MARCELA

Não estava arrependida do que havia dito, era o que pensava mesmo. No entanto, fui à procura da Aninha. Não podia me dar ao luxo de ficar brigada com minha melhor amiga.

A encontrei sentada na calçada com aquela sap… Opa, era melhor não pensar, foi por causa daquela palavrinha estúpida que levei uma bronca da minha melhor amiga e a deixei chateada comigo! Enfim, a garota estava com ela. Educadamente, pedi para falar em particular com a minha amiga. A talzinha percebeu que estava sobrando e começou a levantar da calçada se despedindo, mas a minha amiga não ia deixar passar a oportunidade de me envergonhar; Ana a impediu de ir embora.

Juro, quase tive um treco.

Aninha tinha pegado pesado. Ela sabia o quanto me custava fazer um pedido de desculpas. Sabia perfeitamente o quanto sou orgulhosa e que raramente me arrependo e peço perdão a alguém. Fiquei na dúvida se falava ou não, mas acabei pedindo desculpa a ela pelo que tinha dito. Como era esperado, ela me perdoou, mas praticamente me ordenou que pedisse desculpa a talzinha também.

Doeu, viu? Doeu muito no meu orgulho pedir desculpas para aquela lá. E ela nem me respondeu! Simplesmente, foi embora sem olhar para mim.

— Putz, Aninha, tinha que me fazer pedir desculpas para aquela sap…

— Não termine essa frase, Marcela! — se ergueu de um pulo.

— Tá, tá bom, desculpe! Mas, poxa, praticamente me humilhei pedindo desculpas e ela nem olhou na minha cara!

— E o que você queria? Que se ajoelhasse aos seus pés e te agradecesse por ter feito isso? É claro, aliás, muito óbvio que ela não gostou de saber que alguém que nunca lhe dirigiu a palavra na vida fala assim dela pelas costas. Francamente, Marcela, você estava mesmo merecendo uma lição.

Estressei-me de vez.

— Uma lição? Droga, Ana, não entendo por que você defende tanto essazinha com quem tem amizade há tão pouco tempo e chega ao ponto de deixar de sair comigo, que sou sua melhor amiga desde a infância, para sair com ela!

— Deixa disso, Marcela! Ela também é minha amiga e está passando por um momento complicado na vida, precisa de mim tanto quanto você.

Fiquei em silêncio por uns minutos, me dando conta de que tinha me deixado levar pelo ciúme. Havia exagerado um pouco, aliás, havia exagerado muito.

— Tudo bem, desculpa de novo. Nunca fui de sentir ciúmes das suas outras amizades, mas você tem que admitir que passa muito tempo com ela. — Ana me abraçou dizendo que me amava e que era para eu deixar de ser ciumenta.

Ri com seu pedido, mas logo voltei a ficar séria.

Precisava fazer uma pergunta importante, mas estava receosa pela resposta que poderia receber. Ela pegou minha mão e me guiou para dentro de sua casa, fomos para seu quarto. Deitei na cama dela. Ela deitou no chão, como de costume.

A pergunta continuava martelando na minha cabeça, mas o medo da resposta que poderia receber estava me deixando maluca. Inspirei fundo e soltei a pergunta como se fosse uma bomba prestes a explodir.

— Aninha, você é lésbica?

Ela sentou-se. Me olhou por longos segundos, torturantes para mim.

— Não.

Suspirei aliviada e ela percebeu. Teria sido decepcionante para mim se tivesse dito que sim.

— Por que essa pergunta agora?

— Precisava saber — fui sincera.

— Entendo. E como se sente com a resposta?

— Aliviada e feliz.

— E se eu tivesse dito que sim?

Falei a verdade:

— Teria ficado profundamente decepcionada com você.

— Por quê?

Revirei os olhos.

