Nightingale

Capítulo 32 – Encenação

Por algum milagre Alex conseguiu ser a primeira a acordar. Era cedo, por volta das 5h50, quando a guitarrista abriu os olhos e bocejou. Olhando para o lado ela viu Erika; a morena dormia tranquilamente com a cabeça perto de Alex e uma mão sobre a barriga da menor. Aquilo fez Alex sorrir, de uma forma ou outra sempre que elas dormiam juntas e Alex conseguia acordar primeiro elas estavam se tocando. Toda vez, sem exceção, durante o sono elas acabavam abraçadas ou muito próximas.

Então a mente de Alex acordou de verdade e ela lembrou da noite anterior, isso fez um sorriso surgir nos lábios da guitarrista. Ela queria poder acordar Erika com beijos, mas resolveu que ainda não era hora e apenas decidiu fazer uma surpresa. Com cuidado ela retirou a mão da outra de cima de si e se sentou na cama. Depois de afastar alguns fios pretos que caiam sobre o rosto da morena, Alex sorriu e se levantou.

~50 minutos depois~

Erika acordou sentindo falta de alguma coisa, ela rolou na cama esticando os braços antes de se lembrar que Alex deveria estar ali. Mas quando a morena abriu os olhos não viu a guitarrista deitada ao seu lado. A morena se sentou na cama olhando em volta e não viu nada, até que ela respirou fundo e sentiu o cheiro de café. Estranhando aquilo Erika se levantou e caminhou coçando a cabeça até a porta do quarto. Chegando lá o que Erika viu foi Alex trazendo uma garrafa de suco, que parecia ser uva, pra pequena mesa que já estava cheia de comida.

– Ok….acho que acordei dentro de outro sonho – falou a morena esfregando os olhos e olhando de novo – Essa definitivamente não é a minha cozinha.

– Idiota – falou Alex rindo da cara de sono que a outra fazia – Eu fiz café da manhã. O que é que tem de mais nisso????

– Simples: é você e você sempre acorda com sono, o que significa que mesmo quando acorda antes de mim você só volta a dormir – falou a lutadora bocejando – Sério, teve insônia hoje é??

– Não – respondeu Alex com um sorriso – Só acordei mais cedo e resolvi que faria algo pra agradar você – ela disse dando de ombros – Mas se não quiser tudo bem, volta a dormir que eu como isso tudo sozinha.

– Tô achando é que você fez isso tudo é pra você mesma e não pra mim – falou a lutadora rindo.

– Ah, vai logo lavar essa cara – falou Alex rindo junto – Antes que eu resolva mesmo comer tudo sozinha.

Logo depois as duas se sentaram pra comer o que Alex havia feito. Eram coisas simples: pão com queijo, algumas torradas com manteiga, frutas descascadas e cortadas, o suco para Erika e o café que a guitarrista havia feito para ela mesma. As duas comeram e conversaram calmamente sobre o que fariam naquele dia. Ficou decidido que elas iriam até a casa da guitarrista para que Alex pudesse tomar banho e se trocar, além de deixar as coisas dela lá, como a mochila e o violão. Só depois as duas seguiriam para o ferro-velho na saída da cidade.

Depois do café, como ainda era cedo, as duas resolveram jogar alguns dos jogos que Erika tinha. Ficaram nisso até perto das 10h da manhã quando a morena resolveu ir tomar um banho. Enquanto ela separava uma roupa para usar Alex pegou o violão para tocar algo enquanto esperava a morena tomar estava no banheiro.

Do banheiro Erika conseguia ouvir perfeitamente as notas e a canção cantada em voz baixa por Alex. Depois do banho a morena vestiu um jeans azul escuro e pegou de uma caixa atrás do guarda-roupa um velho coturno preto. Ela colocou também uma regata branca e pegou um casaco de malha preto colocando-o por cima. Era um visual que Alex nunca tinha visto-a usar.

As duas foram no carro da lutadora até a casa da guitarrista onde Alex tomou seu banho e vestiu um jeans rasgado nas coxas, um all star azul claro e uma camisa xadrez verde que ficou com os dois últimos botões abertos. De lá as duas seguiram para a saída sul da cidade, no caminho acertaram que Alex chegaria a pé e que Erika iria aparecer de carro uns 50 minutos depois. No caminho elas também acertaram quanto a encenação que fariam.

Passava um pouco das 11 horas da manhã quando as duas pararam numa esquina a mais de 8 quadras do ferro-velho. Alex respirou fundo e desceu do carro acenando para Erika antes de se afastar do carro. A lutadora ficou de olho na menor até ela entrar no lugar. Erika então começou a contar os minutos. Passados os 50 minutos ela ligou o carro outra vez e dirigiu pra lá.

