I

 

Dalid observou Lenór se aproximar, com passos lentos, porém firmes. Em nenhum momento, o olhar dela desviou do seu. Ele retirou a espada da bainha e a testou com movimentos ligeiros de mão. Perguntou:

— Dizem que os palatins são os guerreiros mais poderosos de Barafor. Agora, me parecem uma piada! Quantas vezes você abriu as pernas para ganhar essas tatuagens?

A resposta dela foi um sorrisinho sarcástico ao pegar uma das espadas curtas que carregava na cintura. Ela tinha apenas um fio de corte e a guarda era ligeiramente mais comprida do lado cego da lâmina.

 

 

 

 

Em vez de segurar o cabo, assim como o oponente fazia com sua própria arma, Lenór a empunhou segurando a guarda longa. Dalid achou estranho, contudo não pensou muito sobre o assunto. Avançou para ela, desferindo um golpe transversal e, finalmente, compreendeu a razão de Lenór empunhar a espada daquela maneira.

A comandante girou a espada, de forma que a parte cega ficou apoiada no seu braço. Nessa posição a lâmina fazia as vezes de uma braçadeira metálica, protegendo o antebraço e agindo como um escudo, que travou o golpe de Dalid.

Antes que Dalid recuasse para desferir novo golpe, Lenór girou o corpo na sua direção e ele se viu a poucos centímetros da comandante. Ela usou a mão livre para golpeá-lo no flanco direito, onde a couraça deixava parte do tronco exposta. O rapaz sentiu o impacto do golpe como se tivesse sido rasgado por uma lâmina, entretanto, Lenór não tinha nada naquela mão.

Dalid soltou a espada, cuspiu sangue e recebeu um soco no rosto. Cambaleou, dando um passo atrás e Lenór lhe passou uma rasteira. Ele caiu de cara no chão, deixando escapar um gemido abafado.

Antes que ele caísse completamente, Lenór jogou-se para o lado, ao perceber que outro soldado se aproximou pelas suas costas e tentou perfurá-la. Por meros centímetros, não foi empalada pela lança de um terceiro soldado. Ela deixou que a haste passasse rente ao seu corpo e a segurou com a mão livre. Em um golpe seco, usou a espada para partí-la. Sem o apoio, o inimigo perdeu o equilíbrio e cambaleou para a frente ao mesmo tempo em que Lenór cortou o ar, retrocedendo o movimento. A lâmina rasgou a couraça dele, como se esta fosse feita de papel e findou seu caminho ao atingir o pescoço.

Enquanto o sangue jorrava nas botas dela, Lenór usou o pedaço de lança que segurava. A jogou para o alto e pegou no ar, mudando a direção da ponta. Em seguida, a atirou no peito de outro homem.

Ela retirou a segunda espada do suporte na cintura e, aos olhos de Vanieli, foi como se ela tivesse se tornado ainda mais forte e mortal. A Kamarie não saberia precisar quanto tempo levou para que houvesse sete corpos espalhados pelo lugar. Mas não fora mais que alguns minutos.

Como uma boa guerreira, Lenór era ambidestra e empunhava as duas espadas com precisão, lutando com dois, às vezes três, adversários ao mesmo tempo. Ela era muito ágil para alguém que tinha uma certa dificuldade de locomoção. Era, também, muito mais forte fisicamente do que aparentava. Prova disso era a quantidade de membros que decepou com apenas um golpe. Um braço, uma perna e até mesmo uma cabeça.

Essas imagens a fizeram Vanieli trincar os dentes e, por vezes, virar o rosto. De nada entendia de combate, porém sabia que era preciso muita força e uma boa lâmina para decepar carne e ossos em um corte limpo. Ficou bastante claro, que Lenór tinha os dois.

Quando a comandante terminou, apenas Dalid permanecia vivo. Ela assim o fez de propósito.

Lenór se aproximou dele, que se arrastava pelo chão em busca de uma rota de fuga, embora soubesse que não havia como escapar dali. Foi com alívio que a comandante percebeu a chegada de Rall, Elius e Adel. Gael não estava à vista, mas estava certa de que velho amigo o tinha deixado em segurança antes de se aventurar a retornar para ajudá-la.

O sangue nas roupas dos três era um bom indicativo dos obstáculos que enfrentaram naquele meio-tempo.

— Ah! — Disse o velho, fazendo um gesto no vazio e se voltando para os dois companheiros. — Não disse para vocês? Não havia motivo para se preocuparem.

Lenór pisou na mão de Dalid e o rapaz gritou como um animal acuado.

— Ainda acha que eu abri minhas pernas para conseguir essas tatuagens? — Ela indagou.

Aumentou o peso sobre a mão que pisava, vendo-o ficar vermelho de dor.

