Nightingale

Capítulo 40 – Judith Anderson

Alex foi a primeira a acordar, primeiro por que ela tinha dormido algum tempo no avião, depois porque a posição em que ela se encontrava não era a melhor do mundo, ao menos não pra dormir. A morena estava abraçada a ela com o rosto no pescoço da guitarrista e com as pernas entrelaçadas nas dela. Já Alex estava deitada de costas com os braços envolvendo o corpo de Erika e a bochecha apoiada sobre a testa da maior. Não era a melhor posição pra dormir, mas pra Alex com toda certeza era a melhor pra acordar.

– Erika – chamou ela num sussurro enquanto trazia a mão para o rosto da morena afastando alguns fios que estavam sobre os olhos da outra – Acorda – ela disse beijando de leve a testa de Erika que lentamente abriu os olhos – Oi – falou Alex sorrindo quando a morena a olhou.

– Oi – respondeu ela numa voz rouca de sono e, com um suspiro, voltou a colocar o rosto no pescoço da guitarrista – Estamos em Oregon e não no Texas não é? – perguntou num tom cansado e Alex fez um som afirmativo – Temos que levantar – ela disse por fim se afastando da guitarrista que sentou na cama e abraçou a morena por trás já que a mesma já tinha colocado as pernas pra fora do colchão.

– Eu tô aqui com você – falou a menor beijando o lado direito do pescoço de Erika enquanto passava os braços em volta dela num abraço apertado.

– Sei que está e obrigada por isso – respondeu ela colocando as mãos sobre os braços de Alex.

– Desculpa interromper – falou Beth com a cabeça pra dentro – Se vocês quiserem um banho ou algo do tipo eu posso separar toalhas e…

– Não precisa – falou Alex com um pequeno sorriso soltando Erika depois de dar um beijo no rosto da morena – Vamos nos arrumar rápido e ir logo.

– É isso mesmo – concordou Erika ficando de pé e dando a volta na cama.

Em poucos minutos as duas estavam saindo do quarto. Erika com a mesma camisa de mangas compridas e capuz, mas com uma calça preta mais desbotada. Alex tinha colocado uma polo preta e por cima a jaqueta preta de couro. Erika vinha com os óculos escuros numa mão e a jaqueta de couro na outra. Elizabeth esperava as duas na cozinha com duas xícaras de café forte e dois sanduíches. Em minutos as duas tinham terminado.

Beth também estava com roupas pretas, um vestido na altura do joelho e um casaco fino, também preto, por cima. Quando as três iam saindo Alex olhou para trás e viu a jaqueta de Erika no encosto de uma das cadeiras em frente a bancada.

– Não vai levar ela? – perguntou Alex encarando o rosto de Erika, um dos olhos tinha uma marca mais roxa perto da sobrancelha.

– Era do meu irmão…minha mãe veria como algum desafio ou….não sei…só não quero arriscar – falou a morena suspirando e abrindo os óculos escuros que tinha nas mãos para coloca-lo.

Alex passou um braço em volta da cintura da morena e ela suspirou abraçando a guitarrista pelo pescoço. Logo as duas estavam novamente no banco traseiro do carro de Elizabeth. Dessa vez Erika não ficou sentada do lado oposto, a morena se deitou no banco deixando os pés na porta e colocando os ombros sobre o colo da menor que a abraçou calmamente.

– Alex….quando chegarmos lá eu…. – começou a maior, mas a guitarrista a interrompeu.

– Não se preocupe – ela falou sorrindo – Eu vou ficar mais afastada; estou aqui pra cuidar de você e não pra piorar ainda mais a situação das coisas com a sua mãe.

– Não era o que eu iria falar – comentou Erika rindo calmamente.

– Ah não ?? – perguntou a menor confusa; ela entendia perfeitamente que Erika precisava lidar com a mãe de uma forma pacifica, e se a Sra. Anderson já não aprovava que a filha fosse uma lutadora pedir para ela aprovar que a única filha estivesse com outra mulher não seria algo muito pacifico na opinião da guitarrista.

– Não – falou Erika já imaginando os porquês de Alex ter dito aquilo; a maior então entrelaçou os dedos das duas e encarou as mãos delas com um suspiro – A minha situação com você e a minha situação com a minha mãe agora….são assuntos a serem tratados em horas diferentes; nisso eu concordo. Mas eu não quero você longe hoje…..Eu acho que as coisas não serão nada fáceis com a minha mãe e….eu vou precisar de você – a morena olhou pra cima, para o rosto de Alex que a encarava de volta com um olhar sério – Não me deixa fazer besteira….nem….algo do qual eu possa me arrepender depois, tá?…..E…Principalmente….não me deixa fraquejar quando eu estiver frente a frente com a minha mãe.

Alex não respondeu com palavras, ela apenas apertou Erika em seus braços e a morena sabia que ela faria tudo aquilo que fosse preciso. No banco da frente Beth tinha um sorriso feliz por ver que Erika finalmente tinha alguém em quem confiar de novo. Mas o sorriso logo sumiu quando elas se aproximaram da pequena capela ao lado do cemitério da cidade. O que viria a seguir definitivamente não seria fácil para Erika.

