Aquela Palavra

Aquela palavra

As paredes multicoloridas do nosso antigo quarto guardam inúmeros segredos e lembranças. Sentada na beira da cama, examino todo o ambiente. Em frente a mim está o guarda-roupa robusto que tem, em seu interior, algumas das nossas intimidades.

Levanto da cama e o abro, na ânsia de encontrar aquele seu perfume que,em mim,causava uma explosão de sensações. Uma ou duas blusas suas estão no cabide e muitas outras desarrumadas, ainda. Escondi uma peça em minha mala, para ter algo que tivesse apenas o seu cheiro, sua essência quando aquela palavra se fizesse presente. Nas gavetas, diversas coisas inúteis, no momento. Na parte superior, onde guardávamos as roupas de cama encontrei aquele mimo que te dei um dia. Mais ao fundo, nosso baú de tesouro.

Fechei o guarda-roupa e voltei para a cama, de posse do baú bordô. O cadeado estava um pouco emperrado, mas, forçando, consegui abrir. Olhando cada objeto específico, fui transportada para um passado não muito distante.

Era um dos nossos tão aguardados fins de semana e havíamos combinado de nos encontrarmos e decidir o que fazer. Cheguei em sua casa, fui recebida por ela vestindo uma regata de estampa e um short desses folgados no corpo que usamos quando pretendemos fazer uma faxina. Ela me olhou e sorriu. Aquele sorriso meio tímido, meio intencionalmente malicioso. Era uma das coisas que mais amava nela.

Os olhos castanhos hipnóticos e expressivos escondiam, por trás da sua doçura, uma leve travessura. Ela estava aprontando algo. Pediu que eu deixasse minha mochila na sala e, sob hipótese alguma, entrasse no quarto. Sim, ela, de fato, me escondia algo.

Entrei no jogo. 

Fomos para a cozinha, conversamos sobre os dias enquanto preparamos a janta, coisa essa que eu só fazia com ela. Primeiro porque dificilmente eu gostava de cozinhar apenas para mim. Segundo, não possuo o hábito de jantar. Ela no fogão e eu na pia, lavando e cortando alguns ingredientes. Ela foi para o banho e me deixou tomando conta da panela, para que eu, curiosa, não fosse espiar o quarto. Quando ela voltou foi a minha vez de banhar-me.

A mesa estava posta para nós duas. Com direito a luz de velas. Um clima romântico com leve toque de sedução havia se instalado. A caixinha de som reproduzia músicas suaves que agradavam a ambas. Jantamos envoltas em uma aura de cuidado e afetividade. Sabendo que sou apaixonada por doces, havia uma sobremesa. Um pedaço de torta de chocolate com morango, que fiz questão de dividir com ela dando algumas colheradas para que ela pegasse.

Não sei em qual momento ocorreu o primeiro beijo daquela noite. Percebi que seu corpo havia se encaixado ao meu, que ela havia levantado da cadeira, sentado em meu colo e me olhava como se eu fosse a personificação de Afrodite na terra. E eu era apenas para ela. Sentia seus carinhos sutis em minha nuca e os dedos de sua outra mão contornarem meu rosto fazendo leves carícias. Fechei meus olhos e, por um momento, agradeci a quem quer que fosse o responsável.

Ao abrir os olhos, era possível sentir o desejo ardente que saía de nossos corpos. Levantei da cadeira com ela presa pelas pernas em minha cintura e caminhei em direção ao quarto fazendo pequenas paradas nas paredes enquanto nos beijávamos com a fome de muitas eras. Ela desceu dos meus braços e se pôs atrás de mim, abriu a porta e meus olhos marejaram com o que viram.

Nosso cantinho estava iluminado. O cheiro do perfume misturado ao incenso de canela no ar dava uma sensação gostosa de acolhimento. Em cima da cama, um pequeno bilhete que dizia, resumidamente, que eu era amada de maneira única. Não percebi as lágrimas vertendo dos meus olhos até o momento em que ela passou a enxugá-las e beijar-me as bochechas, os olhos, a testa, o queijo e, por fim, nossos lábios uniram-se. Sentia o gosto do seu beijo com um toque lacrimal. Nossos corpos voltaram a se unir e a cama macia os recebeu.

Cada parte do corpo desnudada recebia carícias e afagos. Por vezes, alguma marca seja de um chupão entre os seios ou pescoço, sejam unhas fazendo caminhos nas costas ou parte interna das coxas. Nenhum pedaço de pele ficou sem carinho e adoração. Meus dedos adentraram seu templo sagrado ao mesmo tempo em que os dela adentraram em mim. A dança do amor se iniciou ao som de piano, saxofone e gemidos cada vez mais altos. Pequenas mordidas em lugares estratégicos foram cruciais para alcançar o nirvana do gozo sexual. Nos enrroscamos e ficamos ali, quietas. Apenas sentindo o bater descompassado dos corações, a transpiração dos corpos, o cheiro de sexo com gosto de amor, os dedos entrelaçados e a vontade de não mais sair. Não precisávamos dizer nada. Através dos olhos tudo era dito. No fim, ela sempre se escondia na curvatura do meu pescoço. Era um misto de vergonha e dengo. E eu gostava disso e de todo movimento que me guiava.



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