— Eu vou facilitar para você, soldado. Você pode me dizer tudo o que sabe sobre as pessoas que o mandaram nos matar e ter uma morte rápida e quase indolor ou pode se recusar a falar e ter uma morte excruciante.— Ela agachou-se ao lado dele. — Antes de responder, quero que pense na dor que está sentindo agora. Você deve estar pensando “foi apenas um maldito soco, então por que sinto como se as minhas entranhas tivessem explodido?”

Sorriu, cruel.

— Seria um exagero dizer que isso realmente aconteceu, mas garanto que as coisas aí dentro não são iguais há minutos atrás. Você está sangrando tanto por dentro que a dor só vai crescer. Logo, vai sufocar com o seu próprio sangue, mas antes disso vai sofrer muito. Então, o que você acha dessa “maldita e miserável palatin estrangeira”, agora?

— S-sua… — Ele balbuciou, mas foi acometido por um ataque de tosse regado a sangue.

— É, foi o que pensei. — Lenór ficou de pé. — Leve seu segredo para o túmulo. Eu sou uma caçadora, cedo ou tarde encontrarei a minha presa.

Ela o assistiu gemer e sufocar por alguns instantes, antes de ir até Vanieli, que estava tão assustada com o que presenciou que ainda não tinha conseguido sair do lugar. Lenór estendeu a mão para ela e a esposa aceitou, olhando-a como se não a visse realmente.

Lenór segurou firme os dedos delgados e delicados, notando o tremor neles. Ainda tinha uma das espadas ensanguentadas na mão e fez menção de guardá-la, porém Vanieli foi envolvida por uma estranha sensação. Apertou com força excessiva a mão dela e disse:

— Ainda não.

Lenór encarou os olhos âmbar da esposa com uma sobrancelha arqueada. Notou a preocupação que a tomava. Era uma expressão alheia a todas que tinha aprendido a ler na face dela, naqueles poucos dias de casadas.

— Tem algo errado. — Vanieli afirmou.

A Kamarie não gostava de quando percepções como aquela a assaltavam. Na verdade, isso acontecia com mais frequência do que gostaria de admitir, contudo procurava não dar atenção à elas e jamais falava sobre, ciente do que poderia lhe acontecer se as revelasse para alguém.

Todavia, diante daquela situação e do medo que percorreu cada músculo do seu corpo, foi inevitável não alertar Lenór.

— Por favor! — Ela suplicou para a esposa. — Acredite em mim. Há alguém vindo e não tem boas intenções.

A comandante chegou mais perto dela. Poderia parecer a frase insana de uma mulher assustada no meio da floresta, após assistir um banho de sangue. Todavia, seu poder de observação captou o pavor que a tomava e as microexpressões que reforçavam a verdade em suas palavras. Então, disse:

— Eu acredito. — Sentiu a mão dela aumentar a pressão na sua, outra vez.

Um instante depois, notou o ligeiro farfalhar de um arbusto. Ante o alerta recebido, não esperou para ver do que se tratava. Ergueu a espada e a atirou em algo que se escondia entre a folhagem.

Aquilo, o que quer fosse, urrou de dor e revelou-se. Um corpo negro e um rosto assustador com dentes afiados. Era bípede e as mãos tinham garras longas e cortantes. Antes que a criatura pudesse se direcionar para Lenór, a comandante já tinha desembainhado a outra espada e partido para cima dela, estocando o local que acreditava ser seu coração.

Lenór recuperou as duas espadas, antes que seu estranho e assustador adversário caísse ao chão. Mas aquela “coisa” não estava sozinha. Outras surgiram dentre as árvores e, de repente, se encontraram em novo combate.

— Corre! — Lenór disse para Vanieli, percebendo que os novos inimigos eram muito mais numerosos que os anteriores.

As duas correram em direção à estrada, enquanto o capitão Elius e a serva Adel também lutavam por suas vidas. Vanieli seguia à frente, acompanhada de perto pela esposa, que agarrou sua túnica e puxou para trás no exato momento em que uma das criaturas saiu detrás da árvore pela qual passavam.

Vanieli assistiu as garras longas e enegrecidas cortarem o ar a poucos centímetros do seu rosto. Com o puxão, ela caiu junto ao tronco da árvore, ao passo que Lenór se atirou contra a criatura. Os dois se engalfinharam por um momento, rolando entre a folhagem úmida até pararem ao lado de um tronco velho. Um instante se passou, enquanto a criatura cobria o corpo da comandante com o seu. Vanieli levou a mão à boca, temendo pelo pior. Então, a criatura rolou para o lado, Lenór se pôs de pé e ela percebeu o sangue que escorria do peito do monstro.

Rall estocou uma das criaturas que acuava Elius, ao passo que Adel correu em direção à outra. A serva tomou impulso e o seu joelho atingiu a face horripilante do inimigo. Ele tombou para trás, enquanto ela caía sobre outro inimigo, fincando uma espada no pescoço deste. A serva girou o corpo, recuperando sua espada e guiou a lâmina até a barriga de outra criatura, fazendo um corte profundo, que despejou algumas vísceras no chão.

