Capítulo 49

O dia foi tão corrido que não tive tempo para pensar nisso antes de ver a Clara novamente na sala de reuniões no escritório do Vc3. Ela lançou um pequeno sorriso em minha direção, mas não deixava de ser lindo, percebi que ela não estava chateada comigo, o que me deixou um pouco mais tranquila. A reunião foi longa e muito produtiva.

Às vezes eu pegava a Clara olhando em minha direção sem ao menos eu estar com a palavra. Sempre que isso acontecia, sustentávamos os olhares até sermos interrompidas por alguém que nos perguntava algo sobre a ONG e que só nós saberíamos responder. Aquele joguinho até que estava interessante:

-Vocês duas estão de parabéns – a Bruna nos elogiou – estão fazendo um ótimo trabalho juntas. Formam uma ótima equipe – sorriu.

-Muito obrigada, Bruna. Estou fazendo o que gosto e acho que a Clara também.

-Concordo que formamos uma ótima equipe, Bruninha, estou muito satisfeita com o trabalho e competência da Duda.

-Bom, falando nisso, tenho um esboço de um novo projeto para vocês duas iniciarem assim que a ONG for fundada.

Nesse momento eu a Clara nos olhamos, eu ainda não havia dito para a Bruna que tinha antecipado minha ida para Portugal:

-Então vou aproveitar esse momento e informar que antecipei minha ida para Portugal para e segunda-feira depois da fundação da ONG.

-Não acredito que perderei uma das nossas melhores colaboradoras assim tão rápido.

Suspirei, olhei mais uma vez para a Clara:

-Vai sim, já está tudo pronto. A universidade já entrou em contato comigo dando a resposta definitiva.

-Bom, gente, a reunião já terminou e eu preciso ir para casa. Meu amor está me esperando – disse um Carlos sorridente e dispensando o restante do pessoal que participava da mesma.

Comecei a organizar meu material enquanto vi a Clara e a Bruna conversando algo que não conseguia compreender, pois estavam um pouco distantes de mim e falavam baixo.

-Até amanhã, meninas.

Disse indo em direção as duas dando um beijo estalado no rosto da Bruna e quando fiz o mesmo com a Clara, ela virou o rosto e acabou sendo na boca. Ela queria outro tipo de beijo, não neguei, estava com saudade dos seus lábios, da sua língua, do seu carinho. Assim que nos afastamos a Bruna soltou uma piadinha:

-E depois querem me convencer que não voltaram, sei… – sorriu – já vi que além de uma das melhores colaboradoras e cunhada preferida, perderei minha irmã em duas semanas também.

Eu e a Clara sorrimos, queria ter a mesma certeza que a Bruna, mas infelizmente não conseguia ser tão otimista:

-Nós não voltamos, Bruninha. Só resolvi deixar de ser tão dura com a Clara. Ela tem essas duas semanas para decidir o que fazer das nossas vidas e não quero voltar àquele clima chato dos últimos meses.

-Mas, voltaram a ter comportamento de namoradas.

-Mais ou menos, Bruninha – foi a vez da Clara falar.

-Como assim?

-É melhor deixar pra lá – sorri, dei mais um beijo na Clara – estou indo. Amanhã venho para cá pela manhã e nós vamos verificar as instalações da ONG a tarde, certo?

-Me deixa ir com você?

-Não, linda – fiz um carinho em seu rosto – vou dormir na casa de minha mãe. Minha avó chegou na semana passada e só pude almoçar com ela no sábado, estou devendo uma visita mais longa – sorri.

-Tudo bem, amanhã a gente se vê – disse um pouco triste.

Abracei a Clara, depositei um suave beijo em seus lábios:

-Fica assim não, amanhã você dorme lá em casa – sorri.

Ela concordou com um aceno de cabeça, nos despedimos, falei mais uma vez com a Bruna e fui embora. Cheguei em casa, peguei uma roupa para dormir e outra para trabalhar no dia seguinte e quando já estava saindo, senti meu celular vibrar no bolso:

-Fala Rafa.

-Você está aonde, Duda?

-Em casa, mas estou de saída, por quê?

-Estou te esperando na porta do seu prédio.

-Aconteceu alguma coisa?

-Não. Só estou querendo saber como você está.

-A Bruna já te ligou, né?

-Já sim, mas eu já queria conversar contigo já tem um tempo.

-Tudo bem, já estou descendo.

