Capítulo 22

Trocamos um beijo gostoso e acabamos dormindo mais uma vez. A semana foi uma correria enorme para mim, tinha que trabalhar e ainda resolver pendências da cerimônia da formatura:

-Linda, você vai comigo no sábado, não vai?

-Claro, Du. Você acha que vou perder sua formatura? – sorriu e me beijou – você tem certeza   que não vai fazer festa?

-Tenho sim, minha mãe está querendo fazer um jantar para depois da cerimônia, acho até   melhor… Só vou reunir poucos amigos.

-Quer dizer então que vou enfim conhecer minha sogra? – sorriu.

-Vai sim, estou até com medo do que pode acontecer, mas não posso pedir para você não ir a minha formatura. Dessa vez minha mãe terá que aceitar minha imposição.

-E você onde vai ser esse jantar?

-Minha mãe quer fazer na casa dela, mas é muito longe e nem todos que vão tem carro.

-E por que não faz lá no meu apartamento? Depois a gente leva sua mãe, sua avó e seu padrasto para casa. De lá é muito mais fácil para o pessoal ir embora.

-É verdade… vou ligar para ela assim que formos para o almoço.

-Du, deixa disso, liga logo. Hoje já é quinta-feira, sua formatura é daqui a dois dias. Não esqueça que ainda tem que falar com seus amigos que vai mudar o local.

Peguei meu celular e liguei para minha mãe que acabou concordando a contragosto. Avisei a Clara que ela tinha concordado e liguei para os poucos amigos que já tinha convidado. Tudo estava conforme planejado e a minha namorada me ajudando em tudo o que eu precisava mais ainda com relação ao trabalho porque eu tinha que me ausentar em alguns instantes para ajudar minha mãe com algumas coisas. Meu celular não parava, eram ligações de minha mãe, meus colegas da faculdade… eles estavam quase me tirando do sério.

O sábado chegou e cedo tive que ir buscar minha mãe – que fez questão de cozinhar e eu adorei – minha avó e meu padrasto. A Clara saiu cedo com a Bruna e Rafa estava comigo no corre-corre que minha   mãe provocou, a cerimônia estava marcada para iniciar as 17h.

16:45h, eu já estava no Centro de Convenções da Bahia – local marcado para a cerimônia da formatura. Ao contrário de todos os outros formandos, eu estava supertranquila. A única coisa que me incomodava era que ainda tão tinha visto a Clara desde aquela manhã. Todos os meus amigos já tinham chegado, inclusive a Dani que em tão pouco tempo se tornou uma pessoa tão especial para mim, sei que ela é a ex da minha namorada, mas isso não influenciou em nenhum momento:

-Cadê a Clara? O celular dela só cai na caixa postal… – perguntei a Bruna.

-Calma Duda, deixei-a em casa se arrumando, já deve estar a caminho.

-Eu estou calma, só não queria que ela se atrasasse.

-Não precisa mais tanta angustia, olha quem está chegando.

Olhei na direção que a Bruna apontou e vi a minha Clara, ela estava maravilhosamente linda com o vestido azul, a maquiagem e o cabelo perfeitos, o sorriso então… assim que ela se aproximou de mim:

-Desculpa a demora – beijou meu rosto sensualmente.

-Não tem problema, já percebi qual foi o motivo – sorri e beijei seu rosto também.

Puxei-a pela mão e apresentei-a a meus amigos e minha família que estava presente, minha avó para variar abriu o sorriso lindo que ela tinha, já a minha mãe, cumprimentou a Clara fingindo não saber o que ela significava para mim, mas isso não me importava, o que eu queria mesmo era o que estava acontecendo ali: meus amigos, minha namorada – junto com os familiares que conheci há poucos dias no sitio também estavam – e minha família ali comigo dividindo um momento tão importante.

A cerimônia foi chata como todas as outras, não aguentava mais ficar ali sem fazer nada, ouvindo, ouvindo, ouvindo tudo o que eu já sabia, mas foi bonita. Ao final, fomos para a o apartamento da Clara.

Foi um jantar muito bom – obvio porque foi feito pela minha mãe – e muito divertido também. Conclui que eu só conhecia gente louca e acima de tudo muito alegre, o que era melhor.

-Duda, seu pai ligou?

-Nem sei pra que você pergunta mãe, ele nem liga no dia do meu aniversário quanto mais na minha formatura, acho que é pedir demais, não acha?

-Não seja injusta com ele.

-Não estou sendo injusta e sim realista, por acaso estou mentindo? Qual foi a última vez que meu pai se lembrou do meu aniversário? Nem eu lembro mais.

-E você avisou a ele?

-Claro que sim, mas também avisei a minha formatura do ensino médio, o dia que passei no vestibular, quando ganhei a bolsa de estudos, o dia que consegui o estágio no instituto, o emprego no Vc3… sempre  o mantenho informado do que está acontecendo em minha vida, não posso fazer nada se ele não cumpre com seu papel de pai de ao menos me dar os parabéns pelas minhas conquistas.