A comandante correu em direção às duas criaturas mais próximas e jogou-se no chão, antes de se chocar com as garras de ambos. Lenór rolou entre eles e se colocou de joelhos às suas costas. As espadas dela cortaram o ar e os pés dos monstros, ao mesmo tempo em que notava a chegada de mais deles.

Com a cobertura de Elius, o velho Rall arrastou Vanieli em direção aos cavalos do outro lado das árvores. A moça se viu saltando sobre os corpos e pisando no sangue, misturado à lama, dos soldados que um dia serviram Mirord.

Rall a colocou sobre a sela do primeiro cavalo que encontraram e desapareceu atrás de uma árvore. Um momento se passou até ele retornar com Gael e colocá-lo na sela dela.

— Eu estarei bem atrás de vocês! — Ele falou, subindo em outro cavalo e voltando a empunhar a espada.

Quando Vanieli incitou o cavalo a correr, Lenór e os outros irromperam na estrada, perseguidos pelas criaturas. Como prometido, Rall a seguia de perto. E o galope forte dos cavalos se equiparou ao bater do coração da Kamarie, quando sua montaria enveredou pela floresta densa e o velho sumiu de vista.

Ela se viu galopando sem rumo, enquanto Gael apertava sua cintura com o máximo de força que os braços miúdos tinham. Curvou o corpo para a frente, escapando de um galho baixo. Irrompeu em uma clareira e, ao se voltar para trás, reencontrou Rall. Além dele, avistou Lenór e os outros.

O breve momento de alívio, voltou a se tornar inquietante, quando percebeu que as criaturas os seguiam. Se aproximavam rapidamente, montados nos cavalos dos soldados mortos. Foi nesse instante que Vanieli entendeu que não estavam sendo perseguidos por monstros e, sim, homens vestidos de monstros.

Ela incitou o cavalo a correr mais rápido, como se fosse possível, visto que o animal já estava dando o seu máximo. Foi tomada pelo pânico quando a floresta chegou ao fim e se viu diante do Abismo de Tenzin. Poucos e assustadores metros os separavam de uma morte violenta.

Com um forte puxão nas rédeas, Vanieli conseguiu fazer o cavalo desviar da rota mortal. Novamente, respirou aliviada ao perceber que os companheiros também o tinham conseguido e foi tomada por um pequeno momento de euforia quando dois dos perseguidores mergulharam direto para a morte nas profundezas do abismo.

Dois perseguidores emparelharam os cavalos com o de Adel. Tentaram acertar a moça com as lâminas afiadas em seus dedos. Todavia, ela inclinou o corpo para trás, agilmente, assistindo as lâminas passarem no local exato onde deveria estar seu pescoço. Ainda deitada sobre a sela, Adel usou a espada para estocar o cavalo de um inimigo. O corte fez o animal desviar do caminho e atirar o cavaleiro no abismo.

Adel retornou para a posição correta, enquanto o outro adversário se afastava um pouco, a fim de evitar ter o mesmo destino que o companheiro. Entretanto, a serva usou o chicote, que estava atrelado a sela da sua montaria, para enlaçar o braço dele e o atirar no chão. E alguns segundos se passaram até que ele fosse pisoteado por Lenór e outros perseguidores.

Cavalgando um pouco à frente da comandante e Adel, o capitão Elius estava em posse de um arco e distribuía flechas certeiras. Uma delas passou próximo a Lenór, indo de encontro ao peito de um inimigo. A comandante assistiu a queda dele por sobre o ombro e, também, vislumbrou mais um quarteto inimigo, galopando ainda um pouco distante.

Ela se voltou para o caminho à frente, percebendo que sua rota de fuga estava chegando ao fim, pois, naquele ponto, havia uma grande quantidade de pedras que se erguiam, entre redondas e afiadas, formando uma espécie de parede, que circundava o abismo e impedia o acesso à floresta. E, impossibilitados de irem adiante, Vanieli e Gael limitaram-se a assistir o embate que se desenrolava durante a perseguição e a aproximação dos inimigos ao longe.

Àquela altura, Adel, Rall e Elius, já tinham alinhado seus cavalos à espera do quarteto que se aproxima.

Porém, a preocupação imediata de Lenór, ainda era o inimigo que emparelhou o cavalo ao seu. Ele conduziu o animal que montava para perto do dela, tentando atingí-la com as lâminas na mão, as quais Lenór repelia com a espada. Estavam tão próximos da beirada do abismo que a comandante podia vislumbrar a escuridão que tomava o fundo dele. Aproveitando-se disso, o oponente tentou fazer seu cavalo empurrar o dela para a morte, porém Lenór jogou-se sobre ele.