— Não sei te dizer o porquê. Só sei que ficaria muito triste por você ser…

— Diferente da concepção que as pessoas têm do que é normal? Marcela, não há nada de mais nisso. A Joana é uma garota perfeitamente normal, assim como eu e você. A única diferença é que ela gosta de garotas. Mas, isso não significa que ela queira ficar com toda garota que se aproxime dela e que toda garota que ande com ela seja lésbica. Por favor, joga essa sua ideia pré-histórica de que homossexualidade é uma coisa anormal no lixo!

Fiquei novamente em silêncio.

— Odeio quando você me faz sentir vergonha de mim mesma — contei.

— Se sente vergonha é porque sabe que está errada — rebateu.

— Gostaria de saber se você me defenderia dessa maneira caso fosse eu, o que, claro, jamais iria acontecer — alfinetei, mais para contraria-la do que do que como questão. Sabia que ela sempre estaria comigo nos bons e maus momentos.

— Vou fingir que não ouvi isso — informou me enviando um olhar ressentido.

Soltei um suspiro longo. Estava envergonhada, outra vez. Então, tendei mudar de assunto.

— Vai à festa da Raquel hoje?

— Não sei. Hoje é quinta, temos aula amanhã. Você vai?

— Sim, estou precisando me divertir e passar um borrão neste diazinho complicado.

— Pensei que fosse curtir o castigo que, com certeza, vão te dar.

— Você me conhece. Sabe muito bem que isso nunca me impediu de ir aonde quero e quando quero — ela me dirigiu um sorriso sapeca. — Que tal irmos juntas? Já faz um bom tempo que não saímos para nos divertir e caçar uns gatinhos.

— Só se for para voltar cedo. Ainda tenho prova amanhã.

— Combinado!

Ela riu, já estava tudo bem novamente.

— Nem acredito que vamos nos formar juntas. Sendo mais velha, você já deveria estar na faculdade.

— Nem me fale! Tudo graças ao meu querido papai — revirei os olhos.

— Ah, não foi de todo ruim. Pelo menos, você viajou, conheceu pessoas e lugares novos e namorou muito.

Sorri para o teto, isso era bem verdade. Havia aprontado de tudo e mais um pouco naquela viagem.

JOANA

Priscila foi me buscar na hora marcada, nem um minuto a mais ou a menos. A pontualidade era uma das coisas que mais apreciava nela, além de que, era linda e muito educada.

Estacionou o carro em frente à casa onde ocorria a festa de uma de suas melhores amigas. Raquel conhecia meio mundo de gente, de todos os tipos, todas as idades. Não era incomum encontra-la em roda de idosos e ou noutra cheia de adolescentes. Por isso, não me surpreendi ao verificar que já havia muita gente por ali e a música alta se infiltrava através dos vidros fechados do carro estacionado do lado da rua que não tinha iluminação

Priscila me convidou a provar seu beijo e me perder em suas carícias e ficamos algum tempo no carro nos curtindo um pouco. Ela era uma pessoa maravilhosa e eu seria muito feliz se tivesse aceitado meu pedido de namoro, mas ela não era o tipo que namorava, gostava de se sentir livre, por isso só ficávamos sem nenhum outro tipo de compromisso.

Já estávamos ali havia algum tempo e o clima começou a esquentar. O ar condicionado ligado não evitava mais o calor que as carícias dela trouxeram ao meu corpo. Insinuei minha mão até sua intimidade e notei que estava tão excitada quanto eu, ela soltou um gemido baixo com a carícia e me empurrou carinhosamente.

Deu-me um selinho, dizendo:

— Agora não, meu anjo, vamos deixar o melhor para mais tarde. A festa já está bombando e a Raquel vai ficar uma fera se não aparecermos.

Um pouco decepcionada, concordei. Nos recompomos entre selinhos e carícias e entramos na festa que, pelo que pude notar em poucos minutos, estava ótima apesar de ser uma quinta-feira e a maioria dos convidados ter aula no dia seguinte. Eram, em sua maioria, estudantes universitários.