As três entraram juntas, com a morena no meio e Alex segurando em sua mão direita; ao lado esquerdo dela Elizabeth segurou a outra mão da lutadora por saber que não era a hora de Erika ter que explicar sobre Alex. As tres entraram no lugar, havia um número até pequeno de pessoas, talvez umas 30 no máximo. Erika ignorou todos eles e soltou as mãos das duas indo na direção do caixão de madeira escura. Ela parou na ponta, olhando pra dentro do caixão, a tampa superior estava aberta e ela pode ver o rosto de seu pai.

Ela não o via a quase 6 anos e ali estava ele, deitado, pálido, imóvel. Erika tirou os óculos escuros pendurando-os na camisa e ficou encarando seu pai com uma expressão de dor no rosto. Alex e Beth se aproximaram da morena parando um pouco atrás e foi quando as coisas começaram a desandar. A mãe de Erika, que estava sentada numa cadeira perto do corpo do marido viu Erika parada ali, se levantou com uma expressão de fúria e foi na direção da morena. Antes que qualquer um pudesse fazer algo a Sra. Anderson acertou um forte tapa no rosto da lutadora que ficou sem reação.

– O que acha que está fazendo aqui??? Vá embora! Você não tem o direito de estar aqui!!! – gritava a senhora com uma fúria tremenda; Alex tentou entrar no meio das duas, mas Erika impediu isso colocando um braço a frente da guitarrista.

– É o meu pai – disse ela de cabeça baixa – A senhora não pode me impedir de me despedir dele.

– Olha só pra você – falou a mãe de Erika num tom baixo, mas tão furioso quanto antes – Esse rosto marcado, essas roupas velhas….você não pertence mais a essa família – ela falou encarando Erika de cima a baixo – Não sei como pode ter coragem de aparecer aqui de novo….A culpa disso é toda sua. Se você fosse o que pedimos que fosse quando precisamos nada disso teria acontecido. Meu marido não teria tido que ir atrás daqueles animais e ele estaria bem e comigo agora.

Alex estava morrendo de raiva da mulher, mas não queria falar ou fazer algo que Erika pudesse não gostar então ela continuava se mantendo quieta. Então a senhora se virou pronta pra sair acreditando que depois daquilo Erika iria embora.

– Não foi minha culpa – falou a voz da morena num tom mais firme do que se poderia esperar, ela ergueu o rosto encarando a mãe com um olhar calmo, no canto esquerdo da boca uma marca mais vermelha deixada por um dos anéis que Judith Anderson usava nas mãos.

– Não se atreva a usar desculpas – falou a mãe de Erika se virando com uma expressão ainda mais irada – É mais do que óbvio que…

– Que a senhora está querendo descontar em mim a raiva que sente do mundo todo – falou Erika cortando a mãe, Alex segurou o braço da morena como se tentando fazê-la se controlar, mas Erika parecia calma.

Já a mãe dela parecia ainda mais furiosa. A mulher voltou parando em frente de Erika e encarando a garota com um olhar desafiador mesmo tendo que olhar para cima porque a morena era uns 10 cm maior.

– Vá embora daqui – sussurrou ela como uma clara ordem.

– Porque? Não quer expor nosso pequeno drama familiar ao resto dos amigos da família? – perguntou Erika estreitando os olhos – Culpe a quem quiser. Mas a senhora sabe, assim como eu, que ele teria ido atrás daqueles cavalos de qualquer jeito. Acha mesmo que se eu tivesse casado com um dos “partidos” que você arrumou pra mim naquela época algo hoje teria sido diferente????? Travis, Jorge, Louis….são três patetas. Nem no inferno o pai deixaria algo nas mãos deles.

– Como você tem coragem de falar assim de….

– Deles? Ou da suas escolhas? – perguntou Erika cortando a mãe outra vez – Você aceitaria deixar tudo nas mãos de um deles pra que não ficasse nas minhas não é, mãe?? Me odeia a esse ponto por eu nunca ter sido a menininha obediente e bonitinha que a senhora queria que eu fosse – falou a morena com um tom magoado, mas depois sua expressão ficou séria – Você me proibiu de voltar pra casa….mas eu sempre soube que o pai só era cabeça dura demais pra voltar atrás; porque ele sempre achou que quando eu quebra-se a cara no mundo eu voltaria pedindo ajuda. Eu uso roupas velhas porque são o que eu posso comprar. Eu moro num cubículo porque é onde dá pra viver. Eu tenho marcas porque é o meu trabalho. E, SIM, mãe. É o meu trabalho – falou ela encarando a mãe com um olhar de desafio – Eu nunca voltei por um centavo de vocês; e a senhora não tem noção do quanto eu precise deles em diversas situações. Eu passei por coisas que você nunca imaginou passar, mesmo nos seus tempos difíceis. Acha que eu não sofri quando o Phill se foi??? Ele era tudo pra mim também! Mas eu nunca fui nada pra vocês….e quando meu irmão morreu eu me tornei só uma moeda de troca. Mas agora não mais. Eu pago as minhas contas, eu ponho comida na minha mesa, eu sobrevivo com o meu próprio suor. Você não pode mandar em mim agora, mãe. O homem deitado ali…o Seu marido…é o Meu Pai também. E eu o amava, apesar de tudo. Assim como amo você, apesar de tudo também. Mas eu não obedeço mais a senhora. Eu vou acompanhar o resto do funeral do meu pai e sinto muito que isso a incomode. Se continua a me odiar a ponto de me culpar por isso, então culpe se isso a fizer se sentir melhor. Mas eu não vou embora antes de ver os últimos instantes dele sobre a terra.