-Tudo bem… que a verdade seja dita, ele sempre foi um pai desleixado.

-Não mãe, você mais do que ninguém sabe que ele nunca se comportou como um pai – respirei fundo – acho melhor mudarmos de assunto.

Ficamos conversando mais algumas coisas até que minha avó se aproximou:

-Duda, estou tão feliz por você, sua formatura foi linda, seus amigos são maravilhosos.

-Obrigada vó, são todos muito loucos, não dê ousadia a nenhum deles – sorri.

-Aquela é a Clara que você falou no celular quando dormiu lá com a gente? A que estava viajando.

-É aquela sim.

-Muito bonita e parece ser muito simpática também. Não tira os olhos de você – sorriu.

Olhei para minha mãe, ela continuava ali, mas mantinha-se calada.

-Pois é vó, ela é tudo o que a senhora acabou de descrever e ainda muito mais.

-Ih, já vi que enfim você se apaixonou.

-Não tenha dúvidas disso.

-Você nunca se apaixonou? Nem pela Patrícia? – minha mãe saiu do silêncio me surpreendendo.

-Não mãe, gostava dela, mas não era apaixonada – respirei fundo – sei que você acha que, na realidade, a culpa é dela sobre minha orientação sexual, mas ela é quem tem menos culpa em tudo isso. Hoje estou apaixonada sim, mas é pela Clara e sei que é recíproco.

-Você é minha única filha, Duda. Não era isso o que eu queria para você, mas já que está feliz, tenho que respeitar.

Não consegui me segurar e abracei minha mãe por um longo momento, quando nos separamos, nós duas estávamos com lágrimas nos olhos:

-Preciso ir ao banheiro.

-É por ali, mãe – apontei a direção do banheiro, perguntei se minha avó queria alguma coisa e procurei a Clara com os olhos, encontrei-a conversando com o pai. Abracei minha namorada por trás – Posso seqüestrar sua filha por alguns instantes, Sr. Augusto?

-Contanto que você a devolva inteira – sorriu.

Puxei a Clara pela mão:

-Pronto, vó. Aqui está.

As duas ficaram um longo tempo conversando, minha avó falando das minhas traquinagens de quando era criança e eu morta de vergonha, claro que minha namorada estava se divertindo com tudo isso. Minha mãe reapareceu e se juntou a gente, sussurrei no ouvido da Clara:

-Relaxa, depois te explico.

Dei um beijo estalado em seu rosto e sai em direção a varanda onde estavam alguns dos meus amigos, peguei uma taça com vinho e debrucei no muro:

-Está feliz, hein?

Eu já reconhecia aquela voz, por isso nem me dei ao trabalho de virar.

-Acho que tudo isso é um sonho.

-Já estava na hora de sua mãe começar a respeitar sua sexualidade.

-E foi da melhor maneira possível, ela está conversando numa boa com a Clara e sabendo que ela é minha namorada. Minha avó então está ali contando tudo o que aprontei na minha infância – sorri me virando para olhar na direção das quatro.

-Pois é, Duda. As pessoas mudam e já estava mais do que na hora de sua mãe começar a mudar, apesar de que ainda há muito por vir.

Olhei para Dani, mais uma vez ela estava conversando comigo através de enigmas e devido ao meu silêncio e minha cara de quem não estava entendendo nada, continuou:

-Você   tem ido pouco ao Centro, deveria ir com  mais  frequência.  Precisa saber lidar    com sua mediunidade para começar a entender algumas coisas.

-Como você sabe sobre minha mediunidade?

A Dani sorriu, segurou minha mão direita e ficou acariciando:

-Isso funciona da mesma forma que o mundo gay, quem já cuida há certo tempo e tem controle, reconhece outro médium em qualquer lugar.

-Quer dizer então…

-Sim, sou uma médium e tem muito mais para lhe contar a meu respeito que nem a Clarinha sabe, mas é necessário que você tenha conhecimento.

-O que, por exemplo?

-Comece a frequentar o centro. Lá você encontrará muitas respostas e as outras serão comigo. Vou com você durante alguns dias. Existem coisas que está acontecendo em sua vida que você não sabe explicar, lá você saberá os motivos e aprenderá a lidar com isso.

-Isso tem a ver com essa sensação que te conheço há muito mais tempo do que a realidade?

-Tem e muito. Só não vou te explicar agora porque não posso mesmo, você não entenderia. Confia em mim e começa a frequentar o centro, sei que já vai há algum tempo, mas não com assiduidade, sempre joga a culpa em cima do seu tempo. Mas, faça um esforço, garanto que não vai se arrepender.

-Tudo bem, farei isso o mais breve possível. Aliás, na segunda-feira.

-Ótimo, mas não prometa a mim, e sim, a você mesma.