Estávamos dançando quando vi Marcela e Aninha chegarem e quase deixei o baixo astral me abater de novo, mas pela Priscila que não merecia uma má companhia àquela noite, ignorei a presença delas e continuei curtindo a loira linda que se agarrava mais e mais a minha cintura deixando nossos corpos bem coladinhos.

Priscila já estava um pouco bêbada, mas não desgrudava da minha cintura. E eu? Claro que estava adorando. Principalmente, quando ela começou a beijar meu pescoço e sussurrar em meu ouvido.

— Passa esta noite comigo? — perguntou me dirigindo um olhar cheio de promessas e fiquei muito tentada a aceitar, mas não queria me indispor mais com meus pais e declinei.

— Preciso voltar cedo.

— Ainda com problemas em casa? — me puxou para mais perto.

— Sim — escondi meu rosto em seus cabelos, sentindo a lentidão da música envolvendo nossos corpos e o toque macio dos lábios dela no meu pescoço. Era um beijo suave, mais um carinho do que uma carícia com fins de provocar.

— Vai ficar tudo bem — afirmou e me apertei mais a ela.

Em certo momento, percebi que Aninha e Marcela nos observavam. Ana, como sempre, exibia um sorriso divertido. Já Marcela, nos olhava horrorizada e, por um segundo me senti mal, mas depois comecei a me divertir com aquilo.

Deslizei minha mão pelas costas de Priscila, era um carinho singelo, mas o fiz de forma provocante e, enquanto ela se agarrava mais a minha cintura e se servia do meu pescoço, eu não tirava os olhos de Marcela. A música mudou para uma mais alegre e sensual e, para provocar mais, mordisquei a orelha da minha linda loira e tomei seus lábios com muita fome. Confesso, nem estava me reconhecendo. Geralmente, era bastante discreta quando estava com alguém em público.

Marcela, do outro lado da sala, batia o pé incomodada e fingia não estar nos observando, já Aninha ampliou o sorriso e me dirigiu uma piscadela. Priscila se enroscava em mim, provocante e sensual, me fazendo promessas com seu olhar cheio de luxúria.

Trocou-se a música outra vez e percebi que Raquel, a dona da festa, havia feito propositalmente, pois deixou um sorriso provocante escapar para Priscila. Desta vez, Ana veio até nós. Paramos de dançar para lhe dar atenção.

— Oi, Meninas! Nossa, vocês estão lindas hoje. E que belo showzinho, hein?

— Olá, Aninha — Priscila cumprimentou sorrindo, já se conheciam de longa data.

— Oi, Ana. Ah, a gente tem que aproveitar enquanto pode, né? Mas, não estávamos dando show algum.

— Sério? Então, todos os marmanjos que estavam babando pela sala devem ter sido minha imaginação — sorriu maliciosa.

Enlacei-a pela cintura e a puxei de modo que ficou entre mim e Priscila.

— Já que você gostou do “nosso show”, que tal participar dele agora? — sorri, sapecando um beijo em sua bochecha.

Ana era totalmente desencanada e aceitou o convite de pronto. Começou a dançar sensualmente entre mim e Priscila. Agora, sim, estávamos dando um show. Ana colou seu corpo ao meu, enquanto deslizava as mãos pelo corpo de Priscila; tinha nos lábios, um sorriso que vagava entre o brincalhão e o malicioso e todo mundo parou de dançar para nos assistir.

Senti um prazer indescritível ao olhar para Marcela e vê-la de queixo caído de tão horrorizada que estava. Dançar com as duas não havia sido nada de mais, já havia acontecido outras vezes, mas considerei aquele momento como uma pequena vingança contra aquela metida.

A música chegou ao fim e nos despedimos de Ana com um abraço apertado. Empolgada com a brincadeira ela me deu um selinho e vi o queixo de Marcela despencar, então Priscila e eu fomos embora, rumo a nossa festinha particular.



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