Judith iria dizer mais alguma coisa, ela abriu e fechou a boca várias vezes como se procurando as palavras. E a cada segundo sua fúria parecia aumentar. Quando ela pareceu ter achado o que dizer Alex decidiu que já bastava de palavras duras para a sua morena que não tinha culpa de nada e entrou no meio das duas ficando de frente para Erika e ignorando a mãe da morena.

– Chega – ela falou encarando a morena que olhou diretamente nos olhos dela – Vamos lá pra fora um pouco, você precisa respirar fundo. Depois a gente volta – Erika concordou com a cabeça e Alex se virou para Judith que a encarava com um olhar confuso, a guitarrista queria muito, mas não criticou a mãe da morena, apenas encarou os olhos da mulher, eram olhos azuis muito mais claros do que os da lutadora, e o cabelo loiro preso num coque bem feito dava um ar de seriedade à senhora.

A guitarrista apenas empurrou Erika pra longe da mãe a guiando para o lado de fora, ninguém no lugar dizia nada; Beth acompanhou as duas. Do lado de fora havia um banco e Alex vez a morena se sentar nele, sentando ao lado dela logo depois. Beth se sentou do outro lado e Erika se inclinou deixando a cabeça ficar apoiada no ombro da guitarrista que segurou as mãos dela entrelaçando os dedos das duas. Depois de um tempo as três voltaram para dentro da capela, Erika chegou perto do caixão ignorando o olhar raivoso que a mãe lançava à ela.

Perto do meio dia alguns homens, os amigos de pai dela e alguns outros conhecidos se aproximaram para pegar o caixão e leva-lo até o lugar onde seria sepultado. Erika sem dizer palavra nenhuma palavra fez um deles sair e tomou o lugar de um rapaz que pareceu não se importar em ceder isso a ela. Erika ajudou a carregar o caixão até o lugar, depois ele foi posicionado para ser descido até o fundo da sepultura. Quando jogaram a primeira porção de terra sobre a tampa a morena fechou os olhos, sussurrou algo e então segurou a mão de Alex se virando e saindo de lá. Beth olhou mais um segundo para o buraco antes de seguir as duas. A Sra. Anderson apenas chorava em silencio do outro lado da sepultura.

Erika caminhou para uma lápide a alguns metros de distância, um lugar que Beth conhecia muito bem, mas não achava que a morena ainda se lembrava tão perfeitamente de onde ficava. Havia um pequeno vaso de flores, ainda vivas, deixado ao lado da lápide. Erika se ajoelhou e Alex ficou parada ao lado dela, a guitarrista pode ver a foto de um rapaz loiro com um sorriso calmo e os mesmos olhos azuis escuros da sua morena. Na lápide estava escrito: “Phillip Anderson; amado filho. Que descanse em paz”.

A guitarrista colocou uma mão sobre o ombro direito da morena num aperto leve e Erika levou a mão direita até coloca-la sobre a mão de Alex. Depois de alguns segundos de olhos fechados e sussurrando algo a morena se levantou e, segurando a mão de Alex outra vez, rumou para fora do cemitério com Elizabeth logo ao lado delas. As três foram para a casa de Beth de novo e, assim que entraram, Erika foi direto para o quarto. Alex estava indo atrás dela quando a dona da casa a segurou pelo braço.

– Essa é a chave da casa, eu tenho outra, tranque a porta quando eu sair – falou a mulher com um sorriso calmo colocando um molho de chaves na mão da guitarrista – Eu vou atrás de alguns fornecedores meus….vou ficar o resto do dia fora. Faça ela comer algo mais tarde e…..

– E o que? – perguntou Alex quando a outra suspirou.

Elizabeth deu um passo a frente abraçando a guitarrista que correspondeu de uma forma meio desajeitada.

– Obrigada por ter aparecido na vida dela – disse Beth num tom agradecido – Deus sabe o quando eu tentei ajudar, mas a Erika não é o tipo que se abre com qualquer um – continuou ela se afastando de Alex – Olha Alex, ela é complicada…..difícil de se lidar….e……E ela vai ter dificuldade em dizer o que exatamente sente, mas saiba que eu tenho certeza de que o que ela sente por você não é pequeno.

– Eu…sinto que sei – respondeu a guitarrista com um pequeno sorriso – Bate a insegurança as vezes, mas…..eu amo ela e não vou desistir fácil.

– Que bom que não vai – sorriu Elizabeth se afastando e saindo.

Alex logo trancou a porta e foi para o quarto tirando a jaqueta.


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