir de você. Eu nunca mais farei isso! Você é o único e definitivo amor da minha vida e eu vou lutar por você como quem luta pela própria sobrevivência. VOCÊ entendeu?

Suzana saiu silenciosamente.

Eleonora seguiu devagar para o banheiro. Parou de frente a pia e se olhou no espelho. Um vácuo tomara o lugar do estômago e um nó cego habitava o meio da sua garganta. De repente, uma erupção de agonia e dor escapou por sua boca em forma de um grito angustiado e abafado… E um vidro de perfume francês achou o seu fim espatifado contra a parede ao lado da banheira.

– Carla?

– Quem…? Eleonora? – Carlinha olhou para o relógio sobre o criado-mudo – 07:00. Sentou-se na cama. – O que foi, Elê?

– Desculpe, ligar a essa hora, Carlinha. Eu…

– Espere um pouco – cortou, Carla. – Vou desligar aqui e atendê-la na sala – Colocou o telefone no gancho. Olhou para o marido adormecido ao lado e saiu da cama o mais suavemente que conseguiu. Passou para o corredor. Abriu a porta do quarto dos gêmeos e observou se eles também estavam dormindo. “Tudo em paz”, pensou com um suspirou de alívio e foi atender a amiga, livre do assédio dos seus três bebezões.

– Alô? Pode falar, agora.

– Me desculpe mais uma vez, Car…

– Elê! Pare de se desculpar e solte logo a bomba.

– Como você…?

– Além do fato suspeitíssimo de você ter me ligado praticamente de madrugada? Mais de vinte anos de amizade, menina. Anda, desembucha.

– Suzana…

– O quê?

Antes que Eleonora repetisse o nome, Carlinha gritou na frente:

– Não me diga que você está falando daquela pessoa cujo nome começa com Suzana e termina com Alcott.

Eleonora não respondeu. O silêncio falou por ela

– Ái, minha “Nossa Senhora das Assombrações!” – exclamou Carla com a costumeira teatralidade. – Não me diga que…Não, não, não. Diga, sim. Conte-me tudo o que está acontecendo, Elê.

Sucintamente, Eleonora relatou os acontecimentos das últimas semanas para a amiga de infância. Carla ouviu sem interferir senão por alguns “ohs” e “merdas” esporádicos. No fim, Eleonora arrematou:

– Eu esperei anos para ela me dizer o que me disse hoje, e ela vem me dizer isso logo agora que tudo parece tão certo na minha vida. A impressão que eu tenho é a de um divertimento cruel dos destinos… Eu não sei como agir ou pensar. Na verdade, eu não sei dizer nem ao menos como eu me sinto. E ainda tem…

– Luciana – completou, Carlinha.

– Talvez seja o que mais me atormente – Eleonora falou baixinho.

– Não deveria.

– Por que? – perguntou Eleonora, intrigada.

– Antes de se preocupar com Luciana, você deveria descobrir o que você sente em relação ao que aconteceu. Antes de começar a se atormentar pelo fato de ter traído a sua mulher, você deveria pensar no motivo que a levou a voltar para os braços de Suzana.

Carlinha fez uma pausa. Eleonora a encorajou:

– Prossiga.

– Veja bem. Eu não estou dizendo que você não deva se preocupar com a sua esposa ou negligenciar os sentimentos dela. Por favor! Ninguém merece isso e muito menos, Luciana. Além disso, eu quero mais é que Suzana Alcott se afogue em qualquer um dos rios do inferno apenas por um só dos dias em que você permaneceu quase catatônica de tristeza e apatia. Mas… – Carlinha respirou fundo com que para dar mais ênfase ao que iria dizer. – Eu acho, minha amiga, que você deveria enfrentar esse fantasma do seu passado, repentinamente reencarnado, e encarar terminantemente o que ainda existe de Suzana Alcott em algum lugar do seu coração… Desconheço outra forma de se descobrir o que se sente em relação ao que quer que seja.

Eleonora demorou um pouco para tecer algum comentário, como que pesando as palavras que acabara de ouvir. Falou com cautela:

– Não, Carla. Eu posso não saber ainda o que sinto sobre Suzana, mas eu sei o que eu não quero. Eu não quero Suzana Alcott na minha vida nem para um exorcismo! Eu não quero qualquer contato com aquela mulher senão o estritamente profissional porque este é inevitável e eu vou terminar o trabalho ao qual me propus, com ou sem ela – Eleonora afirmou, exaltada.

