Nosso Estranho Amor

54. Início do sofrimento

Por sorte, logo encontrei algumas pessoas conhecidas, bem longe da turminha em que minha ex-noiva estava inserida e iniciei um papo agradável. Acho que já disse que o sofrimento não passa, ele continua intacto, ainda mais agora que o meu amor estava tão perto, mas ao mesmo tempo tão longe de mim, só que com o passar do tempo aprendi a fingir, disfarçar que nada era capaz de me abalar e não parava de esbanjar sorrisos, só Deus sabe que por dentro meu coração estava destruído e minha vontade de chorar era enorme.

Por um tempo até consegui afastar os meus pensamentos da Ágatha quando senti uma mão tocar o meu ombro. Afastei-me bruscamente e dei de cara com um rapaz muito lindo e simpático.

–Olá Giovanna, tudo bem? Desculpa ter te assustado. –comentou sem graça.

–Eu é que peço desculpas, mas como você sabe meu nome? Acabei de chegar de viagem, não conheço quase ninguém daqui.

–Você não tá me reconhecendo mesmo? –o adolescente parecia incrédulo.

–Desculpa, mas não. –falei um pouco tímida.

–Se eu lhe chamasse de tia Gi e agradecesse o presente que você me deu, aquela camisa autografada do Corinthians que guardo até hoje… Será que lembra? –o rapaz indagou segurando o riso e meu peito se encheu de felicidade.

–Meu Deus… Enzo! Dá um abraço! –disse trazendo aquele menino, ou melhor, aquele rapaz lindo para os meus braços, um abraço que não teria mais fim. A saudade era tanta que até chorei de emoção. –Você tá tão lindo! Bem mais alto do que eu.  –disse desvencilhando-me daquele abraço.

–Tia Gi, acontece que eu cresci. –respondeu ainda sorrindo. –Gostaria de te apresentar a minha namorada, pode ser?

–Claro meu anjo! Vamos lá…

Enzo saiu me puxando em meio às várias pessoas que estavam no aniversário dos gêmeos, para meu completo azar, ele estava indo justamente para a mesa onde Ágatha estava trocando carinhos com a desconhecida, tratei de vestir meu traje inabalável e até que me saía como uma boa atriz, fingindo que a presença da ruivinha não me incomodava.

–Carlinha, olha quem reencontrei depois de tantos anos. –Enzo comentou entusiasmado. –Tia Gi, estamos namorando.

–Giovanna, a Sra. continua mais linda do que antes, nunca envelhece. –Carla respondeu simpaticamente. –Veio passar uma temporada no Brasil? –Carlinha indagou me abraçando. Ela era minha ex-aluna, da mesma turma do Enzo.

–Por favor, só tire o senhora, não sou tão velha. –falei em clima descontraído. –Vim para morar definitivamente no Brasil. –respondi olhando para Ágatha que não esboçou nenhuma reação com a notícia, era óbvio de que não representava mais nada na vida dela, essa parte me doeu é claro. –Sempre soube que você e o Enzo formariam um casal muito bonito, desde a infância era algo perceptível.

–Só que não foi fácil conquistar essa cabeça dura, a Carlinha foi muito difícil. –Enzo falou em uma espécie de desabafo, foi impossível conter o riso.

–Quem tá chamando de cabeça dura? –Carlinha indagou beliscando o namorado.

Ainda continuava a rir das brincadeiras e provocações entre os dois até que fomos interrompidos por uma voz.

–Vocês não vão me apresentar a moça? Amor, você conhece ela? –era a mulher que estava no colo da Ágatha. Como me doeu ouvir a estranha chamar a Ágatha de amor, só eu podia chama-la assim.

–Não Sabrina, não faço a menor ideia de quem seja, é melhor perguntar para o Enzo. –olhei para minha ex-noiva e não acreditei no que ela havia falado. Como a Ágatha era capaz de falar tamanha mentira, dizer que não me conhecia, negar toda a história que tivemos juntas? Tudo bem… Se ela iria fingir que não me conhecia, faria a mesma coisa.