– Vamos lá – dizia Alex para o senhor de uns 40 anos que usava um jeans sujo e uma camisa de mangas curtas que era para ser branca, mas já estava toda encardida – Ela não vale tudo isso. Precisa arrumar a pintura, e o motor precisa de peças novas. Eu vou ter que gastar quase um terço do que você já está pedindo pra arrumar ela depois. Por mais rara que seja a moto não vale tudo isso.

– Olha garota, você vem aqui a meses e nunca quer pagar o preço – falou o senhor com sua voz anasalada e ficando um tanto irritado – Eu já até tenho um rapaz interessado nela, ele sim quer a moto porque já me garantiu que em algum tempo vai ter o dinheiro que eu estou pedindo. Se você não quer pagar isso então vá achar outra moto pra você.

Alex ficou sem saber o que falar e torcendo para Erika aparecer logo. O homem já ia saindo de perto de Alex e da moto quando um carro apareceu na entrada do lugar. O dono do ferro-velho parou encarando o veículo que entrava numa velocidade mínima. Dava para notar o motorista olhando em volta como se procura-se algo. Então o carro parou em frente ao homem, o motorista se inclinou para o lado do passageiro onde o homem estava parado.

Era a morena, com o capuz do casaco sobre a cabeça e usando um óculos ray-ban estilo aviador com as lentes num tom marrom. Ela encarou o homem e abaixou um pouco os óculos.

– Será que poderia me indicar onde está o dono do lugar? – perguntou ela ao homem.

– Eu sou o dono – falou ele curioso.

– Ótimo – ela respondeu desligando o carro e descendo, fechou a porta e tirou os óculos pendurando-os na frente da regata branca e tirando o capuz deixando a mostra os cabelos pretos, depois de dar a volta no carro ela para em frente ao homem, Alex assistia a cena de longe – Soube que você tem uma Harley Davidson 1970 a venda e quero dar uma olhada nela. Meu patrão coleciona essas coisas antigas e essa é uma das que ele ainda não tem.

– Ah…Nossa – falou o cara encarando Erika em dúvida, a morena ergueu uma sobrancelha e colocou as mãos na cintura.

– Tá achando que eu não entendo dessas coisas não é – ela riu de um jeito sem humor – Achei esse Dodge a umas semanas – ela apontou pro carro – Fechei o negócio com o antigo dono ontem. Esse é um Dodge Challenger 1970, com alguns ajustes no motor e algumas mudanças na mecânica, ele também vai precisar algumas alterações como mudar pra injeção eletrônica e algumas adaptações da parte elétrica fazemos ele ficar novinho em folha, e é um clássico. Agora será que eu posso ou não ver a tal moto??? – ela perguntou com uma expressão entediada.

– Ali atrás – falou o homem sem saber como reagir com o jeito dela falar.

Erika pegou de novo os óculos e os colocou enquanto caminhava na direção de onde estavam a moto e Alex. A morena passa pela guitarrista como se nem tivesse a notado ali e caminha direto para a moto que estava numa cobertura que parecia um pequeno galpão. Chegando lá Erika se ajoelha ao lado da motocicleta e começa a olhar o motor, colocar a mão em alguns lugares. Ela realmente parecia estar avaliando a moto. Quando terminou a morena se ergueu e limpou a terra dos joelhos.

– E então, quanto está pedindo por ela? – perguntou ao homem que tinha voltado para perto da moto, Alex estava um pouco afastada dos dois, quando ele disse a quantia Erika ficou calada, os óculos escuros escondendo o olhar dela – Você tá brincando comigo não está? – perguntou por fim a morena tirando de novo os óculos.

– Não, é o preço dela – falou o cara fazendo uma expressão séria.

– Deixa eu adivinhar – falou ela dando uma risada sem humor e fazendo uma expressão séria e um tanto irritada – Você resolveu procurar na internet, alguém te disse que era o preço por uma dessas e você resolveu que era o que iria cobrar, tô certa? – ela pergunta chegando perto do homem que a encara sem reação – Só que deixa eu te dizer uma coisa meu amigo. No estado em que essa moto está ela não vale tudo isso nem ferrando!

– Claro que vale! – se irritou o cara – É uma raridade e tem valor sentimental – falou ele encarando Erika.

– O caralho que tem – ela respondeu apontando o indicador da mão direita pra ele – Se tivesse você não tinha largado ela nesse lugar seu mentiroso. Se acha que vai ganhar dinheiro em cima de algum trouxa então boa sorte. Com esse preço você vai ficar com isso encalhado aqui nesse seu ferro-velho pro resto da sua vida – ela disse com uma expressão irritada que fez o cara se assustar.

– Não é pra tanto também – falou Alex se intrometendo – É mesmo uma raridade e…

– E se você é trouxa pode pagar o que ele quer – cortou Erika estreitando os olhos para a menor; mesmo sabendo que era encenação, com aquele visual e aquela atitude Alex realmente pensou que Erika poderia por alguém pra correr de medo – Eu pago 60% disso que você acha que vai conseguir com ela.

