Nightingale

– Você deveria escrever músicas pra você cantar e cantá-las nos shows da Horizons – falou a voz de Erika fazendo Alex e Melissa encararem-na por ela ser a primeira a falar – A sua voz é linda – disse a morena desviando os olhos da guitarrista e parecendo desconfortável.

– A Horizons sempre foi a Tiffy cantando – falou Alex encarando o rosto de Erika a procura de algum sinal.

– Talvez seja a hora de não ser mais só ela – respondeu Erika encarando a menor por segundos antes de se levantar – Bem, eu tenho que voltar a treinar.

– Ah….eu – Melissa começou a falar sem saber o que fazer depois daquilo tudo.

– Posso ficar por aqui? – pediu Alex quando a morena já estava de pé.

– Anh…Claro – respondeu Erika – Pode sim…mas…eu só volto pra cá lá pelas 17h – avisou ela.

– Tudo bem – respondeu Alex com um pequeno sorriso.

Melissa desistiu de tentar dizer algo e esperou Erika sair. Quando ouviram a porta da frente ser fechada as duas garotas se encararam. Alex suspirou e deixou o violão ao seu lado enquanto simplesmente tirava os sapatos e deitava de bruços no colchão parecendo exausta. Melissa a encarou com uma sobrancelha erguida quando viu ela respirar fundo.

– Alex…..acho que essa não foi uma boa escolha de música pra você cantar pra ela – avisou Melissa com uma expressão confusa.

– Foi a musica perfeita – disse a guitarrista suspirando e se deitando de costas – Tinha muito do que eu queria dizer – ela completou com outro suspiro – O que é que você veio fazer aqui??

– Perguntar pra Erika o que aconteceu ontem quando ela foi ver você – respondeu Melissa.

– Mas ela não ligou pra você?? – quis saber a guitarrista curiosa.

– Ela me perguntou das suas cagadas, mas quando eu ia perguntar algo ela simplesmente desligou na minha cara – falou a garota suspirando cansada – Eu vou indo, tenho que ir pra minha aula daqui a pouco. Vai mesmo ficar aqui??

– Vou – respondeu Alex com um sorriso.

Assim que Melissa saiu a menor virou de novo e, chutando os sapatos para longe, subiu no colchão até estar com o rosto contra os travesseiros da morena. Alex tinha sentido muito a falta daquele cheiro de lavanda.

—-xxx—-

Fazia quase dois meses que Alex e Erika haviam voltado à “amizade”. A guitarrista ainda soltava indiretas as vezes, ainda fazia elogios e era gentil, mas no fundo o clima entre as duas era sempre o de velhas amigas. Alex passou a ir para a casa de Erika todas as tardes, para a morena ela dizia que era pra fugir dos amigos querendo ajudar e só atrapalhando. A verdade era que a menor adorava ficar no quarto de Erika e poder sentir o cheiro da morena sem se preocupar muito com o resto do mundo.

Era fato também que ali Alex conseguia pensar melhor e criar de uma forma mais fácil; afinal, ela tinha muita inspiração ali. Tanta que a guitarrista perdeu a conta de quantas musicas começou escrevendo para a banda e teve que fazer apenas de letra pra ela mesma quando o rumo daquilo ficava romântico demais. Essas eram letras que ela guardava de todos e que acabavam numa pasta com as musicas que Alex escrevia para ela mesma cantar.

Quanto a Erika; bem, a lutadora ficava a cada dia mais estranha. Talvez a palavra certa fosse diferente. Ela entrava em qualquer brincadeira com Alex, algumas das quais envolviam provocações bem explicitas da guitarrista, mas Erika parecia ignorar o tom real que a menor colocava nessas ocasiões e levar tudo na brincadeira mesmo. Erika começou a ir aos shows e ficar no camarim com a banda antes e depois das apresentações. Ela e Melissa viviam andando pra cima e pra baixo com os garotos também e sempre ajudavam com os equipamentos.

A morena acabou ficando muito amiga de Jimmy, Ted e Anton; tanto que esse fato irritava certa loira vocalista. Mas a relação que Alex e Erika tinham era muito mais indicativa de uma grande amizade, ao menos era o que a morena demonstrava. Esse fato fez Tiffany tolerar a presença da lutadora, mesmo Alex deixando claro em suas pequenas ações que estava sim interessada na morena. Mas se alguém fosse realmente observador e prestasse atenção de uma forma muito direta, esse alguém conseguiria perceber os detalhes. Alguns gestos, toques e principalmente certos olhares não eram apenas vindos da guitarrista, a diferença é que Erika disfarçava isso muito melhor.