Os dois caíram dos cavalos e rolaram pela borda do abismo, caindo um pouco afastados. A comandante tentou ficar de pé, mas o adversário jogou-se em suas pernas e ela tornou a cair. O sujeito escalou o corpo de Lenór, deixando um rastro de cortes, graças às lâminas nas mãos que ele levou em direção ao coração dela. 

A comandante arqueou o corpo, enroscando a perna na dele, enquanto uma de suas mãos mantinha as garras longe do seu peito e a outra encontrava as suas costelas. A posição ingrata diminuiu a força do golpe, todavia foi o suficiente para tirá-lo de cima dela.

Lenór rolou na direção contrária a dele, ganhando um pouco de espaço para ficar de pé. Seu oponente fez o mesmo, atirando no chão a máscara monstruosa que usava. A Azuti se viu encarando olhos de um negro tão intenso quanto os dela, embebidos numa fúria assassina.

Meros centímetros os separavam da beirada do abismo. Lenór percebeu logo que, naquele ponto, o terreno era instável e assistiu seu adversário dar um saltinho, se preparando para um nova investida contra ela. A comandante tomou uma posição defensiva e o atacante deu um passo em sua direção. Foi quando o chão cedeu sob os pés de ambos.

Tudo aconteceu tão rápido que Lenór só conseguiu compreender o que se passou quando o velho Rall se acercou dela. Em um minuto ela estava diante do inimigo e, no instante seguinte, se encontrava a uma dezena de metros com o rosto enfiado na areia e a sensação de que tinha sido atropelada por um cavalo selvagem.

Ela gemeu e cuspiu um pouco de poeira, enquanto o ar retornava aos seus pulmões. Encarou o horizonte, notando que os inimigos tinham parado seu avanço. Sentou-se, desorientada, mas com a certeza de que os perseguidores haviam desistido da caçada, visto que retornavam pelo mesmo caminho que fizeram até ali.

Alguns instantes se passaram, enquanto ela inspirava fundo e observava a aproximação de Rall. Sentia um forte formigamento no corpo inteiro, misturado a pequenas ondas frio. De fato, havia muito tempo que uma sensação como aquela não percorria seu corpo.

Rall disse algo, mas seus ouvidos zuniam tanto que não entendeu. Fixou os lábios dele e compreendeu que falava o seu nome. Ele pousou a mão em seu ombro e mais alguns instantes se passaram até que ela conseguisse ouvir um:

— Você está bem?

Lenór balançou a cabeça em concordância, depois afastou a vista para o local onde estivera de pé, frente ao seu adversário, momentos antes do chão ceder. Não havia mais nada lá, exceto um grande vazio. Foi então que compreendeu que ela também deveria ter caído no abismo.

Do outro lado daquele buraco, seus olhos encontraram os dourados e assustados de Vanieli, que baixou a vista para as próprias mãos trêmulas, antes de enxugar uma lágrima atrevida que lhe escapou.

— Foi um empurrãozinho e tanto. — Rall falou, também olhando para Vanieli.

Ele ajudou a amiga a levantar, enquanto Elius e Adel se aproximavam, imersos em silêncio. Lenór deu um passo trôpego, percebendo que a magia que a atingiu, ainda não tinha escapado completamente do seu corpo.

— Talvez, seja melhor você continuar sentada. — Rall recomendou, porém Lenór fez um gesto vago, indicando que estava bem.

Ainda sobre o cavalo, Vanieli encarou os olhares acusadores de Adel e Elius.

Ela tampouco sabia o que tinha feito exatamente, apenas ficou feliz em ver que conseguiu. Agora, a euforia do sucesso tinha lhe abandonado e deixado para trás o sabor amargo do medo do preconceito dos companheiros.

Todavia, o que aconteceu foi impulsivo e instintivo. E ela ainda sentia no corpo os resquícios daquela onda estranha e assustadora de energia.

O fato era que, quando percebeu que Lenór também cairia no abismo, seu corpo moveu-se sozinho. Ela ergueu uma das mãos e aquela energia se desprendeu de si, junto com um sonoro “não”. Metros adiante, a comandante foi atingida por essa força e empurrada por uma dezena de metros no ar até cair em solo firme.

Rall e uma Lenór mais claudicante do que o de costume, contornaram o buraco e estacaram diante dela.

— Vem aqui, Gael! — Disse Rall para o neto, retirando-o da sela.

O menino correu para Lenór assim que seus pés tocaram o chão. Ele abraçou a mãe, que murmurou algo em seu ouvido, antes de permitir que Rall o tomasse nos braços. O velho deu um tapinha caloroso na perna de Vanieli e se afastou, retornando para junto de Elius e Adel. 

Lenór não desgrudou o olhar da esposa nem por um instante. Estendeu a mão para ajudá-la a apear do cavalo, mas a moça se esquivou do seu toque e desceu do animal sozinha.

— E-eu… Eu sinto muito… — Vanieli gaguejou.

