Nightingale

Capítulo 26 – Clima estranho

Erika encarou a fachada da casa por um minuto antes de respirar fundo e ir na direção da campainha. A lutadora estava com uma calça azul escura de um tecido fino com os mesmos tênis de corrida cinza e preto e uma camiseta com mangas curtas de uma malha bem leve e macia de um cinza bem claro. Ela respirou fundo antes de passar pelo portão baixo aberto e parar em frente a porta de madeira da frente da casa.

Erika então tocou a campainha e esperou. Esperou vários segundos até que resolveu tocar a campainha outra vez. Depois de quase um minuto ela ouviu a porta ser destrancada, mas ao invés de alguém da família ou da própria Alex, quem estava ali em frente a morena era uma certa loira que fez uma expressão feroz e irritada quando a viu.

– Vai embora – falou Tiffany com um tom irritado.

– Eu vim falar com a Alex, não com você – disse Erika calmamente.

– Ela não vai falar com você – disse a loira ainda mais irritada pela calma da morena.

– Ela é quem tem que me dizer isso – Erika foi firme encarando a outra com um olhar mais sério – Chama ela e então quando ela me disser que não quer falar comigo eu vou embora.

– Eu não vou chamar a Alex, você pode ir embora de uma vez – falou a loira fechando a porta, mas Erika colocou a mão esquerda na frente impedindo que Tiffany conseguisse bater a porta na cara dela – Tira a mão daí sua louca!

– Não, não vou tirar – disse Erika suspirando cansado daquela loira irritante e dando um passo a frente empurrando a porta de forma que ela pudesse entrar.

– Hey! Isso é invasão de propriedade. Eu vou chamar a polícia sua idiota – falou a loira agarrando o pulso da lutadora.

– Mas que merda tá acontecendo aqui? – perguntou Alex descendo as escadas que terminavam em frente à porta, ela tinha ouvido Tiffany falar alto com alguém e desceu pra saber o que estava acontecendo, mas parou sem reação à quatro degraus do fim da escada ao ver Erika ali parada e encarando-a.

– Sua amiga não quer me deixar entrar e diz que vai chamar a polícia – falou Erika com um tom calmo de novo.

– Não, ela não vai – disse Alex tentando se controlar para falar calmamente e, sem tirar os olhos da morena ela se dirigiu à Tiffany – Porque você não me chamou quando viu que era ela aqui?

– Ah, pelo amor de Deus, Alex!! Você tá desse jeito que está a uma semana por causa Dela! Eu só quero cuidar de você – falou a loira irritada.

– Não é por “causa” dela – disse Alex irritando-se com a loira – E você nunca soube como realmente cuidar de alguém.

– Eu não acredito nisso – falou a loira olhando de uma a outra – Você vai mesmo falar com ela mesmo depois de tudo….. Quer saber? Faça como quiser, só não venha atrás de mim quando se arrepender depois! – falou ela e saiu batendo a porta com força.

– Desculpa por isso – falou Alex descendo mais três degraus e parando a uma boa distancia de Erika.

– Eu é que tenho que me desculpar – falou a morena suspirando – Desculpa ter ignorado você por tanto tempo…. Mas eu precisava pensar e….entender o que tinha acontecido e como isso poderia influenciar na nossa amizade.

– E….depois desse tempo todo….o que você entendeu???? – perguntou a menor morrendo de medo da resposta.

– Entendi que no fundo não influencia em nada – falou Erika suspirando – Somos amigas e aquilo foi…Um acaso…..que não vai se repetir – disse ela voltando a encarar Alex com uma expressão calma.

A menor não soube como reagir. No fundo Alex queria que, naquele tempo todo, Erika tivesse descoberto ter algo mais que amizade por ela. Mas a guitarrista também sabia que a maior probabilidade era de que a morena a odiasse eternamente por causa daquele beijo. No entanto Alex não tinha se preparado para Erika aparecendo ali dizendo que aquilo não havia sido nada demais.

– Quer…Quer entrar? – convidou a menor forçando um sorriso; se era pra ter apenas a amizade da morena, então ela aprenderia a se conformar com aquilo e fingir que não tinha acontecido nada demais – Você ainda não conhece a minha casa. Porque não entra? A não ser que você tenha que fazer algo, se for isso eu entendo perfeitamente.