POV Alex

Eram pouco mais de 16h da tarde. Cheguei e Erika estava perto da porta da frente, pude vê-la fazendo flexões no momento em que fechei o portão de entrada. Dava pra notar ela com os fones, mas quando cheguei perto notei que ela na verdade falava com alguém.

– É, eu sei que já fazem dois meses e que nada disso que eu achei que aconteceria aconteceu – ela falava usando os fones, o celular estava logo abaixo dela – Eu não tenho certeza de que é isso mesmo o certo – cheguei perto e fiquei quieta, não queria atrapalhar a conversa dela, também tentei não prestar atenção as palavras de Erika, mas se eu não me concentrasse nisso eu começaria a olhar e prestar atenção no físico da morena e isso não era uma boa coisa a se fazer no momento, não depois de mais dois meses sem sequer beijar ninguém e de eu estar louca pra sentir o gosto do beijo dela de novo – Não Beth, eu não pretendo dizer nada pra ela ainda….talvez não diga nunca….Não sei o que devo fazer – ela admitiu com uma voz cansada e parou com o corpo no ar.

– Será que eu posso ajudar?? – acabei por perguntar por causa do tom que ela usou.

– Alex??? Ai Merda! – ela xingou quando olhou pra cima e se desequilibrou e caiu de cara no chão; a morena rolou para o lado ficando de costas com a mão na testa – Ai, eu te ligo depois Beth; é…eu sei…sua sem graça – disse ela ficando irritada com algo que a tal Beth tinha dito e encerrando a chamada e tirando os fones – Como foi que você entrou aqui???? A academia tá fechada – ela disse me encarando ainda deitada no chão.

Aquela barriga definida e aquele top marrom não ajudavam na minha concentração então eu desviei o olhar pro portão.

– Michael tava saindo, tinha vindo pegar uns documentos, sei lá. Encontrei ele no portão e ele me deixou entrar – expliquei voltando a olhar pra ela que estava se levantando.

– Deve ser algo pra acertar a minha próxima luta – falou ela já de pé e parada a minha frente limpando a terra da barriga e costas, tive que disfarçar o quase suspiro que quis sair pelos meus lábios ao ver aquela cena.

– Quando vai ser?? – perguntei desviando minha atenção – Já tá com alguma previsão disso??

– Depois do 4 de julho – ela disse séria e se virando pra entrar; não precisei de convite pra ir junto.

– Isso é só daqui a duas semanas! – falei surpresa.

– É, eu sei – ela falou indo pro quarto e eu fui junto – Ele já tinha me deixado meio que avisada de que poderia conseguir algo pra essa época, então eu to no peso certo, apenas umas gramas a mais que são fáceis de perder. E meu treino tá em dia, só preciso agora saber contra quem vai ser pra me preparar bem – ela falou pegando uma toalha limpa enquanto eu deitei na cama depois de tirar os sapatos, eu amava poder deitar ali sem ela suspeitar do motivo.

– Hmmm, espero que seja depois do dia 6 – eu disse com um suspiro forçado de preocupação, a preocupação era real porque eu queria que ela fosse ver meu show no dia 6, mas o suspiro foi só pra poder sentir o cheiro dela que vinha das cobertas e travesseiros.

– Provavelmente do dia 7 ou 8 pra frente – ela disse sorrindo pra mim e entrando no banheiro com uma muda de roupas na mão.

Quando a porta se fechou eu abracei os travesseiros colocando meu rosto bem enterrado neles e respirando fundo. Eu não poderia sentir o cheiro dela de outra forma e isso era tudo o que eu vinha tendo nos últimos dois meses. Ouvi o som do chuveiro sendo ligado e me deitei de costas pensando na conversa que tinha tido com meus amigos Ted e Jimmy a algumas horas atrás.

~Flashback on~

– O que é isso?? – perguntei confusa olhando o papel que Jimmy tinha jogado no meu colo.

– É uma adaptação pra um cover – falou Jimmy me encarando com um olhar sério.

– Desista, a Tiffy nunca vai cantar isso – falei olhando as musicas e as notas que ele tinha proposto.

– Não é pra Tiffy cantar – falou o Ted sentando no chão junto comigo – É pra você.

