Nosso Estranho Amor

13. A decepção vem de família

Eu namorei com a Pietra por cinco anos, meu namoro mais longo, e conturbado também, com o desfecho da nossa relação era para ter aprendido a não meter mais os pés pelas mãos, e ir mais devagar com a Ágatha, seria o melhor para nós duas, mas quem disse que conseguíamos fazer isso? Nosso namoro estava só engatinhando, mas cada dia permanecia mais intenso, era muito comum eu dormir na casa dela várias vezes por semana, meus sogrinhos permitiam minha estadia por lá, em momentos raros a minha namorada dormia no meu apartamento.

Se por um lado o meu namoro com aquela ruivinha maravilhosa e gostosa era praticamente perfeito, um sonho do qual não queria acordar, por outro lado o meu convívio com o Renan ia de mal a pior, estávamos mais distantes. Inicialmente achava que era coisa da minha cabeça o fato de que ele não ia com a cara da Ágatha, pensava que eram ciúmes bobos, mas com o passar do tempo tive ainda mais certeza, o próprio Renan não escondia mais esse fato, a minha namorada não era burra, ela também percebia o quanto meu irmão era sarcástico com ela e adorava jogar alfinetadas.

Em uma quinta-feira qualquer, era meu aniversário e estava de folga, então combinei de ir passear com a minha namorada para o desagrado do meu irmão.

–Giovanna, você não se cansa da companhia dessa mulher? É seu aniversário e tá querendo dizer que não vai estar comigo? Desde que esse namoro iniciou nunca mais tivemos um tempo de irmãos, na verdade nem te vejo mais, você só faz questão de ficar com essa mulher todos os dias e até nas suas folgas. A cada dez palavras suas, nove fazem referência a Ágatha. –meu irmão comentava indignado quando soube que não iria lhe acompanhar na trilha do parque zoobotanico onde a Rebeca era bióloga.

–Maninho, nem vem torrar minha paciência. No seu inicio de namoro você também não desgrudava da Rebeca um só instante e eu nunca reclamei, sempre respeitei o seu espaço. –disse na esportiva, implorando mentalmente para que esse assunto não rendesse uma discussão.

–Só que as coisas eram diferentes entre nós, precisávamos nos conhecer bem…

–E por que o seu caso é diferente do meu namoro com a Ágatha? Precisamos nos conhecer melhor e muito. –conhecia o Renan, torcia para que esse “diferente” não tocasse no assunto no qual estava pensando.

–Eu sou homem, não sabia lidar com as crises de TPM dela, fora outros assuntos que eu não tenho domínio por não saber lidar com mentes femininas. –o meu irmão estava dando muitas desculpas esfarrapadas, só que nenhuma delas me convencia, então resolvi parar de rodeios e jogar logo a verdade.

–Te conheço desde que nasci e sei quando você tá mentindo. O meu namoro com a Ágatha é diferente do seu só porque nós somos um casal homossexual e não nos conhecemos nas melhores ocasiões, já você com a Rebeca é bem diferente visto que além de serem um casal hétero, se conheceram no grupo de jovens da igreja, não é mesmo Renan? –perguntei, ou melhor, o confrontei deixando meu irmão quase sem palavras.

–Não é isso que você tá pensando, é só que…

–Renan, a quem você tá tentando enganar? Pode não parecer, mas eu cresci e sei quando as pessoas estão mentindo, principalmente você. –disse lhe lançando um olhar chateado.

–É Giovanna, realmente você tá certa. Com o fim do seu namoro com a Pietra, achei que esse lance de se envolver com mulheres era apenas uma fase, não imaginei que voltaria a namorar tão rápido, muito menos que esse novo namoro seria novamente com uma mulher. Por que não se deu a oportunidade de conhecer novos rapazes e se apaixonar por um?! –estava totalmente desacreditada no que eu ouvia. Muitas informações ao mesmo tempo, o jeito foi me sentar no sofá antes que minhas pernas falhassem.