Ela esperava ver uma expressão condenatória na face de Lenór, porém a esposa parecia a mesma de sempre, séria e com um toque de ironia nas feições sujas de poeira, suor e sangue. A comandante pousou a mão no ombro dela e Vanieli enrijeceu a postura, temerosa do que ela faria. Contudo, Lenór permaneceu em silêncio, a trouxe para perto e a envolveu em um abraço apertado.

 
II
 

Vanieli despertou em um cômodo estranho.

A chuva caía além da janela entreaberta, que não era barreira suficiente para impedir a entrada da luz emitida pelos raios que cortavam o céu. O som dos trovões reverberava nas paredes, enquanto o vento frio percorria o quarto que, entretanto, estava aquecido e aconchegante.

Ela piscou algumas vezes, fitando o fogo na lareira à sua frente. A mente clareou, assentando as memórias. Estava no Castelo do Abismo, mais precisamente, nos aposentos que dividiria com a esposa.

Um suspiro lhe escapou, enquanto a mente vagava pelas lembranças daquela tarde. Sentiu um calafrio percorrer a espinha, quando recordou a sensação da magia buscando uma rota de fuga do seu corpo.

Foi assustador e, também, prazeroso. Porém, a sensação de medo sobrepujava a satisfação.

Depois do que se passou, o grupo seguiu pela borda do abismo até alcançar o Castelo, um pouco antes do anoitecer. Vanieli não recordava de muita coisa dessa parte da viagem, pois tinha sido atingida por um cansaço incomum e até mesmo ficar sobre a sela do cavalo se tornou custoso. Não foram poucas as vezes que quase caiu da montaria.

Atenta a isso, Lenór a trouxe para a sua garupa. E, embora assustada e envergonhada, pôde relaxar com a certeza de que não iria cair do cavalo a qualquer momento.

Sempre que usava magia, o desgaste físico a acometia. Houve situações, no passado, em que ela chegou a desmaiar, causando alvoroço entre seus familiares, visto que ninguém sabia o motivo para isso, pois, fortuitamente, se encontrava sozinha quando seus poderes afloraram.

Não fosse assim, todo o Clã Kamarie já saberia que sua existência era uma desonra para a família.

O caminho até o Castelo foi acompanhado por um silêncio incômodo e sufocante, porém admitia que o abraço que recebeu de Lenór, o tornou menos penoso. Além de agradecê-la, em momento algum a esposa a fitou com a habitual descrença, medo ou vergonha que, comumente, ocorria às pessoas de Cardasin quando se viam diante de um usuário de magia.

Vanieli ainda mantinha bem vívida a memória de quando, sem querer, acabou por destruir a biblioteca particular do pai durante uma discussão. Até então, ela tinha conseguido manter a magia em segredo. Lorde Arino não poderia ter se mostrado mais decepcionado com ela e chegou mesmo a deixá-la confinada em seus aposentos pessoais por duas semanas inteiras. Quando finalmente saiu de lá, o lorde exigiu que ela nunca mais voltasse a usar magia e jurou que a filha jamais sairia de casa se o desobedecesse, principalmente, em público.

Por essa razão, quando o rei propôs seu casamento com Mirord, o lorde não se mostrou tão contrário à ideia. Se um episódio de magia acontecesse após a união deles, já não seria mais problema seu.

A cruel verdade era que Lorde Arino a teria casado com qualquer um para se livrar daquela vergonha e mácula na família. Curiosamente, ele se mostrou contrafeito com o seu casamento com Lenór e o motivo para isso, Vanieli tinha certeza, era a afronta que o rei fez aos clãs e seus costumes.

Com novo suspiro, Vanieli levou a mão à testa. Sentia uma dor de cabeça leve, contudo não era nada preocupante.

Assim que alcançaram as muralhas do Castelo do Abismo e adentraram na cidadela, Lenór a deixou sob os cuidados dos servos do castelo e reuniu-se com Elius e os soldados que vigiavam o lugar.

Vanieli sequer se recordava das suas impressões sobre a cidade. Naquele momento, tudo lhe pareceu escuro e sem graça. Não se prendeu a nada, exceto ao desejo de retirar a sujeira do corpo e recostar a cabeça em um travesseiro. Os servos a guiaram até os aposentos, onde banhou-se, comeu algo insípido e acabou pegando no sono sentada em uma cadeira à beira do fogo, enquanto aguardava a esposa.

Ela endireitou-se sobre a cadeira, massageando o pescoço dolorido pela posição em que adormecera. Um gemido baixo chamou sua atenção. Inclinou-se para o lado, a fim de olhar para a direção de onde o som partiu e deparou-se com Lenór e Adel.

A comandante estava deitada na cama, seminua. Num primeiro momento, Vanieli interpretou a cena erroneamente, visto que as mãos da serva percorriam o tronco da sua esposa, próximo aos seios, de maneira suave e delicada.