– Cês tão de palhaçada neh? – falei rindo, eles sabiam que eu não cantava; eu não cantava nem de brincadeira sequer nos ensaios, fazer um cover no show era definitivamente absurdo.

– O Ted me disse que aquela pasta de musicas que você só escreve e guarda começou a crescer mais rápido do que o normal – falou o Jimmy se ajoelhando na minha frente – É por causa dela que eu sei. Então eu decidi te ajudar. Canta isso, e canta pra ela.

– Você tá doido – falei fazendo uma expressão séria – Eu não posso fazer isso. Primeiro porque eu não sou a cantora dessa banda, e segundo porque….Jimmy, ser mais direta que isso só se eu gritasse que to apaixonada por ela no meio do show. Eu não posso fazer isso, eu….Erika ficou uma semana sem falar comigo quando eu….perdi o controle e beijei ela. Se eu cantar isso….só Deus sabe quanto tempo ela vai me afastar.

– Ela não vai te afastar – garantiu meu amigo, os olhos castanhos do Jimmy pareciam tão certos do que estava me dizendo que eu quase acreditei, quase.

– É claro que vai – disse suspirando e desviando o olhar do Jimmy – Eu tenho que conquista-la devagar, se eu apressar as coisas de novo pode ser que eu a perca pra sempre e eu não posso arriscar.

– Você já a conquistou sua idiota – falou Jimmy rindo e sentando na minha frente – Ted é meio tapado e não percebeu porque nem sabia o que olhar, mas eu e a Melissa já notamos. Vocês se olham Alex, e o olhar dela pra você, quando ela acha que ninguém está prestando atenção nela, não é o olhar de uma amiga.

– Você não pode afirmar isso – eu falei já me irritando com aquela conversa.

– Então vamos apostar algo – sugeriu Ted com um sorriso nos lábios e os olhos verdes brilhando com alguma ideia idiota que ele tinha tido.

– Retardado – falei rolando os olhos pra sugestão dele, mas Jimmy sorriu de um jeito que não deveria – Qualé Jim; a gente sempre rejeita as ideias do nosso amigo idiota – falei e Ted me deu uma cotovelada amigável, ou nem tanto.

– Dessa vez a ideia idiota dele não foi tão idiota – falou Jimmy bagunçando os cabelos pretos do Ted, que já estavam na hora de serem cortados eu diria – Vamos apostar Alex. Da próxima vez que você for na casa dela você faz um teste. Se eu estiver certo de como a Erika vai reagir você perde e então vai ter que cantar isso no nosso show do dia 6.

– Ai cara…..vocês não vão me deixar fugir disso não é? – perguntei vendo a expressão séria e decidida dos dois.

– Se você está certa de que eu estou errado não vai ter problema nenhum pra você fazer o que eu vou sugerir – ele disse dando de ombros, quando eu não respondi Jimmy continuou – Da próxima vez que for lá ver ela, peça pra passar a noite ou sei lá. O que eu quero que faça é o seguinte: você vai deitar em um lugar em que, quando ela tiver que deitar tenha que deitar perto de você. Finja que já dormiu e espere pra ver o que ela vai fazer.

– O que você acha que ela vai fazer? – eu perguntei rindo da ideia maluca.

– Se você fingir direito eu acho que ela vai ficar um tempo te encarando, então vai mexer no seu cabelo, afastar alguma mecha se ela estiver no seu rosto. E acho que ela vai beijar você, um beijo no rosto ou na testa, antes de sussurrar algo.

– Uma amiga cuidadosa poderia fazer isso – eu retruquei estreitando os olhos e fazendo cara de tédio.

Jimmy riu e se aproximou de mim beijando minha testa, foi rápido ele logo sentou de novo no mesmo lugar.

– Isso é o tipo de beijo que um amigo dá no outro. Eu duvido que ela vá fazer assim – ele me disse sorrindo confiante.

– Como acha que ela vai fazer?? – perguntei cética.

– Diferente, provavelmente mais demorado; você vai notar a diferença – ele disse rindo da minha expressão.

~Flashback off~

Eu não tive escolha além de aceitar a aposta. Não era raro eu vir com uma muda de roupas numa mochila pra dormir aqui, mas vim pra cá hoje exatamente pra isso, pra provar que eles estavam errados. Fiquei tanto tempo pensando nisso que Erika saiu do banheiro.