–Para tudo produção! Agora quem não tá entendendo nada sou eu. –disse me levantando e inspirando o ar o mais fundo que podia. –Se já não bastassem os nossos pais, descubro que o meu irmão mais velho também é um grande homofóbico. Só não entendo porque essa sua máscara demorou tanto a cair e como me deixei enganar por tanto tempo acreditando que você apoiava o meu namoro com a Pietra.

–Gigi querida, eu não sou homofóbico, e em nenhum momento fingi que apoiava o seu namoro com a Ruby Rose do Paraguai, não apenas apoiei, como queria muito que o namoro de vocês desse certo, mas não foi isso que aconteceu. –meu irmão disse se aproximando de mim.

–Se a sua intenção é me deixar confusa saiba que está no caminho certo. Você dava a maior força quando eu namorava com a Pietra, mas não apoia o meu namoro com a Ágatha. O seu problema é pessoal? –confusa era meu sobrenome do meio.

–Apenas acho que a Ágatha não seria a melhor opção desse mundo para você namorar, lembra que ela foi amante da sua ex, e todo aquele lenga lenga de que ela achava que a Pietra era solteira ainda não me convenceu.

–Renan, acho que já fui bem clara sobre esse assunto. Quantas vezes ainda teremos que perder tempo falando sobre algo que não vai chegar a lugar nenhum? –estava mais do que irritada.

–Já disse, só acho que se o namoro com a Pietra não deu certo, você poderia voltar a sair com homens, acho que você só tá deslumbrada com esse mundo lésbico, namorar homens também seria um modo da nossa família se unir novamente, sei que no fundo papai e mamãe morrem de saudades de você. O Tiago ainda te ama, o olhar dele não mente, o menino te venera… –nem deixei o Renan terminar de falar e já explodi.

–Caralho meu, já chega de falar tantas abobrinhas! –gritei mais alto do que deveria. –Quer saber mais?! Foda-se você, foda-se o Tiago, foda-se nossos pais e foda-se o caralho a quatro. A vida é minha, namoro quem eu quiser, namoro com a pessoa que eu amar, e quem eu amo mesmo é a Agatha. Não vou viver uma vida de aparências só porque você e meio mundo preferem assim. Já que é pra jogar merda no ventilador, sabemos muito bem que a mãe meteu chifes no papai durante anos com aquele advogadozinho que não saia lá de casa. Se é pra rodar a baiana, então fale também sobre a merda de todo mundo.

–Que modos são esse, Giovanna? A convivência com a Ágatha está te deixando desse jeito?! Nunca vi tantas palavras de baixo calão de uma só vez e não foi essa a educação que você recebeu da nossa família.

–Tem razão, Renan! Na verdade recebi uma educação hipócrita, falsa, onde LGBTQ+ são condenados ao fogo do inferno, mas se é para viver uma vida falsa e infeliz, prefiro mesmo ser condenada ao suplicio eterno como vocês tanto dizem. –disse indo direto para o meu quarto.

–Gi, espera! Para onde você vai? É só uma conversa, não queria que se aborrecesse e ficasse transtornada desse jeito.

–Para onde eu vou é simples, vou me encontrar com a minha namorada, ou você achou que essa briga iria me impedir de vê a mulher que eu amo?

–Não tá mais aqui quem falou. –Renan comentou bufando, mas antes de sair daquela sala disse algo que provavelmente ficou cravado na consciência e no coração dele.

–Renan, além de meu irmão mais velho, te considerava o meu melhor amigo, você não tem ideia do quanto suas palavras e seu modo de pensar retrógrado me magoaram, você foi capaz de acabar com todos os sentimentos bons que tinha por você. –antes de fechar a porta do meu quarto, lhe encarei uma última vez e vi que o meu irmão mais velho chorava no sofá.

Tomei banho, escolhi a minha roupa tudo no modo automático, abismada com tudo o que havia ocorrido, parece que a ficha ainda não havia caído, jamais esperava essa reação descabida do meu irmão, com o excesso de lágrimas meu rosto estava muito vermelho, então fui obrigada a exagerar na maquiagem e fingir que tudo estava bem. A Ágatha havia me convidado para irmos a um parque de diversões, não iria ser eu a estragar nosso passeio com lamentações ou baixo astral.



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