Somente quando abandonou a cadeira, é que Vanieli percebeu o que realmente se passava.

— O que houve? — Perguntou.

A dor no pescoço se revelou ainda mais incômoda, todavia já não prestava atenção aos clamores do seu corpo. Ela chegou perto da cama e observou a esposa com gravidade, notando que ela estava inconsciente, enquanto murmurava coisas desconexas.

Por sua vez, Adel não lhe dirigiu o olhar, tampouco deu a entender que a tinha escutado. Entretanto, após um momento, ela falou:

— Veneno, Senhora.

Seus dedos deslizaram sobre a pele morena de Lenór e interromperam o caminho na altura de um ferimento. Pressionou o local e um pouco de sangue escorreu, arrancando um gemido rouco e dolorido da comandante.

Adel limpou o sangue com uma toalha úmida, a qual atirou em uma bacia com água. O sangue tingiu o líquido, fazendo o tecido desaparecer completamente das suas vistas. Havia algo de errado com isso e Vanieli logo percebeu que a cor parecia mais escura que o normal.

— Aquelas garras, ou seja lá o que aqueles homens usavam nas mãos, estavam cheias de veneno. — Adel explicou, espalhando um tipo de unguento esverdeado e malcheiroso sobre os cortes nas pernas e braços de Lenór.

Ela o fazia com gestos delicados e cuidadosos, de quem já estava acostumada a desempenhar o papel de uma curandeira. Quando passava a se dedicar a um novo corte, tomava algum tempo para avaliá-lo, como se estivesse diante de algo raro e estranho.

— Ela teve sorte. — Declarou, por fim. — Na verdade, todos tivemos.

Retirou faixas limpas de uma sacola e enrolou sobre os ferimentos da comandante. Vanieli fez menção de auxiliá-la, porém a serva a dispensou com um gesto suave.

— Todos sofremos cortes, mas um ou dois arranhões não são suficientes para espalhar o veneno pelo corpo com eficiência. — Adel continuou explicando. — No caso dela, que teve um combate direto com um daqueles sujeitos, e sofreu muitos cortes, é diferente. Ainda assim, são ferimentos leves. Por isso, o veneno teve seu efeito retardado e ela só começou a passar mal uma hora atrás.

— Ela vai ficar bem?

Os olhos amendoados da serva pousaram nela, sem qualquer emoção aparente.

— Vai estar de pé logo. — Garantiu ela. — Será uma noite febril, só isso. Pode ser que tenha alguma dificuldade para se locomover amanhã, todavia estou certa de que nada pior lhe passará.

Finalizou sua tarefa e reuniu seus pertences. Começou a se retirar, com um leve inclinar de cabeça para Vanieli. Notou a expressão quase sombria no semblante da Kamarie que, havia algum tempo, tinha caído em um silêncio profundo com um vinco a se formar na testa.

Ao perceber que ela se despedia, Vanieli abandonou suas recordações do que aconteceu na floresta e no abismo, para perguntar:

— Você não é uma serva, é?

Adel parou diante da porta e voltou-se para ela.

— O que quer dizer, Senhora?

— Não é todo dia que se vê uma serva empunhando uma espada com clara habilidade e familiaridade. — Vanieli retrucou, sem ânimo para rodeios ou falsa delicadeza. — Gostaria que fosse sincera comigo.

A serva balançou a cabeça, deixando o costumeiro olhar humilde desaparecer para dar lugar a outro afiado e audacioso. Nos dias em que durara aquela viagem, ela tinha observado bem a esposa da comandante e entendido que, embora Vanieli Kamarie pudesse se mostrar um pouco frívola e, às vezes, boba, na verdade era bastante sagaz e observadora. Também não lhe escapou que a moça não se sentia confortável em sua presença.

— Não. — Admitiu Adel, após aquele breve momento de silêncio contemplativo.

Vanieli fitou a esposa na cama, antes de fazer outra pergunta:

— Adel é mesmo o seu nome?

A serva arqueou os lábios em um sorriso sem dentes. Afinal, a moça era mais esperta do que parecia. Inspirou fundo, antes de responder:

— Já foi, há muito tempo atrás. Tomei a liberdade de usá-lo novamente a pedido do rei e da sua esposa.

A cabeça de Vanieli subiu e desceu, juntando os pontos daquela história. Adel quase pôde antecipar a pergunta seguinte, que não demorou muito para ser proferida:

— Seu nome atual é Aisen, correto?

Desta vez, a serva não respondeu. Em vez disso, ela se inclinou para a frente, fazendo uma reverência breve. Antes de sair do quarto, disse:

— Por enquanto, é conveniente que eu seja Adel. Sou a serva pessoal de vocês, nada mais. Tenha uma boa noite, Damna.