– Não tenho mais nada pra fazer – falou Erika sorrindo – Não hoje. Hoje o resto pode esperar.

Alex estendeu uma mão e Erika a segurou; então a guitarrista puxou a lutadora pelas escadas acima. O quarto da menor era ainda maior do que o de Erika. Havia uma cama de casal encostada na parede oposta a porta, do lado direito da cama a porta do banheiro e um guarda roupas, do lado esquerdo uma pequena sacada e uma mesa com um notebook. Na parede em que ficava a porta haviam três violões e duas guitarras em suportes no chão. No meio do quarto ficava um tapete enorme e que parecia macio.

– Você tem o que, uma coleção de violões?? – perguntou Erika quando olhou para todos os instrumentos.

– Quase isso – respondeu Alex rindo um pouco e encostando a porta.

Erika olhou em volta, havia um cabide com algumas jaquetas e casacos pendurados atrás da porta e espalhados pelas paredes vários poster’s de bandas conhecidas e outras desconhecidas para a lutadora. Enquanto Alex passava por ela e ia para a cama pegar o quarto violão que estava ali para guarda-lo Erika andou até o cabide.

– Essa sua jaqueta é muito legal – comentou a maior olhando a jaqueta jeans de Alex, uma que a morena já havia visto a guitarrista usar diversas vezes.

– É uma das minhas preferidas – falou Alex sorrindo.

Quando pegou a jaqueta Erika fez uma expressão mais séria do que antes. A jaqueta tinha um o costumeiro perfume amadeirado do qual Erika se lembrava muito bem, mas misturado aquele cheiro havia outro perfume. Um perfume adocicado e forte que era completamente diferente de qualquer coisa que Erika já havia sentido. Era um cheiro que claramente não pertencia à Alex. Depois de alguns segundos segurando a jaqueta em frente a si mesma e sentindo aquele cheiro Erika pendurou novamente a peça e fechou os olhos brevemente.

– Erika? – chamou a guitarrista notando que a morena tinha ficado muito quieta.

– O que foi? – se virou a morena com uma expressão calma e tranquila.

– Não….nada, é só que…. – Alex respirou fundo e se sentou com as costas contra a cabeceira da cama – E então; o que podemos fazer? Faz tempo que a gente não conversa e eu meio que não sei como puxar o assunto.

– Porque não me fala do motivo pelo qual você não tem conseguido fazer o seu trabalho com a banda? – perguntou Erika se aproximando até sentar na outra ponta da cama de Alex; quando a guitarrista a encarou surpresa Erika sorriu – Mel. Foi ela quem me contou que você estava tendo dificuldades com musicas e que você e a loira andavam se desentendendo bastante.

– Ah…isso – suspirou Alex com uma expressão cansada – Olha eu…não vou mentir. Você ter me ignorado tanto me preocupou bastante. E a Tiffany não ajudava e ficava falando coisas ruins sobre você e que eu estava sendo idiota e daí não tinha como eu não me irritar com ela. Não estar conseguindo lidar com as letras pra ela cantar foi só uma consequência disso.

– Entendi – falou Erika tirando os tênis e sentando de pernas cruzadas sobre a cama da menor – Bem, agora tudo vai voltar ao normal.

– Erika eu realmente queria que você me perdoa-se por….. – começou a guitarrista.

– Porque não toca alguma coisa? – interrompeu Erika ao notar do que a outra pretendia falar – Eu realmente nunca te vi tocar algo além da guitarra – comentou ela se virando para olhar os violões.

– Anh…tá, claro – disse Alex entendendo que não deveria falar daquele assunto.

Alex pegou o violão mais claro que era o que estava sobre a cama quando Erika chegou. Ela tocou uma das musicas da banda só com o violão e Erika elogiou, depois as duas começaram a conversar sobre coisas aleatórias como sempre faziam. Havia um clima estranho entre elas; as brincadeiras às vezes ainda saiam um tanto quanto forçadas, haviam momentos em que nenhuma das duas conseguia falar nada, e haviam também os olhares que uma lançava a outra. Elas se analisavam sempre que a outra não estava olhando.