–Sou a Giovanna, fui professora do Enzo e da Carlinha quando eram crianças. –respondi cumprimentando educadamente a namorada/ esposa de Ágatha. Vontade de quebrar aquela mão magrinha, mas óbvio que não faria isso.

–Não apenas uma professora, a tia Gi é a melhor professora do mundo, graças a ela passei a amar português. –Enzo disse tentando dissipar o clima ruim.

–Que coincidência! Ágatha e eu temos uma filha, a Iara, ela é um anjinho, mas tem algumas dúvidas com português. Será que você não podia dar umas aulas pra ela? –sei que a pergunta da tal Sabrina foi inocente, mas tinha vontade de apertar o seu pescoço até lhe faltar o ar. Mentalmente contei de um a dez até responder sua pergunta com a maior educação do mundo ainda ouvindo a voz da minha ex-noiva.

–Por favor, Sabrina, é melhor não… –Ágatha iria formular uma frase, mas lhe cortei propositalmente. Não sei se ela sentiria ciúmes, mas é óbvio que não.

–Sinto muito Sabrina, mas não poderei ajudar. Já tem alguns anos que larguei o ofício de professora, atualmente trabalho como administradora de empresas, pode ver que são profissões bem diferentes. –falei da maneira mais educada e fingida que consegui.

–Algum motivo para mudar de profissão? –indagou Sabrina. Olhei para Ágatha que fazia cara de paisagem e lembrei que dias depois do aniversário dela e do pedido de noivado havia perdido meu emprego na escola do Enzo, mas isso fazia parte do passado.

–Sim. Eu me casei, tive uma filha, minha esposa e eu precisamos adaptar nossas rotinas com a chegada da Kathleen. –disse com um sorriso sem graça.

–Sei como é… A maternidade nos suga e nossos filhos sempre precisam estar em primeiro lugar. –encarei Sabrina e mesmo sabendo que ela estava com o amor da minha vida, não pude lhe culpar por amar a Ágatha, eu mesma deixei escrito naquele bilhete que era para a ruivinha redescobrir sua felicidade. –O nome da sua filha é Kathleen Farlen? Por acaso, você é a esposa da Pietra? –Sabrina indagou curiosa e eu me perguntava de onde ela nos conhecia.

–Exatamente, mas como você sabe de tudo isso? –perguntei meio perdida.

–Com todo respeito, você tem uma esposa muito bonita. As vezes assistimos os vídeos de vocês sobre como é ser mãe de uma artista mirim, fora que sua filha é uma criança bastante conhecida no mundo da moda e muito talentosa. Vocês são uma família linda! –apenas dei um sorriso amarelo em forma de agradecimento.

Desgraça pouca é bobagem, logo Pietra apareceu acompanhada da Dani. Primeiro ficou com a cara amarrada e com ciúmes ao ver Ágatha perto de mim, mas foi só receber elogios sobre como éramos um casal lindo e mais uma dúzia de elogios para nossa filha, na mesma hora a morena esbanjou simpatia com todos, trazendo-nos a imagem da típica família feliz. Durante toda a conversa permaneci calada, falava apenas quando me perguntavam algo, meu coração estava sendo esmagado pela proximidade do amor da minha vida e por seu perfume inebriante, sabendo que já era passado na vida da ruivinha, não tive coragem de lhe encarar mais. As coisas pioraram quando notei a troca de olhares apaixonados entre Sabrina e Ágatha que retribuía a altura. Queria que qualquer coisa me tirasse daquela situação antes que eu surtasse, foi quando minha filha e Natalie se aproximaram em silêncio, agradeci mentalmente por isso.

–Mãezinha linda, tô morrendo de fome. –Kat chegou atraindo as atenções para ela.

–Também tô com fome. –Nat também reclamava.

Após a cara de boba de Pietra apresentando nossa filha para todo mundo, Dani resolveu mudar de assunto.

–Crianças, tem bolo, pipoca, docinhos, muitas coisas gostosas pra vocês comerem. –Dani respondeu simpaticamente.

–É que a gente não come essas coisas. –Natalie comentou com uma expressão de nojo.