– Mas isso é muito pouco!! – falou o cara irritado.

– Olha cara…sinceramente eu não tô afim de barganhar hoje então dou 70%. É quase três quartos do que você  quer e olha que pelo trabalho que vai me dar eu ainda acho que não merece tudo isso – falou a morena estreitando os olhos.

– Não, ela vale mais do que isso – reclamou o homem e Erika riu.

– Ok – ela disse colocando os óculos e puxando de volta o capuz do casaco – Aqui é o meu contato – ela disse puxando um pedaço de papel e um pequeno lápis do bolso traseiro do jeans e escrevendo algo – Caso você não achar nenhum trouxa pra pagar isso aí que você tá pedindo pode entrar em contato comigo. Mas não demora, porque eu sei de outra dessas só a 30 horas de viagem daqui e vou ir vê-la ainda essa semana. Se eu pegar essa não vou mais querer a sua – disse ela dando a volta de novo no carro, entrando e ligando o motor.

Depois de dar ré e sair do ferro-velho Erika deu a volta em algumas ruas e voltou para o mesmo lugar onde Alex tinha descido. Ela apenas ficou ali esperando, quase meia depois ela pode ver a guitarrista sair do lugar. Quando chegou perto do carro Alex correu e vinha com um sorriso enorme no rosto o que fez Erika sorrir de volta, a morena já estava sem o capuz e sem os óculos.

– Eu não sei como você conseguiu, mas Erika você até que podia ser atriz!! – disse a guitarrista entrando no carro empolgada e pulando por sobre o banco até conseguir abraçar a maior pelo pescoço – Ele aceitou a minha proposta!!! Posso trazer o dinheiro em um ou dois dias e já levar a moto!!! Não acredito nisso!!!

– Calma ai, garota – riu Erika abraçando a guitarrista de volta – Vamos sair daqui pra não correr o risco de alguém ver você nesse carro e estragar tudo contando pro idiota – falou a lutadora se afastando da menor e ligando o motor; logo depois as duas já estavam bem longe voltando pra casa da guitarrista – Agora conta – pediu Erika interessada no assunto, mas sem desviar o olhar da rua a sua frente – O que aconteceu depois que eu sai??

– Ah, primeiro você tem que ter noção de que o cara quase se mijou de nervoso com você falando daquele jeito – disse Alex gargalhando no banco do passageiro – Nossa Erika eu não tinha ideia de que você podia mesmo ser assustadora assim. E onde foi que arrumou os óculos??? Deram um toque perfeito pro seu personagem.

– Eu já tinha, ficam no carro. Agora não me enrola e conta como foi que ele aceitou a sua proposta – falou a morena rindo da animação da outra.

– Bem, primeiro eu esperei um tempo. Ele ficou lá encarando a moto com cara de retardado – falou a menor se acalmando um pouco pra explicar a história – Então eu forcei um suspiro e ele me olhou. Daí eu disse que achava que você estava tentando ganhar vantagem em cima dele. Disse que o que ele pediu era muito, mas que você oferecer o que ofereceu era abuso. Daí ele me encarou e parecia puto da vida. Disse pra mim assim: “Se você ainda quer essa porcaria me trás o que você tinha dito que podia pagar até depois de amanhã e pode levar essa coisa daqui” – Alex disse imitando uma voz mais grossa e anasalada como a do cara – Vou pagar só 85% do que ele estava insistindo em pedir Erika!!!! Isso quer dizer que me sobra dinheiro pra começar a arrumar ela!!! Cara eu queria beijar você te tão feliz que eu estou!! – falou a menor e então as duas ficaram tensas com a declaração dela – É…..não foi bem isso o que eu quis dizer…..apesar de que..

– Eu entendi – cortou Erika ligando o rádio – Acho que tá na hora de te levar pra casa. E eu realmente queria ficar um tempo sozinha essa tarde se você não se importar.

– Se foi por causa do que eu disse – começou Alex, mas Erika a cortou de novo.

– Não Alex…..é só… – a morena suspirou – Porque não fazemos assim: eu fico ali com você na sua casa até umas 18 ou 19 horas, dai vou pra casa. Pode ser?

– Claro – respondeu a menor.

As duas acabaram ficando na casa da guitarrista até as 21h. Alex conseguiu distrair a morena e até fez o clima estranho por conta da ultima conversa desaparecer. Então as duas ficaram horas conversando sobre as musicas que Alex tinha feito para a banda e sobre os covers que os rapazes estavam querendo fazer nos próximos shows. No fim tudo ficou calmo entre elas de novo, mas Alex ainda estava cogitando o que fazer nas próximas duas semanas até o dia do show. Ela já tinha decidido que iria cantar o cover, só resolveu esperar o dia para contar aos outros.



Notas:



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