Mas com o passar das horas a conversa começou a fluir como antigamente e elas ficaram mais a vontade uma com a outra, mesmo assim os olhares continuaram, como se uma tentasse decifrar o que se passava pela cabeça da outra. Por volta das 4h da tarde Alex desceu e trouxe suco e alguns salgadinhos para as duas. Elas continuaram por mais algum tempo no quarto, apenas conversando sobre musica daquela vez.

– E você? – quis saber a guitarrista – Não canta nem no banheiro?? – perguntou ela rindo e Erika riu também; as duas já estavam sentadas uma ao lado da outra no chão do quarto sobre o tapete que era realmente macio.

– Olha, normalmente nem assim – disse Erika sorrindo – Mas acho que todo mundo faz isso de vez em quando.

– Então vamos lá – falou Alex levantando e indo pegar um dos violões, dessa vez ela trouxe um marrom mais escuro.

– Mais hein?? – Erika ficou sem entender nada – O que você acha que vai fazer?

– Eu nada, você é que vai – disse a guitarrista voltando a se sentar, mas de frente para Erika – Vai cantar algo.

– Nem pensar, pode desistir – falou ela rindo – Não vou cantar de jeito nenhum.

– Ah, qual é?? O que é que tem? Vou ser só eu ouvindo – falou a guitarrista rindo – Vai, escolhe alguma coisa que você saiba a letra inteira.

– Não Alex – falou a morena – Eu não vou pagar esse mico de jeito nenhum.

– Por favor – pediu a menor fazendo uma cara triste e implorando com o olhar.

– Ahhh como eu te odeio – murmurou a morena rolando os olhos – Tá, mas primeiro você vai ter que tocar e cantar algo pra mim – falou ela sorrindo por saber que Alex também não gostava de cantar; motivo pelo qual ela só fazia segunda voz e apenas em algumas musicas.

– Feito – falou ela sorrindo animada e Erika não acreditou que ela iria mesmo cantar uma musica inteira – Você não escapa de cantar algo pra mim hoje. Certo….agora o que é que eu canto…. – murmurou ela pensativa.

– Não Alex – falou a morena com uma expressão cansada – Eu não quero cantar.

– O que é que tem? – perguntou a menor erguendo uma sobrancelha, mas vendo a expressão irritada da outra ela desistiu – Ok, ok, você venceu. Então tá, vamos parar de falar de musica – ela falou guardando o violão – Já sei! – continuou ela animada indo pegar o notebook – Vou te mostrar uma coisa e você me diz o que acha.

– Me mostrar o que? – perguntou ela curiosa.

Alex voltou a se sentar ao lado da morena com o notebook no colo. Depois de abrir algumas pastas ela colocou uma imagem na tela.

– É uma Harley Davidson 1970 1200cc – falou Alex com um sorriso – Meu sonho de consumo – ela completou rindo; Erika apenas olhava para a moto e para a guitarrista – Estou juntando dinheiro pra ela a uns 6 anos mais ou menos. Já tenho quase a todo o dinheiro pra ela, agora estou procurando alguém que queira vender – disse ela suspirando – Meu pai já disse que se eu precisar de ajuda ele me empresta o que faltar, com juros claro.

– Já achou? – perguntou Erika vendo o olhar de Alex brilhar enquanto ela encarava a imagem.

– Acho que sim – ela disse sorrindo ainda mais – Ela está bem menos bonita do que essa imagem aqui. O dono é um cara de um ferro velho na saída da cidade. Ele quer muita grana por ela, mas a moto nem funciona, ele não liga ela a mais de 30 anos. Pelo que entendi era do pai dele e o velho morreu e ele não gosta de motos, mas sabendo que é uma raridade não ta vendendo barato.

– E você reclamando do meu carro velho – falou Erika rindo.

– Ela não está tão feia que nem o seu carro, neh – falou Alex indignada com a comparação o que fez as duas rirem depois – Eu tenho o que ele tá pedindo…..mas se comprar por esse preço, fico sem grana pra arrumar ela.

As duas ficaram encarando a imagem da moto por alguns segundos, quando Alex iria dizer mais alguma coisa a porta do quarto se abre.

– Oi filha, só vim avisar que seu pai……… Nossa. Não sabia que tínhamos visita – comentou a senhora que aparentava ter em torno de 50 anos, ela vestia um terninho feminino com uma saia justa e parecia muito elegante, tinha os mesmos cabelos castanhos meio ondulados de Alex.