– Eu realmente espero que você consiga, amiga.

– Eu não estou te entendendo, Carla! Eu acabei de dizer que não vou permitir que Suzana se aproxime de mim. Pôxa, Carlinha. Eu sou feliz com Luciana. Você sabe disso. Eu não entendi o tom de dúvida.

– Você quer mesmo saber o que me parece tudo isso, Elê?

– Quero.

– Muito bem. Eu acabei de te aconselhar a encarar esse espectro do seu passado e com ele os seus reais sentimentos. Você recusou. Disse que não quer nenhum contato com essa pessoa nem para esconjurar os seus demônios íntimos, porque você já é muito feliz com o que tem agora. Não duvido. Aliás, por esta postura firme, eu fico imensamente contente, mas…

– Mas?

– Não fique brava comigo, mas eu não consigo deixar de pensar que você pode não estar querendo encarar Suzana novamente porque já fez isso ontem e… Bom… Deu no que deu. Pronto, disse!

– Preciso desligar…

– Tudo bem. Desculpe se eu fui inconveniente, Elê.

– Não! Não…Você não foi. Vou tomar o meu café da manhã, agora.

– Ligue quando quiser.

– Ligarei, obrigada. Tchau.

Eleonora desligou pensativa e levemente aborrecida. O telefonema não a acalmara. Pelo contrário… Não esperava aquele posicionamento de sua melhor amiga. Imaginara um apoio contundente à sua disposição em evitar Suzana, mas ao invés disso… “Não sei porque estou dando tanta importância a isso. A Carla sempre foi meio maluquinha e imprevisível mesmo”. Procurou ignorar um vago pensamento de como aquela doce maluquinha podia ser extremamente lúcida, às vezes.

A segunda-feira começou com uma breve preleção da técnica antes do início do treino, pois o dia marcava a contagem regressiva de trinta dias para o início do campeonato mundial. Regina explicitou o foco que seria dado ao treinamento neste último mês e aproveitou para anunciar que fariam cinco jogos preparatórios contra a seleção de Cuba dali a dez dias. Para não cansar a equipe, fariam três jogos em Curitiba mesmo e dois em São Paulo, de onde partiriam diretamente para a Espanha, sede do campeonato.

Também seria o primeiro dia de Suzana treinando em definitivo junto com a equipe. Por sinal, Suzana não só treinou bem como arrasou no treino. Os dois dias seguintes não foram diferentes. Parecia mais inspirada, atenta e dedicada do que nunca. Não havia uma única pessoa no ginásio que a vendo jogar não ficasse totalmente fascinada. Regina não estava apenas contente com performance de sua melhor jogadora, estava impressionada.

– É claro que precisamos afinar toda a equipe, mas…Caramba! Com Suzana jogando desse jeito, somos sérias candidatas ao título – disse a técnica, dirigindo-se a Eleonora que estava ao seu lado assistindo ao coletivo.

Eleonora apenas anuiu com a cabeça. Olhava, extasiada, para a altiva figura morena esbanjando a sua técnica impecável e o seu corpo vigoroso e flexível perfeitamente ajustado aos ditames de sua senhora. Suzana se agigantava em quadra, fazia jogadas sensacionais, passes mediúnicos, cestas certeiras. Estava irresistível. Não havia como não admirá-la. “Deus, ela é espetacular”, pensava Eleonora sem conseguir reprimir a admiração. Focada no firme propósito de não se deixar aliciar pelos inúmeros atrativos da bela jogadora, Eleonora creditou este súbito fascínio ao entusiasmo produzido por uma atleta excepcional do esporte que era, afinal de contas, uma das paixões de sua vida.

Na verdade, Suzana estava dando tudo de si, utilizando tudo o que sabia e era capaz para atrair os olhares de Eleonora. Nos últimos três dias havia se mantido a uma distância reservada, disfarçando a ansiedade e a perturbação que a presença da jovem loira lhe causava. Sabia intuitivamente que devia deixá-la respirar um pouco, não a forçar, pelo menos por enquanto. A loirinha, se confrontada, podia ser teimosa como uma mula. Devia cercá-la, cumulá-la com a sua presença constante, mas discreta. E então, com paciência e tenacidade, levar Eleonora a perceber que ainda era apaixonada por ela.



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