–Sim, doces engordam, gosto de frutas e saladas. –Kat disse aumentando ainda mais minha vergonha.

–Tô sabendo que você é uma artista mirim. Gosta de fazer novelas? –Sabrina indagou se aproximando da MINHA filha, e claro que não gostei.

–Adoro, e eu vou tá na nova novela infantil que vai estrear daqui a dois meses, farei o papel principal. –Kathleen comentava feliz da vida.

–Princesinha, vá com calma! Nós ainda não temos certeza, estamos aguardando os resultados do teste. –Pietra ponderou.

–A gente viu no celular da tia Gi, na caixa de e-mails. A Kat foi aprovada e eu também, serei coadjuvante. –Natalie comentou entusiasmada.

–Não acredito que mexeram no meu e-mail sem minha permissão. –tentava controlar minha raiva.

–Desculpa mãe! Não foi por mal. –Kat disse com aquele olhar que sempre amolecia meu coração.

–Essa menina é mesmo uma artista e muito linda. Sempre tive vontade de te conhecer pessoalmente, Kathleen. Será que posso te dar um abraço? –Enzo pediu se abaixando para ficar na altura da minha filha.

–Não sei, quem é você? –minha filha não gostava que pessoas estranhas lhe abraçassem ou beijassem, então morria de medo que ela pudesse destratar o meu ex-aluno. Antes que ela pudesse responder alguma grosseria, peguei nas suas mãozinhas, me abaixei ficando na sua altura e falei a verdade.

–Meu anjinho, a mamãe conheceu o Enzo muito antes de você nascer, ele te viu na minha barriga e gosta muito de você. Não vai negar um abraço, né?

Por alguns segundos minha filha me encarava com aqueles olhinhos azuis brilhantes, depois olhava para a Pietra e para o Enzo. Qual não foi minha surpresa quando Kat foi na direção do Enzo e lhe abraçou apertadamente por vontade própria, sem se sentir pressionada. Não sei se minha filha começava a mudar de comportamento ou se o Enzo que possuía uma luz própria.

–Kat, Nat, vocês gostam de purê de maçã? –Enzo indagou após sair do abraço.

–Nós adoramos. –Natalie respondeu.

–Sim, é muito gostoso. –Kat completou.

–Então se a Dani deixar vou preparar um bem gostoso pra vocês. Vamos meninas!

Ia atrás do Enzo, mas Pietra me impediu e queria que continuássemos a posar de família feliz. Só que ao mesmo tempo notava que meu limite já havia sido saturado e não estava mais a fim de encarar as trocas de carinho entre Ágatha e Sabrina, a ruiva não parecia ligar para minha existência. Meu nível de desespero era tão visível que graças a Carlinha consegui sair daquela saia justa. Carla alegou que queria minha ajuda para retocar a maquiagem, claro que aceitei de bom grado. Tudo não passava de uma leve mentirinha e acabamos indo para a cozinha, lugar onde Kat e Nat comiam animadamente enquanto conversavam com o Enzo. O menino de cara percebeu que eu não estava nada bem, sua namorada levou minha filha e minha afilhada dali, finalmente pudemos ficar sozinhos.

–Pronto tia Gi! Pode falar… Creio que nem preciso perguntar porque você está triste. –Enzo disse apertando minhas mãos e pela primeira vez desde que cheguei naquele aniversário me permiti chorar.

–Enzo, eu me sinto uma completa idiota. Fugi do Brasil, casei com uma mulher que não amo, achei que todos esses anos longe esqueceria da Ágatha, mas não esqueci dela um instante sequer. No fundo não estava preparada para voltar e ver o amor da minha vida nos braços de outra, o que mais me dói é o desprezo da sua tia, ela fingir que não me conhece e que nunca tivemos nada. –agora chorava de maneira mais desesperada enquanto meu ex-aluno me entregava um copo d’água com açúcar.