Vanieli fitou a porta fechada por um bom tempo depois que ela se foi. Pelo visto, estava longe de conhecer completamente os planos de Lenór e do rei. Suspirou, resignada.

— Najili.

A voz de Lenór trouxe sua atenção de volta para a cama. A comandante estendeu a mão para ela, que a pegou, notando que estava febril. Os olhos negros estavam injetados e, com toda a certeza, não era com Vanieli que falava. Ela voltou a fechar os olhos, murmurou algo em uma língua que não conhecia e calou-se.

Vanieli a soltou e foi até a janela. De repente, o sono tinha lhe abandonado completamente. Ela ainda se sentia cansada, mas após a rápida conversa com Adel, a mente fervilhava de indagações.

O vento jogou respingos da chuva no interior do quarto quando se aproximou da janela. Mesmo assim, não a fechou de imediato. Passou os olhos pelas muralhas, onde os vigias se encolhiam nas guaritas estreitas, então tentou captar algo da cidadela que elas protegiam, porém nada além da escuridão lhe chegou.

Nova lufada de vento e água em sua face a fez cerrar a janela de vez.

O cansaço físico a levou para a cama, e passou um longo tempo olhando para o teto e ouvindo a chuva, principalmente, quando Lenór, em meio à febre, voltou a chamá-la de “Najili” e a abraçou e repousou a cabeça em seu ombro.

Por algum tempo, Vanieli se sentiu incomodada com o contato, mas acabou se acostumando ao calor e ritmo da respiração dela até que pegou no sono.

O dia se iniciava, ainda chuvoso, quando ela despertou e descobriu que Lenór já não se encontrava agarrada ao seu corpo. Em vez disso, a comandante dormia com a face voltada para o teto e o corpo completamente exposto, já que tinha se livrado das mantas.

Vanieli sentou na cama, se espreguiçando devagar. Passou a mão sobre a testa dela, verificando que a febre tinha cedido e demorou-se um momento assim, enquanto percorria a figura da esposa com o olhar, reparando no grande número de cicatrizes. Demorou-se mais na perna direita, relembrando a história que lhe contou na floresta. Embora Lenór não tivesse falado sobre aquilo especificamente, estava claro que aquele ferimento era obra dos abusos de Lorde Kanor.

Ela comprimiu os lábios, ainda incapaz de conceber a imagem de Lenór como uma vítima. Tampouco conseguia controlar a raiva que se revolvia em seu interior ao imaginar o que passou nas mãos paternas.

Lorde Arino era rígido com ela, assim como fora com todos os seus filhos. Ainda que desgostasse da forma que ele agia, não o condenava por isso. O pai era fruto das tradições de Cardasin, assim como ela própria. Entretanto, apesar do seu rigor, ele nunca maltratou os filhos.

Retornou a vista para os braços de Lenór, analisando os detalhes das tatuagens.

Como a florinae tinha comentado, aquelas tatuagens identificavam a posição que Lenór ocupava entre os palatins. Com isso em mente, Vanieli notou que era possível distinguir os níveis pelos quais ela passou até a posição de capitã. A tatuagem se iniciava nos ombros, quase sem detalhes expressivos, mas tornava-se mais intrincada a medida que descia em direção ao braço. A cada nível, um detalhe diferente foi adicionado.

De fato, aquela era a primeira vez que Vanieli tinha a oportunidade de contemplar o corpo da esposa completamente, já que o máximo que Lenór fazia em sua presença em relação ao vestuário, era calçar as botas. Não que ela costumasse se mostrar curiosa a respeito, contudo, foi inevitável não reparar naquelas marcas quando Adel a estava tratando. No entanto, não se prendeu muito nisso, ante o assunto que lhe instigava o interesse no momento.

— Parece gostar do que está vendo.

A voz de Lenór lhe chegou baixa e rouca e Vanieli deu-se conta de que ainda mantinha a mão na testa dela. Focalizou os olhos negros no rosto adornado com o mesmo ar provocativo que usou na frase.

A Kamarie retirou a mão da testa dela e respondeu no mesmo tom:

— Claro, afinal você é minha esposa. Entretanto, tenho que confessar que você tem “peito” demais para o meu gosto.

— Imagino que a ausência de barba também lhe desagrade, assim como de outras coisas. — Lenór retrucou.

— Você não é só um rostinho mal-humorado, também é esperta, Comandante Azuti. — Vanieli zombou, antes de se afastar completamente. — Sua febre baixou, mas ainda tem um pouco. Talvez seja melhor cobrir-se.

— Talvez, eu esteja esperando que a minha esposa queira fazer isso por mim, ou melhor, que ela continue sua observação detalhada do meu corpo sem as poucas peças de roupa que estou usando. Quem sabe, até decida tateá-lo. — Lenór soltou, ainda em tom provocativo.

— Estou certa de que você não foi tão envenenada assim, para causar tamanho delírio.

