Capítulo 50

Mais uma vez a Clara me surpreendeu, ela estava dentro do carro em frente a casa da minha mãe, entrei e sentei ao seu lado. Antes que eu reclamasse ou falasse qualquer coisa:

-Fiquei com saudade – a Clara disse quase num sussurro.

Fiquei olhando-a, admirando-a. A mulher que eu tanto amava estava ali dizendo que estava com saudade e tínhamos nos visto há um pouco mais de seis horas e ainda por cima nós não estávamos namorando. A Clara me abraçou e ficou com a cabeça apoiada em meu ombro.

Pela primeira vez desde que entrei naquele carro naquela noite, percebi que tinha uma música tocando ao fundo, estiquei meu braço para aumentar um pouco o volume – provavelmente ela diminuiu para me ligar – tocava o CD do Frejat, e no momento tocava a música “Eu não quero brigar mais não” que toquei junto com a Dani no sábado que fui para sua casa em Arembepe justamente no momento que a Clara chegava. Sorri.

-O que foi?

-Até o Frejat está querendo nos ajudar.

Ela parou por uns instantes para então prestar atenção na letra da música:

“…Esquece a nossa última briga/ Lembra o primeiro beijo/ E ouça essa cantiga/ Eu não quero brigar mais não/ Eu quero você toda para mim/ Vou começar pedindo a sua mão…”

A Clara levantou o rosto e tocou seus lábios com os meus, mais uma vez aceitei o carinho e retribui. Não sei se o que eu estava fazendo era o certo para ela tomar a decisão que eu queria, mas a saudade que eu estava dela era tão grande que eu não estava mais conseguindo pensar direito e estava me deixando levar por esse sentimento. Ficamos um longo tempo nos beijando de uma forma calma, doce, suave, satisfazendo nossa vontade até que ouvimos meu celular tocar, me afastei só o suficiente para retirá-lo do bolso e verificar quem era:

-Oi mãe.

-Você está aonde?

-Aqui fora com a Clara.

-Com a Clara?

-É sim, ela apareceu aqui do nada – sorri olhando para minha ex namorada.

-Humm então tá… Só liguei porque você saiu daqui sem falar nada, fiquei preocupada.

-Daqui a pouco eu entro.

-Tá bom, beijo.

-Beijo.

Encerrei a ligação e coloquei o aparelho em cima do porta-luvas do carro, a Clara deitou a cabeça novamente em meu ombro e eu fiquei acariciando seus cabelos:

-Já tem alguma coisa planejada para fazer no domingo?

Sorri.

-Tenho sim – pausa – te ver onde você estiver – depositei um beijo em sua cabeça.

-Estarei na casa do meu pai como todos os anos. Prefiro ficar em família e só convidar poucos amigos. Quero você lá comigo.

A Clara levantou a cabeça para me olhar e ficamos ali, mais uma vez perdidas em nossos pensamentos e em nossos olhares. Encostei nossos lábios e continuamos de olhos abertos:

-Mesmo que você não me convidasse, eu iria – sorri.

-É?

-Sim, esqueceu que conquistei sua família também? Qualquer um deles me deixaria entrar, principalmente minha cunhada favorita.

-Você tem muitos aliados.

-Nós temos aliados para continuarmos juntas.

Segurei sua nuca e a puxei para mais um beijo, ficamos nos curtindo por mais alguns minutos até sermos mais uma vez interrompidas por minha mãe, mas dessa vez estava batendo na porta do carro. A Clara saiu do mesmo para se abraçarem e ficaram conversando um longo tempo sobre o seu “sumiço”. Dizer também que todos – olhou para mim – estavam sentindo sua falta e mais um monte de coisas que só uma mãe poderia fazer.

A minha ex namorada aproveitou e a convidou para seu aniversário e minha avó e meu padrasto também, minha mãe aceitou prontamente:

-Já está tarde, porque não dorme aqui?