Tudo aquilo que Dani conversou comigo era a mais pura verdade, existiam coisas que estavam acontecendo em minha vida que eu não conseguia nenhuma explicação. Meus problemas com meus pais, a Regina, a paixão repentina pela Clara… E várias outras coisas que eu achava meio louco como minha performance na cama, sempre querendo ser a ativa, a atração que as crianças com síndrome de down tinham comigo. Sempre que eu passava por uma delas na rua, queriam me beijar, abraçar e incrivelmente não me sentia nem um pouco incomodada. De uma coisa eu tinha certeza: eu ia mesmo frequentar o  centro e se eu não encontrasse as respostas que eu procurava, ia atrás de Dani.

-Duda, será que você já pode nos levar?

-Claro, mãe. Espera só um pouco que vou pegar as chaves do carro da Clara.

Já com as chaves em mãos, chamei minha namorada no quarto, roubei-lhe um beijo que há tempos ansiava e disse ofegante:

-Segura o pessoal aí um pouco, linda. Vou levar minha mãe, meu padrasto e minha avó em casa, tá?

-Tudo bem, mas só te libero depois de mais um beijo desse.

-Humm, só um beijo? – puxei seu corpo para mais perto do meu.

-Nesse momento sim, mas mais tarde quero que você me coma todinha.

Beijei-lhe ardente, feroz e apaixonadamente, desci por seu pescoço.

-Du… Não faz isso… – derreteu-se.

-Por que, amor? Não está gostando?

-Estou adorando. É por isso mesmo que você não pode continuar. Não vou deixar você sair desse quarto tão cedo.

-Tudo bem. – dei mais um leve beijo e fui em direção a porta e Clara veio logo atrás me encostando na parede – não era você que estava pedindo para parar? – sorri beijando-a.

-Era sim, mas quero mais um beijo.

Depois de mais um beijo e de muito carinho ousado trocado, fomos para a sala, falei com algumas pessoas e avisei a minha mãe que estávamos indo. Ela, minha avó e meu padrasto se despediram de todos formalmente e foi incrível a despedida delas com Clara, teve até abraço.

Já no carro e mais da metade do caminho:

-Gostei muito da sua namorada, Duda.

Olhei para minha avó e sorri.

-Ela também gostou de vocês, vó.

-Ela tem um carinho muito grande por você, parece mesmo apaixonada… quando você nos deixou conversando e foi falar com aquela grandona, ela não tirava os olhos de você, precisava ver o brilho que eles tinham.

Adorei saber daquilo. Continuamos nossa conversa até chegarmos a casa de minha mãe, todos desceram, me despedi, os três me parabenizaram mais uma vez pela formatura e fui embora em seguida. Não queria nem entrar porque eu conhecia as peças e sabia que não me deixariam sair tão cedo.

Quando cheguei, a festa ainda rolava e as pessoas não davam sinal que queriam ir embora, sorri e logo a Rafa me viu:

-Até que enfim, né? Pensei que tinha desistido de voltar e ia dormir na casa de sua mãe –  minha amiga já estava alterada pela bebida.

-Deixa de exagero, vai Rafa. Esqueceu onde eles moram? – olhei para o relógio – até que nem demorei tanto.

-Tá bom, tá bom… Vamos deixar de conversa fiada e nos divertir porque a festa só está começando.

Isso só foi um jantar, o pessoal tinha comprado mais bebida sem me avisar por isso que a festa ainda rolava com tanta animação. Conversei, brinquei, zoei com todos que estavam ali e é claro que namorei muito, afinal de contas não podia ficar perto da Clara e não a beijar. Quase as 4h os últimos convidados foram embora, a minha namorada queria organizar algumas coisas antes de dormirmos:

-Linda… quando acordarmos fazemos isso, vamos dormir… Estou cansada e com sono, vem…

-Não Duda! Não consigo ver essa bagunça e não organizar pelo menos um pouco. Vai tomando seu banho que já estou indo – disse num tom sério.

Respirei fundo e fui tomar meu banho, me joguei na cama sem ao menos me cobrir, algum tempo depois senti um peso na cama e sem abrir os olhos, abracei o corpo que eu tanto sou apaixonada. A Clara nos cobriu e aconchegou-se em mim.

Apesar do cansaço, acabei acordando cedo no dia seguinte. Terminei de arrumar as coisas que Clara deixou por fazer e preparei nosso almoço por conta do horário. Entrei no quarto e minha namorada ainda dormia, retirei o lençol que cobria seu corpo e comecei a beijar-lhe desde os pés até a boca e quando cheguei ao meu destino Clara já estava muito bem acordada, levantei o rosto:

-Bom dia, linda – me aconcheguei entre suas pernas e afundei meu nariz em seu pescoço.

-Bom dia, Du – abraçou-me e fez um carinho com as unhas em minhas costas.

Fiquei ali curtindo o momento, mas logo em seguida levantei:

-Vem, vamos tomar banho, preparei nosso almoço, depois a gente dá uma volta e vamos ao cinema, o que acha? – disse ajudando-a a se levantar.

-Ótima ideia.



Notas:



O que achou deste história?

Deixe uma resposta

© 2015- 2017 Copyright Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem a expressa autorização do autor.