Já imaginava o teor da conversa que minha amiga queria ter comigo. Peguei minhas coisas e fui encontrá-la, decidimos conversar no Center Lapa – o shopping gay que comentei no início. Fomos direto para a praça de alimentação:

-Como você está, amiga?

Olhei para Rafa e vi o real sentido da sua pergunta:

-Estou bem, na medida do possível.

-E como vocês estão?

-Não estamos. Só decidi não continuar aquele clima de antes. Você mais do que ninguém sabe o quanto que amo a Clara e não estava mais suportando aquela situação, mas não voltamos, ela tem um pouco mais de dez dias para decidir sobre a gente. Se eu for embora terei certeza que ela prefere ter uma mulher como a Regina por perto, mas uma mãe, do que a mim que nem preciso dizer novamente o que sinto, faço e faria por ela.

-Mas, está acontecendo de tudo nessa reaproximação?

-Não. Ontem dei uma carona a ela porque tinha ido de taxi e ela me convidou para subir até seu apartamento, não resistimos e ficamos namorando até perdemos a noção do tempo e acabei dormindo lá, mas não aconteceu nada demais. Por muito pouco, aliás, por causa da Bruna a gente não fez amor hoje pela manhã. Estava impossível resisti e cedi, mas na hora “H” o telefone tocou e a minha consciência voltou.

-Você está arrependida de alguma coisa?

-Isso é um interrogatório? – brinquei.

-Não, só quero saber um pouco sobre o que está sentindo. Depois que vocês terminaram, você se jogou de cabeça no trabalho e quase não temos tempo para conversar.

-Como diz a minha mãe: “mente vazia é oficina do diabo”. Se eu não mergulhasse no trabalho ia ficar pensando demais nisso e certamente iria enlouquecer com a falta de atitude da Clara.

-Responda minha pergunta – fazia tempo que não via a minha amiga tão séria.

-Não, não estou arrependida de nada. Você já sabe o que acho sobre toda essa situação: não quero saber da Regina e ponto final e antes desse assunto vir a tona estava tudo muito bem. Mais uma vez ela atormentando minha vida – fiquei brincando com minha lata de Coca-Cola ainda cheia.

-Por que você não “força” um pouco a Clara tomar logo essa decisão?

-Mais, Rafa? Desde que esse problema veio à tona é o que mais faço. Não tenho mais ânimo para inovar nas minhas tentativas.

-Domingo é o aniversário dela.

-Eu sei – olhei para minha amiga como se ela tivesse dito o maior absurdo do mundo: como iria esquecer o aniversário da Clara?

-Mais um motivo para você fazer mais uma tentativa.

-Não, Rafa. Estou cansada dessas tentativas frustradas – me larguei cansada na cadeira.

-Eu acho que você deveria tentar pelo menos uma última vez, quem sabe ela agora não cede? Vocês estão bem, estão se curtindo, quase voltando ao início do namoro.

-O que essa sua cabecinha poluída já está arquitetando? – sorri.

-Não sei. Uma surpresa, sei lá… Usa um pouco essa sua criatividade para ter sua mulher de volta – minha amiga devolveu o sorriso.

-Não sei, Rafa. Vou pensar e se eu tiver alguma ideia interessante vou ver o que faço. Mas, não garanto nada.

Continuamos a conversa mais um pouco e logo em seguida fui para a casa de minha mãe. Ela juntamente com minha avó e meu padrasto me recebeu muito bem e nem imaginavam que eu iria dormir por lá esses dias.

Minha avó tinha levado um monte de coisas que adoro: doces, bolos, biscoitos, pães. Essas coisinhas de interior que parece que o sabor é totalmente diferente mesmo fazendo com os mesmos ingredientes. Parece que o clima de cidadezinha de interior muda também o sabor das comidas.

Já era mais de 22h quando ouvi meu celular tocar, atendi:

-Oi – disse tranquilamente.

-Como estão as coisas por aí?

-Está tudo tranquilo, para variar minha avó quer me engordar trazendo aquele monte de guloseimas que ela faz e que tanto gosto – sorri.

-Ela levou aquele doce de banana?

-Doce de banana em rodelas e com calda? Você acha que ela ia deixar de trazer o doce que ela faz que mais gosto e que descobriu que você também adora? – ri – ah, ela trouxe pra você também.

-Serio? Fiquei até com vontade.

Sorri porque sabia onde ela queria chegar:

-Se não fosse tão tarde… – provoquei.

-Até que seria uma boa ideia.

-Onde você está?

-Abre a porta que você vai saber.



Notas:



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