Olhei meu relógio, quase meia-noite, a Clara olhou para mim e fiz um sinal como se dissesse para ela decidir. Ela nunca havia dormido lá:

-Não vai incomodar?

-Só vai incomodar se você não ficar porque ficarei muito chateada contigo e não irei ao seu aniversário.

-Que chantagem, hein mãe – sorri.

-Fica quieta, Duda!

-Sim, senhora! – sorri prestando continência.

A Clara aceitou, entramos e minha avó a fez comer todas as besteiras que eu tinha comido, aproveitei para roubar um pouco do seu doce de banana:

-Hei, isso é meu, sabia? – fingiu seriedade.

-Eu sei. Está tão bom quanto o meu, sabia? – sorri.

-E então porque está pegando meu doce?

-Roubado é mais gostoso – continuei sorrindo.

Minha avó e minha mãe estavam entupindo a Clara de besteiras do interior, eu olhava para as três me divertindo muito. Enquanto a minha ex namorada recusava mais uma guloseima, aproveitei para roubar mais um pouco do doce que tanto gostávamos:

-Da próxima vez furo sua mão com um garfo.

-Que garfo? Você está comendo o doce de colher – ri.

-Eu arranjo – fingiu seriedade mais uma vez.

-Ai amor, você não ia ter coragem de fazer isso comigo.

Ela me olhou e sorriu lindamente. Percebi que a chamei de amor, foi meio que sem querer, força do hábito, mas não poderia retirar isso, né? Continuamos as brincadeiras até a hora que decidimos dormir. Como minha avó estava dormindo no meu quarto, minha mãe deu um jeitinho em outro que ninguém usava.

Percebi que essa parte de não prestar tinha puxado a ela porque minha genitora pegou um colchão de ar e colocou para eu e a Clara dormirmos juntas. Peguei a roupa que eu havia levado e dei a ela para vestir, peguei uma antiga roupa para vestir – uma das que havia deixado na casa de minha mãe quando saí de lá – fomos deitar logo depois do banho.

Quando entrei no quarto, a Clara já estava deitada de barriga para cima perdida nos pensamentos. Fechei a porta, desliguei a luz e deitei ao seu lado. Foi aí que percebi que ela já tinha voltado à realidade, pegou minha mão direita, colocou sobre sua barriga e ficou de costas para mim, entendi o que ela queria. Colei meu corpo ao seu e fiquei inspirando o perfume dos seus cabelos, meu coração parecia que ia sair pela boca. Suspirei mais alto do que imaginava:

-Adorei quando você me chamou de amor – nada respondi – queria que voltássemos àquele tempo que você me chamava assim o tempo inteiro – apertei ainda mais o abraço para dar a entender que eu continuava acordada e escutava perfeitamente o que ela falava. Ela virou de frente para mim – volta pra mim, Du.

Mesmo com a escuridão do quarto, conseguíamos enxergar nossos olhos. Fiz um carinho em seu rosto suspirando:

-Só depende de você – disse num sussurro.

Ela estava muda me fitando. Ficou assim por longos minutos:

-Eu aceito sua condição.

Olhei para ela incrédula, não conseguia dizer nada. Não sabia se sorria, se a beijava, se a abraçava.

-Você está falando sério?

Ela balançou a cabeça em sentido afirmativo e buscou meus lábios. Dessa vez o beijo que aconteceu foi mais intenso, mais furioso, mais saudoso, mas não menos gostoso que os outros que havíamos trocado desde o dia anterior. As mãos percorrendo o corpo da outra, as línguas, as bocas foram inevitáveis, pois a saudade que sentíamos era enorme. Tentávamos abafar os gemidos com beijos, mas foi uma tarefa muito difícil. Os orgasmos vinham um logo após o outro, estávamos insaciáveis. Parecia que só havia aquela noite para matarmos todo o nosso desejo, toda a nossa vontade, toda a nossa saudade. Ela estava mais incrível do que nunca, não me deixava descansar um minuto sequer, meu corpo não me obedecia mais e sim obedecia a Clara, tudo o que ela queria, pedia, mandava, ele prontamente fazia automaticamente e sem contestar.