–Gi, não quero que pense que estou te julgando e que estou ao lado da minha tia, mas você tomou a sua decisão quando deixou o país para se casar com a Pietra mesmo a minha tia tendo te implorado para que você não tomasse essa decisão. Eu era apenas uma criança, mas lembro de todo o sofrimento que a Ágatha passou, ela viu as fotos do seu casamento, as fotos do nascimento da Kathleen e cada momento feliz que a Pietra fazia questão de postar nas redes sociais. Por um tempo minha tia se afundou no álcool. Foi muito difícil pra ela te esquecer e deixar de te amar, e seguir com a vida dela. –essas palavras vieram como socos no meu estômago.

–Você tem razão, Enzo. Eu mereço todo esse sofrimento e essa angústia que tô sentindo no peito, a culpa é toda minha. –disse tentando conter as lágrimas que persistiam em cair pela minha face. –Então a Ágatha realmente me esqueceu e deixou de me amar, né? O que eu faço? Daria tudo pra voltar no tempo e consertar meus erros.

–Tia Gi, infelizmente há erros que não tem mais conserto. Não vou te iludir, mas creio que já tem um tempo que a tia Ágatha deixou de te amar, inclusive ela tem uma filha que é a vida dela. Você também é casada e tem uma filha linda, apenas posso te dar um conselho: A Pietra parece que é muito legal e te ama. Tente ser feliz ao lado dela… As lembranças boas da minha tia deixe no passado, ela não faz mais parte do seu presente e nem do futuro. –senti o peso das palavras do Enzo e pude me permitir chorar no colo do meu ex-aluno por mais algum tempo. O Enzo estava certo, deixaria a Ágatha ser feliz ao lado de Sabrina e da filha delas mesmo sabendo que iria amá-la pelo resto da minha vida.



Notas:



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6 Respostas para 54. Início do sofrimento

  1. Espero que Gi e Agatha possam conversar sobre o passado. E se for amor de verdade se restarem, apesar de ambas terem formado familia. Mas sem traição. Que o verdadeiro amor, vença.

    • Concordo. As duas ainda precisam conversar bastante, resta saber se o orgulho e as circunstâncias permitirão.
      Beijos.

  2. Confesso que fiquei com dó da Giovanna. Até senti o peso das palavras que Enzo disse pra ela. Coitada 🙁

    Comentei no capítulo anterior que a Gio merecia sofrer um pouquinho pra ter a Ágata de volta, mas pensando bem, Giovanna ja sofreu bastante não é autora?! Giovanna foi vítima de violência sexual, teve uma gravidez não planejada, foi rejeitada pela Ágatha quando a mesma soube da gravidez, e por fim abriu mão do amor da vida dela por que acreditava que não deveria atrapalhar a carreira profissional da Ághata.

    Autora, já está na hora da Giovanna ter o perdão dela!

    O diálogo entre as duas não pode mais ser adiado. Elas precisam colocar os pingos nos “is”. Muitas coisas que aconteceram no passado precisam ser esclarecidas entre elas, como por exemplo, a viagem da Ágatha no mesmo período em que a mão da Gio se encontrava hospitalizada.

    Outra coisa aqui rsrs em uma das falas inocentes da Sabrina (esposa da Ágatha) ela deixou escapar que ela e Ágatha sempre olham os vídeos sobre como é ser mãe de uma artista mirim que Pietra posta nas redes sociais. Aqui minhas amigas, fica evidente o quanto a Ágatha tbm ama Giovanna, pois sempre buscou saber sobre a vida dela.

    Tenho fé que o amor vencerá viu autora! Rsrs

    • Bom dia Ana.
      Estou percebendo que a Gi começou a amolecer o seu coração e fico muito feliz por saber disso. Realmente a Gi já sofreu bastante e continua sofrendo porque já deu pra perceber que a filha dela, a Kathleen não é fácil de lidar, tem uma personalidade forte e a loira sofre bastante por causa disso.
      Com relação a Ágatha perdoar a Gi talvez seja um processo bastante longo, até porque as duas acabaram de se reencontrar, mas quem sabe… Como deu pra perceber a Ágatha nunca deixou de acompanhar a vida da Giovanna.
      Continue acompanhando.
      Beijos 🙂

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