Vanieli sorriu com o seu humor provocativo. Era uma face de Lenór que apreciava e ainda não tinha conhecido. Voltou a se deitar e a comandante a obedeceu, enfiando-se debaixo das mantas com alguma dificuldade.

— Nossa, não esperava que você fosse mesmo obedecer! — Vanieli riu.

— Um bom soldado sempre sabe reconhecer quando está diante de uma batalha perdida. A febre pode ter diminuído, mas ainda me sinto débil. Então, se não se importar, ficarei mais um tempo por aqui.

 


Oi, amores!

Espero que tenham curtido o capítulo de hoje. Me deixem saber. Comentem ou curtam, aqui embaixo. [Aquela que fica esperando receber uma notificação de comentário toda quarta-feira e fica super feliz ao lê-los. Euzinha mesmo! Não nego!]. Rs…

A magia da Vanieli surgiu como teoria em um dos comentários dos primeiros capítulos, então imagino que muita gente já esperava por isso. Mas e quanto a serva Adel? Alguém imaginou a possibilidade da verdadeira daijin participar da história? rs…

O desenho no início do texto não é novo. Na verdade, se repararem, é o mesmo da capa. Como o tempo anda um pouquinho complicado para mim, não consegui desenhar algo para hoje. Contudo, uma das minhas revisoras disse que, ao ler a cena, não conseguiu visualizar bem a forma que a Lenór segurou a espada. Antevendo que outras pessoas poderiam ter a mesma dificuldade, adaptei esse desenho para que vocês tenham uma ideia.

Na verdade, ela segura a espada como se fosse um cassetete. Mas, até onde sei, cassetetes não são armas medievais e achei que ficaria estranho mencionar algo assim na descrição da cena. Eles são semelhantes às tonfas que são mais antigas e originárias do Japão, contudo essa também é uma arma cuja descrição não é muito comum em histórias de fantasia.

Agora, vamos a sessão “desculpas”! Hehe…

Sinto muito por ainda não ter respondido alguns comentários. O tempo tá complicado, como expliquei acima. Prometo fazer isso até o fim da semana. Só tenham um pouquinho de paciência comigo, tá?

Então, espero vocês na próxima quarta-feira.

Beijos e xêros! 



Notas:



O que achou deste história?

11 Respostas para 8.

  1. Mulherr tu escreve maravilhosamente bemm! A cada capitulo a trama fica mais viciante!
    Não vejo a hora das duas ficarem juntas!

  2. Revelações e mais revelações, uma luta sangrenta e com seus mistérios, mas só quero saber quando Vanieli vai notar que cresce um sentimento pela Lenór?

    • kkkkkkkkk… Será que vai?
      Doida pra dar spoiler, mas não teria graça, né? Então, te espero nos próximos capítulos!

      Beijos!

    • Hehe.. Que bom que tá curtindo, Carla. Ainda há muitos segredos em torno dessa aventura, mas eles vão se revelando a cada nova etapa.

      Obrigada pela companhia!

      Beijos!

  3. Maravilhoso.

    Personagens apaixonantes em uma história mega
    envolvente.
    Só nos resta a aflição em esperar um cap. por
    semana.

    Continuas arrasando Tattah!

    Bjs,

  4. Bom dia, Tattah!

    Mulher, suas histórias estão cada vez melhores! Hahaha 🙂
    A espera pelo próximo capítulo não é nada agradável pela ansiedade. Por isso evito as histórias em andamento.
    Fiquei feliz com a ação de Vanieli. Estava pensado quando ela se revelaria e foi no melhor momento.
    Quanto a Adel, suspeitava que fosse Aisen desde a colocação que Vanieli se incomodava com sua presença enquanto Lenór se sentia à vontade. Por outro lado, em momento algum foi revelado o que havia acontecido com ela após o ataque sofrido. A conversa entre ela é Lenór durante a refeição na floresta, também me pareceu um diálogo entre iguais.
    Muito emocionante e empolgante cada capítulo. A participação de Volt também. 🙂
    Enfim, meus parabéns. Você é uma das autoras das quais sou fã. 🙂
    Gostei também da forma como usou a ilustração. Na capa parece uma posição de proteção com a esposa. No capítulo ilustra bem a posição de combate.
    Olha essa capa é tão incrível que coloquei como plano de fundo do computador.
    Muito boba, não é? Kkkkk
    Mas gostei de verdade.
    Boa semana!
    🙂 🙂 🙂

    • Pôxa, Viviane!

      Adorei saber disso. Fico muito feliz que tenha curtido a capa a esse ponto, já que ela demorou alguns dias para ficar pronta. Sou metida a perfeccionista, mas é só metida mesmo. kkkk… E não tem nada de bobo, use no seu desktop sem moderação. Hehe…

      Beijos!

  5. Você não sabe o que é ficar uma semana na espera desse capítulo, eu tô amando, não vejo a horas delas começarem a se relacionarem

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