Tínhamos acabado de gozar mais uma vez juntas, o sol estava começando a invadir o quarto. Estávamos sentadas e abraçadas com as pernas em volta da cintura da outra. A Clara fazia o carinho em minhas costas que eu tanto gostava, eu estava com a cabeça apoiada em seu ombro respirando o perfume de seu pescoço. Nós não conversávamos, nós nos sentíamos, sabíamos o que a outra estava dizendo através do olhar, do carinho, do contato do corpo.

Na realidade eu estava com medo daquilo ser um sonho ou mais uma vez a Clara tentando ficar comigo, mas com a Regina ainda em contato com ela. Suspirei com esse pensamento e ela o leu:

-Não se preocupa, amor. A gente não se fala desde o domingo e não pretendo mais ligar e nem vê-la muito menos atender suas ligações.

Não disse nada, apertei mais o abraço e continuamos com aquele contato, com o carinho. A Clara levantou meu rosto para que ela pudesse fitar meus olhos, ficamos assim durante alguns minutos e mais uma vez ela quebrou o silêncio:

-Eu te amo, Eduarda!

Disse seriamente, mas logo depois sorriu e não consegui também ficar séria. Lágrimas começaram a cair dos meus olhos sem que eu pudesse controlar:

-Hei, por que você está chorando? – Clara tentava em vão secar minhas lágrimas.

-Porque ainda não acredito que estamos juntas de novo. Tenho medo ainda.

-Não precisa ter medo Du, eu te amo, estou aqui com você e vou contigo para Portugal – sorriu lindamente mais uma vez.

A puxei pela nuca para mais um beijo, deitamos e nos perdemos naquele carinho ate que enfim adormecemos. Acordei as 070minh, não consegui dormir muito por medo de minha mãe entrar no quarto e nos flagrar daquela forma. Acordei também a Clara com muitos beijos, só não fizemos amor mais uma vez porque muito provavelmente todos da casa já estavam acordados e eu não queria amá-la mais uma vez de forma limitada, queria a minha morena totalmente entregue, fazendo tudo o que gosta na cama e gemendo da forma que tanto me excita.

Conseguimos sair do quarto e tomar banho separadamente. Quando chegamos à cozinha tinha uma mesa preparada para o café da manhã com tudo o que eu gostava. Definitivamente minha mãe e minha avó tinham escutado alguma coisa e perceberam que quase não dormimos:

-Sentem-se e comam. Vocês devem estar famintas – disse minha mãe.

Sorri e olhei para a Clara, ela estava mais uma vez com cor de formiga de tão envergonhada. Eu realmente estava com muita fome, comi de tudo o que tinha ali. Minha mãe tinha caprichado ainda mais do que nunca:

-Dudinha – olhei para minha avó – quando vocês vão para Portugal?

-Resolvi antecipar um pouco e marquei para dois dias depois da fundação da ONG – disse sem maiores detalhes.

-Você vai no mesmo dia que a Duda, Clara?

-Não sei, tenho que ver se consigo ir no mesmo voo. Mas, ainda tenho que resolver algumas coisas sobre a empresa, o apartamento que moro, meu carro, entre outras coisas do tipo. Caso contrário, terei que conseguir mais próximo desse dia.

A conversa continuou, mas sem tocarmos mais no assunto da nossa mudança. Eu ainda não conseguia acreditar que isso estava acontecendo.

Conseguimos ir embora por volta das 9h. Fui direto para o escritório. A Clara passou em casa para trocar de roupa e a tarde nós ficamos de ir verificar as instalações da ONG. A manhã passou voando, podemos dizer assim.



Notas:



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