– Oi mãe – disse a guitarrista – Não te ouvi chegar. Essa é a Erika – apesentou Alex com um tom desconfortável.

– Boa tarde, senhora Lancaster – cumprimentou Erika com um sorriso sem jeito, ela já tinha se afastado um pouco de Alex quando a senhora abriu a porta.

– Então essa é a Erika – falou a mãe da guitarrista – Sou Carmen, é um prazer. Querem alguma coisa? Posso fazer algo pra vocês comerem.

– Não, muito obrigada. Alex trouxe algumas coisas agora a pouco e nós comemos – agradeceu Erika com um sorriso.

– Gostei dela Alex – falou a Senhora Lancaster sorrindo para a filha que arregalou os olhos – É muito mais educada do que os seus outros amigos.

– Mãe! – falou Alex ficando envergonhada e rolando os olhos.

– Ok, ok. Vou deixar vocês conversando – riu a senhora fechando a porta.

– Não acredito nisso – sussurrou Alex envergonhada .

– Tudo bem – Erika ria um pouco da cena – Sua mãe parece ser uma senhora legal. Bem, acho que eu já vou então – a morena mudou de assunto e se levantou indo até o tênis para calçá-los de novo.

– Mas já?? – perguntou Alex levantando também e largando o notebook no chão – É cedo ainda. Porque não fica mais um pouco?

– Porque são quase 18h – riu Erika – E eu vou voltar a pé pra casa, na verdade vou aproveitar a distância e correr um pouco.

– Ah… – Alex não sabia o que mais dizer para fazer a morena ficar – Eu…levo você até a porta então – ela disse suspirando.

– Quando vai ser o próximo show de vocês? – perguntou Erika amarrando os cadarços.

– Daqui 4 ou 5 dias, ainda não tá decidido oficialmente. Você vai?? – perguntou ela esperançosa.

– Claro que vou. Voltei a treinar, mas o Michael já disse que tenho que me distrair mais. Segundo ele eu ando pegando pesado demais nos treinos.

– Hmm…Isso é bom. Quero dizer….treinar demais pode não te fazer bem – falou Alex vendo que a morena já se levantava.

– Exatamente. Ele acha que foi por excesso de treino que eu não me sai tão bem assim na luta contra a Houfman.

– Mas….você venceu – falou Alex sem entender nada.

– O UFC trabalha com números sabe, como eu só tenho uma luta meus números estão altos, mas não autos o bastante pra que eu chame a atenção deles. Isso porque eu não fui assim tão bem contra ela. Michael acha que por eu ter treinado muito não consegui manter um bom ritmo na luta. Agora eu tenho apenas que manter uma rotina e estou proibida de tentar baixar o peso – ela disse rindo um pouco.

– Já sabe quando vai ter uma próxima luta? – perguntou a menor enquanto guiava o caminho pela escada.

– Ainda não, em um mês ou dois talvez. Não é bom que eu fique muito tempo parada, ainda mais depois de ter vencido a primeira luta – respondeu a morena calmamente, ela não parecia ter pressa em descer os degraus – E o Michael tá querendo organizar um torneio entre academias…..algo maior que só lutas isoladas. O que pode atrair um pouco a atenção pros bons lutadores. Mas ele está esperando o Frederick chegar num nível mais perto do meu pra começar isso.

– Entendo – elas tinham chegado na porta – Quando a gente pode se ver de novo?? – perguntou a guitarrista abrindo a porta – Posso ir na academia ou…..você vir aqui fica meio longe…

– Alex – falou a morena com um sorriso gentil – Você tem trabalho pra fazer lembra? Suas musicas. Porque não pensa um pouco nisso?

– Tô pensando – falou ela rindo baixo – Tô pensando.

– Se puder passar lá na academia eu não me importo – disse a maior dando de ombros – Estou com horas de treino reduzidas ainda. Tô com muito tempo livre.

– Feito – respondeu a menor sorrindo mais animada – Até amanhã.

– Até – falou Erika sorrindo de volta e saindo pela porta.

Logo que chegou na rua a morena respirou fundo e começou uma lenta corrida que logo depois seria mais rápida. A guitarrista ficou na porta olhando-a correr até ela desaparecer por uma esquina.



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